sexta-feira, 18 de março de 2016

Opinião do dia - Celso de Mello

Esse insulto ao Poder Judiciário, além de absolutamente inaceitável e passível da mais veemente repulsa por parte desta Corte Suprema, traduz, no presente contexto da profunda crise moral que envolve os altos escalões da República, reação torpe e indigna, típica de mentes autocráticas e arrogantes que não conseguem esconder, até mesmo em razão do primarismo de seu gesto leviano e irresponsável, o temor pela prevalência do império da lei e o receio pela atuação firme, justa, impessoal e isenta de Juízes livres e independentes, que tanto honram a Magistratura brasileira e que não hesitarão, observados os grandes princípios consagrados pelo regime democrático e respeitada a garantia constitucional do devido processo legal, em fazer recair sobre aqueles considerados culpados, em regular processo judicial, todo o peso e toda a autoridade das leis criminais de nosso País!
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Celso de Mello é ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) em pronunciamento na abertura da sessão plenária, ontem.

Judiciário repudia ofensas e suspende manobra de Lula

• ‘Condutas criminosas à sombra do poder jamais serão toleradas’, avisa decano do STF

Ex-presidente chegou a ser empossado em solenidade na qual Dilma reagiu à divulgação de grampos pelo juiz Sérgio Moro e disse que ‘ golpes começam’ assim. Em carta no fim do dia, Lula afirmou que respeita o Judiciário e pediu justiça

A posse do ex-presidente Lula na Casa Civil, vista pela Lava Jato como manobra para obter foro privilegiado e escapar do juiz Sérgio Moro, foi suspensa logo após a solenidade no Planalto. Dois juízes deram liminares, uma já cassada, por entender que a nomeação é uma intervenção indevida nas investigações sobre Lula. Mais de 30 ações, no STF e na primeira instância, contestam a posse por a considerarem uma manobra da presidente Dilma e de Lula. No STF, os processos ficarão com o ministro Gilmar Mendes, crítico do PT. Dilma reagiu à divulgação dos grampos e repudiou a tese de blindagem. O Supremo mostrou indignação com ataques de Lula, para quem a Corte “está acovardada”. O decano Celso de Mello disse que “condutas criminosas à sombra do poder jamais serão toleradas”. No STJ, o ministro João Otávio de Noronha também reagiu. Juízes e procuradores apoiaram Moro. Lula divulgou carta dizendo que respeita o Judiciário.

Conflito de poderes

• Judiciário suspende posse de Lula e reage a declarações de ex-presidente; Dilma ataca Moro

- O Globo

Enquanto o agora ministro Lula (Casa Civil) retomava o caminho do Palácio do Planalto, ontem pela manhã, escoltado pela presidente Dilma e ovacionado por aliados, a Justiça reagia em série, em todas as suas instâncias. Juízes federais foram às ruas defender a atuação de Sérgio Moro. Foi de Moro a decisão de retirar o sigilo das investigações contra o ex-presidente na Lava- Jato, o que levou à divulgação dos diálogos entre Lula e a cúpula do poder, que estremeceram o país. Uma das conversas, entre Lula e Dilma, indica que ela atuou para evitar a prisão do ex-presidente.
Dilma, única a falar na cerimônia de posse, fez um libelo contra Moro, ao criticar a divulgação das conversas: “Os golpes começam assim”, sintetizou. A declaração da presidente, na posse, foi o estopim para mais um dia frenético de crise.

Em silêncio anteontem, apesar de citados nos grampos, integrantes das cortes supremas criticaram abertamente Lula. Em conversa telefônica com Dilma, o ex- presidente chamara de “acovardada” a postura do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Superior Tribunal de Justiça ( STJ) diante da atuação da Lava-Jato.

— Esse insulto ao Poder Judiciário traz, no presente contexto da profunda crise moral que envolve os altos escalões da República, reação torpe e indigna, típica de mentes autocráticas e arrogantes que não conseguem esconder, até mesmo em função do primarismo de seu gesto leviano e irresponsável, o temor pela prevalência do império da lei e o receio pela atuação firme, justa, pessoal, isenta de juízes livres e independentes — disse o ministro Celso de Mello, decano do STF, para quem “condutas criminosas perpetradas à sombra do poder jamais serão toleradas”.

O ex-presidente não teve tempo de exercer as funções de ministro. Poucos minutos depois da posse, o juiz Itagiba Catta Preta, da 4 ª Vara Federal de Brasília, suspendeu seus efeitos. A liminar, suspensa mais tarde, foi substituída por outra, da juíza Regina Coeli Formisano, da 6 ª Vara Federal do Rio. Em comum, o argumento de que o ex- presidente voltou ao governo para escapar de Moro, que tem em suas mãos um pedido de prisão contra Lula.

Reação indignada também teve o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, chamado de “ingrato” por Lula nas gravações. Em viagem à Suíça, disse: “Ser ministro não blinda ninguém”.

— O Ministério Público tem que ter couro grosso. Tem que agir destemidamente — disse, irritado com o teor da gravação: — Não sei que gratidão é essa. Devo isso ( minha carreira) apenas à minha família.

Em Curitiba, a reação foi imediata. O procurador Deltan Dellagnol leu uma espécie de desagravo à Lava- Jato: “Não há independência do Judiciário sem o respeito às suas decisões”.

Alvo central da indignação do governo, Moro reagiu nos autos. Lembrou o caso Watergate, que levou à renúncia do então presidente dos Estados Unidos Richard Nixon, em 1974: “Nem mesmo o supremo mandatário da República tem um privilégio absoluto no resguardo de suas comunicações”, escreveu Moro.

A temperatura alta contagiou as ruas. Manifestantes ocuparam parte da Avenida Paulista, em São Paulo, novamente com um coro de “Fora, Dilma”. Alguns completaram 24 horas no local. Rio e Brasília também tiveram vigílias. Houve protestos em 21 estados e no DF.

Em carta aberta divulgada no fim da noite, Lula pediu a compreensão do Judiciário, que disse respeitar. Ele afirmou que sua intimidade e da sua família “tem sido violentada por meio de vazamentos ilegais". Lula sustenta que as conversas pessoais divulgadas “jamais teriam ultrapassado os limites da confidencialidade, se não fossem expostas por decisão judicial que ofende a lei".

No Congresso, foi traçado mais um cenário desfavorável ao governo: escolhida ontem, a comissão de impeachment tem 31 deputados com perfil favorável a Dilma, 26 contra e oito indecisos. O relator, Jovair Arantes (PTB- GO), é ligado ao presidente da Câmara, Eduardo Cunha. No comando das comissões, nenhum integrante do PT

Decano do STF reage a Lula: ‘ Ninguém está acima das leis’

• Ministro Celso de Mello diz que ‘ condutas criminosas jamais serão toleradas’

“A República repudia a outorga de favores especiais e rejeita a concessão de tratamentos diferenciados” Celso de Mello Ministro do STF

“O Ministério Público brasileiro e a Justiça não se amedrontarão” Deltan Dallagnol Procurador da força- tarefa da Lava- Jato

Carolina Brígido, Renato Onofre e Luiza Souto – O Globo

- BRASÍLIA, CURITIBA E SÃO PAULO - O mais antigo integrante do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Celso de Mello, fez ontem duro discurso em defesa da Corte. As escutas telefônicas divulgadas quarta-feira indicam que a presidente Dilma Rousseff teria nomeado o ex- presidente Lula para a Casa Civil com o objetivo de blindá- lo contra ameaça de prisão. Com o cargo, Lula passaria a ser investigado pelo STF, e não pelo juiz federal Sérgio Moro, da primeira instância. Mello disse que criminosos serão punidos, mesmo que ocupem cargo no governo.

— A República, além de não admitir privilégios, repudia a outorga de favores especiais e rejeita a concessão de tratamentos diferenciados aos detentores do poder ou a quem quer que seja. Por isso, cumpre não desconhecer que o dogma da isonomia a todos iguala, governantes e governados, sem qualquer distinção, indicando que absolutamente ninguém está acima da autoridade das leis e da Constituição. Condutas criminosas perpetradas à sombra do poder jamais serão toleradas, e os agentes que as houverem praticado, posicionados, ou não, nas culminâncias da hierarquia governamental, serão punidos na exata medida e na justa extensão de sua responsabilidade criminal — afirmou.

“Insulto ao poder judiciário”
O decano protestou contra trecho em que Lula diz que o STF era uma Corte “totalmente acovardada”.

— Esse insulto ao Poder Judiciário traduz, no presente contexto da profunda crise moral que envolve os altos escalões da República, reação torpe e indigna, típica de mentes autocráticas e arrogantes que não conseguem esconder, até mesmo em razão do primarismo de seu gesto leviano e irresponsável, o temor pela prevalência do império da lei e o receio pela atuação firme, justa, impessoal e isenta de juízes livres e independentes. (Esses juízes) não hesitarão em fazer recair sobre aqueles considerados culpados, em regular processo judicial, todo o peso e toda a autoridade das leis criminais de nosso país — disse o decano no Supremo.

O presidente do STF, Ricardo Lewandowski, também defendeu a Corte.

— Os constituintes de 1988 atribuíram a esta Suprema Corte a elevada missão de manter a supremacia da Constituição e a manutenção do estado democrático de direito. Tenho certeza de que os juízes desta Casa não faltarão aos cidadãos brasileiros com o cumprimento desse elevado múnus — disse.

No Superior Tribunal de Justiça (STJ), o ministro João Otávio de Noronha, em discurso, reagiu à acusação de que a Corte estaria acorvardada.

— Esta Casa não é uma Casa de covardes, é de juízes íntegros, que não recebem doação de empreiteiras. Não se alinha a ditaduras da América do Sul, concedendo benefícios a ditadores e amigos políticos que estrangulam as liberdades (...) Me envergonho de ter algumas lideranças políticas que o país tem — afirmou Noronha.

Em Curitiba, em ato de juízes federais e procuradores a favor de Moro, o procurador Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa da Lava- Jato, disse ontem que “o Ministério Público brasileiro e a Justiça não se amedrontarão e darão fiel cumprimento à Constituição e às leis”. Dallagnol leu manifesto explicando que “os procuradores da República do caso Lava- Jato têm dever de esclarecer que as interceptações telefônicas foram legalmente determinadas pelo juiz da 13 ª Vara Federal”.

O juiz Nicolau Couto também leu manifesto, da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), em que mostra “apoio total à independência judicial do juiz federal Sergio Moro e de todos os magistrados federais que atuam nos processos da Operação Lava- Jato”.

Crítica de Lula ao Supremo é 'típica de mentes autocráticas e arrogantes', diz Celso de Mello

• Ministro abriu sessão plenária nesta quinta com duro pronunciamento contra afirmação do ex-presidente

Gustavo Aguiar – O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O ministro Celso de Mello abriu a sessão plenária desta quinta-feira no Supremo Tribunal Federal (STF) com um duro pronunciamento contra a afirmação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva de que Suprema Corte estava “completamente acovardada”. Antes do início do julgamento dos processos do dia, o decano do Tribunal afirmou que a “grave ofensa” de Lula é “típica de mentes autocráticas e arrogantes que não conseguem esconder o temor pela prevalência do império da lei”.

O ministro declarou que “ninguém está acima da autoridade das leis e da Constituição”, e que “os agentes que as houverem praticado (crimes), posicionados, ou não, nas culminâncias da hierarquia governamental, serão punidos por seu Juiz natural na exata medida e na justa extensão de sua responsabilidade criminal”.

“Esse insulto ao Poder Judiciário, além de absolutamente inaceitável e passível da mais veemente repulsa por parte desta Corte Suprema, traduz, no presente contexto da profunda crise moral que envolve os altos escalões da República, reação torpe e indigna, típica de mentes autocráticas e arrogantes que não conseguem esconder o temor pela prevalência do império da lei”, afirmou o ministro.

A fala de Lula foi captada por grampos telefônicos, expostos ontem pelo juiz Sérgio Moro, numa conversa com a presidente Dilma Rousseff registrada no dia em que ele foi conduzido para prestar depoimento na Polícia Federal no âmbito da Lava Jato. Lula havia pedido ao Supremo pela suspensão o dos processos contra ele em Curitiba, o que foi negado.

Depois do pronunciamento de Mello, o ministro Ricardo Lewandowski, visivelmente aborrecido, tomou a palavra para defender a Suprema Corte. “Os constituintes de 1988 atribuíram a esta Suprema Corte a elevada missão de manter a supremacia da Constituição Federal e a manutenção do Estado Democrático de Direito. Eu tenho certeza de que os juízes dessa casa não faltarão aos cidadãos brasileiros com o cumprimento desse elevado hunos”, disse.

Confira a íntegra do pronunciamento do ministro
"Os meios de comunicação revelaram, ontem, que conhecida figura política de nosso País, em diálogo telefônico com terceira pessoa, ofendeu, gravemente, a dignidade institucional do Poder Judiciário, imputando a este Tribunal a grosseira e injusta qualificação de ser "uma Suprema Corte totalmente acovardada"!

Esse insulto ao Poder Judiciário, além de absolutamente inaceitável e passível da mais veemente repulsa por parte desta Corte Suprema, traduz, no presente contexto da profunda crise moral que envolve os altos escalões da República, reação torpe e indigna, típica de mentes autocráticas e arrogantes que não conseguem esconder, até mesmo em razão do primarismo de seu gesto leviano e irresponsável, o temor pela prevalência do império da lei e o receio pela atuação firme, justa, impessoal e isenta de Juízes livres e independentes, que tanto honram a Magistratura brasileira e que não hesitarão, observados os grandes princípios consagrados pelo regime democrático e respeitada a garantia constitucional do devido processo legal, em fazer recair sobre aqueles considerados culpados, em regular processo judicial, todo o peso e toda a autoridade das leis criminais de nosso País!

A República, Senhor Presidente, além de não admitir privilégios, repudia a outorga de favores especiais e rejeita a concessão de tratamentos diferenciados aos detentores do poder ou a quem quer que seja.

Por isso, Senhor Presidente, cumpre não desconhecer que o dogma da isonomia, que constitui uma das mais expressivas virtudes republicanas, a todos iguala, governantes e governados, sem qualquer distinção, indicando que ninguém, absolutamente ninguém, está acima da autoridade das leis e da Constituição de nosso País, a significar que condutas criminosas perpetradas à sombra do Poder jamais serão toleradas, e os agentes que as houverem praticado, posicionados, ou não, nas culminâncias da hierarquia governamental, serão punidos por seu Juiz natural na exata medida e na justa extensão de sua responsabilidade criminal!

Esse, Senhor Presidente e Senhores Ministros, o registro que desejava fazer."

Moro afirma que presidente não tem sigilo absoluto

• Janot reage às reclamações de Lula e diz que Ministério Público tem ‘ couro grosso

Renato Onofre e Tiago Dantas - O Globo

- CURITIBA E SÃO PAULO- Ao justificar a divulgação da conversa entre o ex- presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a presidente Dilma Rousseff, o juiz federal Sérgio Moro, que está à frente da Operação Lava- Jato na primeira instância, escreveu ontem em despacho que “nem mesmo o supremo mandatário da República tem um privilégio absoluto no resguardo de suas comunicações". Segundo o despacho publicado ontem de manhã por Moro, a comunicação com Dilma foi interceptada “fortuitamente”, já que o investigado pela Polícia Federal era Lula.

O juiz da 13 ª Vara da Justiça Federal se apoia em um precedente da Suprema Corte americana: o caso Watergate, que terminou com o afastamento do presidente Richard Nixon da Presidência dos Estados Unidos em 1974. Nas palavras de Moro esse caso “é um exemplo a ser seguido”.

Juiz diz não ter reparado em horários
Moro afirma que determinou a interrupção do grampo de Lula às 11h12m de quarta-feira. Segundo ele, o diálogo entre os dois últimos mandatários do Brasil ocorreu mais de duas horas depois — às 13h32m , “entre a decisão e a implementação da ordem junto às operadoras”. Moro afirma não ter reparado nesse fato.

No dia anterior, no entanto, Moro dera sinais de que viu os 34 arquivos de áudio anexados ao processo pela PF. Em decisão proferida naquele dia, o juiz optou por manter o sigilo sobre dois grampos. No texto de ontem, disse: “Como havia justa causa e autorização legal para a interceptação, não vislumbro maiores problemas no ocorrido”. E decidiu pela não exclusão do diálogo com Dilma do processo. “Evidentemente, caberá ao Supremo Tribunal Federal, quando receber o processo, decidir definitivamente sobre essas questões”.

Moro manteve a rotina normal ontem. Passou a manhã na sede da Justiça Federal despachando. Moro chegou ao prédio por volta das 9h30m em carro blindado escoltado por agentes da Justiça e da Polícia Federal.

À noite, o juiz manteve uma agenda pública e se apresentou como o palestrante principal do seminário “Combate à lavagem de dinheiro”, realizado pela Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil.

Na palestra, o magistrado disse que as interceptações telefônicas não são as principais provas usadas na Lava- Jato e que elas podem ser compartilhadas desde que de interesse público.

Em Berna, na Suíça, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, também reagiu às declarações de Lula, que o chamou de ingrato por ter concordado com uma investigação contra ele. Ao ser perguntado se sente pressionado pelo ex-presidente, respondeu:

— Não. O Ministério Público tem que ter couro grosso. O Ministério Público mexe com liberdade das pessoas, com o patrimônio das pessoas, e é normal que as pessoas reajam. O Ministério Público tem que agir com tranquilidade, tecnicamente, mas destemidamente. O Ministério Público não tem medo de nada.

Sobre a suposta ingratidão citada por Lula, também respondeu:

— Que ingratidão? Posso dizer que entrei no meu cargo por concurso público. Tenho 32 anos de carreira, estou em final de carreira. e se devo a alguém esse meu cargo é à minha família.

Governo faz ofensiva contra Sérgio Moro


  • Planalto deu início a questionamentos sobre ação do juiz federal; Dilma afirma que magistrado violou garantias da Presidência

Beatriz Bulla, Carla Araújo, Eduardo Rodrigues e Tania Monteiro - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O governo iniciou ontem uma ofensiva com questionamentos sobre a ação do juiz federal Sérgio Moro, que tornou públicos anteontem os áudios do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em conversa com a presidente Dilma Rousseff. A iniciativa começou com a própria presidente durante a cerimônia de posse de Lula. Em um claro recado a Moro, responsável pelas investigações da Operação Lava Jato na Justiça Federal em Curitiba, a petista criticou a quebra do sigilo e a divulgação do conteúdo de conversas entre eles.

“Não há justiça quando as próprias garantias da Presidência da República são violadas. O Brasil não pode se tornar submisso a uma conjuração que invade garantias constitucionais da Presidência da República, não por que a presidente seja diferente de outros cidadãos. Mas se se fere essas prerrogativas, o que farão com as prerrogativas do cidadão?”, questionou Dilma, ao discursar na solenidade.

A presidente garantiu que todo o fato será investigado. “Vamos avaliar as condições desse grampo. Quem autorizou, por que autorizou, e por que foi divulgado quando ele não continha nada, nada, eu repito, nada que possa levantar qualquer suspeita sobre seu caráter republicano”, disse a presidente. Na sequência, Dilma declarou:

“A justiça e o combate à corrupção sempre são mais fortes e dignos quando respeitam os princípios constitucionais”.

Documento. A presidente fez questão de mostrar o documento na cerimônia e afirmou que ele foi enviado porque Lula poderia não comparecer ao evento devido a um problema de saúde de Marisa Letícia, sua mulher, também investigada.

Dilma mostrou ainda que o termo estava assinado apenas por Lula, e, sem sua assinatura como presidente, não teria qualquer validade para impedir uma eventual prisão. “Em que pese o teor absolutamente republicano do diálogo que tive ontem com ex-presidente lula, ele foi ‘publicizado’ com interpretação desvirtuada”, afirmou a petista.

A presidente disse ainda que é preciso “superar os ódios” no País e afirmou que a “gritaria dos golpistas” não vai tirá-la do rumo, não vão “colocar nosso povo de joelhos” nem causarão “caos e convulsão social”. O clima na solenidade no Planalto foi de ato político, com gritos de que “não vai ter golpe”.

Depois da posse, ministros também atacaram Moro. O novo ministro da Justiça, Eugênio Aragão, sugeriu que o juiz cometeu crime. "Se houve conversa da presidente que merecesse atenção jurisdicional não caberia ao juiz de primeira instância nem sequer aquilatar o valor daquela prova e muito menos dar-lhe publicidade". Já o advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo, disse que o sigilo da conversa da presidente é questão de “segurança nacional”.

Os argumentos serão usados pelo governo para partir para o enfrentamento da decisão do juiz de divulgar a conversa. A investida, no entanto, pode ser articulada internamente no governo mas protagonizada por parlamentares do PT e do PC do B, a exemplo do que foi feito no Supremo Tribunal Federal (STF) para questionar o rito do processo de impeachment.

O plano é argumentar que a escuta já deveria ter sido encerrada por ordem do próprio Moro no momento da gravação de Dilma e que, ao encontrar autoridade com foro privilegiado, o juiz precisaria encaminhar o caso imediatamente ao STF./

Janot diz que Lula não será ‘blindado’

• Procurador-geral da República afirma que ministro não está imune às investigações

Jamil Chade – O Estado de S. Paulo

BERNA - O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, afirmou ontem que o Ministério Público não agirá para “blindar” o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, nomeado ontem ministro da Casa Civil. O petista foi alvo da 24.ª fase da Operação Lava Jato. Questionado se o foro privilegiado de Lula impediria investigações contra o ex-presidente, Janot confirmou que não. “Ser ministro não blinda ninguém. Vou pegar os processos que estão em Curitiba (4.ª Tribunal Regional Federal), trazer para o Supremo e dar continuidade”, afirmou o procurador-geral, durante evento em Berna, na Suíça.

Janot declarou confiar no papel do Supremo Tribunal Federal, instância que investiga políticos com foro privilegiado. “O Supremo já deu mostras de que também tem uma atuação republicana. No julgamento da ação penal 470 (mensalão), quem pensava dessa maneira, deixou de pensar. E esse exemplo deve ser seguido para os demais”, ressaltou.

Janot também deixou claro que não se sente pressionado, apesar das críticas de Lula captadas nas gravações. “O Ministério Público precisa ter couro grosso. O Ministério Público mexe com a liberdade das pessoas, como patrimônio das pessoas e é normal que reajam. Mas o MP precisa agir com tranquilidade, tecnicamente, mas destemidamente”, disse.

‘Gratidão’. De Berna, o procurador-geral da República rebateu o ex-presidente, que criticou a falta de “gratidão” de Janot pelo fato de o senador Aécio Neves (PSDB-SP) não ter sido denunciado pela força-tarefa após ser citado por vários delatores investigados. A PGR arquivou investigação que envolvia o senador. “Que gratidão é essa ?”, questionou o procurador. “Os cargos públicos não são dados de presente. Eu sou muito grato à minha família”, afirmou. “Fiz concurso. Estudei para caramba. Tenho 32 anos de carreira”, completou. Janot foi nomeado ao cargo por Dilma Rousseff, em 2013, e reconduzido em 2015. “Se eu devo meu cargo a alguém, é à minha família. Republicanamente, fiz concurso”, declarou.

Em conversa telefônica com o advogado Luiz Carlos Sigmaringa Seixas, no dia 7 de março, Lula reclamou: “Essa é a gratidão. Essa é a gratidão dele por ele ser procurador”.

O procurador contestou o argumento de Lula sobre a seletividade do Ministério Público Federal. “Não é porque mexi com uma pessoa que tenho de mexer com a outra. Se houver indício de algum crime, quem quer que seja, será investigado”, disse. “Simples assim.” Acrescentou, ainda, que não vai usar o princípio do “balanço”.

Janot acrescentou que a pauta política não deve “contaminar” a seara jurídica. “E eu vou atuar dessa maneira. Tecnicamente, juridicamente e sem contaminação política de um lado ou de outro”, disse.

Reações em série ampliam isolamento de Dilma e Lula

• Na posse de Lula, suspensa na Justiça, Dilma critica Moro e diz que ação dele abre caminho para golpe

Débora Álvares, Gustavo Uribe, Daniela Lima – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Na cerimônia de posse do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva como ministro da Casa Civil na manhã desta quinta-feira (17), a presidente Dilma Rousseff acusou o juiz Sergio Moro de ter desrespeitado a Constituição Federal e ressaltou que a utilização de "métodos escusos" e "práticas criticáveis" podem levar à realização de golpe presidencial no país.

"Convulsionar a sociedade brasileira em cima de inverdades, métodos escusos e práticas criticáveis viola princípios e garantias constitucionais e os direitos dos cidadãos. E abrem precedentes gravíssimos. Os golpes começam assim", disse.

No dia anterior, foi divulgada uma conversa telefônica entre Lula e a presidente Dilma Rousseff, na qual ela disse que encaminharia a ele o "termo de posse" de ministro. Dilma diz a Lula que o termo de posse só seria usado "em caso de necessidade".

Os investigadores da Lava Jato interpretaram o diálogo como uma tentativa de Dilma de evitar uma eventual prisão de Lula. A gravação foi incluída no inquérito que tramita em Curitiba pelo juiz federal Sergio Moro.

Em discurso duro, a petista disse que o funcionamento da Justiça "deve ser assentado em provas" e, sem citar o seu nome, acusou o magistrado de tentar convulsionar a sociedade brasileira com "inverdades". Segundo ela, o país não pode se tornar submisso a iniciativas que "invadem as prerrogativas presidenciais".

"Interpretação desvirtuada, processos equivocados, investigações baseadas em grampos ilegais não favorecem a democracia neste país. Quando isso acontece, fica nítida a tentativa de ultrapassar o limite do estado democrático e cruzar a fronteira do estado de exceção", disse.

Segundo Dilma, a divulgação da gravação é um "fato grave" e uma "agressão" não só contra presidente, mas também contra a "cidadania, a democracia e a Constituição". Ela ressaltou ainda que "a gritaria dos golpistas" não vão tirá-la do rumo ou "colocar o povo de joelhos".

Na cerimônia de posse, a presidente voltou a defender versão do governo federal de que o mandou entregar o documento porque Lula não poderia comparecer nesta quinta-feira (17) à cerimônia de posse, uma vez que a mulher do petista, Marisa Letícia, não passava bem.

"Não há Justiça quando as leis são desrespeitadas. Não há justiça para os cidadãos quando as garantias constitucionais da própria Presidência da República são violadas", disse a petista, sob o coro da plateia de "Moro fascista".

Protestos no planalto
Logo no início da fala de Dilma, houve um princípio de tumulto quando o deputado Major Olímpio (SD-SP) protestou: "É uma vergonha o que aconteceu ontem". O parlamentar foi imediatamente vaiado e hostilizado pelos grupos que acompanham a cerimônia no Palácio do Planalto.

Ele chegou a ter a boca tapada por uma integrante de movimento social que acompanha o evento, mas foi escoltado pela segurança presidencial de imediato, que o acompanhou até a porta. Olímpio avisou anteriormente a Folha que haveria uma "surpresinha" na posse.

Dilma começou sua fala saudando "os brasileiros e brasileiras de coragem que estão aqui dentro", enquanto enfrentava protesto do lado de fora do Palácio do Planalto promovido por defensores do impeachment.

"Nesse momento temos de estar juntos pelo Brasil. Eu, Lula, nossa base política e social", disse, durante o discurso. "Podemos todos agir em conjunto e deixar para trás a paralisia econômica. Estamos determinados a promover o reequilíbrio fiscal e reduzir a inflação. Meu governo terá ainda melhores condições para recolocar o Brasil nos trilhos com o Lula ao meu lado."

Lula chegou pela manhã em Brasília para a posse no Planalto. Além de Lula, tomam posse Eugênio Aragão (Justiça), Mauro Lopes (Secretaria de Aviação Civil) e Jaques Wagner (Chefe de Gabinete Pessoal).

O vice-presidente Michel Temer não participou da cerimônia no palácio. Segundo sua assessoria, ele "não pode comparecer à posse de um ministro que afronta a decisão soberana da convenção nacional do PMDB de não ocupar cargos no governo". É uma referência direta a Mauro Lopes, que assume a Aviação Civil. A expulsão de Lopes do PMDB será analisada a partir de sexta.

O ministro Jacques Wagner, que viajou para a Bahia para comemorar seu aniversário na quarta-feira (16), não chegou a tempo de participar da cerimônia. Segundo a presidente Dilma, isso ocorreu porque ele estava viajando a Brasília "de avião de carreira" e "não de avião da FAB".

Protestos pelo país
Do lado de fora do Planalto, manifestantes pró e contra a nomeação do ex-presidente para a Casa Civil já entraram em confronto. No salão negro, onde ocorre a cerimônia de posse, é possível ouvir a manifestação do lado de fora em alguns momentos.

Manifestantes gritavam "Lula, ladrão, seu lugar é na prisão" e tentavam passar pela barreira policial montada. Carros fizeram buzinaço em frente ao Congresso Nacional. O trânsito ficou bloqueado na descida para o Planalto.

Mais cedo, a Polícia Militar havia feito bloqueios na altura do Congresso para impedir que manifestantes pró-impeachment se encontrassem com os que apoiam o governo. Três conseguiram furar o bloqueio e logo iniciaram uma briga de rua. A polícia usou spray de pimenta para apartar o confronto.

Em São Paulo, a Polícia Militar estimava, às 10h, haver aproximadamente 700 pessoas na avenida Paulista. No local, manifestantes batem panela e gritam "1 2 3, Lula no xadrez" e "renúncia".

Um grupo de manifestantes fez vigília na avenida Paulista pelo impeachment ou renúncia da presidente Dilma Rousseff. Segundo a Polícia Militar, ao menos cem pessoas estavam reunidas por volta das 4h em frente ao prédio da FIESP (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).

O gestor José Ferreira, 30, passou a noite no local e não tem previsão para ir embora. "Estou consertando o que eu fiz nas últimas eleições", diz Ferreira, que sempre votou no PT.

Gravações
A gravação da conversa entre Lula e Dilma foi revelada nesta quarta (16) pelo canal "Globonews". Ela havia sido feita às 13h32 desta quarta, quando Lula aceitou o convite para assumir a Casa Civil, no lugar de Jaques Wagner.

Segundo Moro, o telefone grampeado é de um assessor do Instituto Lula que era usado com frequência pelo ex-presidente.

O juiz Moro não pode mandar prender ministros porque eles detêm foro privilegiado.

O juiz vai encaminhar para o Supremo toda a investigação sobre Lula quando chegar o termo de posse de Lula.

A conversa foi gravada pela Polícia Federal, no inquérito que apura a posse do sítio em Atibaia (SP). A hipótese dos investigadores é que o sítio foi doado a Lula por empresas que tinham contrato com a Petrobras, como a Odebrecht, OAS e José Carlos Bumlai, este amigo do ex-presidente.

O Palácio do Planalto divulgou nota em que diz que a divulgação da gravação é uma "afronta aos direitos e garantias" da Presidência da República.

"Todas as medidas judiciais e administrativas cabíveis serão adotadas para a reparação da flagrante violação da lei e da Constituição da República, cometida pelo juiz autor do vazamento", diz a nota.

O advogado de Lula, Cristiano Zanin Martins, acusa Moro de estimular uma "convulsão social" com a divulgação do telefonema. " Isso não é papel do Judiciário", disse.

Com a indicação Lula à Casa Civil, o ex-presidente passa a ter foro privilegiado nas investigações da Lava Jato. Desta maneira, Lula só pode ser julgado pelo Supremo Tribunal Federal.

No dia 4 de março, a Polícia Federal cumpriu um mandado de busca e apreensão na casa do ex-presidente e no Instituto Lula, entre outros lugares ligados ao petista.

Ele foi conduzido coercitivamente pela PF para prestar depoimento, como parte da 24ª fase da Operação Lava Jato.

PMDB antecipa reunião para rompimento e boicota posse

• Partido decidiu marcar para o dia 29 o encontro no qual decidirá sobre o fim da aliança com Dilma

“O governo resolveu afrontar uma decisão da Convenção Nacional do PMDB nomeando Mauro Lopes” Michel Temer Vice- presidente, em nota oficial

Júnia Gama, Cristiane Jungblut - O Globo

O vice de Dilma e o presidente do Senado boicotaram a posse de Lula. O PMDB antecipará decisão sobre a saída do governo.

 - BRASÍLIA E SÃO PAULO- O governo recebeu durante todo o dia de ontem sinais de afastamento por parte do PMDB, o maior partido da base aliada e considerado peça fundamental na tentativa de retomar a governabilidade. A ausência das principais figuras da legenda na cerimônia de posse dos novos ministros foi o primeiro gesto para marcar a distância que o PMDB pretende impor em relação ao Palácio do Planalto. O partido decidiu, ainda, antecipar a reunião do diretório nacional, que irá deliberar sobre o desembarque do governo.

A falta do vice-presidente Michel Temer à posse explicitou o protesto contra a nomeação de Mauro Lopes para a Secretaria de Aviação Civil, realizada após o partido decidir em sua convenção no último sábado que nenhum peemedebista poderia assumir cargos governamentais até que haja uma definição sobre o eventual rompimento com o governo. Segundo pessoas próximas, Temer decidiu permanecer em São Paulo por considerar que a decisão do Planalto é uma “afronta” ao partido. Recluso em na capital paulista desde a terça-feira, o vice- presidente divulgou uma nota demonstrando sua irritação: “O governo resolveu afrontar uma decisão da Convenção Nacional do PMDB nomeando Mauro Lopes”.

— O governo está afrontando a decisão do partido de não nomear novos cargos e com isto tenta desautorizar a decisão majoritária do partido. Temer, como presidente do partido, não pode comparecer à posse de um ministro que representa uma desautorização da decisão do PMDB — disse ao GLOBO a assessoria do vice.

A ausência dos senadores do PMDB à cerimônia foi ainda mais sentida pelo Palácio do Planalto. O acerto foi feito em reunião na noite de quarta- feira no gabinete do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB- AL), até então a principal ponte do governo com o PMDB e maior aposta do ex-presidente Lula para tentar reaglutinar a base aliada.

Oficialmente, Renan Calheiros justificou a falta como uma tentativa de manter “posição isenta” num momento de crise política. Renan disse que o país vive um “momento de exacerbação” e que é preciso esperar a discussão do processo de impeachment na comissão instalada na Câmara ontem. E repetiu o discurso de que não é “governista, nem oposicionista”.

— Mais do que nunca, não posso ser governo e nem oposição. Qualquer presença que permita a leitura que estamos desequilibrando o cenário, perdendo a isenção e partidarizando o debate, não é bom para o país e a democracia — disse Renan.

Mas, segundo interlocutores, o gesto serviu como uma espécie de “protesto branco” sobre toda a conjuntura no governo e também marca uma posição de distância dos senadores, que mantinham postura mais alinhada ao Palácio do Planalto. O líder do PMDB, senador Eunicio Oliveira (CE), e o vice-presidente do partido, Romero Jucá ( RR), acompanharam Renan na decisão. Um dos presentes à reunião dos senadores destacou a dificuldade de o PMDB se manter ao lado do governo neste momento.

— Se a Dilma não nomeasse Lula, o governo acabaria. Com a nomeação do Lula, o governo implodirá — disse um dos presentes.

Sob pressão dos diretórios regionais, a Executiva do PMDB então marcou para a tarde o dia 29 deste mês a reunião que irá definir se o partido desembarcará do governo Dilma Rousseff. A decisão foi tomada ontem, pouco depois da posse. As pressões vieram de diversos filiados, além dos deputados estaduais e da juventude do partido. O pedido nos estados e na juventude é para que o PMDB rompa já com o governo. Apesar da ausência dos dirigentes do PMDB, ministros do partido participam do evento. No início desta semana, os seis ministros peemedebistas reafirmaram seu ao apoio ao governo Dilma Rousseff, após a convenção do PMDB ter demarcado um distanciamento do Palácio do Planalto.

Além do PMDB, a direção do PP também divulgou ontem o requerimento de convocação extraordinária do Diretório Nacional do PP para deliberar sobre a saída do partido da base aliada do governo. Vinte dos 45 deputados e cinco senadores assinaram o documento.

— Não podemos ser o último a sair desse barco. Estou pedindo ao senador Ciro Nogueira, presidente do PP, que examine e convoque uma extraordinária — defendeu a senadora Ana Amélia (PP-RS). (Colaboraram Mariana Sanches e Silvia Amorim)

Cunha exclui PT do comando de comissão

• Dos 65 integrantes, 31 são a favor do impedimento de Dilma, 26 são contra e oito ainda estão indecisos

Leticia Fernandes, Isabel Braga Manoel Ventura - O Globo

No momento mais grave da crise política, líderes fazem acordo e excluem petistas de todos os cargos de comando do colegiado que decidirá se a presidente deve responder a processo de afastamento do cargo

Com o apoio de deputados de partidos aliados do governo, a Câmara elegeu ontem a comissão especial que vai analisar o pedido de impeachment da presidente Dilma. O relator do processo, provocado pelas chamadas “pedaladas fiscais” e que agora inclui as acusações feitas a ela pelo ex-líder e senador Delcídio Amaral, será o líder do PTB, Jovair Arantes ( GO), aliado do presidente da Câmara, Eduardo Cunha ( PMDB- RJ), adversário do Planalto. Rogério Rosso, líder do PSD, presidirá a comissão. 

Dilma foi notificada ontem mesmo e terá prazo de dez sessões do plenário para se defender. Levantamento feito pelo GLOBO mostra que, hoje, 31 dos 65 membros titulares votariam a favor da abertura do processo e 26, contra. Outros estão indecisos. Entre os integrantes da comissão, cinco estão sob investigação da Lava- Jato. Se o pedido de impeachment for aprovado na comissão especial, o processo terá de passar pelo plenário da Câmara, onde são necessários 342 votos para a sua aprovação. E ainda dependerá de aval do Senado. - 

BRASÍLIA- Levantamento feito pelo GLOBO junto aos parlamentares indica que, dos 65 integrantes da comissão especial do impeachment eleitos ontem, 31 são a favor do impedimento da presidente Dilma Rousseff, 26 são contra e 8 ainda estão indecisos.

O presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB- RJ), conseguiu emplacar como relator um de seus aliados mais próximos: o líder do PTB, Jovair Arantes (GO). O acordo, firmado ontem à noite, sem a presença do PT e do líder do PMDB, Leonardo Picciani ( RJ), estabeleceu também que o líder do PSD, Rogério Rosso (DF), presidirá a comissão.

Pelo acordo, o PT foi impedido de participar até mesmo das vice- presidências da comissão, que ficaram com PSDB, PSB e PR. Dilma já foi notificada ontem, e o prazo de dez sessões para a defesa dela começa a correr a partir de hoje.

Na avaliação de aliados, o governo já começa o jogo na comissão em situação desfavorável, mas ainda é possível virar votos em algumas bancadas. Cálculos otimistas dos governistas estimam em 34 os votos contra o impeachment. A avaliação é bem diferente das contas da oposição, que já calcula pelo menos 36 votos para aprovar o impedimento da presidente.

Segundo deputados aliados do governo, apesar do clima bastante adverso em razão do grampo e do desgaste do ex-presidente Lula, tudo dependerá da força dos movimentos nas ruas e também do que pode vir das investigações da Lava- Jato. 

5 investigados na Lava Jato 
Cinco deputados que estão sendo investigados na Lava- Jato estão na comissão do impeachment: o petista José Mentor (SP) e os deputados do PP Aguinaldo Ribeiro (PB), Jerônimo Goergen (PP-RS), Luiz Carlos Heinze (PP-RS) e Roberto Brito ( BA). O governo, para petistas, terá que negociar no varejo com cada um dos deputados da comissão e, depois, em plenário, para evitar que a oposição obtenha os 342 votos a favor da abertura do processo em plenário.

— O país precisa de serenidade, de união. A Constituição Federal não tem lado, é para toda a população. Estou ao lado do povo e vou aguardar o parecer técnico para me posicionar — disse Rosso.

— Estou aqui há 22 anos. Sou próximo de todos os deputados, todos os presidentes que passaram aqui e sou próximo também da presidente da República, porque a ajudei nas causas mais importantes que o Brasil precisou. Isso não me impede e não vai me constranger de maneira alguma. Não quero fazer um jogo de futebol Dilma x Cunha — avisou Jovair Arantes.

O primeiro vice- presidente será Carlos Sampaio (PSDB-SP), o segundo vice, Maurício Quintella Lessa ( PR- AL), líder do PR, e o terceiro vice, Fernando Coelho Filho, líder do PSB.

Segundo Rosso, o rito do processo do impeachment será obedecido sem protelação ou tentativa de atropelo. A intenção da oposição e de alguns aliados é dar celeridade ao processo, garantindo que as 15 sessões previstas no rito — 10 para a defesa de Dilma e 5 para a votação na comissão — sejam vencidas em três semanas.

Por isso, deputados serão escalados para garantir quorum mínimo de 51 para abrir a sessão nos cinco dias da semana.

A sessão de escolha da comissão foi tensa. A chapa com os 65 titulares foi eleita por 433 votos favoráveis e apenas um contra, o do deputado Airton Cirilo (PT-CE). Nela estão os 24 partidos com representantes na Câmara. No PMDB, com a desistência de José Priante ( PA), o líder Picciani tentou indicar Altineu Côrtes ( RJ), que ontem saiu do PR para o PMDB. Cunha rejeitou, alegando que a mudança ainda não tinha sido oficializada. Foi eleito para vaga Leonardo Quintão (MG), favorável ao impeachment, empatando em 4 a 4 os votos do partido.

Ações unificadas no TSE
No Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o presidente, ministro Dias Toffoli, decidiu unificar as quatro ações que pedem a cassação da presidente Dilma Rousseff e do vice, Michel Temer. A medida foi tomada para facilitar a tramitação do caso e evitar que o TSE tome decisões diferentes em processos semelhantes. Já foram incluídas na ação provas da Lava- Jato.

Aliados de Cunha são eleitos presidente e relator da Comissão de impeachment

• Acordo entre membros do governo e da base aliada viabilizou indicação de Rogério Rosso para a presidência e Jovair Arantes para a relatoria

Igor Gadelha, Bernardo Caram, Daiene Cardoso, Daniel Carvalho e Julia Lindner - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Aliado do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), o deputado federal Rogério Rosso (PSD-DF), foi eleito na noite desta quinta-feira, 17, presidente da Comissão Especial da Casa que dará parecer sobre o processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff. Também aliado de Cunha, o deputado Jovair Arantes (PTB-GO) foi escolhido relator do processo no colegiado.

Após acordo entre a maioria dos partidos, Rosso e Jovair foram escolhidos em votação de chapa única, aprovada por 62 votos favoráveis. Houve ainda três abstenções dos representantes dos representantes do PSOL, PTN e Rede na comissão, que alegaram que não participaram do acordo fechado entre as demais legendas para a escolha dos vice-presidentes eleitos.

Na chapa eleita, o deputado Carlos Sampaio (SP), coordenador jurídico do PSDB, foi escolhido primeiro vice-presidente da comissão. O líder do PR na Câmara, Maurício Quintella (AL), por sua vez, será o segundo vice-presidente, enquanto o terceiro vice será o deputado Fernando Bezerra Filho (PE), líder do PSB na Casa.

Apesar de ser da base aliada, Rogério Rosso, que é líder do PSD na Câmara, ainda não se posicionou oficialmente sobre o impeachment. Nos bastidores, contudo, já admite a aliados que poderá votar a favor do impedimento de Dilma. Nessa quarta, ele comentou a conversa telefônica vazada entre a presidente Dilma e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Rosso avaliou como "gravíssimo" o teor da conversa, que, na avaliação de líderes da oposição, Dilma demonstra ter nomeado Lula para a Casa Civil apenas para que ele passasse a ter foro privilegiado. Para o líder do PSD, a divulgação da conversa "balança" a base aliada do governo. "Pode estar ferindo princípio constitucional", afirmou.

Arantes, por sua vez, é líder do PTB na Câmara. Seu partido já adota postura "independente" na Casa. Apesar de estar a frente do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, o partido diz que a indicação de Armando Monteiro para o cargo faz parte da cota pessoal da presidente Dilma Rousseff.

Acordo. Membros do governo e da base aliada passaram cerca de duas horas reunidos nesta quinta-feira e, após confusão, chegaram a um acordo sobre os nomes de Rosso.

Ambos são conhecidos como aliados do presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), responsável por deflagrar o processo de impeachment contra Dilma. Os nomes foram decidios em reunião, nessa quarta-feira, 16, entre Cunha e membros do PSDB e do DEM. Com o acordo do governo e da base aliada em optar pelos mesmos nomes da oposição, eles devem ser eleitos nesta quinta. Para o líder do governo na Casa, José Guimarães (PT-CE), a decisão "visa a estabilidade do País".

Ao ser questionado sobre a aproximação dos dois candidatos com Cunha, Guimarães disse que o processo segue a normalidade. "Eu me reúno com tanta gente aqui, com o Cunha, com todos eles, portanto isso não é problema nenhum. Aliás, ele ainda é presidente da Câmara, então não é motivo de restrição nenhuma", afirmou o líder do governo. "Essa foi uma construção que integra dois partidos da base, apostamos na confiança que nós temos que eles farão um trabalho sério, não serão instrumento de ninguém, mas serão instrumento da estabilidade política."

A decisão de acordo não foi unânime, o vice-líder do governo, Sílvio Costa (PT do B-PE), discutiu com os parlamentares. "É melhor perder do que ganhar sem ganhar", disse o vice-líder sobre o acordo que estava sendo costurado. Em seguida, saiu da reunião. Nos bastidores, alguns deputados disseram que ele havia se oferecido para ser o relator da comissão, o que foi negado pelos demais. Um dos membros da base aliada afirmou que neste momento é preciso colocar "bombeiros" na liderança da comissão, e não "incendiários" como Sílvio.

Entre os participantes do encontro estavam o líder do PMDB na Câmara, Leonardo Picciani (RJ), o líder do PR, Maurício Quintella (AL) e o líder do PP, Aguinaldo Ribeiro (PB).

Oposição sai à frente na comissão do impeachment

Por Raphael Di Cunto e Thiago Resende - Valor Econômico

BRASÍLIA - A oposição largou na frente na busca de votos para aprovar o impeachment da presidente Dilma Rousseff na comissão especial criada na Câmara dos Deputados para analisar o assunto. Segundo levantamento feito pelo Valor, dos 65 integrantes da comissão, 32 são favoráveis ao impedimento, 29 são contrários e 4 ainda não têm opinião.

Os números podem mudar graças à dinâmica própria do processo de impeachment. Os quatro deputados do PR que, a princípio, votariam com o governo, já começam a repensar. "Cada um votará com a sua consciência", disse o líder do partido, Maurício Quintella (AL). A oposição acredita que parlamentares do PSD e do PP, que hoje declaram voto contra o impedimento, podem mudar de posição nos próximos dias.

Os partidos aliados ao governo teriam 38 cadeiras (58% dos votos), mas houve rebelião. Entre os integrantes indecisos estão os líderes do PSD, Rogério Rosso (DF), e do PTB, Jovair Arantes (GO), eleitos, respectivamente, presidente e relator da comissão.

Comissão Especial tende para impeachment
A oposição está em vantagem na comissão da Câmara dos Deputados que analisará o impeachment da presidente Dilma Rousseff, mostra levantamento do Valor com os parlamentares, líderes e assessores. Dos 65 integrantes eleitos ontem, pelo menos 32 já se manifestaram a favor do afastamento da petista.

O governo conta, hoje, com o apoio de 29 titulares da comissão e há quatro auto-proclamados indecisos, mas a tendência de pelo menos três é votar com a oposição. A falta de apoio, e a demora em negociar os nomes para o comando do colegiado, fez o governo aceitar a imposição do líder do PSD, Rogério Rosso (DF), para a presidência da comissão e o líder do PTB, Jovair Arantes (GO), para a relatoria.

O Planalto só foi negociar as indicações na tarde de ontem e tentou vender a imagem de que os dois foram escolhas suas. Mas a decisão ocorreu na noite anterior, na casa do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), do qual os dois são aliados. Ambos se declaram "indecisos" sobre o afastamento de Dilma. "Meu patrono é o povo brasileiro", disse Rosso.

"Melhor perder no voto do que ganhar perdendo", protestou o vice-líder do governo Silvio Costa (PTdoB-PE) ao deixar a reunião da base. PT e PMDB foram excluídos de todos os cargos de direção do colegiado. Em caso de ausência de Rosso, o PSDB presidirá as sessões.

O presidente tem a capacidade de alongar ou encurtar prazos e marcar quando ocorrerão as oitivas. O relator dará o parecer que será votado primeiro na comissão e depois no plenário da Câmara afirmando se há indícios de que Dilma cometeu crime de responsabilidade que justifique a saída.

A princípio, os partidos da base teriam a 38 cadeiras (equivalente a 58% dos votos). Mas, por pressão dos dissidentes, que ameaçaram depor os líderes caso não houvesse a distribuição das vagas proporcional ao pensamento de cada grupo, as legendas dividiram parte das cadeiras com as alas de oposição. PMDB, PP e PSD fizeram essa divisão, o que reduziu o apoio ao governo. O PTB, que está a frente do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, só indicou favoráveis ao impeachment.

Se a oposição formar maioria - o que pode ocorrer com mais dissidências na base ou o Rede, de oposição, decidir votar favoravelmente ao afastamento-, terá o controle da comissão e poderá aprovar requerimentos para, por exemplo, convocar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Há 219 requerimentos até agora.

Com a instalação e a notificação de Dilma, começa o prazo de 10 sessões de plenário para que a petista apresente sua defesa e cinco sessões para votar o parecer, que depois vai ao plenário independentemente de defender o arquivamento ou pelo prosseguimento da denúncia. Se pelo menos 342 deputados, de 512 possíveis, votarem a favor do impeachment, o pedido será encaminhado para que o Senado Federal processe a presidente da República. O prazo de tramitação na Câmara fica entre 30 e 45 dias.

Justiça decidirá futuro de Lula no ministério

- Valor Econômico

BRASÍLIA E SÃO PAULO - O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva tomou posse ontem na Casa Civil em clima de comício e com direito a palavras de ordem cantadas pela militância petista. Enquanto a solenidade ocorria no Palácio do Planalto, o juiz da 4ª Vara da Justiça Federal, Itagiba Catta Preta, suspendia a nomeação. Em liminar, afirmou que a posse e o exercício do cargo por Lula "podem ensejar intervenção indevida e odiosa" na atividade policial, do Ministério Público e do Judiciário. No fim da tarde, outra liminar foi concedida pela 6ª Vara Federal do Rio. À noite, o Tribunal Federal do Distrito Federal cassou a primeira liminar.

O governo Dilma Rousseff enfrenta forte resistência para manter Lula no posto. O Supremo Tribunal Federal já recebeu dez ações contra a posse do ex-presidente. O ministro Teori Zavascki é relator de duas ações, movidas por PSB e PSDB. Ele pediu informações à Advocacia-Geral da União e à Procuradoria-Geral da República e deu prazo de cinco dias para que as partes se manifestem. O ministro Gilmar Mendes é relator de outras quatro petições.

A posse de Lula foi boicotada pelas lideranças do PMDB e desencadeou protestos por todo o país. Em São Paulo, manifestantes fecharam o trânsito durante todo o dia na avenida Paulista, em frente à Fiesp.

O ministro do Supremo, Celso de Mello, classificou como "insulto" as declarações de Lula sobre o STF em conversa telefônica interceptada pelo Polícia Federal. Mello disse que a fala é "absolutamente inaceitável e passível da mais veemente repulsa", porque "ofendeu gravemente a dignidade institucional do Poder Judiciário". Na gravação, Lula afirma que o Supremo está "totalmente acovardado", assim como o Superior Tribunal de Justiça e o Parlamento.

Para tentar diminuir o impacto negativo de suas declarações, o ex-presidente divulgou à noite uma carta aberta em que afirma sua confiança e respeito ao Judiciário.

O governo reagiu à divulgação das interceptações telefônicas entre Dilma e Lula. Os ministros da Advocacia-Geral da União, José Eduardo Cardozo, e da Justiça, Eugênio Aragão, externaram a avaliação do governo sobre a "evidente ilegalidade" na divulgação das escutas. Cardozo disse que o juiz Sérgio Moro não tinha competência para divulgar as gravações e, sim, o STF. A defesa de Lula vai pedir a nulidade das gravações e seus advogados pretendem apresentar ao Conselho Nacional de Justiça reclamação contra Moro, por desvio funcional.

Contagem regressiva para o impeachment - Roberto Freire

- Diário do Poder

Desde que milhões de brasileiros tomaram as ruas de todo o país, no último domingo, 13 de março, para pedir o impeachment, uma sucessão avassaladora de acontecimentos fez disparar a contagem regressiva para que viremos esta triste página de nossa história. As gravações autorizadas pela Justiça que trouxeram à tona conversas pouco republicanas envolvendo Dilma Rousseff, o ex-presidente Lula e diversas autoridades do governo e do PT escancaram à sociedade a necessidade de retirarmos do poder a organização criminosa que dele se apoderou.

Nas últimas horas, assistimos a novas manifestações populares de indignação contra a desfaçatez daqueles que utilizam sua influência para solapar as instituições e a própria democracia. O estágio de degradação política e moral é tamanho que os brasileiros já não aguentam e não querem mais esperar. Milhões voltaram às ruas exigindo a destituição de Dilma por meio do instrumento constitucional do impeachment ou pedindo sua renúncia, além da prisão de Lula. Nas conversas gravadas pelas autoridades, está caracterizada a tentativa de obstrução das investigações da Operação Lava Jato - o que só reforça o crime de responsabilidade cometido pela presidente da República e a perda de todas as condições morais e políticas para que ela permaneça no cargo.

Horas antes da divulgação das gravações, o atual governo já havia debochado dos brasileiros ao nomear Lula, investigado por corrupção, ministro-chefe da Casa Civil. Trata-se, como ficou claro nos diálogos grampeados pela Polícia Federal, de uma sórdida tentativa do ex-presidente de fugir da Justiça, obtendo o foro privilegiado e escapando da alça de mira do juiz Sérgio Moro na Vara de Curitiba - deixando que sua família responda sozinha ao juízo de primeira instância pelos eventuais crimes cometidos, enquanto o chefe do PT seria julgado pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

Com Lula no ministério, o Brasil passa a viver a experiência constrangedora de um presidencialismo de fancaria no qual Dilma se transforma em uma figura meramente decorativa. Na condição de tutor de sua sucessora, o ex-presidente volta a mandar e desmandar no governo, desafiando o decoro, o bom senso e, principalmente, o desejo da parcela majoritária da população brasileira.

A velocidade dos acontecimentos é tão grande que, a esta altura, poucos se lembram do conteúdo explosivo da delação premiada do senador Delcídio do Amaral, que referendou o que as gravações autorizadas por Moro explicitaram ao país. Segundo ele, Dilma e Lula não só sabiam do esquema criminoso da Petrobras como fizeram de tudo para barrar as investigações da Lava Jato. O ainda ministro da Educação, Aloizio Mercadante, teria tentado comprar o silêncio de Delcídio, o que configura mais uma vez a tentativa de obstrução da Justiça. O PT, de fato, não tem limites.

O desmantelo deste governo que já não mais governa chegou a tal ponto que Dilma sequer tem capacidade de nomear seu novo ministro da Justiça sem infringir a Constituição Federal. Primeiro, escolheu para a pasta Wellington César, membro do Ministério Público, o que é vedado pelo artigo 128, parágrafo 5º, inciso II, alínea d, da Carta Magna – e o próprio Supremo tratou de referendar a inconstitucionalidade da escolha. Como se não bastasse tamanha humilhação, a presidente o substituiu por Eugênio Aragão, subprocurador-geral eleitoral e, portanto, também membro do MP. A indicação será, evidentemente, contestada no Judiciário.

O fato é que, a cada dia, fica ainda mais evidente o total esgotamento do governo lulopetista, que nada faz além de tentar evitar o impeachment e cometer crimes para barrar as investigações da Lava Jato. A nomeação desesperada de Lula para a Casa Civil, como os brasileiros deixaram claro ao ir às ruas, não impedirá o desenrolar do processo que já foi iniciado na Câmara dos Deputados. A comissão do impeachment será criada nas próximas horas e, a partir daí, o afastamento democrático e constitucional da pior presidente de nossa história republicana será apenas uma questão de tempo.

Dilma, Lula e a organização criminosa que tomou de assalto o Estado brasileiro devem ser detidos pela força da lei e das instituições. O país não aceita mais o deboche, o acinte, o escárnio daqueles que imaginam estar acima do bem e do mal. O relógio disparou. A contagem regressiva já começou. O impeachment vem aí, pelo bem do Brasil.

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Roberto Freire é deputado federal por São Paulo e presidente nacional do PPS

Comportamento rasteiro - Merval Pereira

- O Globo

Grampo revela um Lula sexista e autoritário. O Lula que as gravações liberadas pela Operação Lava- Jato revelam é um político autoritário, com uma visão nada republicana do país, que exige lealdade e gratidão daqueles que nomeou, e trata com desdém os adversários e as instituições públicas, e um homem sexista, que faz piadas de profundo mau gosto e referências grosseiras a militantes femininas de seu entorno.

O ex-presidente Lula revela ainda um tremendo desprezo pela democracia que diz respeitar, instruindo seus seguidores a agirem com violência contra adversários, para que estes sintam receio de se oporem aos petistas. Diz a seu irmão Vavá, por exemplo, que os “coxinhas” que chegarem perto de sua casa vão levar uma surra dos sindicalistas que estão de guarda.

Uma dessas conversas mais reveladoras do caráter de Lula é justamente com a presidente Dilma, onde diz que “temos uma Suprema Corte totalmente acovardada, um Superior Tribunal de Justiça totalmente acovardado, um Parlamento totalmente acovardado. Temos um presidente da Câmara fodido, um presidente do Senado fodido, não sei quantos parlamentares ameaçados. Fica todo mundo no compasso de que vai acontecer um milagre.”

Coube ao decano do STF, ministro Celso de Mello, dar uma resposta à altura, pois o presidente atual, Ricardo Lewandowski, não iria falar, embora tenha sido citado diversas vezes. Tanto que iniciou a sessão de ontem lendo a pauta e chamando o primeiro processo, como se nada estivesse acontecendo no país. Celso de Mello pediu a palavra e externou o sentimento majoritário da mais alta Corte de Justiça do país:

“Esse insulto ao Poder Judiciário, além de absolutamente inaceitável e passível da mais veemente repulsa por parte desta Corte Suprema, traduz, no presente contexto da profunda crise moral que envolve os altos escalões da República, reação torpe e indigna, típica de mentes autocráticas e arrogantes que não conseguem esconder, até mesmo em razão do primarismo de seu gesto leviano e irresponsável, o temor pela prevalência do império da lei e o receio pela atuação firme, justa, impessoal e isenta de juízes livres e independentes, que tanto honram a magistratura brasileira e que não hesitarão, observados os grandes princípios consagrados pelo regime democrático e respeitada a garantia constitucional do devido processo legal, em fazer recair sobre aqueles considerados culpados, em regular processo judicial, todo o peso e toda a autoridade das leis criminais de nosso País”.

Em outra conversa, Lula faz uma piada sexista sobre sua assessora Clara Ant, que provoca gargalhadas em Dilma: “Entraram cinco homens na casa dela, ela pensou que fosse um presente de Deus, mas era a Polícia Federal”. Em outra conversa, com Jaques Wagner, os dois gozam os problemas que a senadora Marta Suplicy teve nas manifestações: “A Marta teve que se trancar na Fiesp. Foi chamada de puta, vagabunda, vira- casaca”, diz Lula, ao que Wagner responde: “É bom para nega aprender.”

Tanto quando fala com Wagner para que Dilma pressione a ministra Rosa Weber, quanto com o ex-ministro Vannuchi, Lula trata as mulheres de maneira, no mínimo, grosseira. “Se homem não tem saco, quem sabe uma mulher corajosa possa fazer o que os homens não fizeram”, diz sobre a ministra. E, ao falar sobre a necessidade de mobilizar as mulheres do partido para assediar um juiz de Rondônia acusado de maltratar a mulher, Lula pergunta: “Cadê as mulheres de grelo duro do PT?”.

O ex-presidente Lula mostra bem seu “republicanismo” quando manda o ministro da Fazenda Nelson Barbosa ver o que a Receita Federal está fazendo no Instituto Lula. Cobra de Rodrigo Janot, o procuradorgeral da República, gratidão por ter sido nomeado, e recebeu de troco o comentário de que ministério não blinda ninguém, e que não deve a Lula gratidão nenhuma.

Com o deputado petista Wadih Damous, que já foi presidente nacional da OAB e está no Congresso graças a uma manobra de Lula, pois era suplente do PT, o ex- presidente mostra toda a sua visão “democrática”, quando fala sobre o juiz Sérgio Moro e os procuradores da Lava- Jato: “Bicho, eles têm que ter medo. Eles têm que ter preocupação...”.

Enfim, para quem é tido como um grande articulador político, Lula queimou todas as pontes e revelou-se um desqualificado, com um padrão moral rasteiro.

O poder a serviço da ilegalidade - Dora Kramer

- O Estado de S. Paulo

Depois de criminalizar a política, o PT tenta agora politizar o crime. Mais grave: faz isso sob o patrocínio da Presidência da República, ora em via de ser exercida por duas pessoas ao mesmo tempo.

Não bastasse a situação já ser por si suficientemente anômala sob qualquer ângulo que se examine, acrescenta-se a ela o fato de que o “presidente” nomeado pela presidente eleita é alvo de seis inquéritos no Ministério Público Federal, outro no MP do Distrito Federal e uma denúncia apresentada pelos procuradores de São Paulo. Luiz Inácio Lula da Silva passa à jurisdição do Supremo Tribunal Federal, mas leva junto essa folha corrida para o Planalto.

Provavelmente, imaginando-se agora respaldada pela aludida “identificação” de Lula com o povo e pela determinação demonstrada por ele nas gravações divulgadas pelo juiz Sérgio Moro, de movimentar a máquina do Estado em sua defesa, a presidente Dilma Rousseff abandonou qualquer cautela inerente ao cargo para, durante a cerimônia de posse, criticar de maneira contundente os agentes da lei responsáveis pelas investigações em curso.

Ela o fez em tom inflamado, consoante ao ambiente misto de assembleia sindical e comício partidário que tomou conta do Palácio na posse de Lula. A ponto de saudar as dezenas de presentes como os “brasileiros de coragem que estão aqui nesta sala”. Por essa ótica, os milhares que estavam do lado de fora em vários pontos do País manifestando-se contra, seriam covardes.

Além de ter dado, com a nomeação de Lula, resposta oposta aos protestos de milhões de brasileiros no domingo, a presidente da República ainda desdenhou de todos ao falar à militância petista como se ela representasse a maioria – e não o contrário – convocando-a à reação. Poderá, e certamente irá, colher mais tempestades ao aderir à ofensiva agressiva proposta por Lula.

Dilma estendeu-se sobre o tema da legalidade ignorando a evidência de que é o governo quem está do lado sombrio da lei. Há a condição legal de Lula e, em decorrência do diálogo mantido com ele em uma das gravações, sobre o uso do termo de posse, há a possibilidade de ela ser alvo de investigação e de novos pedidos de impeachment.

Em palavras claras: o poder no Brasil está nas mãos de dois chefes com calcanhares de aquiles. Calcanhares estes expostos à caça de agentes da lei e do Congresso. Em sua já provada incapacidade de governar, que a levou à total fragilização, Dilma não teve opção; curvou-se às conveniências do momento acreditando que a entrada de Lula no governo seria um bote salva-vidas para ambos. Estava, como sempre, equivocada.

O problema maior, no entanto, não é o erro de avaliação. É a suposta solução ter sido urdida em ambiência de ilegalidades e impropriedades tão flagrantes que incentivou as pessoas a voltarem às ruas, desta vez para pedir explicitamente a renúncia de Dilma e a prisão de Lula.

O discurso de ontem da presidente não contribui para acalmar os ânimos. Por outra, inflama a indignação reinante na sociedade e incentiva a animosidade de seus defensores.

Boa coisa não poderá resultar daí. Queira o bom senso que o governo não esteja apostando no caos que gera violência e produz vítimas.

Os riscos de atacar Moro – Bernardo Mello Franco

- Folha de S. Paulo

O governo saiu da defensiva e decidiu adotar a tática do confronto com o juiz Sergio Moro. A guerra foi declarada por Dilma Rousseff ao dar posse ao padrinho Lula na chefia da Casa Civil.

A presidente protestou contra os grampos da Lava Jato e se disse alvo de uma "conjuração". Ela sustentou que seus direitos constitucionais foram violados com a divulgação de conversas telefônicas.

"Os golpes começam assim", afirmou Dilma, acusando o juiz de tentar "convulsionar a sociedade brasileira em cima de inverdades, de métodos escusos e de práticas criticáveis".

O discurso foi reforçado por aliados da presidente. O novo ministro da Justiça, Eugênio Aragão, sugeriu que Moro cometeu crime ao divulgar o grampo. O líder do governo no Senado, Humberto Costa, acusou o juiz de conduta "ilegal e arbitrária".

A ofensiva empolgou a militância petista, mas é uma estratégia arriscada para o governo. A atuação midiática transformou Moro em herói das passeatas pró-impeachment. Torná-lo alvo pode ser uma forma de engrossar os protestos nas ruas.

As críticas de Dilma também inflamaram setores da Justiça e do Ministério Público que já estavam politizados. O ministro Gilmar Mendes, sempre ele, começou a dar entrevistas antes das nove da manhã. O procurador Deltan Dallagnol fez uma espécie de comício em Curitiba. O próprio Moro comparou Dilma a Richard Nixon, presidente americano que renunciou para não ser cassado.

Neste clima de engajamento, um juiz que milita contra o governo nas redes sociais não se considerou impedido para conceder a liminar que suspendeu a posse.

Para azar do Planalto, um dos grampos divulgados por Moro também mexeu com os brios do Supremo Tribunal Federal, que Lula chamou de "acovardado" ao telefone. A reação enérgica do ministro Celso de Mello indicou que o ex-presidente não deve esperar simpatia da corte, com ou sem foro privilegiado.

Todo poder no Judiciário - César Felício

• Protagonismo da Justiça é crescente e internacional

- Valor Econômico

Uma posse de ministros boicotada pelo PMDB era o destaque do noticiário de 18 de março de 2014, o dia seguinte da deflagração da Operação Lava-Jato. O Brasil vivia os preparativos de um processo eleitoral e o eixo do poder transitava entre partidos, o Palácio do Planalto e o Legislativo.

Parecia mais importante a cota pemedebista na Esplanada no momento em que Dilma montava sua aliança do que a prisão do operador Enivaldo Quadrado, relegado a um canto discreto do noticiário. Ainda não se percebia que Quadrado era um figurante na orquestração de Alberto Youssef.

É complicado atribuir a destruição da Presidência de Dilma Rousseff apenas ao juiz Sergio Moro. A fundamentação do pedido de impeachment que tramita contra ela atualmente, questionável ou não, passa ao largo das questões de natureza jurídico-policial. O tema de fundo é o labirinto econômico em que o país está metido. É razoável pensar que o mandato de Dilma poderia ser questionado mesmo sem as 63 delações premiadas que lastreiam a operação hoje.

O lance arriscado de Moro ao dar publicidade a um áudio que compromete nada menos que a presidente da República e o caos e desastre em que se transformou a posse de Luiz Inácio Lula da Silva na Casa Civil fazem pensar que os principais efeitos da Lava-Jato ainda possam ser vistos no futuro.

Hoje o Poder Judiciário claramente se sobrepõe ao Executivo e ao Legislativo, uma vez que se constata o total comprometimento da linha sucessória. Desestabiliza qualquer arranjo entre os outros dois Poderes para a costura até 2018 e depois de 2018. Não há como escapar de seu espírito. Não há como fugir de sua presença. Está na asas da alvorada e na profundidade do mar, e nem as trevas prevalecem sobre ele, como o Deus onipresente do salmista.

Há especialistas como o professor Michael Mohallem, da Fundação Getulio Vargas do Rio, que acreditam que o foro privilegiado de Lula fará com que o Judiciário exerça a autocontenção e defina os próprios limites, o que significa calibrar a Operação Lava-Jato, mas não necessariamente dar sobrevida a Lula, como indicou a duríssima fala contra o ex-presidente feita pelo ministro Celso de Mello, o decano do Supremo. "A República, além de não admitir privilégios, repudia a outorga de favores especiais e rejeita a concessão de tratamentos diferenciados aos detentores do poder ou a quem quer que seja", advertiu Mello, segundo relato da repórter Carolina Oms, em um sinal que o foro privilegiado pode colocar Lula em uma situação ainda mais delicada que o mal que poderia lhe ser feito em Curitiba.

Sob a enganosa proteção do foro, Lula pode partir para uma ofensiva muito mais concreta para restaurar o primado do Executivo e do Legislativo no jogo político: usar seu posto na Casa Civil para mudar o arcabouço legal e tentar assim uma nova blindagem. Por este modelo, mencionado como uma possibilidade pelo professor de Direito Penal da Universidade Mackenzie, Evandro Fabiani Capano, Lula seria algo como um novo Berlusconi.

O magnata italiano, três vezes primeiro-ministro da Itália, usou seus poderes para atuar no processo legislativo, diminuindo prazos de prescrição de crimes e tentando manietar a Justiça. Berlusconi governou por nove anos somados e foi o mais longevo mandatário italiano desde Mussolini. Um dos juízes protagonistas da Operação Mãos Limpas, Antonio di Pietro, terminou com 461 processos por danos morais.

A blindagem que Berlusconi conseguiu usando seu poder não foi tão perfeita, tanto que terminou excluído da vida política em 2013, mas demonstrou a resiliência dos meios e modos de se fazer política em seu país, frente ao furor renovador do Judiciário.

A dimensão política da ofensiva de Lula levou Moro a cruzar uma fronteira. Dar publicidade aos áudios não era necessário do ponto de vista técnico. Ao fazê-lo, Moro tomou uma decisão tão política quanto a de Dilma, comentou o juiz Max Paskin Neto, da comarca da justiça estadual em Maringá (PR), terra natal de Moro. Paskin Neto é um admirador do juiz da 13ª Vara Federal, mas afirma que a divulgação dos áudios, que teve seguimento ontem, foi um movimento reativo, mais que proativo.

O protagonismo do Judiciário na cena brasileira não nasceu no dia 18 de março de 2014. Começou a ser delineado em 1988, com a nova Constituição. Ganhou impulso com a adoção de mecanismos de autocontrole que garantiram ao Judiciário a independência, a partir da reforma constitucional de 2004, como assinala a pesquisadora Grazielle Albuquerque, que desenvolve doutorado na Unicamp sobre o aumento da exposição midiática da justiça.

O protagonismo do Judiciário também não é um fenômeno verde e amarelo. Ele se deu em velocidade semelhante a que se deu em outros países da América Latina que passaram por um processo de redemocratização.

Diminuiu no Brasil, como em países vizinhos, a noção clássica de que o poder Judiciário é inerte, age apenas quando demandado, dirimindo conflitos entre indivíduos e Estado e entre os Poderes.

Nos últimos anos, o Judiciário afasta-se destes princípios e avança em uma interpretação dinâmica da lei. É uma aproximação, guardada as diferenças, do modelo americano, em que a lei, por este ponto de vista, é uma sugestão, e não um mandamento.

Em países como os da América Latina, a proatividade do Judiciário fatalmente leva a uma reação dos palcos tradicionais da política, os poderes Legislativo e Executivo, em que se expressa a vontade popular. A gigantesca ofensiva representada pela Operação Lava-Jato aguarda uma reação, que poderá vir com Lula ou com o grupo político que vier a suceder o petismo.

Fim de festa - Eliane Cantanhêde

- O Estado de S. Paulo

Posses de ministros, especialmente de um chefe da Casa Civil, são solenidades concorridas que lotam o principal salão do Palácio do Planalto com políticos, empresários, líderes dos mais variados setores da sociedade. Imagine-se se esse superministro já foi presidente da República e desceu a rampa há apenas cinco anos, com 80% de popularidade! Pois não foi nada disso que se viu ontem na posse de Lula, que virou um evento do PT, ao som de “não vai ter golpe”.

Nada poderia ilustrar de forma tão contundente o isolamento do governo Dilma Rousseff e o esvaziamento da força política e do encanto de Lula. Mas o pior nem foi a falta de figurões da sociedade, mas sim a do PMDB e do vice Michel Temer. Caso típico em que uma ausência foi mais estridente do que todas as presenças.

Significa que o impacto positivo de Lula como superministro não resistiu 24 horas. Foi atropelado pelos protestos na porta do Planalto, pelas gravações de Lula e Dilma, pelas liminares concedidas por mais de um juiz e acabou empurrado para o terceiro plano com a criação da comissão do impeachment na Câmara, horas depois da posse que não valeu.

Se Lula foi a estrela da quarta-feira, já na quinta era considerado fato velho, enquanto o foco se desviava para Temer e para o PMDB, que vão se transformando no polo aglutinador dos partidos que entram na fila para se desgarrar de um governo moribundo. O PSB já tinha caído fora, ontem foi o PRB, agora é a vez do PP. Até a ministra Kátia Abreu está de saída.

Foi para evitar a debandada que Lula, ao aceitar a saída mequetrefe de virar superministro, avisou para Dilma que sua prioridade seria segurar o PMDB. Mas Lula, apesar de toda a sua genialidade política, vem sucumbindo ao peso da própria crise pessoal e comete um erro atrás do outro. Está mal no PMDB, na PGR, no STF...

Enquanto telefonava para Temer, José Sarney, Renan Calheiros e sabe-se lá mais quem, ele articulava com Dilma a cooptação do deputado Mauro Lopes (PMDB-SP) para a Secretaria de Aviação Civil, com direito a anúncio e posse ao lado do mito Lula, dias depois da convenção em que o PMDB proibiu seus filiados de aceitarem cargos no governo.

Foi uma afronta que deu, de mão beijada, o pretexto que Temer e o PMDB queriam para se distanciar de Dilma, Lula, PT e todas as crises do governo, potencializadas pela decisão de Dilma de levar para dentro do Planalto o juiz Sérgio Moro, a Lava Jato, a Zelotes, Lula, os filhos, o tríplex, o sítio e as empreiteiras que destruíram a Petrobrás. Como se ela, Dilma, já não tivesse crises suficientes...

Nomear o tal de Lopes numa hora dessas foi de uma burrice política inacreditável. Péssimo para a estratégia de Lula de se reaproximar do PMDB, excelente para a decisão do PMDB de se distanciar a galope de Lula e Dilma. Tanto que, além de não ir à posse de Lula, Temer cancelou uma conversa que teria com ele ontem, em São Paulo. Ato contínuo, assinou, como presidente do PMDB, um ato antecipando em duas semanas, para o próximo dia 29, a reunião do diretório nacional do partido que deverá formalizar a “independência” – ou o “rompimento”, puro e simples, dependendo de como as coisas caminhem até lá, sobretudo nas ruas.

O afastamento, já em si grave, se torna desesperador diante da instalação da comissão do impeachment no momento mais crítico do governo. O PSDB e seus aliados na oposição são o lado minoritário. O PT e a base de Dilma, o majoritário. Quem tem número e força para mexer nesse equilíbrio é o PMDB, ímã da dissidência governista.

Como a história ensina, governos só caem quando a dissidência encorpa, a traição se generaliza e o “povo” vai para a rua, como no fim do regime militar e na queda de Fernando Collor. Ah! E caem também quando posses espetaculares em palácio viram grito de guerra de um só partido.