quinta-feira, 10 de setembro de 2009

Uma bomba política

Merval Pereira
DEU EM O GLOBO


Está na mesa da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, uma verdadeira bomba política, exemplar de uma coalizão onde cada partido defende seus interesses próprios e mantém o governo refém. Um grave problema para quem é candidata oficial à sucessão do presidente Lula: o pedido do ministro da Ciência e Tecnologia, Sérgio Rezende, para que a Aeronáutica troque seu representante na Agência Espacial Brasileira (AEB), o major-brigadeiro Antonio Hugo Pereira Chaves, que é PhD em Engenharia Espacial em Toulouse, na França, e ex-piloto da Esquadrilha da Fumaça, considerado "top gun" na Aeronáutica.

O pedido de demissão foi feito por pressão do presidente em exercício do Partido Socialista Brasileiro (PSB) e ex-ministro da Ciência e Tecnologia, Roberto Amaral, que acumula a função política com a presidência da empresa brasileiro-ucraniana Cyclone Alcântara Space, que vai explorar o lançamento de foguetes da Base de Alcântara, no Maranhão - cuja utilização está no centro de toda a crise política.

Esse acordo com a Ucrânia, por sinal, foi objeto de uma polêmica logo no início do governo Lula, pois ele continha cláusulas que haviam sido contestadas pelo PT quando o governo Fernando Henrique Cardoso negociou tratado semelhante com os Estados Unidos.

Na campanha eleitoral de 2002, o candidato Lula dissera que o acordo com os Estados Unidos não levara em conta a soberania nacional, pois os americanos é que dariam permissão para que brasileiros entrassem na base e não cabia aos brasileiros "fiscalizar um contêiner em nosso território". Cláusulas semelhantes estão no contrato com a Ucrânia.

Na reunião da Agência Espacial Brasileira na semana passada, houve um bate-boca entre Roberto Amaral e o major-brigadeiro, que defendia uma negociação com os representantes dos quilombolas e dos indígenas que estão instalados no terreno da Base de Alcântara antes de colocá-la em funcionamento novamente.

Embora Alcântara, no Maranhão, seja considerada o melhor local do mundo para lançamento de foguetes, o Programa Espacial está sendo emperrado por grupos de indígenas e quilombolas que estão instalados na região.

É preciso construir uma nova base para os lançamentos de foguetes, pois a antiga base explodiu em agosto de 2003, matando mais de 20 engenheiros, na maior tragédia do setor na história brasileira.

Mas há problemas, pois a Funai exige um estudo de impacto ambiental e um levantamento socioeconômico, enquanto a demarcação do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) destinou 78,1 mil hectares aos quilombolas e 8,7 mil para o programa de lançamentos de foguetes.

O ex-ministro Roberto Amaral está empenhado para que as obras da nova Base de Alcântara sejam incluídas no PAC, para garantir a prioridade do projeto e acelerar o processo de licença ambiental da área onde os lançamentos serão feitos.

O projeto da empresa binacional seria iniciar as obras de terraplanagem em agosto, para lançar o primeiro satélite, sem fins comerciais, no segundo semestre de 2010, e o primeiro lançamento comercial em 2011, mas o processo está atrasado pelos problemas.

O major-brigadeiro Antonio Hugo Pereira Chaves, representante da Aeronáutica na AEB, defendeu na reunião da agência a tese de que seria melhor que se tentasse um acordo com os quilombolas e indígenas instalados na região, para que os lançamentos de Alcântara não fossem impugnados internacionalmente pelos movimentos sociais e se tornassem alvos de protestos, inclusive locais, para impedi-los.

Roberto Amaral, presente à reunião como representante da Cyclone Alcântara Space, irritou-se com a proposta do brigadeiro e alegou que os problemas já haviam sido equacionados. Argumentou que a sugestão do brigadeiro prejudicaria o programa espacial brasileiro e, a certa altura, a classificou de uma "proposta de filho da puta", batendo violentamente com a mão na mesa, para em seguida tentar atirar um copo de água na direção do brigadeiro, que reagiu com outro soco na mesa.

Ao mesmo tempo, o brigadeiro atirou-se na direção de Roberto Amaral para lhe tomar o copo, o que fez com que o presidente em exercício do PSB caísse da cadeira, gritando palavrões e sendo contido por seus auxiliares.

Mesmo assim, conseguiu jogar o copo na direção do brigadeiro, sem, no entanto, atingi-lo. Sentindo-se agredido, o presidente do PSB exigiu do ministro da Ciência e Tecnologia a destituição do brigadeiro do conselho da AEB.

Esse ministério é, desde o início do governo Lula, um feudo do PSB, tendo sido Roberto Amaral o primeiro ocupante do cargo, ficando conhecido por uma polêmica declaração em 2003 à BBC Brasil, quando afirmou que concordava com a ideia de que o Brasil tem de buscar "o conhecimento necessário para a fabricação da bomba atômica".

Foi substituído pelo então deputado federal Eduardo Campos, neto de Miguel Arraes, hoje governador de Pernambuco, e depois pelo atual ministro Sérgio Rezende - que coordenou o grupo que elaborou a proposta de apoio à ciência e tecnologia do governo de Arraes, em Pernambuco, em 1986, e depois foi seu secretário estadual de Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente.

Como se vê, Rezende não tem condições políticas de recusar uma exigência do presidente do PSB, e muito menos de adverti-lo. Ele já conversou várias vezes nos últimos dias com o ministro da Defesa, Nelson Jobim, e com o da Aeronáutica, tenente-brigadeiro-do-ar Juniti Saito, mas encaminhou um pedido de demissão do major-brigadeiro Chaves do Conselho da AEB, o que está abalando a Aeronáutica.

O major-brigadeiro Antonio Hugo Pereira Chaves continua trabalhando normalmente, à espera do desfecho da questão.

Guardas da esquina

Dora Kramer
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO


A impressão dá é que o Legislativo quer coibir de algum modo o uso da internet durante períodos pré-eleitorais, mas não sabe direito como nem por quê. A Câmara pelo menos foi clara: propôs a imposição da censura à internet em períodos pré-eleitorais e ponto final. Quem não gostou gostasse.

Ou, então, recorra ao Supremo Tribunal Federal para restabelecer os ditames da Constituição no que tange a garantia legal à liberdade de expressão.

Já o Senado percebeu o absurdo da coisa, afrouxou um pouco, "deixou" livres as manifestações em blogs de pessoas físicas e redes sociais, como twitter, Orkut e YouTube, mas, até o início da noite de ontem quando começaram a discutir o assunto em plenário, estava de pé a ideia de proibir.

Gratuita, como se percebe pelo conteúdo da proposta que, se aprovada ontem, voltaria para nova votação na Câmara.

Os senadores ficaram perdidos na discussão. Foram e vieram ao sabor de críticas e pressões. Primeiro, haviam decidido acabar com a restrição a opiniões e debates, tal como ocorre (de maneira absurda) no rádio e na televisão.

Depois, ensaiaram um recuo por conta da posição dos deputados, que querem a manutenção do texto original, e ontem já não se sabia mais o que, afinal, queriam os senadores.

A prova esteve na quantidade de dúvidas que os parlamentares levantaram a respeito da matéria no início da sessão, vários deles proporcionando a grata surpresa de contestar as restrições propostas pelo relator Eduardo Azeredo.

Ele alega que não se trata de censura. Quer apenas "organizar" as coisas a fim de "assegurar o equilíbrio" de tratamento para todos os candidatos. Evidentemente, não convence.

Inclusive porque a emenda ao projeto da Câmara garante a "livre manifestação de pensamento" em blogs e redes sociais. Em português claro isso significa admitir que em outras formas de comunicação na internet essa mesma liberdade é subtraída.

O objetivo subjacente a todo palavrório é não abrir brecha que possa dar margem ao questionamento das regras restritivas à manifestação de opiniões no rádio e na televisão.

A ideia por trás do argumento racional do "equilíbrio" é a concepção do guarda da esquina, cujo maior tesouro é sua autoridade. Por mais diminuta que seja.

O texto proposto à discussão do Senado é confuso e contraditório. Proíbe os sites noticiosos mantidos por empresas de comunicação de "dar tratamento privilegiado a candidato, partido ou coligação, sem motivo jornalístico que justifique".

O que seria "motivo jornalístico" justificável? Suas excelências não especificam. Nem lhes caberia especificar, uma vez que as razões jornalísticas de veículos de comunicação são da alçada das empresas, não do Parlamento. A menos que os senadores pretendam legislar sobre critérios para a publicação de notícias, artigos e reportagens.

O texto, vago, tanto se presta a julgamentos restritivos quanto à mais absoluta inutilidade.

Segue a proposta, proibindo a divulgação de pesquisas eleitorais com "manipulação de dados", ainda que sob forma de entrevista jornalística.

Desconhece-se se em algum outro tipo de veículo seja permitida a manipulação de dados. Mesmo que a intenção do legislador tenha sido a de inovar, ficou faltando detalhar quais seriam os indícios de manipulação, acompanhados da definição exata do termo no que tange à cobertura jornalística das campanhas eleitorais.

Aqui também a proposta foi redigida de forma genérica, dando margem a questionamentos de resultados que podem ser até mais restritivos que o agora pretendido. Qualquer um poderá se considerar prejudicado por qualquer motivo.

A situação mantida como está, regulada pelo direito de resposta assegurado em lei às vítimas de calúnias, economizaria tempo, energia e muita tolice.

Depois de levar merecida surra de críticas pela condução errática no episódio das acusações contra o presidente do Senado, José Sarney, o líder do PT, Aloizio Mercadante, é um sério candidato à remissão.

O único a se posicionar de forma precisa e sem rodeios, propõe a retirada dessa burlesca tentativa de controle, com um argumento meridiano: "O homem público que teme sofrer crítica na internet é como o guarda noturno que teme trabalhar de noite. Tem que mudar de profissão."

Faltou incluir os que repudiam a crítica ao ponto de dispensar a leitura dos jornais a fim de evitar sofrer de azia.

Algo se move

Aécio Neves já não repudia com ênfase a hipótese da composição de uma chapa "puro-sangue" com José Serra e passou a admitir a escolha do candidato do PSDB a presidente por exame das pesquisas e não mais por meio de prévias.

Em compensação, quer que sejam levados em conta outros aspectos além dos índices de intenção de votos: baixa rejeição, capacidade de agregar e potencial de crescimento.

Ou seja, o mineiro anda. Mas vai devagar.

Papel de trouxas

Eliane Cantanhêde
DEU NA FOLHA DE S. PAULO


A norte-americana Boeing e a sueca Saab gastaram milhões de dólares para disputar a seleção de renovação da frota da FAB.

E eis que de repente, não mais que de repente, Lula vai comer uma moqueca com Sarkozy e ambos anunciam ao mundo a escolha dos Rafale, da francesa Dassault.

O anúncio, num texto em diplomatês e à parte do comunicado conjunto longamente negociado, correspondeu a dizer que o processo não era para valer. Era só para americanos e suecos verem.

Isso, evidentemente, criou problemas na Aeronáutica, que comanda a indicação com seu jeito militar de ser: tudo tem regra, cronograma, informação técnica. Ou, como explicou Jobim no Planalto, processos de seleção, principalmente internacionais e na área de defesa, seguem "prazos e ritos".

Então, como explicar para a milicada, aqui dentro, e para os países e empresas concorrentes, lá fora, que a decisão foi tomada antes da conclusão do parecer técnico? Esse tipo de voluntarismo cabe bem em lutas sindicais, mas pode criar problemas em negociações muito mais complexas.

Na segunda, Lula e Sarkozy anunciaram a escolha dos Rafale. Na terça, Jobim, em nota, deu o dito pelo não dito. Ontem, foi a vez do contorcionismo retórico para explicar o inexplicável, enquanto Lula tentava reduzir tudo a uma brincadeira: "Daqui a pouco eu vou receber de graça". (Atenção ao "eu". Não tem graça nenhuma.)

OK. Há muito mais do que vã filosofia, questões técnicas e até mesmo de preços por trás da preferência do Brasil pelos aviões franceses -ou melhor, pelos franceses. Mas não precisava esculhambar.

Bastava seguir os "trâmites normais", deixar a FAB concluir o seu trabalho, pressionar por melhores preços e juros e anunciar o negócio com a França com profissionalismo e compostura, para conferir ar de seriedade ao país e evitar questionamentos, até jurídicos, depois.

O preço da aliança a qualquer preço

Maria Inês Nassif
DEU NO VALOR ECONÔMICO


Os números da última pesquisa CNT-Sensus não são tão ruins a ponto de o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ter que enterrar qualquer pretensão de fazer o seu sucessor nas eleições do próximo ano, nem tão boas que recomendem manter a sua excessiva autoconfiança de que sua popularidade - que caiu, mas continua alta - terá o poder de eleger um poste em 2010. A moral da pesquisa é que Lula conseguiu manter um baixo grau de contaminação a crises políticas, mas não é nenhum Deus: não ficará imune a elas sempre, em qualquer circunstância.

Existe um elenco de números favoráveis a Lula que pode ser usado com sucesso numa campanha de um candidato governista. Embora tenha caído o desempenho de Lula e do governo, ambos continuam em níveis bastante altos. A pesquisa começou a ser coletada em 1998, no ano da campanha para a reeleição do presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), e até 2002, último ano da administração tucana, os maiores índices foram registrados em março de 2001, quando a avaliação positiva do governo FHC foi de 33,3%, e em abril daquele ano, quando o índice de aprovação de FHC foi de 46,1%. O governo Lula, na baixa, ainda tem 65,4% de avaliação positiva; o presidente Lula, também amargando ligeira queda, tem a aprovação de 76,8% dos entrevistados.

Além disso, o Índice do Cidadão (IC) do CNT-Sensus não aponta para um brasileiro pessimista em relação ao país - e normalmente quando isso acontece há repercussões severas sobre a popularidade do presidente e do partido no poder. O Índice de Avaliação do Cidadão está em 47,79 pontos - já esteve em 54,30 pontos em setembro de 2008, declinou, junto com a crise, até 31,18 pontos, em março deste ano, e sustenta-se em crescimento desde então. O Índice de Expectativa do Cidadão - isto é, o que ele espera do futuro do país - é de elevadíssimos 71,95 pontos, apenas um pouco abaixo dos 73,82 registrados em outubro do ano passado, o maior desde o início da apuração do índice, em abril de 2007.

O IC é medido pela ponderação das avaliações dos entrevistados sobre seis variáveis, nos seis meses anteriores à pesquisa: emprego, renda mensal, Saúde, Educação e segurança pública. Somente na Saúde houve uma percepção clara de piora do serviço público, da penúltima pesquisa, em maio, para a última, em setembro - em maio, 44,4% achavam que a Saúde havia piorado; em setembro, 49,4% tinham essa percepção. Certamente, é um efeito gripe suína. Na questão do emprego, aumentou o número daqueles que consideram que a situação melhorou nos últimos meses - em maio, eram 32,3%; em setembro, 36,5%.

A avaliação sobre a renda mensal ficou estabilizada (46,7% acham que ficou igual, contra 42% na pesquisa anterior; 28,2% acham que melhorou, contra 28,7% entrevistados em maio); na Educação mantém-se uma percepção de melhora (43% achavam que melhorou em maio em 43,8% consideram o mesmo agora) e mantém-se até uma tendência a uma visão mais otimista sobre a segurança pública (24,7% acham que melhorou, contra 22,6% em maio; e 46,9% consideram que piorou, contra 52,2% em maio). Nos cinco indicadores, a expectativa de melhora nos próximos seis meses varia de 48,2% (para a segurança) até 59,6% (emprego).

Esses índices mostram que, pelo menos por enquanto, não há um estrago irremediável na popularidade de um governo que conseguiu manter-se com a cabeça fora d"água inclusive no pior período de crise financeira internacional. Lula teve uma queda de popularidade acentuada em 2005, depois do mensalão, mas rápida - em seguida, manteve índices crescentes de popularidade, ficou a salvo de contaminações de crises cujo palco foi principalmente o Legislativo e ainda conseguiu se dar ao luxo de transferir popularidade para candidatos ligados a ele. O PT, para o tamanho do escândalo do mensalão, não teve uma perda correspondente nas eleições seguintes.

Existem sinais, todavia, de que Lula tende a não manter o mesmo grau de imunidade nas eleições que se aproximam. As quedas que ocorreram agora, mesmo pequenas, e ainda que não o desbanquem como o presidente mais popular do período pós-redemocratização, não são neutras: elas ocorrem justo no momento em que deveria estar colhendo uma passagem relativamente amena pela crise internacional; do pontapé inicial da exploração do pré-sal, que tenderia a levar um eleitorado majoritariamente nacionalista a um certo ufanismo; e quando o país não apenas saiu, mas aparenta ter saído de um longo período de estagnação, ao exibir canteiros de obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) no país inteiro.

Ainda é cedo para avaliar por que Lula apresenta essas quedas justo num momento de retomada parcial da economia, mas existem indícios. O presidente animou-se excessivamente com o fato de ter passado praticamente incólume, desde 2005, por todos os escândalos políticos que aconteceram no país, e com o fato de as campanhas da oposição contra ele e seu governo terem caído no vazio pelo exagero. Bancou a candidatura de Dilma Rousseff, neófita em política, basicamente com o seu prestígio, e assumiu as negociações com o PMDB para viabilizar essa candidatura certo de que todo o desgaste que isso envolve se diluiria no ar porque era ele, Lula, o fiador. O problema é que os escândalos que envolvem o PMDB não são uma mera campanha da oposição - até porque todos os escândalos que envolvem o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), tem potencial de atingir igualmente os partidos oposicionistas representados no Senado. Os escândalos são a própria imagem política - e popular - do aliado PMDB. O pacote da aliança com o maior partido do Congresso embute o preço de transferência dessa imagem para o aliado. Lula já paga um preço com maior declínio em duas regiões em que já era fraco - Sul e Sudeste - e onde o PMDB perdeu espaço para o PSDB e foi quase consumido pelo partido que é o maior adversário do PT. E paga um preço adicional nas classes de maior renda e escolaridade porque essa aliança imobiliza o governo institucionalmente. Os constantes recuos do presidente Lula, nas mais variadas questões de governo, para consolidar sua aliança com setores conservadores que têm como representantes o PMDB e pequenos partidos da base aliada são acenos de fraqueza de uma administração que termina.

Maria Inês Nassif é editora de Opinião. Escreve às quintas-feiras

Centralidade do pré-sal e o desgaste do PT vão inviabilizando nova CPMF

Jarbas de Holanda
Jornalista

Curiosamente, partiu das bancadas federais do PT, em maior grau do que das do PMDB, a recomendação para que o Palácio do Planalto não assumisse como seu o projeto de instituição da CSS – Contribuição Social para a Saúde, novo nome da CPMF com alíquota (inicial) menor, de 0,10%. Curiosamente porque os parlamentares petistas destacam-se como linha de frente de propostas destinadas à ampliação das receitas fiscais do governo Lula. Indiferentes aos efeitos delas na exacerbação da carga tributária e combinando a retórica da prioridade de programas sociais com a capitalização dos dividendos eleitorais que eles possam propiciar.

O que explica a mudança de postura dos parlamentares petistas é o receio de agravamento, resultante de uma estreita associação ao projeto da nova CPMF, do desgaste que têm sofrido na opinião pública, em especial nas camadas médias e, em conseqüência, de dificuldades maiores para a reeleição, sobretudo dos senadores. Tal desgaste, já evidenciado em 2006 após o mensalão e outros escândalos que envolveram lideranças do partido, acentuou-se na recente crise do Senado. Com efeitos de caráter político, imediatos e sensíveis – forte erosão de credibilidade entre os formadores de opinião e nos chamados movimentos sociais, erosão reforçada por um deslocamento de boa parte do respaldo de que desfrutavam nessas áreas em direção à provável candidatura presidencial de Marina Silva. E com o risco de pesados danos eleitorais para os candidatos petistas dependentes do voto crítico dos grandes centros urbanos, como o senador Aloizio Mercadante, em São Paulo.

Para o presidente Lula, a recomendação das bancadas do PT foi bem acolhida – o Executivo apenas acompanhará o andamento do projeto, cujo sucesso terá de resultar da “mobilização social”, segundo declaração que fez – não porque ele se sinta também dependente do apoio da opinião pública (substituída por sua elevada popularidade nas classes C, D e E), mas por contribuir para que o debate político-parlamentar se concentre agora nos projetos do pré-sal, convertido em carro-chefe da campanha da sua candidata à sucessão, Dilma Rousseff. Debate em que ele será favorecido pela retomada do crescimento da economia, e ao qual buscará associar o acordo com a França de Sarkozy para a compra de equipamentos militares, justificada como ação estratégica de defesa de nossas riquezas minerais e da soberania da Amazônia. Outro motivo, inspirado pela reconhecida sensibilidade tática de Lula, para a abstenção do governo em relação ao projeto da CSS foi o de não entregar aos oposicionistas uma bandeira, concreta, ligada a um tema de grande apelo social: o combate à abusiva e crescente carga tributária do país.

Por tudo isso – mesmo com a recomposição do predomínio governista no Congresso após a superação da crise do Senado, e com a perspectiva de esvaziamento da CPI da Petrobras, um dos objetivos do regime de urgência para as matérias do pré-sal é provável que o projeto da CSS seja abandonado ou venha a ser rejeitado. E a resistência a ele foi reforçada pela divulgação ontem de pesquisa da CNT/Sensus, na qual 53,9% dos entrevistados se manifestam contra a recriação da CPMF, apoiada por apenas 37,1%. O que deve ter influenciado declaração feita à tarde pelo presidente da Câmara, Michel Temer: “Com muita franqueza, não acho fácil a votação dessa matéria. Há grande rejeição, há grande resistência a qualquer hipótese de aumento de imposto”.

O custo tributário

Abertura de matéria da Folhaonline, de ontem, da repórter Janaína Lage (de Nova York), com o título “Empresário brasileiro é o que trabalha mais para pagar impostos no mundo”:

“O empresário brasileiro trabalha 2.600 horas a cada ano para acertar suas contas com o fisco. Segundo o relatório "Doing Business - 2010", divulgado pelo Bird (Banco Mundial), trata-se do maior patamar verificado em um conjunto de 183 países. Na lista de economias onde o empreendedor precisa trabalhar mais tempo para pagar os impostos figuram ainda as de Camarões, com 1.400 horas, Bolívia (1.080 horas) e Vietnã (1.050 horas). No sentido oposto, o empresário precisa trabalhar apenas 12 horas para quitar as dívidas com o fisco nos Emirados Árabes e 63 horas na Suíça. Na comparação regional, o Brasil também vai mal: a média dos países da América Latina é de 563,1 horas. De modo geral, o Brasil fica no 129º lugar no ranking elaborado pelo Banco Mundial de locais de maior facilidade para a realização de negócios. A classificação coloca o país atrás de Colômbia, Chile, Peru, El Salvador e Nicarágua, entre outros. No relatório anterior, o país estava no 127º lugar. O indicador leva em conta exigências para abertura de um negócio, legislação trabalhista, registro de propriedade, pagamento de impostos, comércio exterior e fechamento de empresas, entre outros aspectos.”.

O QUE PENSA A MÍDIA

Editoriais dos principais jornais do Brasil
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Nova Escola / RJ

Carta do Deputado Comte Bittencourt/PPS

Professores,

O Parlamento cumpriu a sua obrigação na votação da incorporação do Nova Escola, ontem (8/9), nessa Casa. Mas, na realidade, os grandes responsáveis por esse acordo são vocês que, através de seus sindicatos, foram incansáveis nessa luta. A categoria mostrou presença e força nas galerias e escadarias da Assembleia, nas ruas, por meio do correio eletrônico, na presença nos gabinetes dos deputados, em reuniões propostas pelas lideranças do governo junto aos secretários e, principalmente, na Comissão de Educação, da qual sou presidente.

Os avanços ainda não são o ideal nem o merecido. O governo ainda não deu as condições necessárias para que a categoria tenha salários dignos. Sabemos que ainda falta muito para conseguirmos o ideal. Mas temos que encarar a votação de ontem como um primeiro movimento importante no papel da valorização do educador fluminense.

A partir de agora, temos que começar a mudar um capítulo da história da Educação no Estado do Rio de Janeiro, algo que não se via há quase duas décadas. Ou seja, entender a Educação como investimento, e não como despesa.

Esperamos que a sociedade comece a enxergar, apesar dos acontecimentos de violência inaceitáveis da polícia, que não vamos transformar e nem preparar nossos filhos sem que tenhamos investimentos maciços em Educação. Tenho afirmado isso permanentemente em todos os meus discursos dentro e fora do plenário.

E investimento maciço em Educação é qualidade. E qualidade é qualificação dos seus profissionais, professores e todos os trabalhadores de Educação.

Reafirmo, na qualidade de presidente da Comissão de Educação, que o meu papel permanente na Casa é fazer com que a Educação seja, de fato, a principal política deste estado. Não avançamos o que desejamos, mas, seguramente, avançamos. Esse avanço é simbólico para que possamos inaugurar uma nova etapa de compreensão do papel da escola pública no desenvolvimento do Estado do Rio de Janeiro.

Tenha certeza que a nossa luta pela valorização da educação pública no estado continua.

Atenciosamente,
Comte Bittencourt (PPS)
Presidente da Comissão de Educação da ALERJ

Câmara aprova em 1º turno mais 7.709 vagas de vereador

Ranier Bragon
DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Texto aprovado por 370 votos a 32 aumenta Câmaras em 14,8%; cidades entre 80 mil e 1 milhão de habitantes são as mais afetadas

Emenda ainda precisa ser votada em 2º turno; Câmara estava lotada de suplentes de vereador, que esperam tomar posse após aprovação

Em meio a muita polêmica e uma pressão nos corredores e gabinetes que durou semanas, a Câmara dos Deputados aprovou ontem à noite em primeiro turno a emenda à Constituição que pretende criar 7.709 novas vagas de vereadores no Brasil, elevando o atual tamanho das Câmaras Municipais em 14,8%.

O texto foi aprovado por 370 votos a 32, com 2 abstenções, e ainda precisa passar por votação em segundo turno para ir à promulgação. A emenda redimensiona o tamanho da maioria das Câmaras, aumentando cadeiras principalmente em cidades entre 80 mil e 1 milhão de habitantes. Capitais como São Luís e Maceió, por exemplo, sairiam dos atuais 21 vereadores para 31. São Paulo permaneceria com 55 vereadores.

A votação foi feita sob uma galeria lotada por centenas de suplentes de vereadores que há semanas pressionam os deputados na Câmara. A expectativa deles é que as Câmaras deem posse imediata aos suplentes assim que a emenda seja promulgada, já que o texto fala em eficácia imediata, sem retroatividade de salários e benefícios.

Há muitas dúvidas em relação a isso. Vários deputados dizem que vão recorrer aos tribunais superiores sob o argumento de que o novo tamanho das Câmaras, para valer para este mandato, teria de ser aprovado antes das convenções partidárias das eleições de 2008.

A emenda aprovada ontem é a resposta dos congressistas a uma decisão do Tribunal Superior Eleitoral de 2004 que cortou cerca de 8.000 vagas de vereadores ao interpretar o artigo da Constituição sobre as Câmaras. Os defensores da emenda aprovada ontem alegam que ela diminui o teto de gastos das Câmaras de 5% a 8% da receita dos municípios, dependendo do tamanho, para 3,5% a 7%.

"Existirá uma economia de R$ 2,2 bilhões anualmente", afirmava panfleto distribuído ontem pela Associação Brasileira de Câmaras Municipais.

Mas não há nenhuma garantia de redução de gastos. Isso porque as prefeituras, em média, não repassam às Câmaras a totalidade dos recursos permitidos pela Constituição. Dados do Tesouro relativos a 2007 mostram que o repasse médio é de 65% do limite permitido. Ou seja, há margem para aumento de gastos, já que mais vereadores exigem mais assessores.

"Presidente Michel Temer [PMDB-SP], o senhor, como grande constitucionalista, sabe que essa emenda não resiste dez segundos no Poder Judiciário. Isso não tem sustentação jurídica e o senhor sabe disso", discursou o deputado Silvio Costa (PMN-PE). "Não nos perguntamos se há uma demanda real dos munícipes, do povo de cada cidade, por mais representantes.

Ficamos, isso sim, prisioneiros das pressões dos suplentes, essa nova "categoria social" mobilizada e reivindicante", afirmou Chico Alencar (PSOL-RJ).

"Não existe hospital sem médico, escola sem professor, nem democracia sem representação", disse Flavio Dino (PC do B-MA), que apoiou a medida. Segundo ele, o aumento de quase 50% da Câmara de São Luís é válido. "São Luís tem um milhão de habitantes. Está sub-representada politicamente."

Senado ainda debate censura à rede na eleição

Adriana Vasconcelos e Maria Lima
DEU EM O GLOBO

Sarney e Tasso batem boca sobre regras para substituição de governadores que tenham os mandatos cassados

BRASÍLIA. Faltando 24 dias para o prazo limite de publicação das mudanças nas regras para a eleição do próximo ano, o Senado iniciou ontem à noite, sem consenso sobre os principais pontos, a votação da reforma eleitoral, que ainda terá de passar novamente pela Câmara antes de ser sancionada. O plenário estava dividido sobre a imposição ou não de restrições à cobertura jornalística feita por empresas de comunicação na internet, e sobre regras para a substituição de governadores cassados pela Justiça Eleitoral.

Os senadores Tasso Jereissatti (PSDB-CE) e José Sarney (PMDB-AP) chegaram a bater boca em plenário por causa da emenda do tucano que estabelece que a cassação de mandatos de prefeito, governador ou presidente poderia resultar na realização de uma nova eleição, se o julgamento fosse consumado nos dois primeiros anos de mandato. Ou de eleição indireta, na metade final do mandato.

Sarney disse que a medida seria inconstitucional, e que o Senado assim, recriaria a eleição indireta. Tasso rebateu, disse que defende a democracia, mas que é preciso haver eleição, e não a posse do segundo colocado - como ocorreu com a filha de Sarney, Roseana, hoje governadora do Maranhão.

No caso da cobertura da campanha na rede, a ideia dos dois relatores, senadores Marco Maciel (DEM-PE) e Eduardo Azeredo (PSDB-MG), era aplicar aos sites de notícias as mesmas regras impostas hoje a jornais e revistas, impedindo tratamento privilegiado de candidatos. Mas o líder do PT, Aloizio Mercadante (SP), tentava arregimentar o apoio para derrubar qualquer restrição à internet:

- A internet é a praça pública. Não tem qualquer sentido essa restrição.

Redes de relacionamento estão liberadas

Até o início da votação só havia consenso para a liberação de manifestações de pensamento em blogs assinados por pessoa física, e nas redes de relacionamento ou troca de mensagens, como Orkut e Twitter. Desde que assegurado, neste caso, o direito de resposta àqueles que se considerarem prejudicados ou ofendidos.

Em busca de apoio, Mercadante garantiu, na última hora, um acordo autorizando todos os candidatos a manterem no ar, até o dia da eleição, seus respectivos blogs e sites pessoais, assim como de seus partidos. A proposta da Câmara previa que esses blogs e sites de candidatos e partidos saíssem do ar 48 horas antes do pleito.

- Se o candidato poderá levar porrete de qualquer blog ou site, é natural que ele possa se defender e o espaço para isso seria o seu próprio blog ou site pessoal - concordou Demóstenes Torres (DEM-GO).

Contrariando o texto da Câmara, que proibia qualquer propaganda eleitoral paga na rede, o Senado autorizou a publicidade, mas apenas para os candidatos à Presidência, por serem nacionais. Serão autorizadas até 24 inserções ao longo da disputa.

Entre as propostas consensuais aprovadas, a oposição garantiu a proibição, nos quatro meses antes da eleição, a qualquer candidato de comparecer a inaugurações ou lançamento de pedra fundamental de obras públicas e até a atos de assinatura de ordem de serviço. No período também ficam proibidas propagandas eleitorais ou institucionais dessas obras.

Será proibido expandir e criar programas sociais em ano eleitoral. Esses benefícios podem ser reajustados, desde que haja previsão orçamentária.

Outro ponto sem acordo referia-se aos debates eleitorais. O texto previa que dois terços) dos candidatos deveriam obrigatoriamente ser convidados, exigindo ainda que seus partidos tenham pelo menos dez deputados federais. Senadores consideraram que isso poderia violar o direito das minorias.

- Assim, a ex-senadora Heloisa Helena (PSOL-AL) não teria participado dos debates da última campanha presidencial, apesar da votação expressiva que teve - ponderou o líder do PSDB, Arthur Virgílio (AM).

Serra quer emitir títulos para antecipar receita

Ricardo Brandt
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO


O governador de São Paulo, José Serra (PSDB), encaminhou à Assembleia Legislativa projeto de lei permitindo que dívidas tributárias e não-tributárias que o Estado tem a receber, algo em torno de R$ 3 bilhões, sejam transformadas em títulos, a ser vendidos no mercado financeiro. A operação vai gerar até o fim do próximo ano cerca de R$ 900 milhões, segundo estimativa da Secretaria da Fazenda. O dinheiro será usado exclusivamente no plano de investimentos do governador, principal nome do PSDB para a disputa presidencial de 2010.

Serra pediu prioridade à Assembleia para que o Projeto de Lei 749 seja aprovado este ano. A lei vai permitir a emissão das debêntures por parte de uma estatal a ser criada, uma sociedade de propósito específico, que ficará responsável pelas operações financeiras. Apenas dívidas já parceladas dentro do Programa de Parcelamento Incentivado (PPI) serão contabilizadas.

Na prática, a estatal vai colocar as debêntures no mercado e resgatá-las conforme os contribuintes forem pagando suas dívidas.

O secretário adjunto da Fazenda, George Tormin, afirmou que o sistema permitirá antecipação de receita ao Estado e não altera nada para o devedor.

Aécio vê descaso de Dilma com Minas

Eduardo Kattah, BELO HORIZONTE
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO


Governador e pré-candidato tucano diz que governo "está devendo uma ação mais consistente" no Estado

Ao afirmar que o governo federal "está devendo uma ação mais consistente" no Estado, o governador de Minas, Aécio Neves (PSDB), acusou ontem a Casa Civil de "descaso" em relação à proposta de uma Parceria Público-Privada (PPP) para a ampliação do metrô de Belo Horizonte.

Em setembro de 2008, o governo estadual, representado pelo então secretário de Estado de Desenvolvimento Econômico, Marcio Lacerda (PSB) - atual prefeito da capital mineira -, apresentou a proposta à ministra Dilma Rousseff. O objetivo é ampliar a capacidade de transporte do metrô de 150 mil para 800 mil passageiros por dia, com investimentos estimados em cerca de R$ 3 bilhões.

"Apresentamos alternativas para que o governo federal pudesse ter a parceria tanto do Estado quanto do município e do setor privado, através de uma Parceria Público Privada. Parece que isso não entusiasmou a própria Casa Civil", reclamou o governador. "Mas essa falta de entusiasmo não pode vir acompanhada do descaso a essa questão e da ausência de resposta."

Aécio é pré-candidato tucano à Presidência em 2010 e Dilma é apontada como virtual candidata do PT na disputa.

Aécio também cobrou da Infraero o início do projeto de ampliação do Aeroporto Internacional Tancredo Neves, em Confins. Reclamou da falta de investimento federal em rodovias que cortam Minas e da "omissão" do governo no ressarcimento a Estados por perdas com a desoneração das exportações, como determina a Lei Kandir.

O mineiro afirmou não acreditar em retaliação pelo fato de ser de um partido de oposição, pois o presidente Luiz Inácio Lula da Silva "não tem esse viés". "Acho que, mais uma vez, é a gestão do Estado que é morosa, é complexa e os resultados demoram a vir", disse. "O governo terá inúmeras dificuldades no que depender da nossa ação para aprovar o seu Orçamento, se continuar se omitindo em algo que é de responsabilidade do País e da economia brasileira".

Ministra interina contesta tucano em nota oficial

A ministra-chefe interina da Casa Civil, Erenice Guerra, divulgou nota oficial em que nega "descaso do governo federal em relação a Minas Gerais", em resposta ao governador Aécio Neves. Depois de destacar que "quem construiu e mantém o metrô de Belo Horizonte é o governo federal", a nota informa que, somente no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), o Estado receberá "investimentos que somam R$ 50,6 bilhões".

Lula faz acordo e recua na urgência do pré-sal

Maria Clara Cabral, Valdo Cruz e Kennedy Alencar
DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Em troca, oposição concordou em votar projetos até 10 de novembro

O presidente Lula recuou e aceitou retirar a urgência constitucional dos quatro projetos de lei sobre o marco regulatório do pré-sal. Em troca, a oposição fechou acordo com a base aliada do governo na Câmara dos Deputados para votar os projetos até 10 de novembro.

O acordo deu à oposição mais 24 dias corridos, cerca de 70 dias ao todo de tramitação, para debater e tentar modificar a proposta do governo. Antes, pelo regime de urgência, os projetos teriam de ser votados em até 45 dias. Caso contrário, trancariam a pauta da Casa.

Lula recua e retira urgência do pré-sal

Temer fecha acordo com presidente para votação de todos os projetos até 10 de novembro e promete "mínimo de modificações"

Oposição ganha 70 dias para debater projetos; Jucá, líder do governo no Senado, defende a manutenção de regime de urgência na Casa


O presidente Lula recuou e aceitou retirar a urgência constitucional dos quatro projetos de lei que tratam do marco regulatório do pré-sal. Em troca, a oposição fechou acordo com a base aliada do governo na Câmara para votar os projetos no dia 10 de novembro.

O acordo deu à oposição mais 24 dias corridos, cerca de 70 dias ao todo de tramitação, para debater e tentar modificar a proposta do governo. Antes, no regime de urgência, os projetos teriam de ser votados em 45 dias ou trancariam a pauta.

O recuo foi articulado pelo presidente da Câmara, Michel Temer (PMDB-SP), que prometeu a Lula ontem à tarde não só votar todos projetos até o início de novembro como também aprová-los na Casa com o "mínimo de modificações".

Pela manhã, Temer havia se reunido com líderes da oposição, como José Aníbal (PSDB-SP) e Ronaldo Caiado (DEM-GO) para fechar o acordo, que havia sido negado pelo próprio Lula na semana passada.

Para convencer Lula, Temer disse que o melhor caminho seria a negociação, já que, com a obstrução que DEM e PSDB estavam fazendo na Câmara, os projetos não seriam votados antes de novembro. E num clima de guerra. O peemedebista disse ainda que deputados da oposição tendem a votar a favor do governo em boa parte dos projetos, mas a urgência poderia prejudicar essa disposição.

Com a urgência, o prazo para as votações se encerraria no dia 16 de outubro. No dia 17, os projetos passariam a trancar as demais deliberações. Sem a urgência, o tempo para a apresentação de emendas foi ampliado. O prazo, que venceria hoje, passa para a próxima semana.

"Desde ontem tenho conversado com todos os líderes, estabelecendo um novo calendário de 60 dias. Levei ao presidente que no dia 10 [de novembro] inicio as votações, mesmo que as comissões não tenham concluído o seu trabalho. Agradamos a todos", disse Temer.

Em retaliação à urgência, líderes dos principais partidos da oposição estavam obstruindo todas as votações na Câmara, o que dificultava o andamento dos trabalhos na Casa.

"Prevaleceu o bom senso. Voltamos a nos pautar, não há mais ameaças do Executivo", disse Ronaldo Caiado.

Para alguns líderes governistas, apesar do recuo de Lula, o novo calendário é positivo. Avaliam que, se a obstrução fosse mantida, os projetos não seriam votados até 10 de novembro. "Lula aceitou retirar a urgência constitucional, embora as propostas continuem urgentes. Uns dias a mais não fazem tanta diferença", disse o líder do PMDB na Câmara, Henrique Eduardo Alves (RN).

Senado

Deputados governistas lembraram ainda que o acordo com Lula é referente só à Câmara. Ou seja, nada impede que Lula opte por pedir novamente o regime de urgência quando os projetos forem ao Senado. Se isso acontecer, o prazo de 45 dias para análise e votações voltaria a ser contado no Senado.

"Eu defendo a urgência conosco. Um acordo na Câmara não tem relação aqui", disse o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), ressaltando que a oposição tem mais força na Casa.

A visita de Temer a Lula na tarde de ontem, com outros líderes da base, foi a segunda com o mesmo objetivo. Na semana passada, sem o apoio do PT, Lula havia negado a mudança.

Ontem, no entanto, com o calendário semelhante de votação estabelecido por Temer e com o apoio dos petistas, ele aceitou a proposta.

Supremo indica extradição de Battisti

Carolina Brígido e Catarina Alencastro
DEU EM O GLOBO

O Supremo Tribunal Federal (STF) indicou ontem que deverá determinar a extradição do italiano Cesare Battisti, condenado na Itália por envolvimento no assassinato de quatro pessoas, na década de 1970. Por cinco votos a quatro, os ministros consideraram ilegal a decisão do ministro da Justiça, Tarso Genro, de conceder refúgio político ao italiano. Em nova votação, quando o placar era de quatro votos a três pela extradição, o ministro Marco Aurélio pediu vista e o julgamento foi interrompido. Mesmo que ele vote contra a extradição, o presidente da Corte, Gilmar Mendes, deverá desempatar votando à favor.

STF tende a extraditar Battisti

POLÊMICA DIPLOMÁTICA

Julgamento é interrompido em 4 a 3, e resultado parcial contraria decisão do governo

O Supremo Tribunal Federal (STF) abriu caminho ontem para a concessão da extradição do italiano Cesare Battisti, condenado em seu país pela participação no assassinato de quatro pessoas, na década de 1970. Quando o placar contabilizava quatro votos a três pela extradição, o ministro Marco Aurélio Mello pediu vista, para analisar melhor o caso. Não há previsão de quando ele devolverá o processo, mas a expectativa é que vote contra a extradição. Se isso acontecer, caberá ao presidente da Corte, Gilmar Mendes, desempatar. No STF, há indicações de que Gilmar é favorável à extradição.

No julgamento, o maior derrotado foi o ministro da Justiça, Tarso Genro. Dia 15 de janeiro, ele concedeu refúgio a Battisti, considerando que os crimes pelos quais o italiano foi condenado eram políticos. E que ele corria o risco de ser perseguido em seu país, caso fosse extraditado. Por cinco votos a quatro, os ministros consideraram que o benefício foi concedido de forma ilegal, pois não haveria indício de que Battisti seria vítima de perseguição política na Itália. O relator, Cezar Peluso, lembrou que a Itália de hoje é uma república democrática, que respeita os direitos humanos:

- Não há razão para acreditar que, se for concedida a extradição, o extraditando não veria seus direitos respeitados na Itália de hoje.

Peluso: Lula não pode impedir extradição

Apenas nove ministros participam do julgamento. Para o relator, Battisti cometeu crimes comuns e, por isso, não pode ser tratado como refugiado político. Se a posição vencer, Battisti cumprirá pena de prisão na Itália. Se não, será libertado e poderá viver no Brasil. Peluso considerou inevitável a extradição, porque há um tratado entre o Brasil e a Itália que determina a entrega de criminosos comuns ao país de origem. O relator disse que o presidente Lula não tem poderes para se recusar a cumprir a determinação do STF, com base no mesmo tratado.

O relator também defendeu a tese de que Battisti não pode ser considerado refugiado porque cometeu crimes comuns, sem propósitos políticos - embora fosse membro do grupo Proletários Armados pelo Comunismo (PAC) à época. As vítimas eram um açougueiro, um joalheiro, um carcereiro e uma mulher. Segundo Peluso, os homicídios foram motivados por vingança pessoal:

- Não há a mínima possibilidade de enxergar aqui algum crime de caráter político contra um açougueiro e um joalheiro, para dizer o mínimo. Os delitos entram, com folga, na classe dos crimes comuns graves, classificados como hediondos.

Peluso também rebateu o argumento de que Battisti não teria tido o direito de se defender no julgamento na Itália. Sustentou que o réu constituiu advogado, mas foi julgado à revelia porque estava foragido:

- As pessoas que fogem de procedimentos judiciais não são refugiadas. O refugiado é uma vítima da Justiça e não é alguém que foge da Justiça.

O relator afirmou que a tese de que os crimes prescreveram não se sustenta. Segundo Peluso, a prescrição ocorreria apenas em 2013. Outro argumento da defesa é o de que não havia provas concretas contra Battisti. Peluso esclareceu que as leis brasileiras não permitem a revisão de provas de casos julgados em outros países.

O primeiro a discordar do relator foi Eros Grau. Para ele, não há irregularidade na decisão do ministro da Justiça de conceder o refúgio. Para Eros, o processo de extradição deveria ser arquivado e o italiano, libertado. Joaquim Barbosa foi além: disse que a decisão do Executivo é soberana, uma decisão de estado e, por isso, não pode ser submetida ao crivo do STF:

- Concessão de refúgio é assunto político.

Cármen Lúcia concordou. Além de Peluso, foram favoráveis à extradição Ricardo Lewandowski, Carlos Ayres Britto e Ellen Gracie.

Tarso: 'Conceder refúgio político é uma prerrogativa do Executivo'

Ricardo Galhardo
DEU EM O GLOBO

POLÊMICA DIPLOMÁTICA: Ministro diz que ainda não fará "juízo político" do STF

Ministro reclama de "pressão ostensiva e estranha" da Itália sobre o Brasil

SÃO PAULO. O ministro da Justiça, Tarso Genro, responsável pela concessão de refúgio político ao ex-ativista italiano Cesare Battisti, disse ontem que, se o Supremo Tribunal Federal decidir a favor da extradição do italiano, significará o fim do refúgio político no Brasil. Para o ministro, o governo italiano faz uma pressão "ostensiva e estranha" sobre o Brasil.

- Se for declarada a inconstitucionalidade deste artigo (33 do Estatuto dos Refugiados), fica extinto no Brasil o direito de refúgio, que é uma prerrogativa do Executivo. Isso me parece uma questão para ser discutida de maneira profunda - disse Tarso, duas horas após o início do julgamento, depois suspenso.

O ministro reforçou que se trata de uma prerrogativa do poder Executivo.

- Este artigo transforma o asilo em uma questão pertinente ao Executivo, com juízo político do Executivo. Tem questões que são do Judiciário, indevassáveis, e outras do Legislativo também. Cada poder tem suas prerrogativas e características - afirmou.

Críticas ao governo Berlusconi

Ele reclamou da forma como o governo italiano tem se comportado neste caso:

- O governo da Itália exerceu pressão ostensiva e estranha, no mínimo. Pressão que não fez em outros casos aqui no Brasil e também na França, de pessoas que estavam na mesma condição de Battisti.

Ao cobrar mais respeito às decisões brasileiras, o ministro criticou o governo Silvio Berlusconi:

- É preciso examinar por que o governo italiano propõe, por exemplo, leis que obrigam os médicos a denunciar seus pacientes que são imigrantes ilegais. É um feito de um país soberano, tem que ser respeitado, mas o Brasil não precisa se curvar a isso - disse Tarso.

O ministro citou o caso do próprio Battisti, que passou 11 anos exilado na França sob a proteção do governo social-democrata, como exemplo de que o refúgio é uma decisão política que cabe a cada país.

- Em todos os países democráticos do mundo, não só aqui no Brasil, a questão do asilo é do Executivo. Veja que o Battisti esteve 11 anos na França como um refugiado político a partir de um juízo do governo francês, do presidente (Mitterrand), que inclusive tinha um juízo político tão completo que pediu a eles que assinassem um documento renunciando à luta armada.

Perguntado se o fato de o STF estar julgando o caso seria uma intromissão, Tarso preferiu esperar o veredicto:

- O juízo político sobre a decisão do Supremo vou fazer depois.

João Bosco, Nilze Carvalho e Diogo Nogueira

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