Deodato Rivera
Ex-jornalista, formado em Filosofia e pós-graduado em Ciência Política
DEU NA GAZETA MERCANTIL
Apesar de não ter sido eleito, Fernando Gabeira não "morreu na praia", já que sua campanha teve um significado político muito maior do que o mero resultado eleitoral.
Gabeira deu um exemplo, inédito no Brasil, de um novo paradigma político, ao conseguir tão expressiva votação frente a uma candidatura que praticou todas as tretas e mutretas tradicionais do carcomido paradigma político vigente. De fato, a campanha de Eduardo Paes:
1 - gastou cerca de R$ 50 milhões, ou mais, sem dizer donde vinham nem como se gastavam (Gabeira só gastou R$ 4 milhões, com origem e destino publicados diariamente na Internet);
2 - sujou profusamente a cidade com santinhos, panfletos, cartazes, posters, bandeiras de plástico, out-doors caríssimos etc. (Gabeira, por princípio, não sujou a cidade, como prometera);
3 - contratou e pagou um número enorme de "cabos eleitorais" e de comitês (Gabeira não teve comitês nem precisou pagar ninguém, pois contou com um voluntariado de milhares de cidadãos, principalmente jovens);
4 - beneficiou-se de métodos ilegais e repugnantes de propaganda negativa - crimes eleitorais constatados pela fiscalização do TRE -, com materiais, apócrifos ou não, cheios de mentiras, calúnias e injúrias, "demonizando" o adversário (Gabeira não ofendeu ninguém, como prometera, nem usou propaganda negativa);
5 - Beneficiou-se das "máquinas" federal, estadual, sindical-petista e "universal" (Gabeira não foi candidato de máquinas nem de maquinações de costas para a cidadania);
6 - muito provavelmente também beneficiou-se da "esperta" e vergonhosa manipulação do feriado pelo governador Sérgio Cabral, para afastar do Rio potenciais eleitores do adversário (Gabeira não teve "máquinas" e perdeu por apenas 55.000 votos num universo de 4,5 milhões de eleitores!);
7 - prometeu mundos e fundos - 83 promessas ao todo! -, mesmo sendo notório que a crise financeira mundial e a conseqüente recessão no Brasil afetaria o orçamento municipal nos próximos anos (Gabeira não fez promessas que não pudessem ser cumpridas);
8 - negociou no segundo turno alianças espúrias e fisiológicas com partidos que agora, com chocante voracidade, cobram suas "cotas" no governo: os cargos que lhes dêem acesso às verbas bilionárias das secretarias municipais e à formação ou manutenção dos nichos eleitorais que lhes garantam a sobrevivência política (Gabeira, se eleito, não lotearia o governo).
Desse modo, Gabeira demonstrou ser possível disputar uma eleição sem sujeira ecológica nem ética. Demonstrou também ser um grande equívoco dizer-se, por exemplo, que "a política é suja" (palavras da sexóloga Marta Suplicy, ao tentar justificar a propaganda caluniosa contra o prefeito Kassab). Ora, são exclusivamente os políticos sem ética que sujam a política - não todos os políticos -, como se viu no Rio.
Ex-jornalista, formado em Filosofia e pós-graduado em Ciência Política
DEU NA GAZETA MERCANTIL
Apesar de não ter sido eleito, Fernando Gabeira não "morreu na praia", já que sua campanha teve um significado político muito maior do que o mero resultado eleitoral.
Gabeira deu um exemplo, inédito no Brasil, de um novo paradigma político, ao conseguir tão expressiva votação frente a uma candidatura que praticou todas as tretas e mutretas tradicionais do carcomido paradigma político vigente. De fato, a campanha de Eduardo Paes:
1 - gastou cerca de R$ 50 milhões, ou mais, sem dizer donde vinham nem como se gastavam (Gabeira só gastou R$ 4 milhões, com origem e destino publicados diariamente na Internet);
2 - sujou profusamente a cidade com santinhos, panfletos, cartazes, posters, bandeiras de plástico, out-doors caríssimos etc. (Gabeira, por princípio, não sujou a cidade, como prometera);
3 - contratou e pagou um número enorme de "cabos eleitorais" e de comitês (Gabeira não teve comitês nem precisou pagar ninguém, pois contou com um voluntariado de milhares de cidadãos, principalmente jovens);
4 - beneficiou-se de métodos ilegais e repugnantes de propaganda negativa - crimes eleitorais constatados pela fiscalização do TRE -, com materiais, apócrifos ou não, cheios de mentiras, calúnias e injúrias, "demonizando" o adversário (Gabeira não ofendeu ninguém, como prometera, nem usou propaganda negativa);
5 - Beneficiou-se das "máquinas" federal, estadual, sindical-petista e "universal" (Gabeira não foi candidato de máquinas nem de maquinações de costas para a cidadania);
6 - muito provavelmente também beneficiou-se da "esperta" e vergonhosa manipulação do feriado pelo governador Sérgio Cabral, para afastar do Rio potenciais eleitores do adversário (Gabeira não teve "máquinas" e perdeu por apenas 55.000 votos num universo de 4,5 milhões de eleitores!);
7 - prometeu mundos e fundos - 83 promessas ao todo! -, mesmo sendo notório que a crise financeira mundial e a conseqüente recessão no Brasil afetaria o orçamento municipal nos próximos anos (Gabeira não fez promessas que não pudessem ser cumpridas);
8 - negociou no segundo turno alianças espúrias e fisiológicas com partidos que agora, com chocante voracidade, cobram suas "cotas" no governo: os cargos que lhes dêem acesso às verbas bilionárias das secretarias municipais e à formação ou manutenção dos nichos eleitorais que lhes garantam a sobrevivência política (Gabeira, se eleito, não lotearia o governo).
Desse modo, Gabeira demonstrou ser possível disputar uma eleição sem sujeira ecológica nem ética. Demonstrou também ser um grande equívoco dizer-se, por exemplo, que "a política é suja" (palavras da sexóloga Marta Suplicy, ao tentar justificar a propaganda caluniosa contra o prefeito Kassab). Ora, são exclusivamente os políticos sem ética que sujam a política - não todos os políticos -, como se viu no Rio.
A percepção de que a onda verde não morreu na praia foi bem descrita pelo jornalista Augusto Nunes, no Jornal do Brasil de 29 de outubro:
"Faltou platéia para comemorar a vitória de quem será prefeito. O povo festejou nas ruas o desempenho de quem por pouco não foi. No restante do País ninguém se interessou pela sorte de Paes, ninguém viu algo de novo no que dizia. Em contrapartida, distribuídos por todos os estados, milhões de brasileiros juntaram-se à distância ao bom combate. Os 1.640.970 do Rio de Janeiro transformaram o que parecia apenas uma onda num genuíno movimento popular. O movimento já exibe dimensões impressionantes. E só começou."
De fato, a onda verde do Rio está virando um tsunami. Um "tsunami do bem". Um tsunami que, em vez de afogar pessoas, vai afagar um velho sonho cívico que não quer morrer, e em vez de destruir vai ajudar-nos a construir uma sociedade finalmente livre da "banda podre" que enxovalha a nossa política. É essa "banda podre" que joga na mesma lama, aos olhos de boa parte da cidadania, todos os políticos deste país, inclusive os dignos e íntegros...
Por tudo isso a eleição de 26 de outubro de 2008 no Rio será conhecida como o marco inicial de uma grande mobilização cidadã, com um novo espírito cívico, uma nova vontade política extremamente poderosa e transformadora.
Inspirada no exemplo da campanha de Gabeira, essa vontade cidadã será exercida estritamente dentro dos parâmetros legais e no respeito dos princípios e valores humanos superiores, democráticos e republicanos. Ela será participativa, organizada e responsável, sem ódio nem complacência, com alegria e respeito, criatividade, competência e transparência.
Essa vontade lúcida, que não se confunde com voluntarismo, caracterizar-se-á pela aprendizagem da participação e da ação democráticas por parte de cidadãs e cidadãos comuns articulados em rede - não dirigidos nem manipulados verticalmente por "caciques" de estruturas de poder-dominação. Será a aprendizagem do poder-serviço e da cidadania, engajada mas sem fanatismo nem ódio-atividade. Essas habilidades são indispensáveis ao exercício pleno e perseverante, não espasmódico, de dois poderes democráticos fundamentais, porém pouquíssimo ou nada usados no Brasil: o poder fiscalizador e o poder inspirador da cidadania.
Todos os que nos sentirmos convocados e capazes podemos e devemos exercer esses poderes - e não somente, a cada dois anos, simplesmente o poder e o direito de votar! -, a fim de que um dia o nosso atual modo arcaico de fazer política seja substituído por um modo limpo, decente e transparente, que inspire e mereça o respeito e a confiança da população.
Sem essa vigilância lúcida e permanente da cidadania, nos termos da lei, a democracia torna-se capenga, a política uma farsa, e as eleições, em muitos casos, uma gazua para o assalto aos cofres públicos em defesa de interesses escusos e de ambições pessoais doentias e muitas vezes funestas.
Trazer isso à luz do dia foi o serviço prestado à nossa democracia por Fernando Gabeira e pelos que lhe deram o seu voto. Sua vitória consiste em ter inspirado e orientado a onda que não morreu na praia.
Essa onda amplia-se agora com a missão que uma parte significativa do eleitorado do Rio lhe conferiu simbolicamente, e que Gabeira compreendeu e aceitou: assumir a liderança do movimento popular de tipo novo em gestação, que por certo não se restringirá ao Rio de Janeiro, para a regeneração do nosso arcaico e carcomido modo de fazer política e disputar eleições.
Parodiando o slogan de Alberto Dines, criador do "Observatório da Imprensa": depois da façanha de Gabeira, nós nunca mais devemos olhar a política e as eleições do mesmo jeito...
kicker: "Fernando Gabeira demonstrou ser possível disputar uma eleição sem sujeira ecológica nem ética."