sábado, 27 de outubro de 2018

Opinião do dia: Luiz Werneck Vianna

IHU On-Line – Qual será a economia de 2019?

Luiz Werneck Vianna – Nesta eleição praticamente não se discutiu economia. Discutiram-se valores, rumos políticos. Agora, qual é a economia? A economia do candidato do PT no primeiro turno foi a política levada a cabo pela ex-presidente Dilma Rousseff, cujo resultado é conhecido: fracasso absoluto. Bolsonaro, em relação a isso, não precisou fazer mais nada para deixar o tema correr solto e se deixou navegar nessa onda em que ele foi extremamente favorável, porque ele não teve que se defrontar com um projeto de renovação da sociedade, da política da sociedade e de suas instituições que estivessem em linha de continuidade com a nossa história. Há uma surpresa nisso aí, olhando bem ao fundo. É uma surpresa imediata: poxa, que votação espantosa, inesperada. Fora isso, fora essas interjeições, quais são as explicações?

Esse segundo turno pode – e eu temo isso – transcorrer num ambiente mais inóspito do que o primeiro, porque esses candidatos – salvo o arremedo de procura do Centro político que estão fazendo - continuam sem apresentar os seus programas de governo: para onde se quer ir? Haddad se desvencilhou de verdade do programa da Dilma?Como? Que quadros ele vai levar para isso? É um teatro de sombras, porque as coisas verdadeiras não aparecem. O que teria de ser pensado para aprofundar agora? Falta à sociedade perceber quais são os rumos alternativos, para onde ela deve conduzir a sua opção. Para a política da Dilma? Para o Chile de Pinochet, com neoliberalismo com fuzis? O Centro não é um lugar sem valores, um lugar que deva ser pensado, como esses políticos que estão aí fazem, como um lugar fisiológico, um lugar sem projeto. Expulsaram o MDB do Centro político.


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Luiz Werneck Vianna, sociólogo, PUC-Rio. Entrevista: ‘Depois do “teatro de sombras”, Brasil precisará se reinventar e sair do caminho da prancheta.’, Blog Democracia Política e novo Reformismo, 23/10/2018

Marco Aurélio Nogueira: Os próximos dias do resto da nossa vida

- O Estado de S.Paulo

O Brasil não terá como ser governado sem uma pacificação geral dos espíritos

Seja qual for o resultado das urnas de amanhã, uma constatação está dada: protagonizamos a mais tensa e desqualificada disputa presidencial da História nacional. Poderemos gastar um bom tempo de pesquisa para interpretar o uso que se fez das redes e das fake news, os erros e acertos das campanhas, mas nada será mais desafiador do que compreender o terremoto que abalou as estruturas políticas da sociedade e alterou de forma substantiva a cabeça dos brasileiros.

Como foi possível que, na segunda década do século 21, a disputa presidencial transcorresse como se o País ainda estivesse no século 20? Suas elites políticas e intelectuais ignoraram os sinais de que algo estava a fermentar nos subterrâneos da vida social. Nada se discutiu de substantivo, nenhum mapa cognitivo saiu dos debates, nenhuma luz iluminou o eleitorado, que chegou às urnas enfeitiçado por pregações mágicas e regressistas, alheias ao razoável, mudas diante dos desafios que se abrem para o futuro.

O resultado foi a ampliação dramática das divisões políticas e do desentendimento social.

Tornamos inviável o centro político, a inteligência e a moderação, em benefício da estridência reacionária, da agitação irresponsável, do apelo a um passado mitificado. O oportunismo, a demagogia e a prevalência de interesses mesquinhos tomaram o palco de assalto, marginalizando as demais candidaturas. Sobraram os antípodas, que se escolheram reciprocamente, impelidos por uma ordem social despedaçada e sequiosa de “segurança”, um o espelho invertido do outro.

Nenhuma vitória terá força suficiente para desprezar esse quadro social. O vencedor e sua oposição terão de negociar, dialogar, contemporizar. Um pacto terá de ser costurado.

Se Haddad vencer, será uma vitória da resiliência democrática e do poder das redes. Na semana derradeira, as mensagens pró-Haddad e uma militância determinada deram-lhe o gás que faltava. Não será uma vitória do PT. O partido, porém, cuidou de armar uma nova narrativa para si: sai o Lula perseguido pelo golpe, entra o “fascismo fraudulento” de Bolsonaro, impulsionado pelo pânico que impregnou a alma de muita gente.

José Augusto Guilhon Albuquerque: O povo é o eterno culpado

- O Estado de S.Paulo

O eleitor não determina o resultado da eleição, só reage a um cenário que lhe é imposto

O previsível resultado do segundo turno da eleição presidencial de 2018 tem sido atribuído, no Brasil e no exterior, a um crescimento avassalador do conservadorismo do eleitor brasileiro. Esse diagnóstico implica acusar o povo brasileiro de ser incapaz de votar racionalmente, e só se explica como efeito do que chamarei de vitimologia eleitoral.

Criada para traçar um perfil das vítimas como instrumento para explicar a motivação de um crime e o comportamento de criminosos, a técnica da vitimologia tem sido empregada na análise do comportamento político, quando se trata de explicar um resultado eleitoral inesperado: prendam-se os suspeitos de sempre.

Ora, não é razoável acusar o eleitorado pelo resultado das eleições, porque o voto não é uma escolha de livre-arbítrio do eleitor, mas, sim, uma opção limitada por uma agenda que lhe é imposta pelo sistema eleitoral, pelo sistema partidário que dele decorre e pelas cúpulas partidárias, pressionadas mais pelos interesses da classe dirigente do que pelo clamor popular. A liberdade política do cidadão brasileiro pode ser considerada uma liberdade condicionada.

O voto popular limita-se a responder a uma agenda compulsória, construída de cima para baixo, não é uma livre escolha. A pesquisa sobre comportamento eleitoral tem foco na descrição estatística, ou na interpretação “qualitativa” de variáveis presentes nas respostas dos eleitores, mas nada ensina sobre o processo político que criou o leque de escolhas que lhe são impostas. É como um experimento em que se consideram as respostas, ignorando inteiramente os estímulos que lhes deram origem.

João Domingos: Lições de 2018

- O Estado de S.Paulo

Direta ou indiretamente, o PT foi responsável pelo crescimento de Jair Bolsonaro

Cientistas políticos, sociólogos e outros estudiosos da situação brasileira indagam quais foram as razões que levaram o País a essa polarização extrema entre os apoiadores de dois candidatos antípodas. Situação que, mesmo com a eleição de amanhã, que escolherá um deles presidente da República, dificilmente acabará.

É possível que esses estudiosos venham a se concentrar sobre o tema por muito tempo. Pode ser que a resposta nunca seja encontrada. Ou que não exista apenas uma resposta, mas várias.

O que se pode dizer nesse momento é que o eleitor se cansou. De tudo. Do serviço público de pouca qualidade na saúde, educação, transporte, saneamento básico. Da insegurança que leva à mortandade dos mais pobres. Dos privilégios que integrantes de todos os poderes se dão, como verbas de gabinete para gastos quase ilimitados, auxílio moradia para juízes e parlamentares, mordomias.

O Brasil se cansou dessa vida de abusos quase que diários no que se refere ao ir e vir do cidadão. Ele sai de sua casa de madrugada, a duas horas do trabalho, quando tem trabalho, e corre o risco de encontrar a rua bloqueada por algumas pessoas que, também descontentes com alguma coisa, resolvem botar fogo em pneus e fazer o bloqueio da passagem por horas.

Adriana Fernandes: O perigo da transição

- O Estado de S.Paulo

Nas trocas de governos, a burocracia econômica não sofre mudanças significativas

O discurso do candidato Jair Bolsonaro (PSL) enviado a manifestantes na Avenida Paulista, no último domingo, com a promessa de “uma faxina muito mais ampla” caso assuma o governo foi interpretado pela elite do funcionalismo público como um risco de “caça às bruxas” que pode atingir servidores que já tiveram cargo com comissão nos governos do PT.

A promessa do candidato líder nas pesquisas azedou o clima entre os técnicos da área econômica e pode comprometer de antemão o diálogo na transição de governo que começa nesta segunda-feira. Também coloca em risco a gestão da economia nos primeiros meses de governo, justamente aqueles decisivos para o encaminhamento das reformas.

Seria um “tiro no pé” na transição que prometia – pelo menos até agora - ser mais tranquila do que a explosiva e desgastante campanha manchada pelas fake news e polarização ideológica.

Bolsonaro e sua equipe econômica, liderada pelo economista Paulo Guedes, vão precisar desse mesma elite da burocracia para o assessoramento técnico para o mais alto nível decisório. Inclusive para “escrever” os textos das propostas de mudança na legislação que serão enviadas ao Congresso, tarefa que precisa de robusto conhecimento técnico e experiência na gestão administrativa.

É bom lembrar que, entra governo e sai presidente, essa burocracia econômica – concentrada nas áreas de Orçamento, Tesouro, Receita e jurídica – não sofre mudanças significativas. Ocupou cargos com comissão nos governos não só do PT, mas de Temer e, alguns, até mesmo de FHC (PSDB).

Merval Pereira: Os mesmos eleitores

- O Globo

PT foi aos poucos sendo levado para o Nordeste, perdeu a classe média para o PSDB primeiro, e agora para Bolsonaro

O que poderia ser uma “onda vermelha” não se confirmou. Nenhum fato novo ocorreu ontem para reforçar essa possibilidade, e a média das pesquisas divulgadas mostra uma situação estável, indicando que o segundo turno está praticamente definido a favor de Bolsonaro.

É quase impossível que cerca de 15 milhões de pessoas mudem o voto de um dia para outro em favor de Haddad. Os resultados dos diversos institutos de pesquisa são diferentes, mas dentro das margens de erro. Apenas coma pesquisa de hoje, a terceirada série no segundo turno de Ibope e Datafolha, será possível dizer se a tendência de Bolsonaro é de queda e de Haddad é de alta, o que até agora não se confirmou tecnicamente. E qual a velocidade das mudanças.

O diretor do Datafolha, Mauro Paulino, explica que, para definir se houve uma variação fora da margem de erro, é preciso que os números se movam na proporção de 4 pontos percentuais, para mais ou para menos. Por isso, mesmo Haddad tendo crescido 3 pontos e Bolsonaro caído outros 3, teoricamente fora da margem de erro, que é de 2 pontos percentuais, ainda não há indicação de que houve uma alteração efetiva do quadro eleitoral.

Se analisarmos bem, o resultado é praticamente o mesmo em todas as pesquisas, algo em torno de 60% para Bolsonaro e 40% para o PT, pouco mais ou pouco menos. O interessante é que esses números são da mesma ordem de grandeza das vitórias que Lula teve em 2002 sobre Serra (61,27% a 38,72) e Alckmin em 2006 (60,83% contra 39,17%).

Míriam Leitão: As idas e vindas de Bolsonaro

- O Globo

Todo líder pode e deve mudar de ideia depois de ser convencido. Mas é desconcertante a lista de idas e vindas de Bolsonaro nesta campanha

Ao longo dos últimos meses, Jair Bolsonaro disse o maior volume de coisas estranhas já ouvidas numa campanha. Em agosto ele prometeu tirar o Brasil da ONU, porque a organização seria “uma reunião de comunistas”. Dias depois, alegou que foi um ato falho. Afirmou inúmeras vezes que se eleito o país sairia do Acordo de Paris argumentando que “o que está em jogo é a soberania nacional, porque são 136 milhões de hectares que perderemos ingerência”. Esta semana voltou atrás. Disse que vai levar a embaixada do Brasil para Jerusalém, e a diplomacia já foi avisada que haverá retaliações dos países árabes.

O que ele fará de fato caso seja eleito? Não se sabe. O Brasil está no pior dos mundos: o líder das pesquisas por impedimento físico, por esperteza política, por estratégia deliberada esconde o que pensa. Bolsonaro mandou seus assessores e seu candidato a vice ficarem no máximo de silêncio até depois das eleições. Ele está pedindo ao país que vote no desconhecido.

A lista do disse-desdisse é enorme, em qualquer assunto. Na área internacional, ele revela um desconhecimento constrangedor. O Brasil foi um dos países fundadores da ONU. Como deferência é sempre o primeiro país a falar a cada Assembleia Geral, desde o chanceler Oswaldo Aranha. Como ele pode ter achado em algum momento que a ONU é uma “reunião de comunistas”? O Acordo de Paris foi resultado de negociação exaustiva, longa, depois de 21 Conferências das Partes, COP, um esforço que nasceu na Rio-92. Deixar o acordo é escolher ficar fora do mundo, como lembrou o embaixador Rubens Ricupero. É preciso ignorar muita coisa, não ter visto o que aconteceu em duas décadas de negociações, para achar que o Acordo de Paris é uma conspiração internacional para tirar a soberania do Brasil sobre o seu território.

Roberto Abdenur: Riscos na política externa

- O Globo

As plataformas de política externa do PT/Haddad e de Bolsonaro acarretam riscos consideráveis aos interesses do Brasil. Ado PT começa com referência à crise financeira de 2008 — “crise do capitalismo” —e contém inverdades como a afirmação de que nos “países centrais” os governos “aprofundam os ataques contra os direitos políticos e sociais das classes trabalhadoras” e “aprofundam as agressões imperialistas contra a soberania nacional dos países economicamente mais frágeis ”.

O texto, erradamente, acusa o governo “golpista” de desconstruir a integração regional, desinvestir na vertente estratégica Sul-Sul, abandonara aposta num mundo multipolar e submetera política de defesa “aos interesses norteamericanos”. O atual governo tomou posição correta ao suspender o regime venezuelano ditatorial do Mercosul. Só fez trabalhar pela integração regional ao estimular aproximação do Mercosul coma Aliançado Pacífico. E prestigiou os mecanismos Sul-Sul, como o Brics.

Surpreendentemente, o texto define como “risco” a celebração de acordos de nova geração com países desenvolvidos. Isso justamente quando o Mercosul busca, após atraso de quase 20 anos, concluir acordo delivre comércio coma União Europeia—passo importantíssimo. O problema é que o PT incorpora uma visão negativa das relações com o mundo desenvolvido. Aparecem repetidas referências à “hegemonia norte-americana”. Expressa um tolo antiamericanismo.

No caso de Bolsonaro, praticamente não há plataforma de política externa como tal. O que há são esparsas referências, aqui e acolá, a temas internacionais. Bolsonaro repudia o que chama de escolhas “ideológicas” do PT — mas também ele parece guiar-se por um pensamento ideológico, só que oposto ao do PT. O candidato parece disposto a alinhar o Brasil com os EUA. Expressa admiração por Trump, de quem deseja aproximar-se. Mas ele precisa ter em mente que Trump já identificou o Brasil como alvo para futuras pressões em comércio e investimentos. E deve evitar o risco de colocar-se em posição subalterna perante Trump, o que seria vergonhoso.

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Roberto Abdenur é embaixador aposentado e foi secretário-geral do Itamaraty

Demétrio Magnoli: Um crime chamado linguagem

- Folha de S. Paulo

Trump e Bolsonaro têm responsabilidade política pelas centelhas de violência

"Inimigos do povo". Na Casa Branca, ao longo de 20 meses, Trump dirigiu essa acusação aos democratas e à imprensa. Dias atrás, pacotes com explosivos foram endereçados a Obama, Hillary, Soros e à CNN.

"Sem mentiras, sem fake news, sem Folha de S. Paulo. Nós ganharemos esta guerra". Na Paulista, domingo (21), Bolsonaro declarou sua "guerra" à imprensa. Nas horas seguintes, a jornalista Patrícia Campos Mello tornou-se alvo de uma enxurrada coordenada de ofensas, calúnias e ameaças de morte. A linguagem tem consequências.

Os ensaios de atentados nos EUA originaram-se, tudo indica, de grupos ultranacionalistas de extrema direita. Obviamente, Trump não tem responsabilidade organizacional na operação terrorista. Raul Jungmann avisou que "não existe anonimato na internet": cabe à polícia descobrir se há relações orgânicas entre os autores das mensagens criminosas a Patrícia e o QG de campanha bolsonarista. Mas Trump e Bolsonaro têm responsabilidade política pelas centelhas de violência. Os dois, de modos similares, violam a sintaxe da democracia.

Os nazistas usavam a palavra "ratos" para se referir aos judeus. Na Ruanda genocida, o regime hutu utilizava "baratas" para os tutsis. "Gusanos" (vermes, larvas) é o termo de escolha do castrismo para insultar dissidentes políticos. Num degrau abaixo, encontram-se "inimigo do povo", expressão de longa história, cara tanto a Trump como ao PT, e "inimigo da pátria", preferida por regimes autoritários nacionalistas e pelo bolsonarismo.

Hélio Schwartsman: Redução de danos

- Folha de S. Paulo

É mais provável que Bolsonaro se revele um populista medíocre do que um gênio do mal

Li, nos últimos dias, várias referências à ascensão de Hitler ao poder na Alemanha dos anos 30, que foi aceita de forma mais ou menos passiva pelas elites políticas e intelectuais do país. Não é impossível que Bolsonaro repita os passos do ditador alemão e nos conduza ao totalitarismo e à barbárie, mas também não me parece que isso seja provável.

Não podemos perder de vista o chamado espaço amostral. O mundo já produziu várias dezenas de líderes populistas e apenas um Hitler. É mais provável que o capitão reformado se revele mais um populista medíocre do que um gênio do mal.

Julianna Sofia: Cinco quilômetros

- Folha de S. Paulo

Reduzir Esplanada a 15 ministérios deve ser primeira promessa que Bolsonaro descumprirá

A partir da próxima semana e pelos dois meses que se seguirão, o centro de decisões em Brasília se deslocará da Praça dos Três Poderes para um QG no CCBB da capital. De lá, sairão os nomes do gabinete ministerial de Jair Bolsonaro, se confirmado o favoritismo do candidato do PSL à Presidência da República neste domingo (28).

A expectativa é que o ministério bolsonarista seja anunciado num prazo de 30 dias. A promessa do deputado de lipoaspirar a Esplanada dos Ministérios, reduzindo suas medidas de 29 para 15 pastas, será a primeira sujeita a descumprimento. A ideia do “Superministério da Fazenda”, com Planejamento mais Indústria e Comércio sob sua tutela, foi abatida sem grande esforço pelo lobby empresarial. De tão estapafúrdia, a fusão de Agricultura com Meio Ambiente tende a virar pó.

O capitão reformado crava publicamente até agora só três nomes. Onyx Lorenzoni (Casa Civil), general Augusto Heleno (Defesa) e Paulo Guedes (Fazenda). O jogo também está acertado para que Ilan Goldfajn permaneça no comando do Banco Central. Na nova gestão, conquistaria de direito a autonomia que hoje tem de fato.

Ricardo Noblat: O dia que só mal começou

- Blog do Noblat | Veja

A toga repressora

A sexta-feira 26 de outubro de 2018 poderá passar à história como o dia em que o Brasil, escandalizado, descobriu que a Justiça criara uma nova arma de repressão à liberdade – a Polícia do Pensamento Acadêmico (PPA).

A nova sigla poderá juntar-se a outras de triste memória – entre elas, DIP (Departamento de Imprensa e Propaganda), SNI (Serviço Nacional de Informações) e DOPS (Delegacia de Ordem Política e Social).

Sem falar de siglas horrendas e criminosas como DOI-CODI (Destacamento de Operações de Informação – Centro de Operações de Defesa Interna) e CENIMAR (Centro de Informações da Marinha).

Entre quinta-feira e ontem, a polícia bateu às portas das universidades e não foi para estudar. Mais de 40 delas foram alvo de operações da Justiça Eleitoral e da Polícia a pretexto de impedir atos políticos a favor de candidatos.

Desde o fim da ditadura militar de 64 nada de parecido jamais se vira. Na Universidade Federal da Paraíba, por exemplo, foi apreendida uma faixa onde estava escrito simplesmente: “Mais livros, menos armas”.

O prédio da Faculdade de Direito da Universidade Federal Fluminense (UFF) amanheceu com uma faixa em que se lia “Censurado”. Ali, até a véspera, havia uma bandeira com as inscrições “Direito UFF” e “Antifascista”.

A bandeira havia sido retirada a mando do Tribunal Regional Eleitoral (TRE) do Rio de Janeiro que ameaçara prender o reitor se sua ordem fosse desrespeitada. Estudantes protestaram diante do prédio do tribunal.

“Não é permitida a propaganda eleitoral partidária em bens de uso comum”, disse o tribunal em nota. Por que, diabos, uma bandeira contra o fascismo, sem alusão a candidato algum, pode ser considerada propaganda?

“A Justiça está consagrando o entendimento de que há uma candidatura fascista e de que quem é contra o fascismo está praticando algum tipo de desobediência”, comentou Wilson Machado, diretor da faculdade.

Uma nota oficial da Universidade Federal de São João Del-Rei “a favor dos princípios democráticos” foi proibida pela Justiça Eleitoral de Minas Gerais. Ela também não mencionava nomes de candidatos.

Tão absurdo quanto essas coisas foi a notificação pelo Tribunal Regional Eleitoral de Pernambuco ao bispo auxiliar de Olinda e Recife, dom Limacêdo, para que não falasse de política em missas que celebre hoje ou amanhã.

Há exatos 50 anos, a casa de dom Hélder Câmara, então arcebispo de Olinda e Recife, foi metralhada e pichada com os dizeres “Comando de Caça aos Comunistas”. Por nove anos, a imprensa não pôde falar sobre dom Hélder.

Quem a Justiça Eleitoral pretendeu beneficiar com suas incursões policiais às universidades? Onde está escrito que o debate político foi interditado dentro das universidades e fora delas, antes ou depois de eleições?

Um Juiz de Petrópolis, Rio de Janeiro, mandou apreender a lista de estudantes inscritos para participar naquela cidade de um congresso sobre Direito. Por que ele quis conhecer os nomes dos inscritos? Para fazer o quê depois?

STF e TSE reagem a proibição de atos políticos em universidades

Toffoli e Rosa Weber criticam operações realizadas por ordem de juízes eleitorais em 20 universidades

Os presidentes do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Rosa Weber, reagiram a possíveis abusos, como desrespeito à autonomia universitária, cometidos durante operações ordenadas por juízes eleitorais em 20 universidades de 12 estados. Eles condenaram a proibição de atos políticos nas universidades, em operações que se baseavam em alegações de que estaria sendo praticada propaganda eleitoral ilegal. Os ministros Luís Roberto Barroso, Marco Aurélio Mello e Gilmar Mendes também se pronunciaram em defesa da liberdade. A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, pediu ontem à noite ao STF uma liminar para restabelecer as liberdades de expressão, reunião e cátedra nas universidades públicas.

GARANTIA DE LIBERDADE

TSE e STF reagem a ações de TREs em universidades

André de Souza, Carolina Brígido e Mateus Coutinho | O Globo

Ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e Tribunal Superior Eleitoral (TSE) reagiram ontem contra o que apontaram como abusos que podem ter ocorrido em ações policiais e de fiscalização da Justiça Eleitoral realizadas nos últimos dias em 20 universidades em todo o país a partir de decisões de juízes eleitorais. Em 12 estados, juízes de primeira instância determinaram a apreensão de materiais e proibiram manifestações consideradas políticas. Os presidentes do STF, Dias Toffoli, e do TSE, Rosa Weber, condenaram a interferência nas universidades.

Estudantes fazem protesto no TRE do Rio

Presidente da Corte diz não poder interferir em decisões de juízes de 1º grau, mas que fiscais têm atuado ‘de forma democrática’

Helena Borges e Lucas Altino | O Globo

Estudantes das universidades públicas do Rio se reuniram ontem em frente ao prédio do Tribunal Regional Eleitoral (TRE-RJ) num ato de protesto. Uma comissão de seis estudantes, além do diretor da Faculdade de Direito da Uerj, Ricardo Lodi, foi recebida pelo presidente do tribunal, desembargador Carlos Eduardo da Fonseca Passos. Os estudantes reclamaram do que consideraram excessos da Justiça Eleitoral. A eles, Fonseca Passos disse que não poderia interferir nas decisões de juízes de primeiro grau. O presidente do TRE-RJ orientou os que se sentiram ofendidos ou afrontados a recorrer à Justiça. Membro da Federação Nacional dos Estudantes de Direito, Felipe Cesar Santiago disse que os universitários querem ser o “símbolo do diálogo”.

—A reunião foi importante para mostrar que houve doses cavalares ditatoriais nas ações dos TREs. 

Atos que compõem um grande contexto de arbitrariedade. Foram pontuais, mas conversam entre si. Depois do encontro, os estudantes saíram em passeata por ruas do Centro do Rio, com faixas e cartazes em defesa da liberdade de expressão nas universidades. Os alunos argumentam que as ações de fiscais tiveram como alvo manifestações que não tinham cunho eleitoral, o que é proibido em repartições públicas.

Polícia faz ação em faculdades; ministros do STF reagem

Presidentes do TSE e do STF defendem autonomia das instituições; procuradora-geral, Raquel Dodge, pede providências ao Supremo

Rafael Moraes Moura Amanda Pupo / O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Universidades públicas foram alvo de ações da Justiça Eleitoral e da polícia para coibir eventual propaganda eleitoral. Decisões judiciais proibiram atos e colocação de faixas. Os presidentes do STF, Dias Toffoli, e do TSE, Rosa Weber, defenderam a liberdade de expressão. A procuradora-geral, Raquel Dodge, pediu providências ao Supremo.

Nos últimos dias, universidades públicas em diversos Estados foram alvo de ações da Justiça Eleitoral e da polícia para fiscalizar e coibir eventual propaganda eleitoral. Decisões judiciais com base na “lei das eleições” proibiram a realização de atos e a colocação de faixas nessas instituições. As operações foram criticadas por ministros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e do Supremo Tribunal Federal (STF) e levaram a Procuradoria-Geral da República (PGR) a entrar com ação no STF para garantir a liberdade de expressão nas universidades.

A presidente do TSE, ministra Rosa Weber, disse ontem que a Corregedoria-Geral da Justiça Eleitoral vai apurar se houve eventuais excessos nas operações. Ela lembrou que a legislação eleitoral veda a realização de propaganda em universidades públicas e particulares, mas ressalvou que a proibição é dirigida somente à propaganda eleitoral, não alcançando a liberdade de manifestação e de expressão, “preceitos tão caros à democracia, assegurados pela Constituição”.

Em nota, o presidente do STF, ministro Dias Toffoli, defendeu a autonomia e a independência das universidades, “bem como o livre exercício do pensar, da expressão e da manifestação pacífica”.

Integrante do STF e do TSE, o ministro Edson Fachin disse ao Estado que o debate de ideais e de visões de mundo, como as críticas ao fascismo estampadas em faixas em algumas das universidades, “está dentro de um intocável ambiente de liberdade de expressão, de pensamento, não só dentro das universidades públicas, como da sociedade de modo geral”.

PGR vai entrar com ação no STF para garantir liberdade de expressão em universidades

Para a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, há indícios de que houve ofensa à liberdade de expressão em decisões judiciais que proibiram atos em instituições

Rafael Moraes Moura e Amanda Pupo, O Estado de S.Paulo

BRASÍLIA - A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, afirmou nesta sexta-feira, 26, que vai entrar com uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) para garantir a liberdade de expressão em universidades e assegurar a plena vigência da Constituição, após decisões da Justiça Eleitoral proibirem a realização de atos em instituições públicas. Foram ao menos 17 intervenções em nove Estados, alvos de críticas de ministros do STF e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) ouvidos pelo Broadcast Político nesta sexta-feira.

“Por verificar que no curso de várias medidas noticiadas pela imprensa, houve indícios claros de que houve ofensa à liberdade de expressão, à liberdade de reunião e de cátedra, e sobretudo à discussão no ambiente universitário, estou requerendo ao STF providências de assegurar a plena vigência da Constituição, no País e sobretudo nesse momento de eleições, com pedido de medida liminar para restabelecer a liberdade de expressão, de reunião, a liberdade de cátedra”, disse a procuradora-geral da República, na abertura da sessão plenária do TSE desta sexta-feira.

Universidades de todo o país são alvo de ações policiais e da Justiça Eleitoral

Entidades e comunidade acadêmica repudiam operações, que aconteceram em diversos estados

- Folha de S. Paulo

SÃO PAULO E RIO DE JANEIRO - Policiais e fiscais de tribunais eleitorais desencadearam uma série de ações em universidades públicas por todo o país que despertaram reação da comunidade acadêmica e de entidades da sociedade civil.

As medidas, na maior parte delas relacionadas à fiscalização de suposta propaganda eleitoral irregular, vêm acontecendo nos últimos três dias. Críticos das operações apontam censura.

No Rio de Janeiro, por exemplo, a Justiça ordenou que a Faculdade de Direito da UFF (Universidade Federal Fluminense) retirasse da fachada uma bandeira em que aparece a mensagem "Direito UFF Antifascista". A bandeira chegou a ser removida na terça-feira (23) sem que houvesse mandado judicial, mas logo depois foi recolocada por alunos.

A decisão judicial, proferida após 12 denúncias recebidas contra a faixa, diz que ela teria "conteúdo de propaganda eleitoral negativa contra o candidato à Presidência da República Jair Bolsonaro [PSL]". No lugar da antiga bandeira, apareceu uma nova com a palavra "censurado" no prédio. Os estudantes, que negam ter feito propaganda político-partidária, organizam uma manifestação para esta sexta (26).

Na Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro), também houve ação de policiais militares para a retirada de faixas: uma em homenagem à vereadora Marielle Franco (PSOL), assassinada emmarço, e outra em que estava escrito "Direito Uerj Antifascismo". Segundo a universidade, não havia mandado judicial para a remoção, e as bandeiras continuam na entrada do campus Maracanã.

Também houve relatos de ações na Unirio.

Em nota, a seção do Rio da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) manifestou "repúdio" a "decisões da Justiça Eleitoral que tentam censurar a liberdade de expressão de estudantes e professores das faculdades de direito". A entidade afirma ainda que "a manifestação livre, não alinhada a candidatos e partidos, não pode ser confundida com propaganda eleitoral".

A liberdade de informação: Editorial | O Estado de S. Paulo

Tem havido, nos últimos anos, um grande debate sobre os efeitos políticos e sociais da difusão, por meio das redes sociais, das fake news. A discussão ganhou intensidade com a eleição do presidente Donald Trump, em novembro de 2016. No caso, as atenções estiveram voltadas para o Facebook, o que depois levaria a empresa a alterar o modo como apresenta os diferentes conteúdos na timeline de cada usuário.

No Brasil, as fake news não são propriamente uma novidade. Nas campanhas eleitorais, sempre houve a difusão de notícias falsas. Por exemplo, em várias eleições presidenciais, o PT afirmou que, caso o PSDB saísse vencedor das urnas, o candidato tucano iria acabar com o programa Bolsa Família. Nesta eleição, a questão das fake news voltou à tona, com discussões voltadas mais especificamente para o compartilhamento de notícias por meio do aplicativo WhatsApp.

Antes do início da campanha eleitoral, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) prometeu uma rigorosa ação contra as fake news, com a instalação de grupos de trabalho e comitês para o tema. Em junho, o então presidente do TSE, ministro Luiz Fux, tranquilizou a população dizendo que a Justiça eleitoral iria “remover imediatamente” notícias falsas que se espalhassem pelo País e fossem abusivas. Também foi anunciado que dez partidos políticos haviam se comprometido com a manutenção de um ambiente eleitoral “imune de disseminação de notícias falsas” e que Google e Facebook haviam se prontificado a tirar do ar conteúdos falsos a partir de notificação do TSE. Em agosto, o ministro Fux chegou a afirmar que, em razão da atuação do TSE, “falar que pode haver fake news já é uma fake news”.

Pergunta no posto: Editorial | Folha de S. Paulo

Fuga de Bolsonaro de debates leva à falta de clareza sobre propostas

À parte o truísmo de que faltou debate de propostas e planos na campanha eleitoral, é manifesta a carência de discussão (e consenso) até no círculo do candidato que lidera os índices de intenção de voto. No tema energia, a plataforma de Jair Bolsonaro (PSL) comporta tanta algaravia que melhor se descreveria como incongruente.

O postulante é contra ou a favor de privatizar partes importantes da Eletrobras e da Petrobras? Deseja manter a atual política de preços para combustíveis? Planeja construir grandes reservatórios hidrelétricos na Amazônia ou dará preferência a usinas a fio d’água? Não se sabe ao certo.

Uma das razões para esse déficit de clareza reside na fuga de Bolsonaro de debates em que pudesse ser questionado sobre pontos nebulosos de seu programa.

A ala ultraliberal de economistas liderada por Paulo Guedes conta com a venda de estatais para tapar o buraco nas contas públicas.

O engenheiro Luciano de Castro, que coordena o plano do PSL na área energética, fala em “dar uma guinada de 180º com relação aos governos do PT”, com descentralização e redução do papel do governo no setor elétrico.

Não há dúvida de que as políticas intervencionistas da presidente Dilma Rousseff (PT) colheram resultados desastrosos. Há que mudar de rumo, como de resto vinha buscando Michel Temer (MDB), mas falta o PSL explicitar qual rota pretende seguir.

Todos precisam trabalhar para a pacificação: Editorial | O Globo

Seja qual for o resultado das urnas amanhã, a atmosfera de conflito tem de ser logo dissipada

A oscilação para baixo do candidato Jair Bolsonaro em pesquisa Ibope recente foi confirmada anteontem pelo Datafolha, segundo o qual a diferença entre o candidato do PSL, líder na disputa presidencial, e Fernando Haddad (PT) caiu seis pontos.

Era de 18, no Datafolha de quinta-feira da semana passada (59% a 41%) e caiu para 12 na última quinta (56% a 44%).

Candidatos e respectivos estrategistas tratam de fazer seus diagnósticos, a fim de reforçar pontos fortes e eliminar ou minimizar os fracos, nas horas que restam para o voto final. As campanhas de Bolsonaro e Haddad já sinalizaram ter entendido o mal que faz a radicalização.

Uma, moderando a vociferação contra adversários e recuando em propostas delirantes em áreas como a do meio ambiente; a outra, com alterações no programa, como a retirada da proposta golpista da convocação de uma Constituinte exclusiva, algo que só se faz nas rupturas de regime. Ou aprova-se emenda constitucional, atendendo ao quorum especial de 60% nas duas Casas do Congresso, em votação em dois turno, ou nada feito.

Coral Edgard Moraes e Getúlio Cavalcanti - Por quem os Blocos Cantam

Joaquim Cardoso: Tarde no Recife

Tarde no Recife.
Da ponta Maurício o céu e a cidade.
Fachada verde do Café Máxime.
Cais do Abacaxi. Gameleiras.
Da torre do Telégrafo Ótico
A voz colorida das bandeiras anuncia
Que vapores entraram no horizonte.

Tanta gente apressada, tanta mulher bonita.
A tagarelice dos bondes e dos automóveis.
Um carreto gritando — alerta!
Algazarra, Seis horas. Os sinos.

Recife romântico dos crepúsculos das pontes.
Dos longos crepúsculos que assistiram à passagem
[dos fidalgos holandeses.
Que assistem agora ao mar, inerte das ruas tumultuosas,
Que assistirão mais tarde à passagem de aviões para as costas
[do Pacífico.
Recife romântico dos crepúsculos das pontes.
E da beleza católica do rio.