domingo, 23 de fevereiro de 2020

Opinião do dia - José Arthur Giannotti*

O PSDB nunca foi, de fato, um partido. O PT foi consumido pelas corporações e pela burocracia e não zelou pela honestidade pública. E agora vivemos num populismo ligado a milícias.

A esquerda precisa fazer uma boa análise do capitalismo contemporâneo, mas ninguém fez isso ainda. Você conhece algum texto que trate disso? Se sim, me indique, por favor, que eu vou ler agora.


*José Arthur Giannotti, filósofo, professor emérito do Departamento de Filosofia da Universidade de São Paulo (USP). Revista Época, 24.02.20

Luiz Carlos Azedo - Cabo Anselmo

- Nas entrelinhas | Correio Braziliense

“Bolsonaro tem uma militância armada e radicalizada muito numerosa, que intimida pela truculência, não apenas nas redes sociais. Aonde isso vai parar, ninguém sabe ainda”

É domingo de carnaval, mas vou falar de coisa séria. José Anselmo dos Santos, o Cabo Anselmo, nasceu em 13 de fevereiro de 1941, em Sergipe. Foi um dos protagonistas do golpe militar de 1964, atuando como um agente provocador. Em 1962, filiou-se à Associação dos Marinheiros e Fuzileiros Navais do Brasil (AMFNB), da qual se elegeu presidente. Em 25 de março de 1964, durante as comemorações do 2º aniversário da AMFNB no Sindicato dos Metalúrgicos do Rio de Janeiro, protestou contra a punição imposta a 12 dirigentes da associação por apoiarem as reformas de base propostas pelo então presidente da República, João Goulart.

O cenário era de radicalização política: derrotado no Congresso, e diante da forte oposição dos governadores da antiga Guanabara, Carlos Lacerda; Minas Gerais, Magalhães Pinto; e São Paulo, Adhemar de Barros, Goulart resolvera se apoiar nos sindicatos de trabalhadores e nas ligas camponesas. Os marinheiros, porém, roubaram a cena: decidiram não acatar a ordem de prisão dada aos colegas e permanecer no prédio do sindicato. No dia 26, parte dos fuzileiros navais enviados pelo ministro da Marinha, almirante Sílvio Mota, para reprimir o levante, aderiu ao movimento. Diante da recusa do comandante do Corpo de Fuzileiros Navais, almirante Cândido Aragão, em sufocar o motim, Sílvio Mota recorreu à Polícia do Exército e demitiu Aragão.

Goulart acabou se colocando ao lado dos marinheiros, gerando uma crise na Marinha, que culminou com a saída de Sílvio Mota, a nomeação do almirante Paulo Mário da Cunha Rodrigues para a pasta e a recondução de Cândido Aragão ao comando do Corpo de Fuzileiros Navais, além da libertação dos amotinados. No dia 28, José Anselmo, comemorou a vitória com uma passeata de marinheiros pelo centro do Rio, e, no dia 30, levou o presidente Goulart ao ato promovido pela Associação de Subtenentes e Sargentos da Polícia Militar, no Automóvel Clube do Rio de Janeiro. Envolver-se com os amotinados foi um erro fatal do presidente da República, era o pretexto que faltava para que os principais líderes militares da época, à frente o marechal Castelo Branco, assumissem o poder.

Cassado pelo Ato Institucional nº 1, em abril, José Anselmo asilou-se na embaixada do México. Quinze dias depois, deixou a embaixada, mas foi preso no dia seguinte. Em março de 1966, fugiu novamente, em circunstâncias estranhas; porém, era reconhecido como líder político de esquerda. No final do ano, seguiu para o Uruguai. Em 1967, ao lado do líder comunista Carlos Marighella, participou da 1ª Conferência da Organização Latino-Americana de Solidariedade, realizada em Havana, que deflagrou uma onda de guerrilhas na América Latina. Ainda em Cuba, participou da formação do primeiro núcleo de treinamento de guerrilha da Vanguarda Popular Revolucionária (VPR).

Retornando ao Brasil, em 1970, foi designado para trabalhar em São Paulo. Meses depois, uma onda de prisões e mortes de militantes que tiveram contato com Anselmo levantou suspeitas de que fosse um agente policial infiltrado. Como fora detido em junho de 1971, era inexplicável sua aparição em liberdade dias depois. Anselmo negou o fato. Em janeiro de 1972, voltou a ser alvo da mesma acusação, dessa vez pela Ação Libertadora Nacional (ALN), após a apresentação de um relatório de testemunhas da sua prisão em 1971. Em fevereiro de 1973, a VPR acusou-o formalmente de ser agente da Central Intelligence Agency (CIA). Suspeita-se de que era agente do Centro de Informação da Marinha, sob a supervisão da CIA, antes mesmo de 1964.

Vera Magalhães - Bolsochavismo

- O Estado de S.Paulo

Motim de policiais com apoio do presidente pode ser embrião para milícia paraestatal

A semana pré-Carnaval foi marcada pelo violento motim da Polícia Militar do Ceará, que ameaça se espalhar por outros Estados, desafia a autoridade dos governadores, conta com a simpatia e o incentivo declarados do presidente Jair Bolsonaro e de seus filhos e asseclas nas redes sociais e pode ser, caso se alastre, o embrião da criação de uma milícia paraestatal bolsonarista inspirada na criada por Hugo Chávez e inchada por Nicolás Maduro na Venezuela.

Não é de hoje que o bolsolavismo bebe na fonte da criação bolivariana, replicando seus métodos de organização e lhes dando uma roupagem ideológica de extrema direita.

A proliferação de escolas cívico-militares, impostas a partir de Brasília aos Estados, a militarização total do Palácio do Planalto, a convocação, feita por um desses militares do gabinete, o general Augusto Heleno, de manifestações de rua em apoio ao presidente e para emparedar o Congresso são todos movimentos combinados que têm clara inspiração na escalada chavista a partir de 2005.

O movimento dos policiais militares é o mais ousado e controverso desses movimentos, porque inclui o incentivo, que era tácito e vai se tornando cada vez mais implícito, a motins já classificados como inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e cuja ilegalidade foi reiterada pela Justiça, no caso do Ceará.

Bernardo Mello Franco - Radicais em causa própria

- O Globo

Motim no Ceará expõe aliança entre as PMs e Bolsonaro. Os policiais querem aumento a qualquer custo, e o presidente busca enfraquecer os governos estaduais

Em julho de 2003, um deputado subiu à tribuna com uma ideia incendiária. Queria convencer policiais militares de todo o país a entrarem em greve contra mudanças na Previdência. “Sem a Polícia Militar, senhor presidente, o Brasil vai se transformar num caos”, disse. “Isso tem que ser feito!”, animou-se.

Além de pregar a desobediência à Constituição, o orador incentivou a quebra da hierarquia e da disciplina nas polícias. Sugeriu que as tropas de Minas Gerais e do Distrito Federal ignorassem seus comandantes e cumprissem ordens de políticos da bancada da bala. “Eles têm liderança sobre suas respectivas Polícias Militares e devem realmente partir para uma greve”, afirmou.

A paralisação geral não ocorreu, mas o deputado continuou a apoiar motins ilegais nas polícias. Em fevereiro de 2017, seu grupo se engajou numa greve por aumento de salários no Espírito Santo. O movimento esvaziou as ruas e provocou uma onda de saques e assassinatos. Agora a situação se repete no Ceará, e o parlamentar que estimulava levantes nos quartéis ocupa o gabinete presidencial.

Aliados de Jair Bolsonaro estão à frente do motim iniciado na noite de terça-feira. O deputado Capitão Wagner e o ex-deputado Cabo Sabino atuam como porta-vozes da tropa rebelada. Em Sobral, o vereador bolsonarista Sargento Aílton bateu boca com Cid Gomes antes do atentado contra o senador. O pedetista levou dois tiros ao confrontar os PMs a bordo de uma retroescavadeira.

O presidente e seus três filhos com mandato já criticaram o senador baleado, que continua no hospital. Até aqui, nenhum integrante do clã condenou o motim ilegal, que emparedou o governador petista Camilo Santana.

Mary Zaidan* - Nada cheira bem

- Blog do Noblat | Veja

Bolsonaro protagoniza um carnaval de conflitos

Há algo estranho no ar. Um indisfarçável cheiro de perigo, perceptível até por aqueles que se inebriaram com as promessas de novos aromas. Às narinas que pretendiam enterrar a podridão do petismo, o governo do presidente Jair Bolsonaro tem ofertado outro tipo de droga, também com efeitos devastadores.

O governo derrapa, quase não anda. Não raro move-se para trás – a fila de 1,3 milhão do INSS e de 3,5 milhões à espera do Bolsa Família que o digam -, e achincalha aqueles que poderiam ajudá-lo a seguir para frente.

O comportamento do presidente segue um padrão. Faz de desentendido quando convém – quem não se lembra do inocente “o que é golden shower?” depois de divulgar um vídeo da cena como se fosse prática carnavalesca. E adora a persona do “sincerão”, não raro associada a agressões à imprensa, para delírio da claque no gramado externo do Palácio do Alvorada.

Além de ultrajar a instituição da Presidência da República com sua avalanche cotidiana de impropérios, Bolsonaro autoriza e estimula a incivilidade. Algo já grave na pauta de costumes, por reforçar toda sorte de preconceitos, que se torna gravíssimo ao encorajar guerras institucionais, desobediência civil, o caos.

A tomada de partido pró-motim de parte da polícia do estado do Ceará é um exemplo dessa insanidade. Diante da ação tresloucada e criminosa do ex-governador e senador Cid Gomes, baleado ao tentar entrar com uma retroescavadeira em uma unidade tomada por PMs grevistas, Bolsonaro não condenou ambos os lados, como caberia a um presidente. Deu razão aos amotinados – posição replicada pelo filho Flávio nas redes –, acendendo o rastilho de bombas prestes a estourar em outros 11 estados nos quais as polícias reivindicam reajustes salariais.

Ricardo Noblat - A sensatez do Major Olímpio e a anarquia dos policiais amotinados

- Blog do Noblat | Veja

O líder do PSL no Senado elogia governador do PT

Assustado, com o quadro de “quebra de hierarquia absoluta”, o senador Major Olímpio (PSL-SP) voltou do Ceará onde esteve em missão de paz batendo duro nos policiais travestidos de milicianos rebelados e elogiando o governador do PT Camilo Pena.

Tem dessas coisas. Até para certos aliados do presidente Jair Bolsonaro, mas não para ele, há limites para tudo. Quanto mais no caso de limites fixados pela Constituição. Forças de segurança armadas não podem fazer greves, diz a lei. Ponto final.

O major foi um dos muitos políticos federais das tendências mais variadas que desembarcaram em Fortaleza recentemente na tentativa de pôr fim à sedição. Conversou com o governador. Reuniu-se com os sublevados. Foi embora pessimista.

Os policiais mascarados que celebram Bolsonaro aos gritos de “Mito! Mito” sempre que o nome dele é citado em assembleias, não concordam em negociar a pacificação dos quartéis sem terem antes garantia de que serão depois anistiados. É o costume.

Há décadas que eles se rebelam em nome de melhores salários e condições de trabalho, deixam populações inteiramente desprotegidas, assistem ao aumento violento do número de roubos, assaltos e homicídios e, mais tarde, acabam perdoados.

No início dos anos 60 do século passado, policiais militares cercaram a sede do governo paulista exigindo um aumento de salário. O general que comandava a 2ª Divisão de Infantaria ameaçou dissolver o movimento à bala e fez 500 prisões.

Dorrit Harazim - Depois do carnaval

- O Globo

Ginzburg argumenta que do conceito de vergonha faz parte a relação entre o ser individual e o ser político

Semanas atrás a “New Left Review” publicou oportuno ensaio do historiador italiano Carlo Ginzburg sobre a Vergonha — a coletiva e a individual, vinculada ou oposta à culpa. Tema bom para estes tempos em que sentir e professar indignação transbordante tornou-se um cacoete, muleta que alimenta mais do que combate as frustrações da vida em sociedade. Talvez seja a hora de reconhecer nossa vergonha — coletiva e individual.

Ginzburg sustenta que sabemos a qual país pertencemos não pelo amor que temos à pátria, mas pelo sentimento de vergonha que ela é capaz de gerar em nós. O autor do texto (filho da escritora Natalia Ginzburg) remonta aos tempos em que Aristóteles definiu a vergonha como uma paixão, não uma virtude. Também esclarece que não sentimos vergonha por opção ou escolha. “Ela recai sobre nós, invade nossos corpos, sentimentos, pensamentos como uma doença súbita”, escreveu ele. Alguns estudiosos diferenciam países como o Japão, que seriam imbuídos de uma “cultura da vergonha” — na qual o indivíduo é confrontado com uma sanção da comunidade à qual pertence —, de países mais chegados à “cultura da culpa” moldada pela civilização judaico-cristã, na qual a sanção é introjetada pelo próprio cidadão.

A percepção de vergonha também é um dos aspectos mais sutis do sóbrio documentário “The Long Way Home”, dirigido por Mark Jonathan Harris e narrado por Morgan Freeman. A obra, que recebeu o Oscar de Melhor Documentário em 1998, foca no Pós-Segunda Guerra dos sobreviventes judeus dos campos de extermínio nazistas. Ela mostra quando os prisioneiros perceberam que haviam se transformado em esqueletos vagamente humanos: somente no momento da libertação. Foi através do olhar de horror dos soldados que lhes abriam os portões que eles se viram horrendos, sentiram vergonha física de serem vistos assim. Espelharam-se no olhar do outro.

Míriam Leitão - Cuidar do legado, regar a semente

- O Globo

Quase dois anos após a morte de Marielle Franco, instituto trabalha para cuidar do seu legado, cobrar justiça e preparar mulheres para a inclusão política

Pedra do Sal é um marco do coração do Rio, por onde passou muita história do país e da escravidão. Durante o mês de março haverá um espaço por lá chamado “Casa de Marielle”. É o primeiro passo do instituto que leva o nome da vereadora assassinada há quase dois anos. Durante todo o mês, haverá atividades, principalmente no dia 14. A diretora do Instituto Marielle Franco, Anielle, tem planos de que ele possa “cuidar do legado, regar a semente e batalhar por memória e justiça” desse crime ainda sem resposta.

Anielle foi jogadora de vôlei profissional, morou 12 anos nos Estados Unidos e voltou com o mestrado em inglês e jornalismo pela Universidade da Carolina do Norte. Sua maior incentivadora era a irmã, cinco anos mais velha.

— Eu pensei várias vezes em desistir, porque era muito tempo longe da família. Mari dizia: fica que eu estou ralando para você estar aí. Um dia você vai voltar e ver o quanto foi importante. Hoje quando vejo o tamanho que a Mari se tornou e eu penso que posso ir aos Estados Unidos fazer uma palestra sobre ela em inglês. Nunca consegui fazer isso sem me emocionar — diz Anielle, lembrando que a irmã queria muito que ela aprendesse inglês.

A saudade vem sempre no meio de muita batalha. Tem sido assim há quase 24 meses. Nunca foi possível descansar. Perguntei o que ela sentia ao ver que uma nota do Planalto reuniu Marielle e o miliciano Adriano Nóbrega. Um trecho dizia que “os brasileiros honestos querem saber os nomes dos mandantes das mortes de Marielle e do capitão Adriano”. Anielle chorou:

— É difícil para mim, como irmã, pessoa criada com ela, perceber que ainda tentam colocar Marielle no mesmo patamar de uma pessoa como Adriano. Parêntesis sobre ele: nenhum ser humano merece ser morto. Mas minha irmã foi vítima de um feminicídio político.

Elio Gaspari - Lembrai-vos de 1968, de 1937, e de 1984

- O Globo / Folha de S. Paulo

Em 13 meses, Jair Bolsonaro conseguiu um prodígio de desarticulação política, implodiu seu partido, não criou outro e demitiu colaboradores imediatos

A incontinência da retórica política dos Bolsonaro, do general da reserva Augusto Heleno e até mesmo do ministro Paulo Guedes indica que eles cultivam um conflito institucional. Pelos seus sonhos, com o Congresso, mas na falta dele qualquer coisa serve. Com 12 milhões de desempregados, “pibinho”, filas nas agências do INSS, motins de PMs e encrencas com milicianos, busca-se uma briga.

Há um ano tudo parecia fácil, de um lado estaria um presidente cacifado por 58 milhões de votos e do outro, um Congresso de crista baixa. Em 13 meses, Jair Bolsonaro conseguiu um prodígio de desarticulação política, implodiu seu partido, não criou outro e demitiu colaboradores imediatos, entre os quais seis generais da reserva. Trocou um ministro da Educação delirante por outro, desastroso. Defenestrou o presidente do BNDES, o secretário da Receita e dois presidentes do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE).

No endinheirado FNDE ainda falta saber quem preparou um edital para a compra de 1,3 milhão de computadores, notebooks e laptops ao custo de R$ 3 bilhões. A CGU apontou o vício do certame e ele foi revogado, mas jabuti não sobe em árvore. Como disse o presidente há poucos dias, “nossa luta contra a corrupção continuará sendo forte, fazendo o possível pelo Brasil melhor”. Faça-se.

Um governo pode viver das brigas que inventa (basta olhar para Donald Trump), mas elas não o livram de encarar os problemas cotidianos da administração. Nesse departamento, Bolsonaro vai devagar, quase parando.

A turma que está em Brasília a fim de arrumar uma briga pode estar perdendo seu tempo. Dois governos armaram cenários que desembocavam em golpes e foram bem-sucedidos. O de Costa e Silva, em 1968, e o de Getulio Vargas, em 1937. Ambos tinham conjunturas internacionais radicalizadas. Vargas enfrentara uma insurreição militar em 1935. Costa e Silva estava diante de um surto terrorista e deixou-se boiar numa provocação palaciana que criou o conflito com o Congresso. A Bolsonaro e aos seus cavaleiros do Apocalipse ainda faltam todos esses ingredientes. As ruas estão em paz e, hoje, em festa. Quarta-feira abre-se a quitanda e continuarão lá os PMs dispostos a se amotinar, bem como os milicianos.

Os golpes bem-sucedidos são sempre lembrados, mas aprende-se também com aqueles que fracassam. Em 1984, quando Tancredo Neves estava virtualmente eleito (indiretamente) para a Presidência, armou-se no invencível Centro de Informações do Exército (CIE) uma provocação venenosa. Pediram-se soldados ao Comando Militar do Planalto para colar em paredes de Brasília cartazes vermelhos, com a foice e o martelo, a sigla PCB, uma figura de Tancredo e o slogan: “Chegaremos Lá”. Ia tudo muito bem até que a polícia prendeu os soldados, e o carro do CIE que lhes daria cobertura escafedeu-se. Exposta a provocação, fez-se silêncio, até que na reunião do Alto Comando do Exército o general que comandava a tropa do Rio perguntou o que tinha sido aquilo. “Gente do meu gabinete, não foi”, respondeu o ministro. O general Newton Cruz, comandante do Planalto, estava na reunião e viria a contar: “Senti um frio na espinha. O CIE era um anexo do gabinete dele. Se não tinham sido eles, tinha sido eu.”

Não tinha, mas acabou sendo. A tropa era dele, porém a operação era do CIE. Nas semanas seguintes fritaram Newton Cruz, negando-lhe a promoção, e ele passou para a reserva, transformado em bode expiatório de todas as bruxarias.

Janio de Freitas - Nosso andar no escuro

- Folha de S. Paulo

País se aproxima de uma situação-limite

Uma certeza se pode ter: a maluquice perversa a que o Brasil está entregue não terminará bem.

Nos últimos dias houve outra mudança de tipificação e de grau nas tensões disseminadas por Jair Bolsonaro e sua tropa de choque. As palavras impeachment, queda, saída, providências das instituições, e mais variantes há mais de ano caídas em conformado silêncio, voltaram com força a tema de conversas e mesmo da imprensa. "A democracia é o regime da responsabilidade, o que implica a necessidade de punir a autoridade que se desvia da lei", disse a Folha ("Sob ataque, aos 99") sobre a conduta de Bolsonaro e lembrando-se de sua própria grandeza. Coube à Folha, no passado, dar outros problemáticos passos iniciais.

Aproxima-se uma situação-limite. A inclusão de generais em torno de Bolsonaro tem a ver com a ditadura, claro, mas também com um motivo prático e imediato: formar uma guarda pretoriana, a partir da ideia de que nenhuma instituição ou movimento público confrontaria essa representação do Exército com a tentativa de um impeachment, que também a alcançaria.

Esses generais, como o capitão que os comanda, são todos formados pela ditadura. Bolsonaro, no entanto, aumenta as extravasões da sua condição de alheio aos padrões dados como normalidade mental. Com seus ministros, expande as medidas danosas a sucessivos setores, não se interessa pelo desemprego, agrava os problemas de saúde e educação, submete-se aos exploradores legais e ilegais da riqueza mineral e florestal, ataca o Congresso e o Judiciário, leva o país a reverter tudo o que o fez respeitado nas relações internacionais.

Ruy Castro* - Três dias de incorreção

- Folha de S. Paulo

O Carnaval tem suas leis. Convém não contrariá-las

Se o politicamente correto acha que vai se impor no Carnaval, proibindo fantasias de índio, piranha, freira, homem vestido de mulher e chinês com coronavírus, arrisca-se a levar a maior goleada de sua história. Ninguém até hoje conseguiu regular o Carnaval. Pelo menos, o Carnaval carioca.

O entrudo, por exemplo —o costume de esguichar água com limão e outros líquidos nos passantes—, foi proibido pelo menos sete vezes pelas autoridades do Rio, em 1604, 1605, 1680, 1691, 1734, 1808 e 1810. E só saiu de moda, em fins do século 19, porque os foliões descobriram coisa melhor. A birra com o entrudo era até justificável. As pessoas levavam baldes de água ao passar sob uma varanda e, como o banho ainda não era um hábito dos mais arraigados, podiam se constipar. Uma vítima do entrudo foi o pai da arquitetura no Brasil, o francês Grandjean de Montigny, no Rio desde 1816 e morto de uma “molhança” em 1850.

Hélio Schwartsman - Viva a apropriação

- Folha de S. Paulo

Homem se apropria de inovações culturais e as aprimora, e é isso que o diferencia de outros animais

Basta alguém famoso fantasiar-se de índio para dar início à polêmica. Como o lança-perfume, o debate em torno da apropriação cultural já se tornou um elemento inescapável do Carnaval.

Não sou nem o maior fã nem o maior crítico do politicamente correto (PC). Penso que o fenômeno pode ser descrito como o efeito colateral de um movimento absolutamente desejável, que foi o esforço de sociedades liberais para conter seus impulsos racistas, sexistas, homofóbicos etc. A origem virtuosa não deve, porém, nos impedir de denunciar seus exageros.

E, se há um elemento da cada vez mais longa cartilha do PC que eu não engulo, é justamente a apropriação cultural. O raciocínio que fundamenta esse discurso é profundamente reacionário. Defender que objetos culturais, que, no fundo, são ideias, devem pertencer exclusivamente ao grupo que os criou equivale a decretar a morte da inovação.

Bruno Boghossian - Bolsonaros disseram o suficiente

- Folha de S. Paulo

As questões que a família insiste em não responder reforçam essas e outras suspeitas

O advogado de Flávio Bolsonaro se irritou com as insinuações de que seu cliente mantinha relação de amizade com Adriano da Nóbrega, suspeito de chefiar a maior milícia do Rio e morto há duas semanas. “Não são amigos, nunca foram amigos, nunca saíram, nunca jogaram futebol”, disse Frederick Wassef.

Como não existe debate sobre a escalação do time de pelada do senador, tudo leva a crer que o doutor tenta pegar carona na confusão. A família Bolsonaro e seus aliados já disseram o suficiente para atestar seu elo com Adriano. As questões que eles insistem em não responder reforçam essas e outras suspeitas.

O defensor de Flávio fez questão de rechaçar o tal “status de amigo” depois que um vereador carioca contou que o filho do presidente visitou Adriano, então capitão da PM do Rio, mais de uma vez quando ele esteve preso, entre 2004 e 2006. Wassef afirmou que o cliente visitava diversos policiais nessas mesmas condições.

Angela Alonso* - Incivilidades

- Folha de S. Paulo /Ilustríssima

Enquanto isso, as reações civilizadas têm sido tíbias e tardias

Já quase ao fim de “À Espera dos Bárbaros”, o personagem de J. M. Coetzee cogita “um relato de como as pessoas deste posto avançado passaram seus últimos anos apaziguando suas almas à espera dos bárbaros.”

A história deste autoapaziguamento pode ser contada no mundo imaginado do romance, mas está também no dia a dia do país real em que vivemos.

Ao longo da última década, deterioraram-se todos os nossos padrões de civilidade. Evidências apareceram nas redes sociais e nas ruas, em sopapos no Legislativo, em rinhas no Judiciário, antes de chegar ao ponto agudo das bravatas do Executivo Federal. O que começou em grito chegou a sangue, que, a despeito do fosso que os separa, tocou a Marielle e a Adriano, a Bolsonaro e a Cid Gomes.

A barbárie está por toda parte. Não se esconde, ao contrário. Os bárbaros eram eufêmicos antigamente, quando um ministro militar mandava às favas seus poucos escrúpulos. Agora, outro acaba seus rompantes sem aveludamentos, num sonoro “Foda-se”.

Quem são os bárbaros? Ao longo de nossa história, a elite política sempre se viu como civilizada e civilizadora. Bárbaros eram os outros: os nativos, os africanos, os pobres.

No Brasil, elites política e intelectual se constituíram entrelaçadas, com os políticos escrevendo ensaios, colunas de jornal, poemas, e os letrados ocupando ou postulando postos políticos. Esta indistinção original criou uma ilusão de ótica, a de que a elite brasileira, ou ao menos sua nata, tenha pendor civilizatório.

A crença sobreviveu mesmo desaparecida a situação em que se enraizava, quando da autonomização da carreira universitária e da profissionalização dos partidos políticos.

Vinicius Torres Freire - O vírus da China e a praga brasileira

- Folha de S. Paulo

Donos do dinheiro grosso indicam que bateu um medo dos efeitos da epidemia

Agora está evidente que o humor dos donos do dinheiro do mundo mudou por causa da doença do novo coronavírus, a Covid-19, esse nome de ficção científica. De dez dias para cá, as taxas de juros no mercado americano embicaram de vez para baixo, raspando em mínimas históricas.

E daí?

Taxas americanas em baixa indicam que a finança teme a extensão do contágio econômico, da China para outras partes do mundo, derrubando União Europeia e Japão. Acredita que é razoável esperar uma baixa da taxa básica de juros americana. Enfim, quando não se sabe que bicho vai dar é melhor traduzir sua riqueza em dólares.

A moeda americana sobe em relação a todas outras importantes. A perspectiva de crescimento mundial menor e a alta do dólar tendem a derrubar o preço das commodities, de mercadorias muito importantes nas vendas do Brasil para o exterior (grãos, minério de ferro, petróleo), afora outros danos.

Esses humores dos donos do dinheiro grosso podem mudar em dias, claro, a depender de notícias da expansão da Covid-19, como uma redução do número de novos casos da doença, o que não é garantia de nada, porém. Ainda que a China volte a funcionar, o futuro do vírus ainda é incerto e a rapidez da recuperação chinesa também.

Arminio Fraga* - Agenda de reformas econômicas: balanço e avaliação

- Folha de S. Paulo

É preciso definir prioridades para aproveitar a janela que antecede as eleições

A pauta econômica do Congresso está repleta de projetos importantes, na maioria dos casos polêmicos e complexos. Será necessário definir prioridades para aproveitar a janela que antecede as eleições municipais e suas campanhas. Este artigo oferece um resumo seletivo e comentado das principais propostas em discussão, organizadas em quatro blocos.

O primeiro tem foco setorial. No topo da lista está a revisão do marco legal do saneamento. Trata-se de uma antiga urgência, posto que quase a metade dos brasileiros não tem acesso a uma rede de esgoto e, dos que têm, apenas 45% têm seu esgoto tratado. Essa lei já foi aprovada na Câmara, num formato considerado adequado por especialistas. Deve andar. Tem que andar.

Nessa mesma categoria está a lei de resoluções bancárias, que versa sobre regras para lidar com crises financeiras. O Banco Central está sem as ferramentas necessárias para administrar uma crise pois a lei que existe (nº 6.024/74) está ultrapassada e obsoleta. Um projeto que preenche essa importante lacuna foi apresentado na virada do ano. O momento é ideal para examinar a questão, pois não há sinal de crise à vista. No entanto, pela mesma razão, provavelmente vai ficar para a próxima (crise).

Incluo nesse bloco também o projeto de lei complementar para modernizar e formalizar a governança do Banco Central (por meio de mandatos independentes para seus dirigentes) e seus objetivos (sendo inflação baixa o principal). Sua aprovação final neste semestre parece provável e ofereceria uma defesa mais robusta da estabilidade, uma conquista valorizada pela população.

O segundo bloco engloba medidas voltadas para reforçar o regime fiscal, que ainda não se recuperou plenamente do colapso ocorrido a partir de 2014. Duas reformas sinalizaram uma primeira resposta à crise: a introdução em 2016 do teto para o gasto público e a reforma da Previdência, aprovada no ano passado. As taxas de juros caíram bastante desde então, sobretudo as de curto prazo (influenciadas também pela brutal recessão).

Eliane Cantanhêde - O controle do mundo

- O Estado de S.Paulo

Recado dos EUA: opção pelo 5G chinês pode comprometer negociações na área de defesa

O Brasil está sofrendo pressões dos dois lados de uma guerra pós-contemporânea que tende a ter grande impacto na humanidade e tem nome curto, na verdade, uma sigla: 5G. Por trás desse avanço revolucionário há uma disputa entre Estados Unidos e China pela dominação do mundo no futuro.

Parece exagero? Pode ser, mas os estrategistas dos países desenvolvidos se debruçam sobre o tema e o governo brasileiro, providencialmente cauteloso, criou um grupo de trabalho para analisar a questão sob os vários aspectos que ela abrange: financeiro, tecnológico, econômico e político, considerando a segurança de dados públicos, privados e individuais. Não é pouco. E não é fácil.

Tanto os chineses pressionam o Brasil a favor do 5-G da Huawei, alegando preços menores e capacidade maior, quanto os americanos trabalham em sentido contrário, alertando para a “ameaça” que pode representar para a soberania nacional uma empresa estatal da China na área de dados.

Em resumo, há temor de que a China, hoje segunda maior potência, possa usar o 5G para não só coletar, mas manipular dados de defesa, comunicações, energia elétrica, estradas, controle aéreo e florestas.

Além de reunir o maior banco de dados de indivíduos do mundo. O governo chinês, que não é exatamente uma democracia, teria o controle de algo preciosíssimo nas disputas entre potências: informação. E, pior: poderia ter o controle remoto do funcionamento de todo o País. Com um botão, desligar uma hidrelétrica.

Rolf Kuntz - Se governar atrapalha a reeleição, melhor mesmo é evitar esse risco

- O Estado de S. Paulo

O critério é claro: baixaria é permitida, mas cuidar de reformas pode ter custo político

Quarta-Feira de Cinzas poderá ser difícil, mas a grande ressaca virá uma semana depois, principalmente para os mais sóbrios, quando sair o balanço econômico do primeiro ano do governo Bolsonaro. Todas as prévias apontam crescimento abaixo de medíocre, parecido com o de 2018 ou até inferior ao desse ano infeliz, quando a crise no transporte e a incerteza política interromperam uma recuperação promissora. Algum desfile extemporâneo poderá chamar a atenção, no início de março, mas o mais fascinante será ouvir as explicações de Brasília sobre as contas nacionais de 2019.

Não se esperam novidades animadoras com a divulgação, no dia 4, do produto interno bruto (PIB) do ano passado. Segundo a prévia mais confiável, produzida pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), o PIB cresceu apenas 1,2%, pouco menos que no ano anterior, quando o avanço chegou a 1,3%. O presidente e seus auxiliares parecem conformados com os números pífios do começo de mandato. Mas o chefão do Planalto já se mostra nervoso, segundo se comenta em Brasília, com o risco de um novo fiasco em 2020, ano de eleições municipais e de construção de uma base para a busca de a reeleição presidencial.

Baixaria está longe de ser problema para o presidente, pelo menos diante de seus eleitores mais fiéis e dos apoiadores no charco digital. Esse comportamento, levado a novo recorde com as ofensas à jornalista Patrícia Campos Melo, pode ser visto como ponto positivo por esse público. Mas até esse auditório poderá ficar inquieto e menos favorável se a economia continuar em marcha lenta e o dinheiro permanecer curto. Por enquanto, os mais otimistas contam como feito importante a redução do desemprego.

Foliões na política – Editorial | Folha de S. Paulo

Bagunça é compatível com presidente que não coordena forças e atua como agitador

Enquanto os festejos do Carnaval tomam as cidades brasileiras, renova-se a esperança de que a folia que deu o tom da política nacional nos últimos dias não sobreviva à Quarta-Feira de Cinzas.

Dissipou-se muita energia e flertou-se com aventuras perigosas e até desastres durante a algazarra.

No Ceará, um senador foi baleado ao acometer-se numa retroescavadeira contra policiais amotinados que aterrorizam a população. Em Minas, dos cofres vazios, o governador concedeu aumento de 42% à polícia, e a Assembleia terminou de contemplar o restante do funcionalismo com reajustes salariais.

O presidente da República fez bravata com combustíveis, provocou governadores e ofendeu jornalistas. Um general que o aconselha acusou o Congresso de chantagear o Executivo, o que estimula protestos de rua contra o Legislativo.

A família presidencial abraçou com fervor a causa de um miliciano morto pela polícia, com direito a divulgação de notícias falsas. O ministro da Economia referiu-se a servidores e a empregadas domésticas de maneira depreciativa.

Há coincidência na concentração desses fatos no tempo, mas existe também, a conectá-los, um déficit de responsabilidade e espírito público de autoridades e servidores incumbidos de funções cruciais para a estabilidade, sem a qual nenhuma administração prospera.

No sistema da Carta de 1988, esse papel cabe preponderantemente ao presidente da República. A arquitetura constitucional fez convergir nele os estímulos e os recursos para que se comporte com racionalidade, moderação e responsabilidade, acima de divisões menores da sociedade e da política.

BRP Comenta: É Carnaval: Na rua tem chantagem, bloquinho e motim


O que a mídia pensa – Editoriais

Foliões na política – Editorial

Bagunça é compatível com presidente que não coordena forças e atua como agitador

Enquanto os festejos do Carnaval tomam as cidades brasileiras, renova-se a esperança de que a folia que deu o tom da política nacional nos últimos dias não sobreviva à Quarta-Feira de Cinzas.

Dissipou-se muita energia e flertou-se com aventuras perigosas e até desastres durante a algazarra.

No Ceará, um senador foi baleado ao acometer-se numa retroescavadeira contra policiais amotinados que aterrorizam a população. Em Minas, dos cofres vazios, o governador concedeu aumento de 42% à polícia, e a Assembleia terminou de contemplar o restante do funcionalismo com reajustes salariais.

O presidente da República fez bravata com combustíveis, provocou governadores e ofendeu jornalistas. Um general que o aconselha acusou o Congresso de chantagear o Executivo, o que estimula protestos de rua contra o Legislativo.

Música | Antonio Nóbrega - "Último Dia"/ "Mexe com Tudo

Poesia | Carlos Drummond de Andrade - Mundo grande

Não, meu coração não é maior que o mundo.
É muito menor.
Nele não cabem nem as minhas dores.
Por isso gosto tanto de me contar.
Por isso me dispo,
por isso me grito,
por isso frequento os jornais, me exponho
cruamente nas livrarias:preciso de todos.

Sim, meu coração é muito pequeno.
Só agora vejo que nele não cabem os homens.
Os homens estão cá fora, estão na rua.
A rua é enorme. Maior, muito maior do que eu esperava.
Mas também a rua não cabe todos os homens.
A rua é menor que o mundo.
O mundo é grande.

Tu sabes como é grande o mundo.
Conheces os navios que levam petróleo e livros,
carne e algodão.
Viste as diferentes cores dos homens,
as diferentes dores dos homens,
sabes como é difícil sofrer tudo isso, amontoar tudo isso
num só peito de homem...sem que ele estale.

Fecha os olhos e esquece.
Escuta a água nos vidros,
tão calma. Não anuncia nada.
Entretanto escorre nas mãos,
tão calma! Vai inundando tudo...

Renascerão as cidades submersas?
Os homens submersos-voltarão?
Meu coração não sabe.
Estúpido, ridículo e frágil é meu coração.
Só agora descubro
como é triste ignorar certas coisas.
(Na solidão de indivíduo
desaprendi a linguagem
com que homens se comunicam).

Outrora escutei os anjos,
as sonatas, os poemas, as confissões patéticas.
Nunca escutei voz de gente.
Em verdade sou muito pobre.

Outrora viajei
países imaginários, fáceis de habitar,
ilhas sem problemas, não obstante
exaustivas e convocando ao suicídio.

Meus amigos foram às ilhas.
Ilhas perdem o homem.
Entretanto alguns se salvaram e
trouxeram a notícia
que o mundo, o grande mundo está
crescendo todos os dias,
entre o fogo e o amor.

Então, meu coração também pode crescer.
Entre o amor e o fogo,
entre a vida e o fogo,
meu coração cresce dez metros e explode.
-ó, vida futura! Nós te criaremos.