quarta-feira, 10 de janeiro de 2018

Opinião do dia: Geraldo Alckmin*

Rodrigo Maia tem razão quando fala que não tem como ter um candidato só porque é natural. O Brasil não é o modelo americano de dois partidos. Essa fragmentação partidária é enorme, uma jabuticaba brasileira. A multiplicidade partidária leva a múltiplas candidaturas.


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*Geraldo Alckmin é governador de S. Paulo e presidente nacional do PSDB. O Estado de S. Paulo, 10/1/2018.

Rosângela Bittar: Os estranhos

- Valor Econômico

Preconceituoso, partido cria facções por idade

Fernando Henrique Cardoso, ao seu estilo de uma dialética inconsequente, engraçada e contundente que sempre o caracterizou, tem sido o único traço de autenticidade do PSDB tal como fundado em 1988. Com sua verve e inteligência emprestados ao partido, que provoca e sacode, vai falando verdades, brincadeiras, alfinetadas aqui, carícias acolá, sem preocupação de desfazer em uma nota posterior a declaração anterior, para depois repor tudo com outras palavras em entrevista e artigo, e estamos conversados, até a próxima celeuma. Um método consagrado, depois de vivido às últimas consequências e retratado nos volumes já publicados de seu "Diário da Presidência". Com os quais, exatamente pelo estilo, transformou amigos queridos em magoados ex-colaboradores. Suas impressões sobre as pessoas, por escrito, causaram mais decepção que aconchego ao intelectual brilhante.

Portanto, o que Fernando Henrique Cardoso falou de Geraldo Alckmin, notadamente que o governador tem que demonstrar capacidade de erguer sua candidatura presidencial senão o PSDB deve partir para outro nome que viabilize o centro político, é uma opinião crua, direta, e óbvia, que já expressou sobre outros amigos, como José Serra, Aécio Neves, e tantos outros do seu círculo. O partido e o candidato não deveriam estranhar o seu presidente de honra, que para começar não deixa pergunta sem resposta. Mas estranharam a única coisa realmente autêntica no tucanato de hoje.

O que se deve estranhar são outras questões que fazem do PSDB um partido de estranhos. Aos 30 anos, a serem completados em julho, transformou-se em um pastiche do PMDB, de quem se separou para fundar uma agremiação política mais séria. Fora Fernando Henrique, nada mais é reconhecível na agremiação. A começar pela própria candidatura Geraldo Alckmin à Presidência da República.

Alckmin é um político paulista, do interior, que sempre lutou com enormes dificuldades para aceitar o Brasil e ser aceito por ele. Não é falta de amor, é falta de jeito.

Merval Pereira: Disputa de espaço

- O Globo

A disputa entre o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, e o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, para ver quem é o mais importante agregador político e, por consequência, candidato a presidente da República, é uma briga de cachorro grande que não é boa para o governo.

O erro deles é não perceber que um candidato do governo só tem chance se a economia melhorar, e se esta briga atrapalhar a aprovação de reformas, sobretudo a da Previdência, eles não irão a lugar nenhum. É por isso que o ministro da Fazenda não deveria deixar clara sua pretensão de vir a ser candidato, porque nessa divisão dificilmente haverá questão importante, ou mesmo votação, que não sofra interferência dessa disputa política dos dois.

A discussão sobre a tal “regra de ouro” do Orçamento é um exemplo dessa situação. A “regra” prevista na Constituição serve para evitar que o governo aumente sua dívida para pagar despesas correntes, como folha salarial e serviços de órgãos públicos.

O presidente da Câmara se sentiu “traído” quando Meirelles disse que era contra, puro e simplesmente, acabar com a “regra de ouro”, e suspendeu o debate que havia iniciado. “Não gosto desta proposta. (...) Queremos que a regra seja seguida, e não suspensa”, argumentou.

Vera Magalhães: Deixa rolar

- O Estado de S.Paulo

Por ora, o ensaio de emancipação do DEM não preocupa o quartel-general de Geraldo Alckmin. No PSDB, os arroubos presidenciais de Rodrigo Maia são vistos como uma tentativa legítima de os parceiros se posicionarem numa futura e provável aliança.

Aliados do governador paulista enfatizam que as relações entre as duas siglas nunca estiveram tão boas nos bastidores.

Alckmin esteve ontem em Brasília e tem estreitado laços com interlocutores democratas, como seu secretário Rodrigo Garcia, muito próximo do xará presidente da Câmara, e o ministro Mendonça Filho (Educação), vice dos sonhos do tucano.

Além disso, os tucanos veem uma utilidade prática na movimentação de Maia: ela serviria para colocar um obstáculo às investidas do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, este sim visto como alguém mais disposto a encarar uma candidatura alternativa à de Alckmin pelo chamado centro político.

Pelo lado do DEM, a ordem é continuar enfunando as velas da candidatura de Maia ao menos até o fim de fevereiro, quando ocorre a convenção partidária, que foi adiada ontem a pedido do próprio Maia.

O fôlego para que o partido insista no discurso da independência em relação aos tucanos vem do fato de Alckmin não ter decolado nas pesquisas, algo que motiva setores do mercado e partidos como PP e SD a colocarem pilha no deputado.

Maia deverá discursar como candidato na convenção. Justamente por isso pediu o adiamento: não quer que sua pretensão política atrapalhe a votação da reforma da Previdência, marcada para 19 de fevereiro.

Hélio Schwartsman: Bolsonaro e o sistema

- Folha de S. Paulo

O deputado federal Jair Bolsonaro recebe auxílio-moradia da Câmara sendo proprietário de um imóvel em Brasília e, junto com seus rebentos, acumulou um patrimônio imobiliário que enseja suspeitas.

Alguma surpresa aí? Há décadas no Parlamento, Bolsonaro só se distingue de seus colegas do chamado baixo clero por ser mais desbocado e por levantar bandeiras especialmente desenhadas para ferir as sensibilidades liberais. E, como o recurso a espertezas, jeitinhos e mamatas é moeda corrente entre políticos, o incomum seria se Bolsonaro não estivesse envolvido com essas coisas.

Elio Gaspari: A foto de Lula poderá estar na urna

- O Globo

Se isso acontecer, e ele for o mais votado, o Tribunal Superior Eleitoral e o STF poderão cassá-lo. Poderão?

Qualquer previsão para o resultado do julgamento de Lula no TRF-4, marcado para o próximo dia 24, será apenas um palpite. No entanto, quem conhece o assunto assegura que, pelo andar da carruagem, a fotografia de Lula estará na urna eletrônica em outubro. Isso poderá acontecer mesmo tomando-se o mais duro dos resultados, 3 a 0 pela condenação, acompanhando-se o voto do relator. Os recursos aos tribunais de Brasília postergarão o fim do processo, e Lula poderá ser votado, mesmo tendo sido condenado na segunda instância. Esse não é um palpite, é o frio diagnóstico de pessoa capacitada a fazê-lo.

Admitindo-se que Lula seja derrotado, o jogo termina. Se ele ganhar, continua, à espera do resultado de seus recursos, que terminarão no Supremo Tribunal Federal. Nesse caso, os 11 ministros do STF estarão diante de uma situação histórica: suspender o mandato de um cidadão que teve em torno de 50 milhões de votos e fez uma campanha apresentando-se como vítima.

Luiz Carlos Azedo: Espinhos do recesso

- Correio Braziliense

uma mudança trivial na composição do ministério tem todos os ingredientes de uma grande trapalhada, na qual o erro de conceito foi a escolha de nomes que não têm nada a ver com o mundo do trabalho

O que era para ser uma rosa nos jardins do presidente Michel Temer, cujo ministério tem uma carência crônica de integrantes do sexo feminino, perdoem-me os mestres Nélson Cavaquinho, Guilherme de Brito e Alcides Caminha pelo trocadilho, virou um tremendo espinho entre as flores do recesso. A eventual ministra do Trabalho, Cristiane Brasil (PTB-RJ), filha do presidente do PTB, Roberto Jefferson, foi duas vezes impedida de tomar posse pela Justiça Federal, em primeira e segunda instâncias, e corre o sério risco de ser mais uma vez impedida pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

Dois ex-motoristas contratados sem carteira assinada, uma condenação na Justiça trabalhista no valor de R$ 60 mil, uma funcionária laranja e um advogado carne de pescoço que resolveu fazer escândalo com o caso estão inviabilizando a posse da deputada fluminense, que também decidiu pagar pra ver e não pretende desistir do cargo. O que parecia ser uma mudança trivial na composição do ministério, desde a saída do antigo titular, Ronaldo Nogueira (PTB-RS), tem todos os ingredientes de uma grande trapalhada política, na qual o erro de conceito foi a escolha de nomes que não têm nada a ver com o mundo do trabalho.

Roberto DaMatta: A democracia como problema

- O Estado de S. Paulo

É um estilo de vida que afeta todos os espaços de nossas vidas. Ele produz tanto um Roosevelt e um Obama quanto a KKK e um Trump

Todo regime democrático tem problemas, e prova mais clara deste ponto é a crise presidencial da primeira democracia de massa do planeta, a americana. Qualquer investigação vai demonstrar que o regime democrático moderno não pode ser reduzido às suas dimensões econômicas, mas deve ser lido, como ensinou Marcel Mauss, como um “fato social total” — a democracia é um estilo de vida que afeta todos os espaços de nossas vidas. Ele produz tanto um Roosevelt e um Obama quanto a KKK e um Trump.

Motivada, como compreenderam Marx e Polanyi, pelo desejo desabrido (e legitimado como virtude e talento) de ganhos e empoderamentos infinitos, ofertados num mercado ou palco, a dinâmica democrática seria sempre sujeita a crises ou vista como burla.

Para tanto, basta lembrar que a democracia liberal é o único regime aberto à proposta de sua destituição, conforme vimos na Europa dos socialismos de esquerda e de direita. Tais desvios são o resultado de um paradoxo: a democracia liberal é o único regime explicitamente aberto à autocorreção.

Vinicius Torres Freire: Temer faz artes na política

- Folha de S. Paulo

Se a economia vai mal, mas dá sinais tênues de vida, o que dizer da política, que ameaça matar a recuperação no berço?

A mera nomeação da irrelevância que será um ministro qualquer do Trabalho do país sem emprego se tornou um show de ridículo, embora essa piada já seja velha.

O vexame da tentativa de mudar uma norma de endividamento do governo, a "regra de ouro", prenuncia coisa pior.

A ministra do Trabalho cai pelas tabelas antes de tomar posse. Substituiria um ministro que caiu antes de ser nomeado, não faz uma semana, por veto de José Sarney, fóssil vivo da desgraça maranhense e hiperinflacionária, de impopularidade insuperada até o advento de Michel Temer.

Os mortos-vivos governam até os muito vivos.

Míriam Leitão: Urgência da hora

- O Globo

A história fiscal do país foi quebrada em 2014 com a entrada na era dos déficits altos e crescentes. A série do Banco Central, iniciada em 1991, mostra que no período Dilma-Temer o país entrou numa anomalia tão grande que exige o uso de armas mais poderosas do que os pequenos pacotes de ajuste. Houve uma mudança na natureza da crise, é preciso muito mais ousadia para enfrentá-la.

Durante os 23 anos que vão de 1991 a 2013 o país teve superávit primário em 22 deles e um pequeno déficit de 0,25% do PIB em 1997. Nessa longa temporada de mais de duas décadas, o país incorporou na contabilidade parte da dívida que estava fora das estatísticas e assumiu os chamados esqueletos. Por isso a dívida aumentou inicialmente. Os superávits permitiram que ela ficasse estável e, depois, caísse. Nos últimos anos, entrou numa escalada que atingiu níveis perigosos. Este é o quinto ano de déficit. Estão projetados resultados negativos para os próximos dois. Serão, então, sete anos de vermelho nas contas. O gráfico abaixo ilustra a mudança radical que houve. Descontrole desse tamanho só aparece nas contas dos países atingidos pelas crises bancárias de 2008, como Espanha, Grécia, Islândia, Irlanda, Portugal. Aqui não houve crise bancária, apenas uma calamitosa administração econômica nos anos Dilma, cujos erros o atual governo não conseguiu reverter e, às vezes, repete.

Monica De Bolle: Fogo e Fúria

- O Estado de S.Paulo

As labaredas do nacionalismo econômico cativam as massas como, entre outros, no fascismo europeu dos anos 30

De pronto, devo confessar: passei o fim de semana lendo o explosivo livro de Michael Wolff, provavelmente o melhor livro de fofoca política que será publicado este ano sobre o governo Trump. Este artigo, entretanto, não é – exatamente – sobre o livro de Wolff, tampouco sobre o que revela ou deixa de revelar acerca da acuidade mental e do temperamento do ocupante da Casa Branca. O livro é, antes de tudo, o retrato do nacionalismo econômico defendido com fogo e fúria pelo defenestrado Steve Bannon, ex-estrategista de Trump, ex-conselheiro sênior da Casa Branca, ideólogo e articulador do Trumpismo que nem Trump sabe o que é.

A última semana foi marcada por dois eventos que, em tese, nada têm em comum: a publicação da obra de Wolff e as reuniões anuais da American Economic Association (ASSA 2018) – evento acadêmico que reúne desde aspirantes em busca de seu primeiro emprego universitário pós-PhD a vencedores do Nobel e outros renomados economistas.

Como não poderia deixar de ser, houve sessão dedicada aos movimentos “populistas” que pipocam mundo afora, tema que já abordei neste espaço. Economistas, cientistas políticos, sociólogos, e outros cientistas sociais não têm definição consensual sobre o populismo. De modo geral – e como visto na ASSA 2018 –, o mínimo denominador comum do populismo é que se trata de visão que contrapõe as massas à elite corrupta, cuja ideologia é desidratada, podendo, portanto, ser cooptada pela direita ou pela esquerda, e que funciona tanto em democracias quanto em regimes autoritários. Embora esses aspectos sejam aceitáveis como esboço para caracterizar o populismo, falta nessa delineação traço fundamental de qualquer movimento que se pretenda populista: o nacionalismo econômico.

Alckmin estimula mais de um candidato de centro em 2018

Tucano concorda com Rodrigo Maia e fala em união no segundo turno

Maria Lima / O Globo

-BRASÍLIA- O governador de São Paulo, presidente do PSDB e pré-candidato do partido a presidente, Geraldo Alckmin, disse concordar com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, que, em entrevista ao GLOBO, defendeu o lançamento de mais de uma candidatura de centro, afunilando alianças no segundo turno em torno de quem for mais viável eleitoralmente. Sobre uma eventual candidatura de Maia, o tucano disse que estimula a entrada de novas lideranças na política. Inclusive, defendeu a candidatura do apresentador Luciano Huck, aventado como um possível nome de centro, caso a escolha do PSDB não deslanche.

— O Rodrigo Maia tem toda razão quando diz que não tem de ser um candidato só de centro. Isso é natural. O Brasil não segue o modelo americano de apenas dois partidos. Há aqui uma fragmentação partidária enorme. Isso estimula ter uma multiplicidade de candidatos. E tem o segundo turno — disse Alckmin, lembrando que o Democratas é um aliado antigo do PSDB em São Paulo e em nível nacional.

Além de Rodrigo Maia, o governador disse que o prefeito de Salvador, ACM Neto, também tem grande potencial. E destacou que as alianças deverão ser pensadas com base em afinidades e propostas dos programas.

— Eu tenho um grande apreço pelo Democratas, foi sempre nosso parceiro em São Paulo, tem bons quadros, lideranças jovens importantes, o Rodrigo, o ACM Neto. Respeitamos profundamente o DEM. Vamos deixar as coisas caminharem, o curso natural vai ocorrer. O Brasil ganha com isso. Não devemos inibir novas lideranças. Eu estimulei o quanto pude a entrada do Luciano Huck. Temos que trazer novas lideranças, a política não pode ser um clube de má fama — declarou Alckmin.

O pré-candidato tucano avalia que o número de candidatos independe se o ex-presidente Lula será ou não inabilitado para levar adiante sua candidatura, por uma eventual condenação em segunda instância, no julgamento de recurso no caso do tríplex, no TRF-4, em Porto Alegre.

Cenário de incerteza

- O Globo

Falta um nome de unidade no centro

“Alckmin e Meirelles ainda não conseguiram se afirmar como nomes do centro que alcancem os eleitores. Portanto, quem unificar essa base, com os partidos do governo, vai ter muito espaço televisivo e uma forte estrutura de campanha. Isso pode transformar um nome como o de Rodrigo Maia em candidato. Ainda não é. Falta um nome para assumir o legado das reformas do governo. Maia deve testar a candidatura até abril ou maio. Isso porque o centro continua à procura de um nome de consenso.”

Paulo Baía, Cientista político e professor da UFRJ

Dura competição no mesmo campo

"Rodrigo Maia vai precisar enfrentar uma competição para se estabelecer como o candidato de centro, centro direita. Duas questões têm maior dificuldade: ele não enfrentou ainda para valer uma candidatura majoritária. Quando disputou a prefeitura do Rio, teve um desempenho pífio. Se trata de um candidato classicamente de Parlamento, como ele mesmo diz na entrevista. É mais discreto. Mas, com a visibilidade que ganhou na Câmara, pode sonhar com voos mais altos. Mas será difícil para ele, com a estrutura do DEM, se opor ou angariar apoio de partidos como o PSDB e o próprio PMDB. Se houver uma aprovação da reforma, ele poderia ficar fortalecido.”

Ricardo Ismael, Professor do Departamento de Ciências Sociais da PUC-Rio

Alckmin elogia DEM e admite ‘múltiplas’ chapas

Governador diz ter ‘apreço’ por sigla de Maia; tucano vai anunciar coordenador de área econômica da campanha na próxima semana

Renan Truffi / O Estado de S. Paulo.

BRASÍLIA - Pré-candidato do PSDB para a Presidência, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, admitiu ontem a possibilidade de “múltiplas candidaturas” ao Palácio do Planalto, enquanto busca se firmar como o nome de centro na disputa eleitoral deste ano. Em Brasília para agenda partidária, ele elogiou o DEM, legenda do presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (RJ), e disse que vai anunciar seu coordenador econômico de campanha na próxima semana.

Para se firmar como o candidato de centro, Alckmin falou em união e lançou seu mote: emprego e renda. O Estado apurou que entre os colaboradores estão os economistas Persio Arida, Roberto Giannetti e Yoshiaki Nakano.

O deputado fluminense e o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles (PSD), já se movimentam para a sucessão do presidente Michel Temer. “Rodrigo Maia tem razão quando fala que não tem como ter um candidato só porque é natural. O Brasil não é o modelo americano de dois partidos. Essa fragmentação partidária é enorme, uma jabuticaba brasileira. A multiplicidade partidária leva a múltiplas candidaturas”, afirmou o governador e também presidente nacional do PSDB.

Apesar da corrida entre os três nomes pelo Planalto, Alckmin adotou discurso conciliador. “Isso (definição de candidaturas) é um processo que está no começo, os argumentos da eleição não foram nem colocados. É preciso controlar o estresse. Essas coisas são definidas mais à frente”, disse, antes de acenar ao DEM: “Eu tenho um grande apreço pelo Democratas, que foi sempre nosso parceiro em São Paulo, tem bons quadros, lideranças jovens importantes, o Rodrigo, o ACM Neto (prefeito de Salvador). Respeitamos profundamente o DEM.”

Alckmin quer anunciar Pérsio Arida para coordenar equipe econômica

Talita Fernandes, Bruno Boghossian /Folha de S. Paulo

BRASÍLIA, SÃO PAULO - Favorito para disputar o Palácio do Planalto pelo PSDB, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, prepara o anúncio de uma equipe de economistas, professores e empresários que vão integrar o grupo de sua possível candidatura presidencial.

O principal nome para coordenar esse grupo é o do economista Pérsio Arida, que participou da implementação do Plano Real, na equipe de Fernando Henrique Cardoso no Ministério da Fazenda, e presidiu o Banco Central. Ele deve liderar uma equipe formada por outros nomes da área, além de representantes do setor produtivo. O time vai elaborar as propostas para a candidatura do governador paulista.

Em ritmo de pré-campanha, o tucano cumpriu agenda partidária em Brasília nesta terça-feira (9) e prometeu divulgar em uma semana o nome do coordenador da equipe econômica. "Eu antes preciso falar com a noiva", brincou ao ser questionado sobre qual será o escolhido.

Também deve integrar essa equipe José Roberto Mendonça de Barros, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda. Além dele, o tucano também mantém contato com outros nomes da área, como Roberto Giannetti da Fonseca e Yoshiaki Nakano.

'GRUPO ECLÉTICO'
Auxiliares de Alckmin afirmam que a equipe deve ser formada por um grupo "eclético" de economistas, além de empresários e acadêmicos.

Com o anúncio, o tucano se antecipa a movimentos que vêm sendo feitos por prováveis adversários na disputa presidencial como o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ).

Os três devem adotar discursos semelhantes se forem candidatos, com a defesa de uma agenda de reformas e responsabilidade fiscal.

Alckmin apresentou a jornalistas o que chamou de seu "cartão de visitas", um comparativo de indicadores do Estado de São Paulo, governado por ele há sete anos, com números da realidade do Brasil.

Agenda no Congresso motiva disputa entre Maia e Meirelles

Por Raymundo Costa e Ribamar Oliveira | Valor Econômico

BRASÍLIA - Os partidos que articularam e fizeram o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff podem chegar à eleição presidencial de outubro com até quatro candidatos, mas é a disputa entre dois deles que no momento causa apreensão sobre o futuro da agenda econômica e da votação dos projetos de interesse do governo: Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente da Câmara dos Deputados, e Henrique Meirelles (PSD), ministro da Fazenda.

Até agora, ambos recusam a hipótese de o embate afetar a agenda econômica e a votação de projetos do governo, como a reforma previdenciária, prevista para fins de fevereiro, início de março. Meirelles acha que a reforma é do interesse de todos os presidenciáveis e, por isso, considera que a proposta será aprovada.

Aliados do ministro dizem que Maia tem interesse em aprovar a reforma para apresentá-la como resultado de sua gestão e de mais ninguém. Nem do presidente Michel Temer. A candidatura Maia tem origem num grupo de partidos que fizeram o impeachment de Dilma, dos quais devem ser destacados o PP e o Solidariedade.

O PTB está com Geraldo Alckmin (PSDB), assim como o PSD de Meirelles articula apoio à candidatura do tucano, mas ambos podem abandonar o barco de Alckmin na iminência de um naufrágio sugerido pelo baixo desempenho do governador paulista nas pesquisas. Segundo fontes do governo, o deputado Jair Bolsonaro, que deve ser o candidato do PSL, aparece nas pesquisas apenas cinco pontos abaixo de Alckmin no próprio Estado de São Paulo.

Maia monta equipe e tenta alianças de olho no Planalto

Presidente da Câmara costura apoio de pelo menos quatro partidos e já tem estrutura de pré-campanha

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), já monta equipe, flerta com legendas e inicia uma série de viagens, dentro e fora do País, depois de assumir sua pré-candidatura à Presidência, informam Eliane Cantanhêde e Igor Gadelha. No sábado, ele embarca para os Estados Unidos, onde terá reunião na ONU, e segue depois para encontro da OEA no México. Sua agenda também inclui idas ao Espírito Santo e a Santa Catarina, para tentar consolidar alianças com pelo menos quatro partidos para eventual candidatura. Estão na mira PP, Solidariedade, PSD, PR e PRB, além de PSDB e MDB – o tucano Antonio Anastasia (MG) é o nome preferido por Maia para compor a chapa. Ele também começou a montar uma estrutura de pré-campanha, com marqueteiro e economistas, e tem dito que não adianta assumir posições avançadas em temas polêmicos, “porque a sociedade não aceita”.

Por Planalto, Maia monta equipe e agenda viagens

Eliane Cantanhêde, Igor Gadelha / O Estado de S. Paulo.

BRASÍLIA - O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), desceu do muro, assumiu sua pré-candidatura à Presidência da República em outubro e já monta até equipe. No próximo sábado, Maia embarca para os Estados Unidos para estrear como presidenciável no ambiente internacional, enquanto encorpa sua agenda de viagens internas com o objetivo de consolidar uma aliança de pelo menos quatro partidos para a largada. Além do DEM, tem conversas avançadas com PP e Solidariedade e namora PSD, PR e PRB, sonhando em atrair apoios em dois dos maiores partidos, PSDB e MDB.

Em sua viagem para Washington e Nova York, Maia terá encontros com o secretário-geral das Nações Unidas (ONU), o português Antonio Guterres, dará entrevista para o jornal The Washington Post e pretende incluir um jantar com jornalistas e diplomatas. Depois, seguirá para Cancún, para um fórum econômico. Na volta a Brasília, ele poderá assumir a Presidência, caso Michel Temer mantenha a ida ao Fórum de Davos, na Suíça.

Aliados veem brecha para Luciano Huck candidato

Igor Gielow / Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - Após gerar especulações ao aparecer com um discurso de candidato a presidente no "Domingão do Faustão" desta semana, o apresentador da Rede Globo Luciano Huck disse a pessoas próximas que continua fora da disputa pelo Planalto -exceto talvez em uma situação.

Esse aliados avaliam que Huck pode mudar de ideia se houver uma combinação na qual o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) esteja impedido de forma definitiva de concorrer e o governador Geraldo Alckmin (PSDB) patine na casa dos 10% de intenções de votos.

O prazo: abril, quando Huck precisa se filiar a algum partido para poder concorrer no pleito de outubro.

No caso do petista, a questão central é o eleitorado. As pesquisas à disposição de Huck mostram que ele teria grande potencial de crescimento na faixa hoje dominada pelo ex-presidente: mais pobres, menos escolarizados, nordestinos e nortistas.

A dificuldade reside na incerteza jurídica. Se Lula tiver a condenação por corrupção confirmada por unanimidade no dia 24, o caminho para recursos judiciais a fim de manter sua candidatura se estreita -embora mesmo aí haja a certeza de que o PT deverá buscar protelar ao máximo a empreitada do líder.

Se não for unânime, os recursos estarão prontamente à mão do petista, e há cenários que veem Lula com condição de disputar a eleição à base de liminares.

Sobre Alckmin, a constatação é a mesma feita por alguns tucanos e governistas: sem uma decolagem mínima até abril, haverá muita pressãosobre o presidenciável, que de resto hoje é o nome com estrutura partidária e política mais sólida para consolidar o voto centrista.

Huck está na bolsa de apostas desde o ano passado, e virou alternativa real quando um dos maiores estimuladores de sua candidatura, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), o citou como nome para encarnar "o novo" em entrevista à Folha.

Inflação brasileira fecha 2017 em 2,95%, menor nível em duas décadas

Pela primeira vez, resultado ficou abaixo do piso da meta

Marcello Corrêa / O Globo

RIO - O Brasil fechou 2017 com a menor inflação em duas décadas, graças principalmente à queda dos preços dos alimentos. Segundo dados divulgados nesta quarta-feira pelo IBGE, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) encerrou o ano passado em 2,95%, menor taxa desde 1998 (1,65%) e a segunda menor da série histórica. O número ficou abaixo do piso da meta estabelecida pelo governo, que era de 3%. É a primeira vez que isso acontece desde que o sistema de metas foi implantado, em 1999. Em dezembro, o índice ficou em 0,44%.

Após alta de 8,62% em 2016, os preços de alimentos tiveram deflação de 1,87% no ano passado, o que foi fundamental para que a inflação ficasse abaixo dos 3%. É a primeira vez que o índice anual registra deflação de alimentos desde a implantação do Plano Real. O grupo respondeu por 0,48 ponto percentual do IPCA fechado. Isto é: se os preços desse grupo tivessem ficado estáveis, a inflação do ano passado teria sido de 3,43%.

Com o resultado, o presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn, terá que enviar uma carta ao ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, explicando por que a inflação ficou tão baixa. A meta para 2017 era de 4,5%, com tolerância de 1,5 ponto para cima ou para baixo. Ou seja, o IPCA deveria ter ficado entre 3% e 6%. O BC já precisou justificar o descumprimento da meta em outras quatro ocasiões (2001, 2002, 2003 e 2015), mas sempre porque a inflação ultrapassou o teto do limite, nunca o piso.

Analistas já esperavam resultado abaixo de 3%. A projeção do mercado para o índice estava em 2,8%, segundo pesquisa da Bloomberg. Os economistas consultados para o boletim Focus, do BC, tinham previsão semelhante, de 2,79%. A expectativa para 2018 é de que o indicador suba para 3,95%. A meta deste ano é a mesma do ano passado.

Falar sobre Bolsonaro: Editorial/Folha de S. Paulo

Antes mesmo do início formal da campanha ao Planalto, o deputado Jair Bolsonaro (RJ) dá mostras preocupantes de despreparo para lidar com questões básicas do escrutínio democrático.

Fala-se aqui da reação de Bolsonaro –ou das reações, melhor dizendo– a reportagem desta Folha que descreveu como se expandiu seu patrimônio e o de seus três filhos com mandato parlamentar.

A primeira atitude foi a recusa em apresentar explicações. Ficaram sem resposta as 13 perguntas encaminhadas ao pré-candidato à Presidência na quinta-feira (4), três dias antes da publicação do relato sobre o acúmulo de imóveis pela família ao longo de sua carreira política.

O silêncio só foi rompido após a veiculação do texto, em ambiente no qual o deputado se sente confortável, o das redes sociais. "O Brasil vive a maior campanha de assassinato de reputação de sua história recente protagonizada pela grande mídia", escreveu.

Impossível não notar na declaração o misto farsesco de megalomania e paranoia, mais o surrado ataque à atividade jornalística, tão encontradiços na retórica de defesa daquele que Bolsonaro escolheu como oponente preferencial, o petista Luiz Inácio Lula da Silva.

Riscos para o Brasil com economia global aquecida: Editorial/Valor Econômico

O cenário de economia aquecida, que prevalece em boa parte dos países desenvolvidos, pode ser encarado como uma boa notícia para o Brasil na medida em que se prenuncia um ano com demanda para os produtos nacionais, mas também pode servir como um sinal de alerta para uma eventual aceleração dos processo de mudanças das políticas monetárias dos bancos centrais dos Estados Unidos, da Europa e do Japão.

Na semana passada, a ata da última reunião do Federal Reserve (Fed, o banco central americano) expressou maior confiança no mercado de trabalho e na economia em geral, mas seus diretores também discutiram o que poderá levar as autoridades monetárias a elevar os juros mais rapidamente do que o esperado até agora.

Diz o documento do Fed, que "os integrantes discutiram vários riscos que, se concretizados, poderiam exigir uma trajetória de elevação dos juros mais acentuada. Estes riscos incluem a possibilidade de que a pressão inflacionária suba mais do que o esperado (...), talvez devido aos estímulos fiscais ou às condições de mercado acomodatícias."

De acordo com a medida de inflação preferida pelo Fed, o índice de gastos com consumo (PCE, na sigla em inglês), os preços ao consumidor subiram 1,8% em novembro, na base anual, mas a aceleração dos preços refletiu, em grande parte, a alta dos preços de energia. O núcleo da inflação apontou alta menor, de 1,5%, na base anual em novembro.

O preço de um grave erro: Editorial/O Estado de S. Paulo

Sob o pretexto de viabilizar a campanha eleitoral de 2018, o Congresso aprovou no ano passado uma verdadeira excrescência. A Lei 13.487/2017 criou com recursos públicos um fundo específico para o financiamento das campanhas eleitorais. Estima-se que o Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) receberá cerca de R$ 1,75 bilhão em 2018. Em vez de promover a tão necessária reforma política, o Legislativo aumentou a deformação do sistema eleitoral, ao destinar mais dinheiro público para financiar os partidos políticos, que são entidades privadas.

Quando o projeto de lei estava em debate no Congresso, parlamentares asseguraram que o novo fundo não tiraria recursos da saúde e da educação, pois o dinheiro viria de um porcentual das verbas destinadas às emendas parlamentares, bem como da compensação fiscal a que emissoras de rádio e TV têm direito por transmitirem os programas partidários. Tentava-se, assim, diminuir a resistência ao FEFC, com a promessa de que ele não iria desequilibrar a periclitante situação fiscal do Estado brasileiro. Ele seria composto apenas de dinheiro que já seria gasto em outras áreas.

Febre amarela é caso de emergência no Rio e em São Paulo: Editorial/O Globo

Foi alertado que o vírus poderia voltar a circular no verão, e foi o que aconteceu; agora, autoridades correm em busca do tempo perdido

Quem conhece o assunto assegura que, pelo andar da carruagem, a foto de Lula estará na urna eletrônica. O Brasil se afasta aos poucos do ponto mais profundo de uma grave recessão econômica, a maior de que se tem notícia, mas há áreas específicas em que o país patina há algum tempo, e sem perspectivas de melhoria. Caso da saúde pública em sentido amplo e, em particular, do controle de epidemias.

Um marco nesta degradação é o início de um ciclo que se eterniza de surtos de dengue e de outras doenças transmitidas pelo Aedes aegypti, mosquito controlado no Rio de Janeiro por Oswaldo Cruz, por volta de 1920, e erradicado do Brasil 30 anos depois. Relaxou-se e, no final da década de 60, o Aedes reapareceu.

Zuenir Ventura: Ainda Cony, inesgotável

- O Globo

Há mais de 40 anos, o crítico Otto Maria Carpeaux advertia: ‘Esconde atrás da máscara de um cinismo feroz seu sentimentalismo inato’

Carlos Heitor Cony morreu deixando de propósito a imagem de que era pessimista, cético, cínico e, como revelou no seu discurso de posse na Academia Brasileira de Letras, anarquista. Gozador, deve estar se divertindo por ter conseguido que acreditassem nisso. Mas será que esse Cony correspondia ao real, de carne e osso? Pelo menos seu amigo Otto Maria Carpeaux achava que não. Há mais de 40 anos, o grande crítico advertia: “Cony esconde atrás da máscara de um cinismo feroz seu sentimentalismo inato”.

Bastaria lembrar o que o cronista expressou publicamente sobre Mila. Um trechinho: “Foram 13 anos de chamego e encanto. Dormimos muitas vezes juntos, a patinha dela em cima de meu ombro”. É difícil imaginar um cínico capaz de se enternecer e chorar de saudade a perda de uma cadelinha.

A mesma contradição se encontra nesse anarquista obediente aos rituais. Foi ele quem revelou: “Estudei em seminário não por um sentido místico, mas porque a liturgia me atraía”. Quer dizer: o que o fascinava nos dez anos de internato não era a fé, mas os ritos da religião.

Dois mecanismos foram importantes na formação de Cony. O primeiro, de compensação. Aos 5 anos, quando começou a articular palavras, ele misturava letras, o que o levou a se refugiar na escrita. Escrevendo, não trocava, por exemplo, o “g” pelo “d” em “fogão” como fazia ao falar, provocando bullying dos colegas.

O segundo mecanismo foi o de defesa — “um modo de não se deslumbrar” — e de proteção contra o niilismo e o desespero. Caminhando sempre entre paradoxos, ele às vezes se mostrava tão cético que parecia não acreditar nem no ceticismo.

Em 1958, Luiz Garcia e eu éramos editores do suplemento literário da “Tribuna da Imprensa” de Carlos Lacerda, quando apareceu na redação um desconhecido com um envelope: “São os originais de meu livro. Não sei se vale uma resenha”. Era Cony, com o “Ventre”. Valia, e como.

Já estava nesse romance de estreia com imagens fortes e uma inesperada contundência de linguagem um pouco da dissonância que iria marcar sua vida e obra — uma espécie de espírito de contradição que gostava de contestar expectativas óbvias e de não se permitir estacionar numa posição ideológica. Chegou a ser flagrado na esquerda, na direita e no centro, mas não por muito tempo.

Uma vez ele escreveu que, vizinhos de bairro, só nos encontrávamos nos aeroportos ou fora do Brasil. Num desses encontros a caminho de alguma palestra, perguntei que máscara ele ia usar na sua fala. Como não aceitava provocação nem de brincadeira, retrucou: “Eu uso a máscara do pessimismo e você, a do otimismo. Cada um se defende como pode da tentação contrária”.

À sua maneira, ele concordava enfim com o diagnóstico de Carpeaux.

Joaquim Cardozo: As Alvarengas

"Tous les chemins vont vers la ville
Verhaeren

As alvarengas!
Ei-las que vão e vem; outras paradas,

Imóveis. O ar silêncio. Azul céu, suavemente.
Na tarde sombra o velho cais do Apolo.
O sol das cinco ascende um farol no zimbório
Da Assembléia.
As alvarengas!
Madalena. Deus te guie, flor de Zongue.
Negros curvando os dorsos nus
Impelem-nas ligeiras.
Vem de longe, dos campos saqueados.
Onde é tenaz a luta entre o Homem e a Terra.
Trazendo, nos bojos negros.
Para a cidade.
A ignota riqueza que o solo vencido abandona.
O latente rumor das florestas despedaçadas.

A cidade voragem.
É o Moloch, é o abismo, é a caldeira...
Além, pelo ar distante e sobre as casas.
As chaminés fumegam e o vento alonga.
O passo de parafuso.
E lentas.
Vão seguindo, negras, jogando, cansadas;
E seguindo-as também, em curvas n’água propagadas.
A dor da terra, o clamor das raízes.

Dorina e Luiz Carlos da Vila - O sonho não se acabou