terça-feira, 14 de junho de 2011

Opinião – José de Souza Martins

"Cabral já não é Cabral, porque se revitalizou e se reelegeu à sombra do lulismo. Seu impasse de agora apenas mostra que o lulismo pode ser bom para ganhar eleição, mas não assegura condições para governar na solidão do poder. No Rio, a simpatia popular vai para a tropa que, mesmo equivocada na forma da reivindicação, atormenta o palácio e encanta a cozinha. É nesse sentido que o episódio do Rio se aproxima do episódio quase simultâneo de Brasília, a crise envolvendo o ministro da Casa Civil, Antonio Palocci.

À sombra do lulismo surgiram figuras, como Cabral e a própria presidente Dilma Rousseff, cuja ascensão política representa um certo desvio em relação à normalidade eleitoral. Mesmo que tenham competência própria, tornaram-se reféns de legitimidade alheia. Essa dependência mostrou agora a fragilidade política de seus supostos beneficiários. "

José de Souza Martins, professor emérito da Universidade de São Paulo, é autor de A Sociabilidade do Homem Simples (Contexto). Fogo mal apagado. Aliás/O Estado de S. Paulo, 12/6/2011.

Manchetes de alguns dos principais jornais do Brasil

O GLOBO

Entidades leiloam negócios com o governo na internet
Classe C começa a atrasar prestações
Porto começa a ter serviços terceirizados
Dilma recua e apoia sigilo eterno de documentos
Italianos derrubam leis de Berlusconi

FOLHA DE S. PAULO

Gasto com doentes sobe e pressiona Previdência
Dilma recua de urgência contra o sigilo eterno
Primeiro projeto de Tiririca na Câmara prevê criação de 'bolsa alfabetização'

O ESTADO DE S. PAULO

Dilma assume articulação e diz ter 'afinidade com política'
Dívidas dos Estados terão mudança no indexador
Governo retira urgência sobre sigilo de papeis

VALOR ECONÔMICO

País inicia ações para enfrentar ataques virtuais
Consumo de bens de capital cresce 10%
BRF negocia acordo com o Cade
Duas rotas que levam à redução da taxa de juros

ESTADO DE MINAS

Travessia de risco
Poder feminino
Vulcão volta a cancelar voos

CORREIO BRAZILIENSE

Recorde de reclamações contra planos de saúde
Elas têm o poder
Cinzas voltam e 30% dos voos internacionais são cancelados

ZERO HORA (RS)

Jovem brasileiro sonha com emprego e boa formação profissional

JORNAL DO COMMERCIO (PE)

Justiça funcionará em horário integral
Dilma quer conforto em casa popular

Entidades leiloam negócios com o governo na internet

Criadas com o objetivo de evitar fraudes e donas de um selo de qualidade emitido pelo Ministério da Justiça para receber recursos públicos, as Oscips (Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público) se transformaram em um negócio lucrativo. Na internet, anúncios oferecem: "Passo a presidência e diretoria de Oscip com 4 anos, devidamente registrada no Ministério da Justiça, sem pendência. R$ 25.000." No endereço desta Oscip, em Ceilândia, bairro pobre de Brasília funciona uma pizzaria. Muitas Oscips anunciadas na internet são organizações de fachada, que existem só para receber o dinheiro dos convênios com o governo federal. A fiscalização é falha. Segundo o Tribunal de Contas da União (TCU), é de R$ 120 milhões o total de verba federal repassado a Oscips por intermédio de parcerias cujas prestações de contas estão pendentes: não foram apresentadas ou analisadas.

Quando o interesse público está à venda

ONGs com selo de qualidade do governo, Oscips são negociadas até na internet

Alessandra Duarte

Oanúncio no site é claro: "Passo a presidência e diretoria de Oscip com 4 anos, devidamente registrada no Ministério da Justiça, sem nenhuma pendência em qualquer órgão regulador. Já com o certificado 2011. R$25.000". A venda pela internet de Oscips - Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público, entidades não governamentais sem fins lucrativos que recebem do Ministério da Justiça uma espécie de selo de qualidade, que lhes habilita a serem contratadas por governos e a prestarem serviços públicos - é o lado mais visível de uma série de irregularidades que envolvem essas entidades.

Criadas pela lei 9.790/1999 para distinguir, no universo das ONGs, as que têm chancela do Ministério da Justiça, as Oscips surgiram para melhorar a fiscalização do setor, mas, na última década, estão servindo a fraudes e desvios como ocorria antes com as ONGs. Segundo o Tribunal de Contas da União (TCU), é de R$120 milhões o total de verba federal que não teve prestações de contas apresentadas ou ainda não analisadas de termos de parceria, instrumento de uso exclusivo das Oscips.

Ação contra "pirâmide"

A venda de Oscips foi alvo de operação da Controladoria Geral da União em dezembro de 2010, mas trocas de e-mails entre anunciantes das entidades e O GLOBO mostram que a prática continua. Levantamento em acórdãos do TCU deste ano e do ano passado mostra outro tipo de fraude: num processo seletivo, a Oscip concorre com outras entidades ligadas a ela - o que faz com que o resultado, seja ele qual for, beneficie a mesma entidade ou pessoa.

Empresas privadas também pagam uma "taxa de administração" a uma Oscip para que esta faça o contrato com o poder público, livrando-se, assim, da licitação - que seria necessária caso a empresa fosse contratada diretamente. Nesse caso, a Oscip subcontrata a empresa que paga a taxa, e é esta que recebe a verba pública para o serviço. Segundo a CGU, além da venda, que "desqualifica o caráter filantrópico" da Oscip, a grande fraude tem sido "a criação de entidades de fachada":

- Elas simulam cotações de preços entre empresas muitas vezes fictícias, ou realização de eventos ou fornecimento de produtos - diz Luiz Navarro, secretário-executivo da CGU.

- Como Oscip não pode ter lucro, uma fraude que vimos é a Oscip criar empresas só para fornecerem nota fiscal a ela e, assim, "comprovar" despesa que não existiu, e isso é seu lucro - diz o delegado da Polícia Federal Fabiano Bordignon, responsável pela Operação Déjà Vu 2, de abril deste ano, que descobriu desvio de R$18 milhões em fraudes entre prefeituras e Oscips em quatro estados e no DF.

Outra prática - alvo de processo no Tribunal de Justiça do Rio, após ação do Ministério Público - é a de uma Oscip atuar como agente de financiamento imobiliário, num esquema de pirâmide: associados pagam uma espécie de parcela e recebem "pontos" se conseguem novos associados.

O GLOBO entrou em contato com o e-mail do anúncio que cobra R$25 mil por uma Oscip. A resposta: "Documentos registrados em cartório, da mesma forma será transferida em cartório. Favor deixar contato, já tenho negócio iminente". Na resposta, assinada por "Márcio", o anunciante indica um link, que leva à Oscip Instituto Nacional de Fiscalização (INF). O símbolo da entidade - que no site diz atuar no combate à pirataria - lembra o distintivo da Polícia Federal.

Em outro anúncio, a oferta: "Passo a presidência de Oscip com 6 anos, com certificação, toda regularizada". O GLOBO fez contato por e-mail com o anunciante, que respondeu: "Totalmente limpa e desimpedida, faça sua proposta". Segundo ele, que usa o email "Sanpherr Construtora", a Oscip não presta serviços a órgãos públicos. Ainda de acordo com o anunciante, a razão da "desistência" da entidade é que "preciso de dinheiro". Ele enviou o que seriam "as finalidades" da Oscip: um compêndio que junta agricultura, intermediação financeira, desenvolvimento de software, ecoturismo, mídia, construção de penitenciárias e conjuntos habitacionais.

Num outro anúncio, a prova de que até contratos com governos já são negociados irregularmente: "Passo presidência de uma Oscip por R$300 mil. Temos créditos federais e estaduais de R$1 milhão". Ao ser procurado pelo GLOBO, o anunciante, "Edevaldo", alegou: "Não tenho mais esses créditos, já venceu o prazo de uso".

"Atenção políticos e empresários! Passo toda diretoria de ONG com mais de dez anos. Pode fazer alteração no estatuto (...) e solicitar mudança de ONG para Oscip", divulgou outro anunciando, vendendo facilidades para conseguir a chancela do Ministério da Justiça. Ao revelar o preço, uma mostra de como o mercado atua: "Só R$20.000 (esse valor, se você colocar sistema de carnês para colaboradores, você tira em 2, 3 meses)".

Acórdãos do TCU mostram ainda mais "criatividade" dessas entidades que surgiram para evitar, justamente, irregularidades que estavam sendo cometidas por ONGs. Um deles, de fevereiro, por exemplo, descobriu "pagamentos a pessoas físicas com identificação fictícia, em face da inexistência do nome e/ou CPF indicado", em convênio entre a Agência Nacional de Águas e o Instituto Pró Rio Doce, de Minas.

Outros três acórdãos, de fevereiro passado, revelam indícios de irregularidades em convênios e termos de parceria da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres e da Secretaria Especial de Promoção da Igualdade Racial com o Instituto Treinar, de Florianópolis. Um dos acórdãos vê "indícios de conluio entre as licitantes". Para o relator, ministro Ubiratan Aguiar, "saltam aos olhos indícios de má-fé na gestão de recursos públicos pelo Treinar, cujo diretor-geral aplicou recursos recebidos em contratações com empresas das quais eram sócios ele, seus familiares e pessoas ligadas à entidade".

No acórdão 1.205/2011, sobre "possíveis irregularidades nas transferências voluntárias a organizações não governamentais em Sergipe entre 2008 e 2010", o TCU determina que o Ministério do Trabalho suspenda o repasse de verba a várias entidades, entre elas a Oscip Agência de Tecnologia, Pesquisa e Ensino do Nordeste (ATNE). A Oscip não presta contas desde 2009 e, diz o TCU, tem representantes envolvidos com entidades "cuja existência física não pôde ser comprovada".

FONTE: O GLOBO

Dilma recua e apoia sigilo eterno de documentos

Dilma cede, e governo vai apoiar sigilo eterno

Presidente aceita mudança na Lei de Acesso à Informação Pública que permite segredo de documentos por tempo indeterminado

Roberto Maltchik

BRASÍLIA. Sob pressão de dois ex-presidentes, além do Itamaraty e das Forças Armadas, a presidente Dilma Rousseff recuou e deu carta branca para que a Lei de Acesso à Informação Pública seja aprovada pelo Congresso com a possibilidade de que documentos públicos fiquem em segredo por tempo indeterminado. Com a decisão, o Planalto contempla o relator da proposta na Comissão de Relações Exteriores do Senado, o ex-presidente Fernando Collor de Mello (PTB-AL), e, assim, cria condições para o texto ser sancionado nos próximos meses. O recuo provocou protestos de historiadores e também de parlamentares governistas e de oposição.

A decisão de Dilma foi revelada pela nova ministra de Relações Institucionais, Ideli Salvatti, antes mesmo de sua posse, o que causou mal-estar na cúpula do governo. Além de Ideli, outro ministro, ouvido pelo GLOBO, confirmou que o governo está disposto a manter trancafiada parte dos documentos históricos. O regime de urgência para análise da proposta será retirado, diz o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR).

O texto em debate no Senado prevê o contrário: as informações ultrassecretas devem ficar guardadas por, no máximo, 50 anos, seguindo um artigo incorporado ao texto original do governo pela Câmara. Porém, Collor e o ex-presidente José Sarney - que hoje comanda o Senado - atuam abertamente para impedir que documentos sejam revelados, entre os quais textos produzidos em seus mandatos. De acordo com Sarney, trata-se de uma precaução para não reabrir feridas do passado:

- A abertura total, não. Documentos históricos, que fazem parte da nossa História diplomática, que tenham articulações, como a que Rio Branco teve de fazer muitas vezes, não podemos revelar. Senão, vamos abrir feridas - disse Sarney, negando que ele mesmo seja beneficiado pela mudança.

Relator do projeto na Câmara vê "retrocesso"

Dentro do governo, a Controladoria Geral da União (CGU) será derrotada, caso o sigilo eterno prevaleça. Já no Congresso, o relator do projeto na Câmara, deputado Mendes Ribeiro Filho (PMDB-RS), diz que é um retrocesso que acaba com o princípio da lei.

- Então, que lei é essa? Não há como compreender sigilo eterno em um mundo de transparência. Hoje, não existe nada que não esteja passível de ser descoberto - salientou o peemedebista.

Representantes da sociedade que participam da articulação pela aprovação da lei explicam que o lobby pelos arquivos secretos mira em disputas por fronteiras, como a travada na Guerra do Paraguai, e capítulos da ditadura militar, como a atuação do Itamaraty durante a Operação Condor, ação coordenada das ditaduras sul-americanas para perseguir seus opositores. O cientista político Ricardo Caldas, que desenvolve estudo na Universidade de Brasília (UnB) sobre transparência e corrupção, diz que a mudança é o elogio à cultura brasileira da falta de transparência.

- É um absurdo! Isso mata a lei. Agora, teremos um volume inacreditável de documentos que serão classificados como ultrassecretos para que fiquem guardados para sempre - acredita Caldas.

O presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), o senador Aécio Neves (PSDB-MG) e o relator do projeto na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, Demóstenes Torres (DEM-GO), também se manifestaram contra o sigilo eterno.

- É um retrocesso, uma contradição em relação ao que o governo vem dizendo até aqui - comentou Aécio.

O coordenador do Fórum de Direito à Informação, Fernando Paulino, acredita que a polêmica pode fazer com que o governo volte atrás. Especialmente, pelo impacto econômico que esse texto teria sobre investimentos estrangeiros no Brasil.

- A Lei de Informação tem impacto sobre os investidores que miram no Brasil pensando na Copa e nas Olimpíadas, que querem saber o nível de transparência do país em que investem. Foi assim na África do Sul e será assim no Brasil. O segredo só aumenta a chance de especulação - destaca Paulino.

FONTE: O GLOBO

Classe C começa a atrasar prestações

Em maio, pelo quarto mês consecutivo, a inadimplência cresceu, e 75,74 dos atrasos estão em prestações de até R$ 250, segundo pesquisa da Confederação Nacional dos Dirigentes Lojistas. A confiança e a intenção de compra desses consumidores também caíram. Pesquisa Mensal do Comércio, do IBGE, que apontou a primeira queda nas vendas em 11 meses, reforça essa tendência.

Calote esfria consumo da classe C

Inadimplência subiu nas prestações mais baixas. Intenção de compra cai

Ronaldo D"Ercole, Paulo Justus e Mariana Durão

Passados mais de seis meses desde que o governo começou a adotar medidas para restringir a oferta de crédito, os consumidores das classes C, D e E, que se tornaram o motor das vendas do comércio em todo o país, começam a perder o ímpeto de ir às compras. E o sinal mais visível é a inadimplência. Mais endividados e com os ganhos corroídos pela inflação, começam a atrasar as prestações. Em maio, a inadimplência medida pela Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL) cresceu pelo quarto mês seguido, avançando 8,21% em relação ao mesmo mês de 2010. O maior volume de atrasos está nos financiamentos com prestações baixas: 75,74% dos inadimplentes no mês passado tinham prestações atrasadas de até R$250, sendo que aqueles com parcelas de até R$50 representavam 32,67% do total, um salto em relação aos 24,97% de calote nesses contratos em janeiro. No Rio, 15,7% dos entrevistados da classe C disseram ter alguma prestação atrasada (contra 12,1% um ano antes) e 21,6% afirmaram que o orçamento familiar será deficitário após o pagamento das despesas, de acordo com Perfil Econômico do Consumidor Brasileiro (PEC) da Fecomércio-RJ:

- Nesses casos, a gordurinha do orçamento não foi suficiente para lidar com a alta da inflação e um forte acúmulo de consumo nos últimos anos - diz Christian Travassos, economista da instituição.

Para Roque Pellizzaro Júnior, presidente da CNDL, os novos dados de inadimplência "acenderam a luz amarela" entre os lojistas.

- Isso indica que a população que está ascendendo, que foi às compras porque o crédito era farto, assumiu compromissos além de sua capacidade de pagamento. Não é que ele seja mau pagador.

Vendas paradas em comércio popular

Com as prestações em atraso, o consumo fica para depois. Pesquisa nacional realizada pela Associação Comercial de São Paulo (ACSP), também de maio, mostra que o índice de confiança da classe C caiu 6,5% e chegou aos 144 pontos, próximo da média do país, de 143 pontos. Foi a segunda vez este ano que o indicador dessa classe de renda se aproxima da média nacional, fenômeno que não ocorreu em todo o ano passado.

- A classe C foi a mais afetada pelas medidas do Banco Central para encarecer o crédito, justamente porque depende mais dos parcelamentos para poder comprar - afirma Emílio Alfieri, economista da ACSP.

No Rio, o mesmo movimento. Em abril, houve queda na intenção de compra da classe C, de acordo com a pesquisa da Fecomércio-RJ. Apenas 11,6% dos entrevistados pretendem comprar algum bem durável nos próximos três meses. Em abril de 2010, o percentual era de 15,2%.

- Isso não é um mau sinal para o comércio porque mostra que o consumidor da classe C está organizando melhor seu orçamento, para honrar os compromisso e voltar a comprar - diz Travassos.

Instalados numa área comercial voltada principalmente às classes mais populares, os lojistas do Brás, bairro da região central de São Paulo, dizem que o faturamento neste ano estagnou.

- Vendemos no primeiro trimestre o mesmo que no ano passado. Se levarmos em conta a inflação no período, houve perda real de vendas - disse o diretor da Associação de Lojistas do Brás, Jean Makdissi Júnior.

O motoboy Marco Wilson Simões conta que está fazendo de tudo para cortar os gastos. Com o "nome sujo na praça" desde o ano passado, Simões deixou de comprar roupas e presentes para fazer frente à alta no preço dos alimentos e pagar ainda as contas de um dos dois cartões de crédito que possui. E tem também as parcelas da moto nova e os gastos com o filho, que nasceu há um mês. Tudo isso com uma renda familiar que varia de R$1,7 mil a R$2,2 mil. Por isso, a dívida de R$2,2 mil do outro cartão, diz, vai ter de esperar para ser paga.

- Já não gastei nada no Natal do ano passado nem no Dia das Mães. Este ano, vamos passar só com o amor mesmo - diz Simões.

Atenta a todos esses sinais, a Federação do Comércio de São Paulo (Fecomércio-SP) já trabalha com a perspectiva de uma estagnação nas vendas no primeiro semestre em relação à primeira metade de 2010. Os dados da pesquisa conjuntural do comércio varejista na Região Metropolitana de São Paulo mostram um crescimento de apenas 0,1% do faturamento do varejo de janeiro a abril, comparado a igual período do ano passado. A Pesquisa Mensal do Comércio, do IBGE, divulgada na última sexta-feira, registrou a primeira queda nas vendas em 11 meses.

- A redução do consumo ocorreu mais no que a gente chama de supérfluo, em produtos como os eletroeletrônicos e os eletrodomésticos - diz Fábio Pina, assessor econômico da Fecomercio-SP.

Carmen Calixto da Silva, encarregada de limpeza, termina de pagar em julho as parcelas de R$300 da TV que comprou no ano passado, em dez vezes, e agora quer economizar para adquirir a casa própria. Por isso, desde o começo do ano, não comprou nada que considera supérfluo, como roupas e eletrodomésticos. Outro fator que pesou nas contas foi o encarecimento dos alimentos, que consomem boa parte dos R$1,3 mil que ganha.

Um levantamento da consultoria Kantar Worldpanel em 8,2 mil domicílios mostrou desaceleração no consumo de todas as classes no primeiro trimestre, frente ao mesmo período do ano passado. Na classe C, o consumo por unidade continua subindo, mas em ritmo menor: 3% de janeiro a março, ante taxa de 16% nos primeiros três meses de 2010.

FONTE: O GLOBO

Charge: O Arraial do Planalto


Humberto/Jornal do Commercio (PE)


Tutela:: Merval Pereira

A aprovação de uma vasta maioria - nada menos que 64% dos entrevistados pelo Datafolha aprovam sua interferência no governo Dilma - legitima a atuação de Lula nos episódios políticos recentes e confirma que a percepção generalizada é a de que o governo Dilma não passa de um interregno ditado pela legislação brasileira, que impediu que Lula disputasse um terceiro mandato consecutivo.

A solução mal ajambrada encontrada pela presidente Dilma Rousseff para sair da crise provocada pela demissão de Palocci é uma tentativa de dar marca própria a um governo que parece refém de dois agentes políticos, o próprio ex-presidente Lula e o PMDB.

O discurso de posse da ministra Ideli Salvatti no posto de coordenadora política do governo ressaltou um insuspeitado lado negociador, que até agora era tido como inversamente proporcional ao seu mais conhecido e público espírito guerreiro, que identifica em um adversário político o inimigo a ser derrotado.

Menos mal que as palavras tenham sido escolhidas com o cuidado de quem sabe que o que se teme em sua atuação é o contrário do que ela deveria ser no comando das relações institucionais do governo, e pelo menos no discurso a ministra Ideli mostrou-se pronta a desconstruir a imagem que dela tem a maioria dos políticos.

Ato contínuo, demitiu o segundo homem do ministério, um adversário político seu dentro do PT de Santa Catarina, para demonstrar que afabilidade tem limites.

O episódio da saída da Casa Civil de Antonio Palocci afetou a credibilidade da presidente Dilma, mesmo que a avaliação geral de seu governo continue dentro dos mesmos níveis anteriores, em torno de 50%.

Eles revelam, no entanto, o mesmo quadro que encerrou a eleição de 2010: um país dividido entre os que apoiam o governo e os que o rejeitam, de maneira mais radical - apenas 10% dos entrevistados, mas número em crescimento -, ou desconfiam dele - 38% o consideram apenas regular.

Esse índice regular, por sinal, pode ser computado como positivo ou negativo, dependendo de quem leia a pesquisa, ou dos critérios técnicos que variam de instituto para instituto.

São eleitores, no entanto, que na teoria estão à disposição da oposição. Se levarmos em conta que 60% dos entrevistados consideram que o episódio Palocci prejudicou a imagem da presidente, e só um terço aprova seu comportamento durante a crise, teremos aí uma base para atestar que sua figura de líder saiu maculada da primeira crise que enfrentou.

Para 57%, Dilma conhece, sim, a lista dos clientes de seu ex-ministro. Essa convicção aumenta à medida que cresce o nível financeiro dos ouvidos: 67% na faixa entre cinco e dez salários, 80% entre os acima de dez salários.

A indecisão da presidente no episódio marcou os eleitores: na pesquisa anterior, 79% dos ouvidos achavam Dilma uma pessoa decidida, hoje este número é de 62%.

Até a inteligência e a sinceridade da presidente estão colocadas em dúvida pelo episódio: eram 9% os que a achavam pouco inteligente, hoje já são 20%, enquanto chega a 22% o número de pessoas que a acham insincera.

A insegurança do eleitorado também aumentou nos últimos meses: 51% acreditam que a inflação continuará a subir, e apenas 33% acreditam que o poder de compra vai subir.

Se juntarmos essas desconfianças com o entusiasmo com que veem a intervenção de Lula nas ações do governo, temos uma mistura explosiva num governo que tem dentro de casa dois partidos se digladiando pelo poder e insatisfeitos com as decisões da presidente, algumas vezes mais pelas virtudes reveladas por suas decisões do que por defeitos identificados pelos fisiológicos dos dois partidos.

O controle do apetite da base aliada, por exemplo, é uma boa iniciativa da presidente Dilma, assim como seu comportamento sóbrio até o momento, que, contrastando com o narcisismo de Lula, havia produzido um ambiente político mais relaxado no país até a crise envolvendo Palocci - que proporcionou a explicitação das indecisões da presidente e a atuação desembaraçada de Lula.

A carta que enviou ao ex-presidente Fernando Henrique, pela comemoração dos seus 80 anos, é um exemplo de civilidade que ela já havia dado ao convidá-lo a participar, com outros ex-presidentes, de um almoço em homenagem ao presidente dos EUA, Barack Obama.

Assim como se recusou a comparecer ao almoço, também até o momento Lula não se dignou a enviar os cumprimentos ao seu antigo aliado político e amigo, que a política distanciou.

Mas as palavras de Dilma têm sentido mais amplo que a pura protocolar homenagem ao aniversariante ilustre.

Ela, em poucas linhas, desconstrói toda uma estratégia política montada em muitos anos de embate entre PSDB e PT, atribuindo a Fernando Henrique o que nem mesmo seus aliados tiveram a coragem de admitir nas campanhas eleitorais, no pressuposto equivocado e mesquinho de que elogiá-lo tiraria votos.

A presidente Dilma Rousseff elogiou por escrito: "(...) o ministro-arquiteto de um plano duradouro de saída da hiperinflação e o presidente que contribuiu decisivamente para a consolidação da estabilidade econômica. Mas quero aqui destacar também o democrata. O espírito do jovem que lutou pelos seus ideais, que perduram até os dias de hoje. Esse espírito, no homem público, traduziu-se na crença do diálogo como força motriz da política e foi essencial para a consolidação da democracia brasileira em seus oito anos de mandato".

Ao lado do reconhecimento público, por atos a presidente Dilma vem fazendo uma revisão de conceitos, aceitando a privatização como a melhor solução para a modernização de nossa infraestrutura, especialmente as estradas e os aeroportos do país.

Sepulta assim anos de mistificação política petista, parecendo querer superar a dicotomia em que nossa política está ancorada, talvez para buscar um governo eficiente e moderno que a possa libertar da tutela lulista.

FONTE: O GLOBO

Arte do impossível:: Dora Kramer

É claro que a nova ministra das Relações Institucionais, Ideli Salvatti, pode surpreender. É uma hipótese remota, mas não é impossível que ela se saia bem na função de administrar apetites, humores e armadilhas de uma base parlamentar ampla, abrigo do maior ninho de cobras criadas da República.

A tarefa inicial é dura: desfazer a primeira impressão de que a presidente Dilma Rousseff só quis afirmar autoridade e confrontar os aliados, escolhendo uma colecionadora de arestas. Não por outro motivo a não ser a aposta de que não há o menor risco de dar certo, Ideli recebeu elogios da oposição.

Os adversários e os aliados em estado de beligerância querem mesmo é ver o circo pegar fogo na articulação política. Aqueles por dever de ofício e estes para que mais à frente a presidente se renda à necessidade de seus préstimos.

A eles Ideli precisará se mostrar bem melhor que a encomenda: conquistar confiança, confirmar influência junto a Dilma e desenvolver capacidade de fazer valer o combinado. Seja no tocante aos atendimentos materiais, seja no tocante aos acordos de procedimentos no Congresso.

No PT caberá a Ideli conduzir a pacificação com sutileza para deixar que o ex-presidente Lula dê cabo da missão (coisa que só ele pode fazer, pois só ele tem a influência necessária sobre o partido) sem dar a impressão de que Dilma está sendo tutelada.

Sutileza não é exatamente o atributo preponderante na personalidade da ministra, como se percebe no esforço de fazer frases para obter um efeito, sempre se referindo à disposição de ser afável, de ouvir, conversar e não repetir o erro da conformação centralizadora do breve período Palocci.

Por ora, louve-se o empenho de Ideli Salvatti para desfazer a má impressão, mas note-se também um quê de artificialismo, cuja resultante é contraproducente.

Dizer que vai fazer "uma operação limpa prateleira, coisa de mulher", não agrada nem às mulheres hoje menos interessadas em ser reconhecidas por méritos domésticos, nem a parlamentares que podem não gostar de ver seus pleitos, ou eles mesmos, comparados a mercadorias em estoque nas prateleiras do Planalto.

Se Luiz Sérgio, como disse, fez mesmo o possível, restará a Ideli fazer frente ao impossível.

Intérpretes. A carta derramada em elogios que a presidente Dilma Rousseff enviou ao ex-presidente Fernando Henrique Cardoso suscitou as mais diversas especulações entre os tucanos que se reuniram no último fim de semana em São Paulo para duas das várias celebrações pelos 80 anos de FH.

Houve quem visse nos termos intenções estratégicas de aproximação; houve quem enxergasse a vontade de marcar diferença em relação a Lula, sempre belicoso em relação a Fernando Henrique; houve quem interpretasse como um gesto de gentileza sem conteúdo político.

Fernando Henrique não deu interpretação política ao texto, mas também acha que a presidente foi bem além da mera formalidade. "Fiquei bastante sensibilizado", disse.

Autoria. Segundo informações do Palácio do Planalto, houve gentileza, mas houve política também na carta que Dilma mandou a Fernando Henrique. Nada a ver com Lula, mas tudo a ver com a intenção de transmitir uma disposição à distensão de ânimos. Ela sabe que não "segura" um ambiente de conflito permanente como fazia o antecessor.

A primeira versão da carta foi escrita por Antonio Palocci, obviamente antes do desfecho da crise que resultou na saída dele do governo. Depois disso o texto foi refeito algumas vezes a várias mãos por ministros e assessores palacianos.

No embalo. José Dirceu ofereceu e a revista Interesse Nacional aceitou publicar um artigo dele, cuja intenção é servir de contraponto ao polêmico texto de Fernando Henrique sobre o papel da oposição no Brasil.

O título do artigo é O papel do PT no Brasil e sai na edição de julho.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

"Conversar, conversar, conversar" :: Eliane Cantanhêde

Apesar de registrar que a aprovação do governo Dilma até oscilou dois pontos para mais, a pesquisa Datafolha de domingo trouxe duas más notícias para a presidente: houve queda na aprovação do governo entre os que têm curso superior, e a avaliação pessoal dela piorou em três dos quatro adjetivos pesquisados.

Pesquisas são indicadores que servem para avaliações, ajustes e até correções de rumo. Tomando-se as conclusões do Datafolha, tem-se que a situação é ainda muito confortável, mas com um leve sinal amarelo, de alerta. Primeiro, porque a percepção sobre governos começa pelos que têm ensino superior e decanta para as demais faixas. Segundo, porque o encanto com Dilma já não é mais o mesmo.

Os que consideram Dilma "decidida" caíram de 79% para 62%; "muito inteligente", de 85% para 76%; "sincera", de 65% para 62%. A avaliação só melhorou num item. Os que a veem como "democrática" passaram de 44% para 52%.

Aparentemente, há uma reação racional e outra emocional. Apesar de 64% dizerem que é bacana Lula participar das decisões da sucessora, a imagem da mulher poderosa desliza de "decidida" para "democrática" -o que tem sutis implicações simbólicas. A relação com Lula é a tal faca de dois gumes que a gente tem discutido aqui.

Com as posses de Gleisi Hoffmann na Casa Civil e de Ideli Salvatti na articulação política, Dilma dá mais um grito de independência, depois de imprimir um estilo mais composto à Presidência, garantir uma posição mais firme do Brasil em direitos humanos, não se imiscuir na eleição do Peru e enviar uma carta de estadista ao adversário Fernando Henrique.

O problema é a relação com o Congresso. Ideli promete "conversar, conversar, conversar", mas talvez isso não baste para garantir a fidelidade do PMDB e do PT ao triunvirato feminino. Eles são necessários, mas não confiáveis.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Tempo nublado :: Fernando de Barros e Silva

O governador do Ceará, Cid Gomes, acaba de defender a volta de Lula ao poder. Em entrevista ao programa "É Notícia", da RedeTV!, disse ao jornalista Kennedy Alencar: "Se eu fosse a Dilma, faria tudo para estar bem em 2014 e convidaria Lula para ser o candidato".

Seria, segundo o irmão de Ciro Gomes, uma "forma de gratidão" por parte de quem "se elegeu pela força de Lula". Vindas de um expoente do PSB, um partido aliado, são palavras que corroem a presidente. São também palavras que dizem muito mais sobre junho de 2010 do que sobre outubro de 2014.

O que motivaria Cid? A disputa com o PMDB por espaço no poder, muito provavelmente. Mas, além disso, o governador é o primeiro a vocalizar algo que está na cabeça e tem orientado o comportamento de muita gente graúda na base aliada.

Michel Temer e seu PMDB, o governador Eduardo Campos (PE) e o próprio Lula, cada um com seus interesses, se movimentam politicamente a partir da premissa tácita de que Dilma tem prazo de validade.

Com a oposição desdentada, o problema da presidente passa a ser a aposta dos "amigos" da onça que a veem como uma líder vulnerável ou uma governante "de transição".

Estava escrito desde o início que os inimigos reais de Dilma estavam no interior do bloco governista. O que há de novo é a explicitação disso com apenas seis meses de mandato. Tudo em política é reversível, obviamente, mas a passagem sem escalas da lua de mel para o envelhecimento precoce é gritante.

Note-se que há um descompasso entre o ambiente político envenenado e a popularidade de Dilma, que segue alta. Muito embora a deterioração das expectativas em relação à economia, captada agora pelo Datafolha, seja um bom termômetro de que a aprovação à presidente pode declinar mais adiante.

É cedo para falar em "sarneyzação". E pessoalmente Dilma é muito superior. Mas este consórcio de poder "articulado" por Temer e Ideli Salvatti não anuncia tempo bom.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Dilma deixou na chuva seu "parceiro de lutas":: Raymundo Costa

Em 2006, homem forte da economia e do governo, Antonio Palocci caiu do Ministério da Fazenda 13 dias após a denúncia de quebra de sigilo bancário do caseiro Francenildo Costa. Agora, resistiu durante 23 dias à suspeita de enriquecimento ilícito. O que não significa dizer que o chefe da Casa Civil de 2011 era tão ou mais forte que o ministro da Fazenda de 2006. A crônica da queda está por ser escrita.

O chão fugiu aos pés de Palocci no momento em que o chefe da Casa Civil parecia recuperar o fôlego, quando a Procuradoria-Geral da República veio pela segunda vez em seu socorro e divulgou parecer segundo o qual nada detectara que sugerisse crime na evolução de seu patrimônio pessoal, multiplicado por 20 no prazo de apenas quatro anos.

A queda de Palocci, em 2011, foi mais fácil que a de 2006, muito embora a crise agora tenha se estendido por um período de tempo maior.

Em 2006, ainda no calor da crise do mensalão e nas imediações das eleições presidenciais, a saída de Palocci do Ministério da Fazenda parecia um salto no escuro para o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, já então candidatíssimo à reeleição.

Demissão de Palocci diz muito da natureza da atual presidente

Lula defendeu e segurou o ministro enquanto isso foi possível sem ameaçar seus planos eleitorais. Dilma deixou o ministro, "parceiro de lutas" e artífice de sua eleição, como disse, exposto por mais tempo. A presidente não queria entregar a cabeça de um auxiliar situado em um posto-chave com apenas cinco meses de governo - uma humilhação, mesmo diante de oposição enfraquecida.

Não houve, no período, uma defesa robusta e pública do auxiliar feita pela presidente. O PT, sob nova gestão, tirou o time de campo, embora defendesse, sem veemência, as explicações do ex-ministro.

É bem verdade que Dilma se emocionou na solenidade que marcou a posse da senadora Gleisi Hoffmann e a despedida de Antonio Palocci da Casa Civil. Mas o ex-ministro saiu como se fosse um "candidato natural" à demissão e não o todo poderoso chefe da Casa Civil, de longe o mais importante ministério da República, cujo titular em geral mantém convivência permanente e cúmplice com o presidente da República, é seu braço direito e homem (ou mulher) de confiança. Nem Fernando Haddad (Educação), com as trapalhadas do Enem e cartilhas de gramática "politicamente correta" teve igual tratamento.

A demissão de Palocci diz muito da natureza de uma Presidência que as raposas antigamente chamadas de felpudas, como aquelas que integram a cúpula do PMDB, só agora começam a apreender e compreender - o que não significa, necessariamente, assimilar (lição já entendida: as consultas de Dilma Rousseff são na realidade comunicados. Ponto).

São conhecidos os embates entre Dilma e Palocci no governo Lula, sendo que um deles a ex-ministra expôs publicamente, em entrevista, ao classificar de "rudimentar" o plano de déficit nominal zero para as contas do setor público, apresentado em 2005 pela equipe econômica.

Na composição do comitê de campanha da candidata a presidente, em 2010, Palocci entrou levado pelas mãos do ex-presidente Lula da Silva. A coordenação da equipe deveria ter sido de Fernando Pimentel, hoje ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, acabou formalmente com o então presidente do PT, José Eduardo Dutra, mas na prática o regente era Palocci, que aproximou-se e ganhou a confiança de Dilma na convivência da campanha eleitoral.

Na formação do governo, Dilma queria Palocci num ministério menos abrangente que a Casa Civil. Ele próprio dizia que preferia fica na Secretaria-Geral, aparentemente, da boca para fora e por ter dúvidas se herdaria o posto que antes fora de Dilma.

As versões palacianas são escritas ao gosto do freguês. O registro mais aceito dá conta de que foi Lula quem convenceu Dilma a instalar Palocci na Casa Civil e não na Secretaria-Geral. Entre outros argumentos, Lula teria usado o parecer que isentou Palocci de culpa na quebra do sigilo bancário do caseiro Francenildo Costa. Lula e Palocci esperavam ganhar tempo para reverter a situação com o aval que o procurador deu às contas de consultoria do ex-ministro.

O primeiro sinal de que a posição do homem forte não era tão forte assim foi emitido na Bahia.

"Eu reconheço, é óbvio que chama a atenção o volume de ganho que ele teve", disse o governador Jaques Wagner aos jornalistas. "Um ano de consultoria ganhar R$ 20 milhões todo mundo se surpreende que é um rendimento muito alto como também chamou atenção a questão lá do apartamento". Wagner foi ministro de Lula, que o chama de "Galego", mas é provável que hoje seja o governador do PT mais próximo de Dilma, que, por sua vez, o chamada de "Jaquinho".

O governador da Bahia também cobrava que Palocci assumisse a própria defesa pública, atitude que já era cobrada por Dilma e petistas mais ligados a ela (Marta Suplicy estava na contramão quando propôs que a bancada do PT no Senado divulgasse uma nota de apoio ao ministro). Gleisi Hoffmann, que em almoço com Lula com senadores tratou o assunto Palocci como uma questão pessoal e não partidária, também é afinada com a presidente da República.

Antes da crise, Palocci e seus aliados pareciam prontos para navegar em altitude de cruzeiro. Atribuía-se ao chefe da Casa Civil uma inflexão ocorrida na política monetária, embora o próprio Palocci, em público, afirmasse que não dava palpite na área econômica. O ministro, é fato, ficou com a gerência da distribuição dos cargos e verbas pedidos pelos partidos que integram a base de sustentação do governo. A insatisfação generalizada entre os aliados, do PMDB ao PCdoB, demonstra que ele não fez nem uma coisa, nem outra.

Os amigos do ex-ministro dizem que ele não fez nada aquém ou além do que foi determinado pela presidente. Pode ser. Mas também é fato que hoje Dilma anuncia uma mudança de postura na sua relação política com o Congresso e os partidos, e sinaliza que a nova equipe palaciana vai destravar a liberação das verbas e dos cargos legitimamente reivindicados. Em outras épocas, chamava-se a isso de "fritura".

FONTE: VALOR ECONÔMICO

O que pensa a mídia

Editoriais dos principais jornais do Brasil
Clique o link abaixo

Estado Ltda. : ‘Capitalismo políticamente orientado’

Um levantamento inédito de ÉPOCA identifica 675 empresas na órbita do governo federal e revela a extensão da interferência estatal na economia

José Fucs e Marcos Coronato, com Keila Cândido, Matheus Paggi, Camila Camilo, Danilo Thomaz e Juliana Elias

A queda do Muro de Berlim parecia ter encerrado o debate sobre o tamanho do Estado na economia. Com a vitória de um sistema baseado na livre-iniciativa – o capitalismo – sobre outro baseado no planejamento estatal – o socialismo –, a conclusão era cristalina: o governo deveria limitar ao mínimo a regulação sobre as atividades privadas e cuidar (bem) dos serviços básicos, como saúde, educação, justiça e segurança. Deveria ser apenas um bandeirinha, no máximo o juiz do jogo econômico – nunca técnico, zagueiro ou artilheiro. Em setembro de 2008, porém, com a eclosão da crise global, os governos de quase todo o mundo tiveram de injetar trilhões de dólares para reanimar suas economias. Nos Estados Unidos e em outros países, o Estado assumiu o controle de bancos, seguradoras e até mesmo de montadoras de automóveis à beira da falência. Foi a deixa para a ressurreição dos críticos do modelo liberal, que predominara por quase três décadas e garantira ao planeta uma era de crescimento sem igual na história. Vozes antes relegadas a um papel secundário no debate voltaram à cena com ares de protagonistas. Uma delas, o economista americano Joseph Stiglitz, prêmio Nobel de Economia em 2001, afirmou recentemente a ÉPOCA: “Não é o tamanho do Estado que importa, é o que o governo faz”.

Vá lá. Mas o que, exatamente, faz o governo num país de economia complexa como o Brasil? Trata-se, como o próprio Stiglitz há de reconhecer, de uma questão importantíssima – mas de resposta dificílima. O governo brasileiro regula a atividade econômica? Regula. O Estado é dono de empresas? Também. É sócio de empresas que não controla totalmente? Certamente. E ainda é dono de bancos mastodônticos e de companhias gigantescas, que detêm participações em uma fauna de empresas de todas as espécies. Para não falar no controle que exerce sobre os fundos de pensão das estatais, os maiores investidores do mercado. De diferentes formas, o governo interfere na gestão de algumas das maiores empresas privadas nacionais, em setores tão distantes quanto metalurgia, criação de animais para abate ou telefonia. A teia de interesses estatais nos negócios é tão complexa, tem tantas facetas e envolve tantos conflitos de interesse que o próprio governo não consegue avaliá-la de modo preciso. Nem o Ministério do Planejamento, a que está ligado o Departamento de Coordenação e Controle das Empresas Estatais, nem a Secretaria do Tesouro Nacional, que controla o caixa federal, sabem quantas empresas no país têm participação estatal. E não há, em nenhuma repartição de Brasília, um diagnóstico completo da atuação e da influência do governo sobre nossa economia.

Nos últimos três meses, uma equipe de jornalistas de ÉPOCA dedicou-se a desfazer o nevoeiro que encobre essa questão. Com o apoio da empresa de informações financeiras Economática, mergulhamos em relatórios ministeriais, balanços e planilhas de dados do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), das estatais, da Bolsa de Valores e das empresas privadas sob influência do governo. Restringimos nosso trabalho às participações do governo federal – um critério conservador para estimar o tamanho do Estado, por omitir as estatais em poder de Estados e municípios. Mesmo assim, o levantamento inédito, cujos resultados são apresentados a partir da página 71 e estão disponíveis de modo interativo em epoca.com.br e em nossa edição para iPad, revela um quadro preocupante. No futebol da economia brasileira, o governo não é apenas juiz, bandeirinha, técnico, zagueiro e artilheiro ao mesmo tempo. Ele também corta o gramado do estádio, costura as redes e – se quiser – pode até mexer no tamanho das traves.

“O governo é um dinossauro insaciável. Nunca tivemos um capitalismo de Estado tão evidente”, diz um economista

De acordo com o levantamento, existem hoje no país pelo menos 675 empresas de todos os setores com algum tipo de participação ou influência do governo federal. São participações diretas ou indiretas do Tesouro, dos bancos e das empresas estatais ou dos fundos de pensão (entidades híbridas, inegavelmente na órbita do governo). Dessas, o governo controla 276, se somarmos todos os tipos de participação. Levando em conta apenas as 628 empresas não financeiras, o faturamento soma R$ 1,06 trilhão, algo como 30% do nosso Produto Interno Bruto (PIB) ou 2,5 vezes as vendas dos 50 maiores grupos privados nacionais (leia o gráfico abaixo) . Nas 247 empresas não financeiras controladas pelo governo, as vendas somam R$ 468,5 bilhões, ou 13% do PIB. E o valor de mercado das 99 empresas cujas ações são negociadas na BM&FBovespa totaliza R$ 1,7 trilhão, ou 71% do valor de mercado das empresas na Bolsa. A interferência do Estado na economia via estatais, BNDES e fundos de pensão é tão intensa que, durante a pesquisa, ÉPOCA teve de atualizar os dados de muitas companhias que receberam recentemente dinheiro do governo, como o frigorífico JBS ou a Cipher, especializada em sistema de segurança de informação. “O governo brasileiro é um dinossauro com apetite insaciável. Nunca tivemos um capitalismo de Estado tão evidente”, diz o economista Rodrigo Constantino, sócio da Graphus Capital, uma empresa de gestão de recursos do Rio de Janeiro.

No Brasil, a visão do Estado-empresário nunca teve dificuldades para angariar fãs. “A partir do governo Lula, houve uma mudança no entendimento do papel que o Estado deve ter no capitalismo brasileiro”, afirma o economista Luiz Carlos Mendonça de Barros, ex-ministro das Comunicações, ex-presidente do BNDES e um dos responsáveis pelas privatizações no governo Fernando Henrique Cardoso. “Eles renegaram a privatização, começaram a gastar demais e a interferir na gestão de empresas privadas. Começou a aparecer essa face do PT, de que o governo deve ser o agente mais importante de uma economia como a nossa.” Mas o próprio PSDB, preocupado em se livrar do estigma de privatista, estuda apresentar uma emenda constitucional para impedir que Petrobras, Banco do Brasil (BB) e Caixa Econômica sejam privatizados. “Os brasileiros amam o Estado, querem mais Estado”, diz o economista Alexandre Schwartsman, ex-diretor do Banco Central e ex-economista-chefe do Santander. “A ideia de que o governo resolverá todos os problemas está entranhada na cultura nacional.”

Em seus oito anos de governo, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva criou sete novas estatais: o Banco Popular do Brasil (BPB), que nem existe mais, a Hemobrás (para fabricação de hemoderivados), a Empresa Brasileira de Comunicações (EBC), a Empresa de Pesquisa Energética (EPE), a Pré-Sal Petróleo, a Ceitec (para fabricar chips e microcondutores) e a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares, designada pela impronunciável sigla EBSERH, cujo objetivo seria prestar serviços gratuitos e apoiar o ensino e a pesquisa nos hospitais universitários federais (esta última não vingou, pois a medida provisória que a criava caducou). Além de criar as novas empresas, Lula investiu quase R$ 100 bilhões nas estatais já existentes e concedeu a elas empréstimos do Tesouro de quase R$ 200 bilhões, principalmente ao BNDES. Houve ainda o renascimento de estatais como a Telebrás, a holding de telefonia cujas subsidiárias foram privatizadas em 1998, e os investimentos bilionários feitos por BNDES, estatais e fundos de pensão na compra de participações em grandes grupos privados. O governo estimulou fusões generalizadas entre empresas privadas, como a Oi, da área de telefonia, resultado da união da Brasil Telecom com a Telemar. Nos primeiros seis meses do governo da presidente Dilma Rousseff, o avanço do Estado sobre o mundo dos negócios continua em ritmo acelerado. Alguns exemplos:

Num leilão realizado no final de maio, o Banco do Brasil (BB) ganhou o direito de explorar o Banco Postal, a rede de serviços bancários dos Correios, a partir de 2012. Com um lance de R$ 2,3 bilhões, o BB superou a oferta do Bradesco, que operava o Banco Postal desde 2002;

No final de maio, o BNDES anunciou a conversão de uma dívida de R$ 3,5 bilhões do JBS, o maior frigorífico de carne bovina do mundo, em ações da empresa e ampliou sua fatia no capital de 17% para 31%;

Quase ao mesmo tempo, o governo patrocinou a troca de comando da Vale, a segunda maior mineradora global, por discordar de sua política de investimento. Embora afastado da Vale desde a privatização, em 1997, o governo usou sua força nos fundos de pensão que detêm o controle da empresa, para impor uma diretoria simpática a seus planos;

Em abril, o Congresso Nacional aprovou um projeto do governo que criou mais uma estatal, a Empresa de Transporte Ferroviário de Alta Velocidade (Etav), para gerenciar o projeto do trem-bala entre Campinas, São Paulo e Rio de Janeiro. Ele terá financiamento de R$ 20 bilhões a juros camaradas do BNDES (20% acima do gasto previsto para o Bolsa Família em 2011);

Embora a decisão de privatizar os aeroportos, anunciada em maio, seja um sinal importante, ela não significa que Dilma tenha subitamente aderido à causa da privatização, palavra demonizada por ela mesma durante a campanha eleitoral. A medida reflete apenas o reconhecimento tardio de que o governo não tem dinheiro para modernizar os aeroportos e prepará-los para a Copa do Mundo de 2014 e para a Olimpíada de 2016, no Rio de Janeiro. Só que o país precisa investir pesado em infraestrutura nos próximos anos – e não apenas para a Copa e a Olimpíada. Os gargalos de nossa economia oneram toda a produção e reduzem a competitividade dos produtos brasileiros no mercado internacional. Além dos aeroportos, é preciso modernizar e ampliar portos, estradas, ferrovias, a geração e distribuição de energia e os sistemas de água e esgoto. De acordo com cálculos do BNDES, as obras exigirão R$ 1 trilhão até 2014. E o governo não tem os recursos necessários para bancá-las. “Apesar de sermos um país que optou por ter um Estado grande, temos um Estado que investe muito pouco”, diz o ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga, hoje sócio da Gávea Investimentos. Também falta poupança interna para financiar todos os investimentos necessários. Sem o capital estrangeiro, portanto, é impossível alcançar a meta.

A decisão de fazer concessão de aeroportos não signifca que Dilma tenha aderido à causa da privatização

De acordo com o banqueiro Henrique Meirelles, que comandou o Banco Central no governo Lula, se houvesse um ambiente de negócios mais atraente no país, o capital estrangeiro, sedento por boas oportunidades de investimento, viria em proporções cavalares. Há aí um espaço gigantesco a trabalhar. O Brasil é hoje o país emergente com a maior carga tributária do mundo, na faixa de 36% do PIB. Nossa legislação trabalhista obriga as empresas a pagar um salário adicional ao governo, além do que já paga ao trabalhador – é um fardo pesado. “O Brasil é um dos países em que é mais difícil empreender”, diz o empresário Jorge Gerdau, que aceitou recentemente comandar a Câmara de Gestão e Planejamento do governo Dilma. “Isso tem origem direta na ineficiência do Estado, prejudica a geração de emprego e renda e faz o Brasil perder oportunidades.” Na gestão de empresas, o Estado costuma ser bem menos eficiente do que a iniciativa privada. “Em geral, quanto mais coisas o governo tenta controlar, menos eficiente ele é”, diz o economista italiano Luigi Zingales, da Universidade de Chicago. Não é à toa que, segundo o levantamento mais recente do Fórum Econômico Mundial, o setor privado brasileiro está em 39º lugar no ranking de competitividade global, entre 139 países, enquanto o setor público ocupa apenas a 130ª posição.

Considerando tudo isso, é pouco provável que o governo consiga desatar o nó dos investimento, para permitir que o país cresça a taxas elevadas sem alimentar a inflação. Como é a iniciativa privada que financia a sede do Estado por recursos, de um jeito ou de outro, a conta da gastança chega. Depois dos trilhões gastos para erguer o mundo da crise, em diversos países – inclusive no Brasil – a dívida pública se multiplicou, e os governos começaram a cortar despesas para equilibrar o orçamento. No Primeiro Mundo, políticos conservadores estão ganhando as eleições com um discurso concentrado na austeridade fiscal e na contenção dos arroubos expansionistas do Estado. Nos EUA, os republicanos ganharam a maioria do Congresso nas eleições de 2010. Também no ano passado, o conservador David Cameron tomou o lugar do trabalhista Gordon Brown como primeiro-ministro na Inglaterra. Na Espanha, o fenômeno se repetiu em maio. A população mais esclarecida sabe que, no final, o custo sobra para ela, por meio do aumento de impostos, da inflação e das taxas de juro.

No Brasil, a estrutura de gastos públicos não dá muita margem de manobra. Do total de despesas, dois terços são consumidos apenas com a folha de pagamentos do funcionalismo federal e dos benefícios aos aposentados e pensionistas da Previdência Social. No início do ano, o Ministério da Fazenda até anunciou cortes tímidos, de R$ 50 bilhões, no gasto público. Mas esse número fica aquém das necessidades para equilibrar as contas. O essencial é deixar de lado o discurso ideológico e analisar friamente os benefícios de vender ativos – tradução: privatizar – no atual cenário. “É inevitável fazer a privatização”, diz o economista Roberto Macedo, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda. “O governo precisa sair da armadilha criada pelo Lula em 2006”, afirma Mendonça de Barros. “A Copa e a Olimpíada estão aí, e não dá para brincar. O PT é um partido pragmático e se dará conta de que é uma boa hora para quebrar o tabu das privatizações.”

A última vez que o país implementou um programa consistente de desestatização foi nos anos 1990, na esteira das privatizações e da desregulamentação promovidas pela Inglaterra de Margaret Thatcher e pelos Estados Unidos de Ronald Reagan. O Estado obeso, herança da era Vargas e dos governos militares, passou por uma dieta notável nas gestões de Fernando Collor, Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso. O governo se desfez de mineradoras, siderurgias, petroquímicas, telefônicas e empresas aéreas. Acabou com o monopólio da Petrobras. Com a privatização, empresas como Vale, CSN e Usiminas voltaram a florescer. Na telefonia, os resultados foram espetaculares. Políticos de centro-esquerda, como Bill Clinton nos EUA, Tony Blair na Inglaterra e o próprio FHC, se viram forçados a abrir mão do viés estatizante de seus partidos para manter-se no poder. O próprio Lula teve, na campanha de 2002, de abandonar antigas bandeiras intervencionistas do PT e comprometer-se a não rever as privatizações, respeitando os contratos assinados.

Depois da crise de 2008, apesar da retomada do crescimento, a ideia de que o Estado pode – ou deve – fazer tudo voltou a ganhar força. “Os países mais bem-sucedidos, como Japão, China, Coreia do Sul e Índia, abriram suas economias de forma gradual e adotaram políticas comerciais e industriais para promover e diversificar suas economias”, diz o economista Dani Rodrik, da Universidade Harvard, EUA, outro defensor do estatismo. “Acaba havendo uma compensação entre a elevação do custo, provocada pelas restrições ao comércio e ao fluxo de capitais, e os benefícios de uma economia mais forte, em que se estimulam setores que, de outro modo, não se desenvolveriam.”

Aqui, as autoridades têm se aproveitado da maré favorável a esse tipo de ideia para ampliar os braços do governo na economia brasileira, seja aumentando a participação em empresas, seja oferecendo crédito subsidiado pelo BNDES. “O BNDES se transformou numa gigantesca máquina de transferência da riqueza dos pagadores de impostos para os aliados do governo. A troca de favores é o meio para o sucesso e o melhor atributo é ser amigo do rei”, diz Rodrigo Constantino. A pretexto de combater a crise, o governo federal parece ter embarcado novamente na ideologia de um estatismo inconsequente.

É provável que, se ele procurasse se concentrar nos três pilares da ação estatal – educação, saúde e segurança –, em vez de alimentar o mito do Estado-empresário, o país funcionaria melhor. Haveria menos corrupção, menos tráfico de influência e menos apadrinhamento. A redução da ação do governo na economia não significa que os mercados devam ser deixados à vontade. O governo pode – e deve – cuidar de sua fiscalização e regulação estabelecendo normas que garantam a qualidade da produção e a boa prestação de serviços à população. Mas o juiz não pode querer chutar a bola no gol.

FONTE: REVISTA ÉPOCA

Por que a taxa de juros é tão alta?:: Yoshiaki Nakano

Segundo matéria do jornal "O Estado de S. Paulo" de sexta-feira passada, entre os 40 países mais importantes do mundo, somente dez praticam hoje taxas reais de juros positiva, entre elas o Brasil, o recordista em juros altos. A taxa real de juros no Brasil de 6,8%, seguida do Chile com 1,5%, Austrália com 1,4%, África do Sul e Hungria com 1,2%, México com 1,1%, China e Colômbia com 1% e assim por adiante. Esses países também elevaram a taxa de juros para enfrentar pressões inflacionárias da mesma forma que o Brasil. Por que praticamos, cronicamente, um diferencial tão elevado de taxa de juros?

Os tradicionais culpados são o déficit público e a elevada dívida pública. Mas, neste particular, fizemos importantes avanços: o nosso déficit público, de cerca de 2,5% do Produto Interno Bruto (PIB), é baixo comparativamente à maioria dos países na lista acima e, mesmo em relação à dívida pública bruta, também melhoramos: o prazo médio é ainda hoje de 3,5 anos, mas melhor do que no passado; o risco de financiamento é elevado, mas diminuiu significativamente, sendo de cerca de um quarto a parcela vencendo em 12 meses; o risco de taxa de juros também caiu, a parcela da dívida pública indexada à taxa de juros e à taxa de câmbio, de cerca de 90% da dívida total, em 2002, caiu para 36,7%, em 2010.

Estes e outros avanços, em termos de estabilidade macroeconômica, permitiram uma queda significativa na taxa real de juros nos últimos anos. Entretanto é preciso lembrar que avanços na área fiscal e na estabilidade macroeconômica explicam a queda na curva de juros na sua ponta mais longa, que é comparativamente muito curta no Brasil. Com certeza, novos avanços na área fiscal e o aperfeiçoamento das suas instituições são fundamentais para derrubar a curva de juros na sua ponta mais longa.

Entretanto, a configuração da curva de taxa de juros no Brasil ainda nos coloca duas questões. Primeira, por que com os avanços fiscais e melhoria no perfil da dívida pública não houve avanço correspondente com o desenvolvimento do mercado de títulos de longo prazo no Brasil? O prazo médio do estoque da dívida pública é ainda de apenas 3,5 anos. Se a causa de juros elevado tem origem no setor público, por que o mercado privado de títulos de longo prazo não se desenvolve no Brasil? Segunda, por que o Banco Central, que atua na outra extremidade mais curta da curva de juros, pratica taxas de juros tão elevadas? Afinal, o Banco Central tem o monopólio da emissão de moeda de curso forçado, portanto, é única entidade absolutamente líquida, consequentemente, sem risco. Por que tal entidade tem que pagar taxas de juros tão elevadas no Brasil?

Essas questões nos remetem às regras operacionais do Banco Central, que foram implantadas no período de alta inflação e permanecem intactas, mesmo depois de mais de 15 anos de estabilização da inflação. No período de inflação alta, o risco da variação da taxa de juros é muito elevada, pois a inflação acelerava muito rapidamente, colocando em risco todo o sistema financeiro. Para reduzir esse risco, os ativos financeiros foram indexados à taxa diária de juros, de modo que sua variação mantinha os seus preços constantes.

Além disso, com alta inflação, toda a dívida pública (LFTs) era refinanciada diariamente no overnight, pagando a taxa de juros Selic. Com isso, o Banco Central passou a fixar diariamente a Selic, que permitia ao Tesouro Nacional refinanciar a sua dívida pública. Inacreditavelmente, o Banco Central mantém esse sistema monetário, que era funcional no periodo de hiperinflação, até hoje.

Mas a consequência prática desse sistema é que o Banco Central, pagando ainda hoje a taxa de juros Selic, que corrige os títulos públicos de longo prazo e incorpora prêmios de liquidez e de riscos, nas operações de overnight e compromissadas, aprisionou toda poupança nacional no mercado de moeda de curtíssimo prazo. As consequências dessas regras operacionais são devastadoras.

O sistema bancário, para competir com o Banco Central, tem que pagar aos seus depositantes, taxas de juros mais elevadas que a Selic e, ainda garantir também liquidez, portanto quase tudo está indexado ao CDI. Da mesma forma, no mercado de capitais, as operações tem, obrigatoriamente, um piso de retorno elevado estabelecido pela Selic, o que dificulta o seu desenvolvimento.

O Tesouro Nacional, por sua vez tem um concorrente que paga a mesma taxa de juros Selic nas operações overnight, que ele paga por seus títulos, mas que ainda garante liquidez imediata aos bancos. Diante desse concorrente não conseguirá alongar o prazo da sua dívida pública, mesmo que venha a ter superávits sistematicamente.

Diante desse quadro monetário, o Banco Central aprisiona, na ponta curta da curva de taxa juros, praticamente toda a poupança financeira do país e, portanto, inviabiliza a criação de um mercado de poupança. Nesse mercado é que deveriam ser negociados os títulos de dívida pública de longo prazo. O mercado de títulos privados de longo prazo também não tem como prosperar. Portanto, para reduzir a taxa de juros no Brasil é preciso desmontar esse sistema anacrônico, um verdadeiro entulho herdado do período de hiperinflação, que trava o desenvolvimento do país.

Yoshiaki Nakano, ex-secretário da Fazenda do governo Mário Covas (SP), professor e diretor da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getulio Vargas - FGV/EESP,

FONTE: VALOR ECONÔMICO

Metáforas infelizes :: Xico Graziano

A agricultura esteve em voga na política destes dias. Melhor dizendo, participou das conversas. Vejam que curiosas frases foram ditas:

Do senador Demóstenes Torres, em entrevista à revista Veja: "Vivemos em um momento crítico, de total submissão. No final das contas, o Congresso se comporta bovinamente".

Do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, questionado a respeito de sua posição atual sobre as drogas: "Só quem é burro não muda de opinião diante de fatos novos".

Do jovem Dayvini Nunes, dono do apartamento alugado pelo ex-ministro Antônio Palocci: "Eu não tenho como bater de frente com essas pessoas. Sou um laranja".

A alusão pejorativa à agricultura tem se tornado, há tempos, uma característica típica da oratória brasileira. Não se conhece outra nação onde a linguagem carregue tamanho preconceito contra o campo. Triste povo que, mesmo sem o perceber, achincalha seus agricultores.

A lista das figuras de linguagem depreciativas do mundo rural soa enorme. "Vá plantar batatas" é uma das mais antigas. Diz-se que a frase nasceu na época gloriosa de Portugal, quando a navegação e a pesca emprestavam prestígio à sociedade, restando desdém pela vida sofrida na agricultura. Tida como alimento vulgar, a solanácea calejava e sujava as mãos dos que a produziam.

Alimento básico da civilização inca, a batata encantou os colonizadores espanhóis, que logo a levaram para a Europa. O sucesso de sua aceitação leva muita gente a pensar que o alimento tem origem alemã. Uma das razões decorre do fato de que, em 1740, Frederico II, o Grande, baixou norma obrigando seus súditos na Alemanha a consumirem batatas para enfrentar a constante ameaça da fome. Ainda hoje, sobre seu túmulo, no Palácio de Sans-Souci, depositam-se batatas para lembrar o gesto pátrio.

Nem sempre facilmente se explica a origem das metáforas negativas utilizadas com gêneros agrícolas. A própria batata, que mereceria uma homenagem, serve ao desabono.

Descascar um abacaxi, outro exemplo, não exige tanto esforço assim para justificar algo penoso, conforme a linguagem popular utiliza na descrição de missão inglória. Mas pegou.

O caso da laranja sempre me pareceu o mais estranho. No Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa se encontra que laranja, em economia, remete a indivíduo, nem sempre ingênuo, utilizado em práticas fraudulentas contra o fisco ou com dinheiro ilícito. Ser "laranja" significa, portanto, um disfarce do mal.

Mas qual seria a motivação semântica do termo? O engana trouxa recai sobre a laranja por ser ela azeda? Ou por causa da coloração amarela por fora, na casca, e branca por dentro, no bagaço? Ninguém duvida que o Palocci esconda algo estranho nessa história de sua grana milionária. Só não entendo eu qual o alegórico pecado da fruta.

Já o coitado do burro sai injustiçado sempre que, aos olhos de uma pessoa, outra não toma boas decisões. Dizer, entretanto, que fulano é burro afronta a natureza, pois o asinino é um animal bem inteligente. Cauteloso, o bicho fez história no transporte de cargas em terrenos difíceis e encostas íngremes, onde um cavalo facilmente despencaria. O burro, ou sua mulher, a mula, empacam por astúcia, não por teimosia.

Fernando Henrique, um homem sabidamente perspicaz, está correto. Quem não muda nunca de opinião é dogmático, perde razão. As Ideias e seu Lugar intitula um dos seus ensaios mais instigantes sobre as teorias do desenvolvimento. Ter ele caído na armadilha da linguagem preconceituosa mostra o quanto o vício está incorporado nos ditos populares. Para mostrar sua flexibilidade intelectual poderia alternativamente ter dito: "Não sou uma pedra"! Parada no mesmo lugar.

Do burro ao boi. O Congresso Nacional, aos olhos do povo, parece uma casa de doidos. O senador Demóstenes Torres, porém, teve alguma inspiração ao contrário, ligada à mansidão, para caracterizar em sua entrevista o lado bovino daquela Casa. A submissão do Congresso ao poder do Executivo é um sério problema apontado por ele, motivo de preocupação dos democratas republicanos. Agora, achar que toda boiada é lânguida significa desconhecer a complexidade da pecuária. Cutuca touro bravo pra ver!

Certo desprezo ao caipirismo se esconde no preconceito urbanoide contra o campo. Nas festas juninas o desdém aparece disfarçado nos exagerados fetiches do caboclo, tais como o chapéu de palha desfiado do tipo espantalho, aquele dentinho pintado de preto para parecer banguela, o sapatão velho de bico furado. Em vez de homenagem, refletem um horroroso mau gosto que deforma a visão das crianças sobre os homens do interior, depreciando-os, igualando-os todos ao triste personagem Jeca Tatu. Pedagogia zero.

O passado escravocrata e latifundiário, aliado aos problemas ambientais do presente, como o desmatamento, certamente ajuda a cultivar na opinião pública uma imagem negativa da nossa agricultura. Vista caolhamente, suas mazelas se destacam, as glórias se escondem. Nesse olhar deformado, o atraso ido subjuga a modernidade rural.

A ideologia urbana, auxiliada por infelizes metáforas, transforma o positivo em negativo, criando uma maldade que ridiculariza o mundo rural. Poderia ser diferente. Bastaria as pessoas se apegarem às jocosas figuras de linguagem. O Palocci caiu do cavalo. Fernando Henrique mexeu com um vespeiro. Demóstenes cutucou a onça.

Louco da vida com as autoridades alemãs, que equivocadamente jogaram sobre as costas dos agricultores espanhóis a culpa por aquele surto bacteriológico, bradou o representante da Espanha, Francisco Sosa-Wagner, brandindo nas mãos um exemplar do legume: "É preciso recuperar a honra do pepino".

Tá certo o homem!

Agrônomo, foi Secretário do Meio Ambiente do Estado de São Paulo.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Tucanato reúne líderes estaduais para afinar discurso de oposição

Nova Executiva quer aproveitar primeira crise política do governo Dilma e começar articulação do partido para eleições de 2012

Julia Duailibi

Na tentativa de faturar com a primeira crise política no governo Dilma Rousseff (PT) e articular o partido para a eleição municipal de 2012, o PSDB organizará nesta terça-feira, 14, em Brasília um encontro com os presidentes estaduais da legenda em todo o País.

Além de discutir a campanha do ano que vem, a ideia do evento é nivelar o discurso de oposição, explorando a queda do ex-ministro Antonio Palocci (Casa Civil) e temas econômicos considerados frágeis pela oposição, como o crescimento da inflação.

Na primeira reunião da nova Executiva do partido, na semana passada, os tucanos deflagraram o debate interno sobre a eleição municipal com a criação de grupos para acompanhar o tema e estudar alianças com outras siglas. O debate sobre a fusão do PSDB com o DEM, defendida por alguns líderes do partido, não será matéria de discussão dos núcleos criados até 2012.

Recém criado pelo PSDB, o Conselho Político, presidido pelo ex-governador José Serra, também deve ter sua primeira reunião ainda nesta semana.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

PSDB comemora elogio de Dilma a FHC

Em carta, presidente diverge de Lula, que cravou o termo ""herança maldita"", e reconhece papel decisivo do tucano no combate à inflação

Daniel Bramatti

Líderes do PSDB comemoraram a divulgação de uma carta na qual a presidente Dilma Rousseff qualifica o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso como político que "contribuiu decisivamente para a consolidação da estabilidade econômica" no Brasil.

A mensagem foi enviada por Dilma por ocasião dos 80 anos de FHC. Na última sexta-feira, durante evento em homenagem ao tucano, a carta foi entregue a ele pelo ministro da Defesa, Nelson Jobim.

"É uma carta de conteúdo democrático e republicano na qual a presidente, apesar das divergências políticas e partidárias, reconheceu os méritos de Fernando Henrique Cardoso, sua habilidade política e seu êxito no combate à inflação", afirmou o líder do PSDB na Câmara, deputado Duarte Nogueira (SP).

No texto, cuja íntegra foi publicado em um site que comemora o aniversário de 80 anos, Dilma afirma que FHC, durante sua trajetória, se destacou como "acadêmico inovador", "político habilidoso" e "ministro-arquiteto de um plano duradouro de saída da hiperinflação".

A presidente destacou também "o espírito do jovem que lutou pelos seus ideais, que perduram até os dias de hoje", em referência ao papel de FHC na consolidação do regime democrático.

"Esse espírito, no homem público, traduziu-se na crença do diálogo como força motriz da política e foi essencial para a consolidação da democracia brasileira em seus oito anos de mandato", escreveu a presidente. "Fernando Henrique foi o primeiro presidente eleito desde Juscelino Kubitschek a dar posse a um sucessor oposicionista igualmente eleito", acrescentou. "Não escondo que nos últimos anos tivemos e mantemos opiniões diferentes, mas, justamente por isso, maior é minha admiração por sua abertura ao confronto franco e respeitoso de ideias."

Para Edson Aparecido, secretário estadual do Desenvolvimento Metropolitano e vice-presidente nacional do PSDB, a carta é "um fato da maior relevância". "A presidente mostra estatura e dignidade ao reconhecer o papel que Fernando Henrique teve para o Brasil."

"Herança maldita". Tanto Aparecido quanto Duarte Nogueira apontaram uma inflexão de Dilma em relação ao comportamento de seu antecessor direto, Luiz Inácio Lula da Silva.

"A herança maldita que Lula tanto propagou não faz parte do vocabulário da presidente", disse o líder tucano na Câmara. "É um reconhecimento que o governo Lula e o PT não fizeram", afirmou o secretário. Duarte Nogueira contou ter ouvido de adversários a avaliação de que a manifestação de Dilma foi mais enfática que as feitas pelos próprios tucanos. "É despeito por ela ter sido tão elegante, coisa que o Lula não foi", ironizou.

No site fhc80anos.com.br há outros depoimentos de personalidades do mundo político, jurídico e cultural. "A passagem do tempo só ampliou minha admiração pelo democrata que pensou o Brasil com os olhos fitos no Brasil e no futuro", afirmou a ministra Ellen Gracie, do Supremo Tribunal Federal (STF). "O presidente Cardoso é um dos líderes mais impressionantes com quem trabalhei durante meu governo, e nos tornamos bons amigos", disse o ex-presidente norte-americano Bill Clinton.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO