segunda-feira, 26 de abril de 2021

José Eduardo Faria* - A “sinalização do povo”

- O Estado de S. Paulo / Estado da Arte (revista de cultura, artes e ideias)

“Eu respeito as instituições, mas devo lealdade apenas a vocês, povo brasileiro”, disse o presidente da República na cidade de Itapira, em agosto de 2019. “Eu sou a Constituição”, afirmou em abril de 2020, em frente ao Palácio do Planalto, em Brasília. “A temperatura está subindo. O Brasil está no limite. O pessoal [sic] fala que eu devo tomar providência. Eu estou aguardando o povo dar uma sinalização, porque a fome, a miséria e o desemprego estão aí”, afiançou ele, na segunda quinzena de abril de 2021, também em Brasília.

Não é a linha de continuidade entre essas três afirmações, pronunciadas no período de um ano e oito meses, que chama atenção. É, isto sim, o enviesamento político e antidemocrático subjacente a elas. Afinal, respeitar as instituições não é concessão, como reitera Bolsonaro. É, também, uma obrigação prevista pela Constituição que ele solenemente jurou respeitar ao assumir o cargo. Além disso, a lealdade de que fala não tem de ser devida apenas ao “pessoal” (ou seja, a turma dos cercadinhos) ou ao “povo” (um conceito amorfo), mas à democracia, a suas instituições e suas regras. Como se não bastasse, ao personificar a Constituição, incorporando a normatividade desta em si próprio, como se suas opiniões a respeito do texto constitucional tivessem força de lei, o presidente erode a força normativa da Carta Magna, na qual se baseia o regime democrático. Por fim, quando diz que está esperando uma sinalização do “pessoal”, Bolsonaro se esquece de que, na democracia representativa, tal sinalização é dada formalmente em eleições livres e periódicas disputadas por candidatos devidamente registrados e homologados pela Justiça eleitoral.

Fernando Gabeira - As voltas que a vida dá

- O Globo

Bolsonaro investiu contra a vida liderando a maior política de destruição ambiental do Brasil moderno. E investiu de novo contra a vida negando a pandemia do coronavírus.

A vida começa agora a cobrar de forma combinada os crimes de Bolsonaro. Numa só semana, convergiram a Cúpula de Líderes sobre o Clima e a CPI da Covid, eventos que lembram a Bolsonaro que sua própria vida ficará para sempre marcada por seu desprezo à vida das florestas e dos bichos e pelo sacrifício humano envolto na tese da imunização de rebanho.

Por mais que psicólogos mergulhem no labirinto da mente de Bolsonaro, nenhuma explicação atenua o dado objetivo de tantas árvores derrubadas, tantos animais carbonizados, tantas pessoas mortas pelo coronavírus.

A economia explica apenas parcialmente. Bolsonaro acha que é preciso tirar todos os recursos da natureza, independentemente do rastro de destruição. Da mesma forma, ele acha que a economia precisa funcionar, independentemente das pessoas que o vírus consome.

A verdade é que Bolsonaro não se importa tanto com a economia, não estuda o tema e, ao se eleger, designou um ministro para responder a todas as perguntas, a quem chamou de Posto Ipiranga. O que move o presidente não chega a ser, portanto, nem uma teoria econômica, por mais grosseira e obsoleta que possa parecer.

Cristovam Buarque* - Os fora-fila

Todos os dias, milhões de brasileiros perdem horas preciosas em filas de ônibus, e reclamam corretamente dos oportunistas fura-fila. Poucos percebem os fora-fila: os que usam carros privados e os que não têm dinheiro nem vale-transporte. Há séculos, muitos brasileiros fazem fila para obter o que precisam, enquanto outros não têm direito nem mesmo de esperar em fila, por falta absoluta de dinheiro; enquanto outros não precisam se submeter a filas porque têm muito dinheiro.  

Por causa das ineficiências econômicas, a palavra “fila” caracteriza o dia a dia dos brasileiros, mas por causa da injustiça social não se percebe os que estão fora das filas, de um lado e outro da escala de rendas. Alguns porque não precisam se submeter a elas, graças a privilégios e dinheiro, outros porque não têm o direito de entrar nelas. No meio, imprensados, os da fila, ignorando os extremos. Nós nos acostumamos a ver com naturalidade os que não precisam e ainda mais os que não conseguem entrar nas filas, por tratá-los como invisíveis. 

No setor da saúde, nos indignamos com os que tentam furar a fila para tomar vacina, mas não percebemos a injustiça quando furam a fila ao usar dinheiro para o atendimento médico de um pediatra para o filho, de um dentista e de profissionais de todas as outras especialidades que não estão disponíveis no SUS, com a urgência necessária. Apesar do nome, o sistema nacional de saúde não é único: de um lado, tem o SUS com suas filas; e, do outro, o SEP - Sistema Exclusivo de Saúde - sem fila para os que podem pagar.

Ricardo Noblat - Governo lista crimes pelos quais será acusado na CPI da Covid

- Blog do Noblat / Veja

Faltou algum?

O governo Bolsonaro sabe muito bem o que fez (pouco) e o que não fez (muito) para combater a Covid-19 que em menos de quatro meses deste ano já matou mais pessoas no Brasil do que nos 12 meses do ano passado. Nas últimas 24 horas, foram mais 1.316 óbitos de um total de 390.797, e mais 32 mil casos de infectados de um total próximo dos 14 milhões e meio.

Justamente porque conhece seu macabro desempenho no enfrentamento da pandemia, foi fácil para o governo listar 23 crimes pelos quais será cobrado a partir da instalação, amanhã no Senado, da CPI da Covid. A lista foi repassada a 13 ministérios para que providenciem respostas convincentes às acusações que lhes serão feitas, ajudando-o assim a defender-se melhor.

 “O objetivo do governo é fazer com que a CPI não avance, mas os fatos são evidentes, gritantes”, diz o senador Humberto Costa (PT-PE). Seu colega Randolfe Rodrigues (Rede-AP), que teve a ideia de propor a criação da CPI, observa: “O único confronto que nos preocupa é com a pandemia e o vírus. Se o presidente tem consciência que fez a coisa certa não precisa temer”.

João Doria* - Vacina no braço e comida no prato

- Folha de S. Paulo

Ações ajudam a recuperar a confiança e retomar a união entre os brasileiros

Desde a redemocratização, nenhum período foi tão turbulento quanto o atual. Nos últimos oito anos, o Brasil enfrentou três grandes recessões, ficou mais pobre, mais frágil e mais vulnerável. Vivemos em um país estressado por ódios e ações sectárias, que conduzem à paralisia administrativa, impotência, atrasos e falta de soluções na gestão pública federal. Nesse ambiente contaminado, o que é preciso para encerrar a espiral de conflitos e erros e encontrar um caminho equilibrado e correto para o país?

Antes de qualquer outro passo, a prioridade é superar a pandemia. Mas, no Brasil, a postura negacionista do governo federal aprofundou divergências. Temos hoje uma clara separação entre os que defendem a saúde e a vida e os que propagam ilusões. Em São Paulo, a defesa da vida colocou empresários, trabalhadores, governo, universidades e sociedade civil na mesma mesa.

Marcus André Melo* - Por que o STF está na berlinda?

- Folha de S. Paulo

O momento em que mais precisamos da Corte, é quando ela enfrenta os maiores ataques

 “Por que eu vou ser o único presidente da Argentina a não ter a sua própria Corte?”

Foi assim que Carlos Menem (1930-2021) justificou sua iniciativa de criar uma maioria na Suprema Corte argentina. O caso ilustra um paradoxo já identificado na literatura: um Judiciário independente é difícil de emergir nos contextos em que se faz mais necessário; e fácil de se consolidar onde ele não importa.

Nas democracias maduras, como a Inglaterra, a Suprema Corte não importa muito. Tanto que uma só foi criada no país em 2009. Há um equilíbrio institucional robusto que dispensa não só sua existência mas também a adoção de uma constituição escrita.

Em regimes autoritários, as cortes importam pouco porque neles elas são facilmente manipuláveis. O efeito é não linear: elas importam muito nos casos intermediários. É nos casos de mudança de regime ou alternância de poder entre forças políticas díspares que o Judiciário adquire centralidade política. Nas democracias estabelecidas isso só ocorre em situações muito raras (EUA sob Trump). Estou tratando aqui de centralidade política; não protagonismo em questões morais e comportamentais.

Celso Rocha de Barros – Bolsonaro é ‘HNI(Presidente)’?

-Folha de S. Paulo

Quantos dos aliados de Bolsonaro nas polícias são gente como Adriano da Nóbrega?

O site de notícias The Intercept Brasil teve acesso a um relatório da Subsecretaria de Inteligência da Polícia Civil do Rio de Janeiro em que são apresentados os resultados da quebra de sigilo telefônico do miliciano Adriano da Nóbrega, chefe da milícia Escritório do Crime, acusada pelo assassinato da vereadora Marielle Franco.

No relatório, pessoas próximas a Adriano fazem referências a contatos com pessoas identificadas pelos investigadores como “Jair”, “O Cara da Casa de Vidro” e “HNI (PRESIDENTE)”, ocorridos logo após a morte do miliciano. Membros do Ministério Público ouvidos em off pelo Intercept suspeitam que se trata do presidente da República, Jair Bolsonaro.

A proximidade do presidente da República com o Adriano da Nóbrega é bem documentada. O miliciano foi homenageado por Jair Bolsonaro e por seu filho, o senador Flávio Bolsonaro, em várias ocasiões. A irmã e a mãe de Nóbrega eram funcionárias do gabinete do filho do presidente da República e são suspeitas de terem participado do esquema criminoso de repartição de verbas conhecido como “rachadinha”.

Ruy Castro - Nosso destino é a estupidez

- Folha de S. Paulo

Em 1964, o Brasil ficou impossível para Celso Furtado ---que os outros países, agradecidos, acolheram

Um mês e meio depois do golpe militar de 1º de abril de 1964, o economista Celso Furtado teve de deixar o Brasil. Seu nome estava na primeira leva de brasileiros com os direitos políticos e civis cassados. De uma lista aberta pelo presidente deposto João Goulart e pelo deputado Leonel Brizola, Celso era já o 26º. Entre os motivos para isto estavam sua passagem pela Cepal (Comissão Econômica para a América Latina), a criação e presidência da Sudene (Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste) e ter sido o primeiro ministro do Planejamento do país. No Brasil dos generais, o ex-pracinha Celso Furtado não podia ser deixado à solta. Estava com 43 anos.

Seu primeiro destino foi Santiago do Chile. Mas não passou muito tempo por lá. Tinha convites de três universidades americanas para lecionar economia: Harvard, Columbia e Yale. Escolheu Yale, onde ficou de setembro daquele ano a junho de 1965, e só saiu porque o governo brasileiro pressionou a congregação para não renovar seu contrato. Foi para Paris, contratado pela pós-graduação da Sorbonne, em ato assinado pelo presidente De Gaulle, para ensinar economia do desenvolvimento. Somente em 1968 teve 15 convites para ser paraninfo de turma.

Denis Lerrer Rosenfield* - Henry e a maldade

- O Estado de S. Paulo

A crueldade se esconde sob o manto de uma ‘família feliz’. O silêncio é aterrador!

O assassinato do menino Henry, de apenas 4 anos, em sua casa, provavelmente em seu quarto, perpetrado com toda a probabilidade por seu padrasto com a cumplicidade e participação de sua mãe, coloca-nos diante de uma face sombria da natureza humana. Não se trata de um crime qualquer, mas de um crime que foge dos parâmetros do que tendemos a considerar normal. Não há nada de banal aqui, uma vez que entra em cena um tipo de ação voltada para a maldade, tendo-a como guia.

Não estamos diante de uma ação má contraposta a uma ação boa, na medida em que pessoas que cometem tais atos se situam para além desta distinção moral. Sentimentos morais estão aqui completamente ausentes, não orientam tal tipo de comportamento. O que se pode dizer de uma mãe que mente e encobre o assassinato de seu filho? Ou de um padrasto (ou seja lá o que essa pessoa signifique) que tortura durante semanas essa criança até a explosão hemorrágica de seus órgãos internos? Pessoas que agem dessa maneira visam única e exclusivamente à destruição do outro.

Antonio Claudio Mariz de Oliveira* - Um missionário da advocacia e da cidadania

- O Estado de S. Paulo

Mário Sérgio Duarte Garcia foi um apóstolo da missão de postular em nome alheio

Mário Sérgio Duarte Garcia não ocupou nenhum cargo público a não ser o de secretário de Justiça do Estado de São Paulo, nos anos de 1987, 88 e 89. Tive a honra de suceder-lhe em 1990.

Serviu à sociedade paulista e brasileira advogando relevantíssimas causas em prol dos interesses nacionais sem exercer nenhuma função governamental. Poucos no Brasil, nessas condições, trabalharam como ele pelo bem comum.

Presidiu a Associação dos Advogados de São Paulo, a Ordem paulista e a federal e teve intensa atuação por sete décadas em numerosas entidades e instituições. Participou durante esse período de todas as empreitadas em prol da construção de um País livre e democrático.

Inicialmente, Mário Sérgio, com grande ardor, contribuiu decisivamente para o retorno ao Brasil dos que dele haviam sido obrigados a sair. A campanha pela anistia, primeiro como presidente da Associação e depois da Ordem, teve nele um dos seus mais importantes arautos. Mobilizou a advocacia para essa que seria uma conquista humanitária memorável.

Cristian Klein - Castro fora do páreo em 2022 torna-se cenário no Rio

- Valor Econômico

Para políticos, como presidente da Assembleia, governador pode concorrer a deputado ou ir para o TCE

A montagem de um palanque estadual do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) em seu próprio reduto, o Rio de Janeiro, para a eleição de 2022, tem encontrado dificuldades que esbarram na capacidade do governador em exercício Cláudio Castro (PSC) de se viabilizar eleitoralmente. Fontes consultadas pelo Valor afirmam que Castro, por não ter posição e imagem consolidadas, corre o risco de ficar sem os aliados mais desejados, aumentando a probabilidade de não concorrer à reeleição. Nas últimas semanas, uma pesquisa com o nome do ministro da Defesa, general Braga Netto, já havia circulado nos bastidores como alternativa no campo bolsonarista quando se levantou ainda a hipótese de que Castro concorra a deputado federal ou venha a preencher uma vaga de conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCE).

Potencial beneficiário desse cenário, pois assumiria o Palácio Guanabara, o presidente da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), André Ceciliano (PT), afirma que a vaga do conselheiro afastado por corrupção Aloysio Neves, a ser aberta no máximo até fevereiro, já está reservada para o deputado estadual Márcio Pacheco (PSC). Mas ressalta que o parlamentar “é um aliado” do governador, de quem Castro foi chefe de gabinete no início da carreira. “Vaga se constrói”, afirma. Ainda que não seja para essa, lembra o petista, outras vagas podem se abrir em breve, caso o Supremo Tribunal Federal (STF) autorize o pedido de aposentadoria antecipada de Neves, levando outros conselheiros afastados a demandar o mesmo benefício. Em 2017, cinco integrantes do TCE foram presos e afastados da função na operação Quinto do Ouro.

Bruno Carazza* - Às cegas

- Valor Econômico

Sem conhecer seus cidadãos, governo se perde na pandemia

A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) destinada a investigar ações e omissões do governo federal no enfrentamento da pandemia inicia seus trabalhos nesta semana e assim o espetáculo da política se arma, com a plateia, dividida, pronta para acompanhar cada lance com balde de pipoca e refrigerante.

Apurar responsabilidades diante da maior tragédia social da história brasileira recente, com quase 400 mil mortos até o momento, sem dúvida é necessário - e mais do que isso, é algo que se faz urgente há tempos. Mas apenas isto não basta.

Seguindo o roteiro de outras CPIs do passado, preparem o F5 de seus teclados para atualizar, em curtos espaços de tempo, as notícias em tempo real dos depoimentos, denúncias e manobras de ambos os lados da política buscando incriminar ou isentar o presidente da República pelo colapso na saúde.

Independentemente do veredito final da CPI - isso se ela vier a chegar a algum desfecho, visto que a maioria das investigações morre sem qualquer conclusão -, é muito provável que continuaremos sem discutir as causas estruturais de nosso fracasso e as lições que podemos extrair desta crise.

Alex Ribeiro - BC trava batalha para controlar expectativas

- Valor Econômico

Projeções de inflação do mercado superam a meta do ano que vem

As expectativas de inflação para 2022, principal alvo da política monetária, subiram a 3,6% na última semana, sofrendo o seu primeiro descolamento expressivo em relação à meta do ano, de 3,5%. Como o Banco Central deve reagir?

Aparentemente, não foi uma alta isolada das expectativas de inflação. Outros indicadores antecedentes sinalizam que, nos próximos dias e semanas, as projeções do mercado tendem a subir um pouco mais. A média das estimativas dos analistas privados já chegou a 3,64%, um indicador de que a distribuição das expectativas dos analistas pende para valores acima da mediana, de 3,6%.

A dinâmica também parece desfavorável. A mediana das expectativas dos analistas que atualizaram as suas projeções de inflação nos últimos cinco dias já se encontrava em 3,67%. Ou seja, quem renovou as suas estimativas mais recentemente já está prevendo inflação ainda maior para o ano que vem.

Malu Gaspar - Cortes no Orçamento podem render a Bolsonaro nova briga com o Congresso

- O Globo

tesourada que o Ministério da Economia deu no Orçamento de 2021 não encerra o impasse com o Congresso. Pelo contrário, deve criar novos focos de conflito. Ao cortar da peça orçamentária os R$ 29,8 bilhões necessários para reequilibrar os gastos do governo, Guedes mexeu num vespeiro.

Ao invés de tirar da previsão de gastos do governo apenas as despesas que haviam sido acrescentadas pelo relator, o senador Márcio Bittar (MDB-AC), a equipe do ministro Paulo Guedes mexeu em outras dotações orçamentárias que, até agora, não estavam em discussão. 

Do total de cortes, apenas um terço eram de Bittar. O resto foi retirado de outras verbas, dos quais R$ 3,2 bilhões de reais em outros tipos de emendas parlamentares. 

Desse total, R$ 1,8 bilhão ia atender às emendas de bancadas estaduais, definidas em conjunto por deputados e senadores. Os estados que mais sofreram reduções foram o Amazonas (R$ 216 milhões), Piauí (R$170 milhões) e Goiás (R$ 159 milhões), segundo levantamento do Instituto Nacional de Orçamento Público (Inop) a pedido da coluna. 

Miguel de Almeida - Sete tipos de bozofrenia

- O Globo

Tantas milhares de mortes depois, qualquer cidadão menos tapado se pergunta qual seria o Deus (ou deus) em que acredita o Bozo. O Malafaia, que ganha dinheiro nessa seara, e é seu conselheiro, ao deixar de ler o livro-caixa, ajoelhado no milho, teria a resposta?

John Gray, filósofo britânico, em seu estupendo “Sete tipos de ateísmo”, ajuda a matar a charada. Bozo pertence em carne e osso à categoria dos seres pré-adâmicos. Ainda na Renascença, Paracelso e depois Isaac La Peyrère extraíram do “Gênesis” a interpretação de que a Terra já era habitada por outros homens antes da chegada barulhenta de Adão. Como não eram criação divina, vieram destituídos de alma; daí sua falta de empatia com o destino das criaturas de Deus.

Taí. Como os neandertais, os pré-adâmicos continuam entre nós, miscigenados. Embora disfarce com o Messias no nome, Bozo, rematado (nasceu sem alma) representante da espécie, deu voz a seu exército saído das trevas.

Como existe um lulopetismo, há à mão a bozofrenia — hoje uma síntese de atraso, ignorância e falta de asseio mental, curiosamente mesclado a um autoritarismo cristão. Sem ser uma ideologia, não deixa de ser um sistema de ideias do contra, amarfanhadas para negar a expectativa de haver uma evolução humana.

Irapuã Santana - Uma boneca negra; um sorriso negro

- O Globo

Representatividade e inclusão importam. Esse precisa ser nosso ponto de partida em comum para iniciar um debate que, à primeira vista, parece desimportante, mas é, ao contrário, um planejamento de futuro da maior parcela da população brasileira: a mulher negra. Ela representa algo em torno de 27% de todos os brasileiros, segundo a PNAD do IBGE.

Entretanto o mercado não oferece o mínimo razoável de opções para um nicho das bonecas, que tem gerado bons dividendos para quem nele investe. Em 2018, a linha correspondia a 19,2% do total de faturamento, que chegou em 2019 a mais de R$ 7 bilhões, conforme o último relatório da Abrinq.

Com um cenário tão favorável, a lógica seria haver uma seção específica para bonecas negras, atendendo a esse mercado consumidor. Todavia elas correspondem a somente 6% da totalidade das fabricadas e 9% das comercializadas em lojas on-line, de acordo com a ONG Avante, que elaborou um relatório sobre essa triste realidade das meninas negras brasileiras.

Música | Milton Nascimento e Mercedes Sosa

 

Poesia | Bertolt Brecht - Elogio da Dialética

A injustiça passeia pelas ruas com passos seguros.

Os dominadores se estabelecem por dez mil anos.

Só a força os garante. Tudo ficará como está.

Nenhuma voz se levanta além da voz dos dominadores.

No mercado da exploração se diz em voz alta:

Agora acaba de começar!

E entre os oprimidos muitos dizem:

Não se realizará jamais o que queremos!

O que ainda vive não diga: jamais!

O seguro não. é seguro. Como está não ficará.

Quando os dominadores falarem

falarão também os dominados.

Quem se atreve a dizer: jamais?

De quem depende a continuação desse domínio?

De nós.

De quem depende a sua destruição? Igualmente de nós.

Os caídos que se levantem!

Os que estão perdidos que lutem!

Quem reconhece a situação como pode calar-se?

Os vencidos de agora serão os vencedores de amanhã

E o “hoje” nascerá do “jamais”

Irapuã Santana - Uma boneca negra; um sorriso negro

- O Globo

Representatividade e inclusão importam. Esse precisa ser nosso ponto de partida em comum para iniciar um debate que, à primeira vista, parece desimportante, mas é, ao contrário, um planejamento de futuro da maior parcela da população brasileira: a mulher negra. Ela representa algo em torno de 27% de todos os brasileiros, segundo a PNAD do IBGE.

Entretanto o mercado não oferece o mínimo razoável de opções para um nicho das bonecas, que tem gerado bons dividendos para quem nele investe. Em 2018, a linha correspondia a 19,2% do total de faturamento, que chegou em 2019 a mais de R$ 7 bilhões, conforme o último relatório da Abrinq.

Com um cenário tão favorável, a lógica seria haver uma seção específica para bonecas negras, atendendo a esse mercado consumidor. Todavia elas correspondem a somente 6% da totalidade das fabricadas e 9% das comercializadas em lojas on-line, de acordo com a ONG Avante, que elaborou um relatório sobre essa triste realidade das meninas negras brasileiras.