segunda-feira, 30 de setembro de 2019

Opinião do dia – Alexandre de Moraes*

"Não custa ao Estado respeitar o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa. Nenhum culpado, nenhum corrupto, nenhum criminoso deixará de ser condenado, se houver provas, se o Estado respeitar esses princípios constitucionais".

*Alexandre de Moraes, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), em seu voto, na sessão de 26/9/2019 (quinta-feira).

Marcus André Melo* - Polarização afetiva

- Folha de S. Paulo

O affair Janot marca a escalada do conflito no ciclo da Lava Jato

A polarização afetiva que se assenta em emoções negativas (desconfiança, desprezo, aversão) dirigidas a grupos políticos rivais é fenômeno novo nas democracias, mas no Brasil adquiriu especificidades: ela foi magnificada devido ao cataclismo produzido pela exposição pornográfica da corrupção.

O debate sobre seus determinantes e sobre se ela é maior entre as elites ou massas produziu duas explicações rivais. A primeira é que a polarização é fundamentalmente um fenômeno das elites --um subproduto do acirramento da competição política.

A segunda é que a polarização é social e resulta da sobreposição de identidades: grupos homogêneos fazem escolhas que as alimentam ("partisan sorting"). Nos EUA, por exemplo, os afro-americanos e evangélicos têm optado pelo partido democrata e republicano, respectivamente, e essa superidentidade acaba influenciando outras escolhas.

Celso Rocha de Barros* - A crise da Lava Jato

- Folha de S. Paulo

Já está claro que Bolsonaro não tem o mais remoto interesse em brigar pela operação

A semana passada foi muito ruim para a Lava Jato, começando com a derrota, de efeitos práticos incertos, no STF (Supremo Tribunal Federal), passando por novas denúncias da Vaza Jato e culminando no episódio grotesco em que o ex-procurador-geral da República, Rodrigo Janot, declarou que quase matou Gilmar Mendes a tiros. O ex-senador tucano Aloysio Nunes declarou que a operação manipulou o Supremo durante o processo de impeachment. Enquanto escrevo, ouço que a força-tarefa da Lava Jato lançou a campanha "Lula mais ou menos livre", e pediu sua mudança para o regime semiaberto. Especula-se que seja uma estratégia para evitar a anulação da sentença contra o ex-presidente.

Se tudo isso tivesse acontecido em 2015, o país estaria em convulsão. O auge do lavajatismo passou quando Dilma caiu, mas houve um novo surto de entusiasmo com a eleição de Bolsonaro e a nomeação de Moro para o Ministério da Justiça.

Vou morrer sem entender por que, em algum momento, o Brasil achou que Jair Bolsonaro estava preocupado em combater a corrupção. O atual presidente da República sempre foi um político do baixo clero, nunca teve qualquer participação nas investigações de corrupção no Congresso (alguém se lembra dele se destacando em qualquer CPI?), foi um dos articuladores da campanha de Severino Cavalcanti para a presidência da Câmara e apoiava Picciani no Rio de Janeiro. Em algum ponto de nossa loucura recente, achamos que esse sujeito era o Batman.

Leandro Colon – Uma instituição em crise

- Folha de S. Paulo

Janot, Dodge, Deltan, entre outros, mostram que órgão precisa de reflexão profunda

O desatino de Rodrigo Janot em declarar que por pouco não apertou o gatilho para matar Gilmar Mendes nas dependências do STF jogou ainda mais luz sobre o Ministério Público Federal, instituição que precisa de uma reflexão profunda.

Muita gente em Brasília não acredita na história de faroeste contada por Janot. Mas nada muda se o fato ocorreu ou se o ex-PGR está blefando para promover seu livro (recheado de incoerências, segundo reportagem publicada pela Folha).

Até que se prove o contrário, vale a versão confessada por um ex-chefe da Procuradoria de que levou uma pistola ao STF para matar Gilmar, mas (ainda bem) fraquejou na hora.

Janot deixou a PGR em setembro de 2017 com um gol contra no final: a delação desastrada da JBS, em que ele atropelou a liturgia das investigações para tentar derrubar um presidente da República (Michel Temer).

Vinicius Mota - Impeachment de Trump é golpe?

- Folha de S. Paulo

Quem deslegitimou tentativa de depor Bill Clinton agora aplaude ação democrata

A Suprema Corte do Reino Unido saiu do seu retiro secular e mostrou cartão vermelho para a intenção do premiê Boris Johnson de deixar fechado o Parlamento por cinco semanas. Os progressistas de todo o planeta comemoraram.

A presidente da Câmara dos Representantes dos Estados Unidos, a democrata Nancy Pelosi, rompeu um longo período de hesitação e instalou inquérito que pode levar ao impeachment de Donald Trump. Nova salva de palmas na centro-esquerda.

Os adeptos da conversa do “jogo pesado constitucional”, difundida pelo best-seller “Como as Democracias Morrem”, também se uniram ao coro. Desta vez está tudo certo, afirmaram. Quando os deputados republicanos tentaram o impeachment de Bill Clinton, em 1998, aí não podia.

Fernando Gabeira - Lobo e o cordeiro no STF

- O Globo

O primeiro grande golpe sofrido pelo sistema anticorrupção partiu de Toffoli em conluio com Bolsonaro

A semana que passou foi complicada demais para caber num só artigo. Começou com aquele discurso de Bolsonaro na ONU e, no final, nem se falava mais nele.

Estava no Ceará cobrindo um encontro dos povos do mar. Nele, discutia-se o conhecimento das populações litorâneas: cultivo de algas para cosméticos e alimentação ou mesmo fazer um bonito lustre com escamas de um peixe grande, chamado lá de camburubim. No final do encontro, as praias nordestinas foram invadidas por um vazamento de óleo, morte de tartarugas e tudo mais.

Bolsonaro voltou de viagem, e dela ficou apenas sua briga com o cacique Raoni e a adolescente sueca Greta Thunberg, atacada pela família presidencial.

O grande fato foi produzido pelo STF, que aplicou uma derrota na Operação Lava-Jato e todas as outras que combatem a corrupção no Brasil.

Alguns processos serão anulados por uma filigrana jurídica: o condenado não apresentou suas declarações finais depois dos delatores.

A discussão desse tema poderia aperfeiçoar as coisas daqui para a frente. Mas anular processos que desviaram milhões só por causa da ordem final é apenas o sinal do momento.

A conjuntura mudou. A correlação de forças é outra. Os vazamentos do Intercept enfraqueceram a Lava-Jato, da mesma forma que a eleição de Bolsonaro, embora o discurso seja outro, e ele tenha integrado Moro ao seu governo.

Cacá Diegues - Meu discurso na ONU

- O Globo

Qual dessas alternativas, a barbárie ou a civilização, cada país deve escolher para o presente e o futuro?

Se a mim coubesse discursar na abertura da 74ª Assembleia Geral da ONU, se eu tivesse essa honra por causa de nossos antepassados políticos que a mereceram por suas ideias, elegância e dignidade, evitaria levar comigo uma pobre moça com cara de indígena que serviria apenas para me filmar encantada, com seu celular progressista de homem branco. Eu não teria coragem de dizer que a menina representa os índios do meu país. Apenas uns poucos, já que o resto a gente massacrou devidamente no passado.

Começaria meu discurso mandando meus confrades do mundo inteiro aprenderem logo o português para lerem “Escravidão”, o livro do professor Laurentino Gomes. Ele nos conta como subjugamos com eficiência, desde o primeiro leilão dos cativos em 1444, uma outra etnia que trouxemos para cá, atravessando com eles um oceano, para que nos servissem e inventassem o país que agora os despreza e discrimina.

Eu também citaria a Bíblia, mas um outro versículo mais apropriado. Podia ser, por exemplo, o que está no Livro Sagrado em Lucas 12, 1-3, que aprendi com Frei Betto: “Tomem cuidado com o fermento dos fariseus, que é a hipocrisia”.

Em meu discurso, talvez fosse o caso de lembrar o que muita gente tenta esquecer ou negar: a ditadura no Brasil, de 1964 a 85. Ela está nas primeiras páginas dos jornais da época, mesmo dos que a apoiavam. Como na manchete de 26 de março de 1969, onde o presidente-general afirma: “O governo já cuida da volta à democracia”. (Ora, o que volta é porque já foi). Ou, em 19 de agosto do mesmo ano, a declaração de membro do triunvirato militar no poder: “Nosso objetivo é restaurar a democracia”. (Ora, só se restaura o que não é mais). O mesmo jornal dizia, três dias depois, que “o Exército está decidindo a sucessão”. Pode ser mais claro?

Ana Maria Machado - Livros livres

- O Globo

Livros devem ser livres. Plurais. Ideias alheias em confronto com as nossas nos enriquecem. Sem imposição de pensamento único. Mesmo se o que está escrito em algum livro for uma bobagem.

Algo alentador no país hoje é a sede de leitura. Apesar das dificuldades. O ensino é capenga. Bibliotecas desatualizadas, só abertas em horário comercial. Indústria livreira em crise. Grandes livrarias fechando. Compras governamentais para escolas suspensas.

Mas na contramão, há sinais animadores. Pequenas livrarias resistem. Clubes de livros e blogs literários proliferam. Professores insistem em explorar com seus alunos o potencial que pulsa na literatura. Festas literárias se multiplicam por incontáveis cidades no interior.

Livros nos dão modelos (como o “Rondon” de Larry Rother) ou mostram males a combater — da escravidão (na obra de Laurentino Gomes) ao autoritarismo (na de Lilia Schwarcz).

Não adianta vetarem Míriam Leitão e Sérgio Abranches em Jaraguá do Sul —isso lhes dá maior ressonância. Não adianta proibir uma HQ com beijo gay —isso faz 14.000 livros sobre o tema serem distribuídos de graça. Não adianta um diretor da Funarte ofender Fernanda Montenegro—o público a cobre de carinho, o apoio a nossa atriz maior viraliza nas redes. Avelha lição: “você corta um verso, eu escrevo outro.”

Simon Schwartzman - Nem CLT nem funcionário

- O Globo

Como quase tudo neste ambiente polarizado em que vivemos, a questão do regime de trabalho dos professores das universidades está sendo discutida como tendo duas únicas possibilidades: ou somos a favor das universidades públicas, e defendemos o atual regime de funcionalismo público para professores e funcionários, ou somos contra, e queremos transformar todas as universidades em empresas comerciais, cobrando matrículas e vendendo serviços.

Na verdade, não tem que ser assim. O atual regime das universidades federais — em que todos os professores são funcionários do Ministério da Educação, e não das universidades, têm a mesma carreira em todo o país e estabilidade desde o dia em que passam no primeiro concurso — é totalmente inadequado, inclusive porque vai contra o princípio da autonomia universitária, que supõe que elas devam administrar com independência seus recursos humanos.

O simples regime CLT — em que os contratos são precários, e o professor pode ser demitido a qualquer momento com ou sem justa causa, e que predomina na maioria das instituições de ensino privadas no Brasil, sobretudo as de fins de lucro —também não é adequado para instituições cujo principal acervo é a reputação, competência e o envolvimento de seus professores. Existe alguma alternativa?

Claro que sim. Nos países que têm universidades de qualidade, as contratações não são feitas por concursos formais e burocráticos, em que a universidade delega a um grupo de professores a decisão de quem vai ser admitido para o resto da vida, e sim por processos de busca com a participação de professores, dirigentes, alunos e avaliadores externos, em que os candidatos passam por entrevistas e busca-se um consenso sobre se eles são os melhores para as funções que precisam ser preenchidas.

Denis Lerrer Rosenfield* - O que é ser conservador?

- O Estado de S.Paulo

Significaria conservar os valores da família, a tradição libertina ou a liberdade de escolha?

Ser conservador encerra muitas significações, sem que, muitas vezes, se saiba ao certo do que se está falando. Ultimamente, no País, estamos presenciando uma onda dita conservadora, como se, com esse termo, uma acepção de todos conhecida pudesse ser facilmente percebida.

Ser conservador, à maneira de Edmund Burke, significava, na época, manter as tradições inglesas, a monarquia constitucional e os valores vigentes, dentre os quais seus preconceitos em relação ao capital financeiro, aos agiotas e aos judeus, que ele acreditava serem aqueles similares a estes. Conservar a tradição e os valores pode igualmente significar aceitação acrítica de toda uma História recebida. Sua repercussão deveu-se, sobretudo, à sua crítica à Revolução Francesa, à concepção democrática que então emergia e a seus excessos no Terror, à concepção jacobina, que terminou se estendendo até o século 20. São valores históricos que estão assim em pauta.

Ser conservador, no Brasil de hoje, coloca precisamente a questão dos valores e da tradição a ser preservada. O discurso político é fortemente contaminado pelo conservadorismo sem que sua acepção seja definida. Cobra-se apenas que o inimigo seja aquele que não a compartilha, sem que o compartilhado, contudo, seja explicitado. Evidentemente, não se pode seriamente cogitar de uma monarquia constitucional do tipo da inglesa, por mais que dom Pedro II tenha sido um grande imperador, ímpar em seu tempo. Essa tradição se teria perdido no período republicano, salvo se entendermos por ser conservador a restauração da monarquia brasileira. Não é essa, porém, a pauta do atual governo, centrado na figura de um presidente que procura impor suas concepções, sem recorrer à História do País.

Cida Damasco - Quem se arrisca?

- O Estado de S. Paulo

Investimento precisa de segurança, tudo que está em falta no Brasil

Foi uma semana de sustos após sustos até para quem se diz acostumado com as turbulências do Brasil dos últimos tempos. Começou com a estreia de Bolsonaro na ONU, desafiando líderes da comunidade internacional e atacando tudo e a todos, em um discurso sob encomenda para o eleitorado mais fiel. Terminou com Rodrigo Janot, ex-chefão da Procuradoria Geral da República, impedido de se aproximar dos ministros do Supremo, depois de ter revelado que planejou assassinar Gilmar Mendes e se suicidar.

Mais que uma frase de efeito, o comentário do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), em seguida à confissão de Janot, dá o que pensar: “Quem vai querer investir num país desse?” Por mais que alguns empresários, executivos e investidores financeiros ainda tentem fechar os olhos para a balbúrdia que se instalou em várias áreas e prefiram concentrar a atenção na agenda ultraliberal da equipe econômica, não há como ignorar os riscos desse cenário. Insegurança é o que vem à cabeça de todos. E, como se sabe, trata-se de um motivo mais do que suficiente para pelo menos provocar dúvidas em quem está avaliando a possibilidade de colocar seu dinheiro no Brasil.

Fareed Zakaria* - Conduta do presidente americano segue padrão global

- The Washington Post, O Estado de S.Paulo

Desde 1995, cresce o número de pessoas que gostariam de ter um líder forte que não precisa se importar com um Parlamento ou eleições

Se você acha que foi uma transgressão passível de impeachment, devemos concordar que o que Donald Trump fez foi errado? Ele pressionou um governo estrangeiro a investigar um rival. Isto é bem diferente da investigação no caso da Rússia, para saber se Trump conspirou com o Kremlin. No caso da Ucrânia, o presidente é acusado de usar o poder dos EUA – que faz uma diferença de vida ou morte para a Ucrânia – para ganho pessoal.

Infelizmente, isto faz parte de um padrão de violações de normas democráticas. O relatório de Robert Mueller revela que Trump buscou restringir ou mesmo pôr fim à investigação do procurador especial. Trump ofereceu perdão para autoridades que infringiriam a lei, criticou agências de investigação do governo e as pressionou para investigarem seus oponentes.

Ele também ignorou convocações para depor no Congresso e recusou-se a entregar documentos, incluindo seu informe de imposto de renda, e enriqueceu suas empresas usando sua posição como presidente. Atacou o Judiciário e a mídia, chamando-a de “inimiga do povo.

Trump é um exemplo atroz, mas sua má conduta se insere num padrão global. O primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, se envolveu em manobras políticas que a Suprema Corte decidiu serem ilegais. O premiê indiano, Narendra Modi, tem aterrorizado as minorias do seu país e corroído sua cultura secular.

O presidente das Filipinas, Rodrigo Duterte, elogia assassinatos extrajudiciais. E, em países como Turquia e Hungria, seus líderes, Recep Tayyip Erdogan e Viktor Orban, conseguiram mudar a Constituição para favorecer um governo de um único partido – ou um indivíduo.

Bruno Carazza* - A estratégia por trás do veto

- Valor Econômico

Bolsonaro beneficiou a si mesmo e ao Congresso

Na última sexta-feira Jair Bolsonaro vetou diversos dispositivos da reforma eleitoral aprovada pelo Congresso no âmbito da Lei nº 13.877. Atendendo à pressão das redes sociais, o presidente posicionou-se contra a possibilidade de aumento do fundo eleitoral, a eliminação de brechas para a não aplicação da Lei da Ficha Limpa e o retorno da propaganda partidária “gratuita” em rádio e TV - sem falar na farra que seria a permissão de adoção de sistemas de contabilidade paralelo à prestação de contas exigida pelo TSE.

Apesar de ter agradado àqueles que temiam que a sanção do projeto tal qual aprovado pela Câmara e pelo Senado contribuiria para a total degeneração da política em corrupção, o veto parcial de Bolsonaro merece ser analisado com bastante cuidado, pois revela uma bem arquitetada estratégia política.

Começamos pelo que não foi vetado. Bolsonaro fez vista grossa para três dispositivos relacionados ao uso do fundo partidário, uma bolada que gira em torno de R$ 1 bilhão de dinheiro público distribuída todo ano aos partidos. De acordo com a nova lei sancionada pelo presidente, os partidos agora poderão utilizar esses recursos para defender judicialmente seus membros em processos relacionados à eleição, para adquirir bens imóveis e móveis (inclusive veículos, jatinhos e helicópteros) e também no impulsionamento de conteúdo na internet.

Ricardo Noblat - O general e a “loura maluca”

- Blog do Noblat | Veja

A sensação do governo (no momento)

Gabinete de Segurança Institucional, apontado como o intelectual do governo e principal conselheiro do presidente Jair Bolsonaro. Até que Bolsonaro esvaziou os poderes de Heleno e, hoje, ele funciona apenas como conselheiro e acompanhante de luxo.

Depois foi o general Carlos Alberto dos Santos Cruz, ministro da Secretaria do Governo, amigo de Bolsonaro há mais de 40 anos, o único dos seus auxiliares que o chamava de “você” e o censurava se necessário. Santos Cruz foi abatido por mensagens disparadas no Twitter pelo vereador Carlos Bolsonaro, o Zero Dois.

O sucessor de Santos Cruz, general Luiz Eduardo Ramos, também paraquedista como ele e Bolsonaro, é a nova sensação do governo. Simpatia em pessoa, com livre trânsito no Congresso, surpreende os que o conhecem pela franqueza e sem cerimônia com que se refere a alguns dos seus colegas. Sobra para quase todos.

Segundo a mais recente edição do TAG Reporter, das jornalistas Helena Chagas e Lydia Medeiros, o ministro Onyx Lorenzoni, chefe da Casa Civil da presidência da República, é um dos alvos preferidos do general que o critica por ter procedido mal ao fazer determinados acordos com partidos para a cessão de cargos.

Não escapa nem o ministro Paulo Guedes, da Economia. Para Eduardo Ramos, Guedes promete, promete, mas não entrega. Em reuniões com parlamentares, ele já usou a expressão “loura maluca” para bater na deputada Joice Hasselmann (PSL-SP), líder do governo no Congresso. O general está com a língua solta.

Há pouco mais de 15 dias, durante um encontro com a bancada de parlamentares federais do Paraná, depois de fazer as restrições de praxe a seus colegas, o general ouviu do deputado Ricardo Barros (PP), ex-ministro da Saúde do governo Michel Temer:

– Presidente não demite deputado, mas deputado demite presidente.

O general engoliu a seco.

A dor de cabeça de Bolsonaro

Tem uma pedra no meio do caminho
Nem o candidato do PT, que só será conhecido em cima da hora, mas que poderá partir de um patamar de intenção de votos na casa dos 20%. Nem o candidato do PSDB, talvez – quem sabe? – João Doria, governador de São Paulo, que atrairia o apoio de siglas do Centrão, tais como o DEM, o PSD e outras menos votadas.

Tampouco o apresentador de televisão Luciano Huck, que mais uma vez poderá ficar onde está para não perder a montanha de dinheiro que ganha e não ter que enfrentar o desconhecido. Sérgio Moro seria um pesadelo indesejável, mas ele se verá tentado a aceitar a indicação para ministro do Supremo Tribunal Federal.

Por ora, o que mais incomoda e mete medo em Jair Bolsonaro é ter que disputar a reeleição tendo como um dos seus competidores o governador do Rio, Wilson Witzel (PSC). O Rio é a principal base eleitoral dos dois. E Witzel, mais do que os outros, está sabendo se apropriar do discurso que rendeu muitos votos a Bolsonaro.

Sergio Lamucci - O Brasil e um mundo de juros baixos

- Valor Econômico

Guerra comercial entre EUA e China poderá levar o mundo a transitar de uma fase de taxas reais de equilíbrio baixas para uma etapa de taxas “ultrabaixas”

O mundo desenvolvido convive com juros baixos desde a crise financeira global de 2007 e 2008, e a tendência é que isso continue por um longo período. Hoje, mais de US$ 17 trilhões em títulos públicos e privados oferecem rendimento negativo, num cenário de elevada incerteza, desaceleração do crescimento mundial e mudanças demográficas e tecnológicas. Esse quadro causa desconforto nos países avançados, levantando dúvidas sobre a eficácia da política monetária para combater a próxima recessão global, uma vez as taxas já estão baixas demais.

Esse ambiente tem obviamente impacto no Brasil, contribuindo para reduzir por aqui o juro neutro (a taxa que permite que a economia cresça sem gerar pressões inflacionárias). Nas contas do economista-chefe do Banco Safra, Carlos Kawall, o juro real neutro (descontada a inflação) caiu de 5,5%, no período de 2008 a 2014, para 2,5% hoje. Um terço desse recuo, segundo Kawall, se deve à queda dos juros no cenário internacional.

Para ele, os outros dois terços decorrem de mudanças na política fiscal - como o teto de gastos e a reforma da Previdência - e também na política parafiscal, com a contenção dos empréstimos dos bancos públicos. Essa combinação de fatores internos e externos permite ao Brasil experimentar um nível de juro neutro ineditamente baixo, com implicações favoráveis sobre a retomada do crescimento, a dinâmica da dívida pública e o mercado de capitais, por exemplo.

Maia e centrais se antecipam à reforma sindical

Presidente da Câmara acerta com entidades apresentação de uma PEC para discutir tema

Por Raphael Di Cunto e Marcelo Ribeiro | Valor Econômico

BRASÍLIA - Em mais uma disputa de protagonismo com o governo, o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), acertou com centrais sindicais, confederações patronais (como CNI, CNC, CNA e CNT) e federações, como a Febraban, a apresentação de uma proposta de emenda constitucional (PEC) para discutir a reforma sindical.

A intenção dos trabalhadores, ao procurar Maia, é se antecipar à reforma sindical em elaboração pelo secretário especial de Previdência e Trabalho, Rogério Marinho (PSDB) - principal responsável pela reforma trabalhista, que acabou com a contribuição sindical obrigatória e a tornou opcional.

Marinho montou um grupo de juristas, economistas e técnicos do governo para elaborar uma proposta até o fim do ano e deixou de fora sindicatos. O coordenador do grupo, o secretário do Trabalho, Bruno Dalcomo, prometeu aos sindicalistas ouvir sugestões, mas eles não terão direito a decidir na confecção do texto.

Marinho estaria se espelhando no modelo americano, de um sindicato para cada empresa, estrutura completamente diferente da brasileira, onde as entidades representam categorias por município ou região, como os metalúrgicos de São Paulo ou os motorista de ônibus do ABC. No modelo dos Estados Unidos, os funcionários do Banco do Brasil se uniriam em um sindicato exclusivo, por exemplo, sem a participação dos empregados de outros bancos.

“O governo sinalizou com o pluralismo por empresa. No Brasil vai haver milhões de sindicatos, vai ser pior do que era antes, e com um sindicalismo muito mais enfraquecido”, disse o presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT), Ricardo Patah, que tem preferência pelo modelo alemão, de sindicatos nacionais por categoria.

Ainda não há uma definição consensual sobre o modelo a ser adotado, mas o fim da unicidade sindical (de um sindicato por município/ região), antes rechaçado no meio, agora já é aceito. A Central Única dos Trabalhadores (CUT) já defendia a mudança nesse modelo, mas suas bases resistiam.

O que a mídia pensa – Editoriais

- Leia os editorias de hoje dos principais jornais brasileiros:

A resistência do populismo – Editorial | O Estado de S. Paulo

Mesmo com as dificuldades políticas que ora desafiam vários dos líderes populistas que chegaram ao poder nos últimos anos, o sentimento de desconforto de parte considerável da sociedade que alimentou o discurso desses demagogos, inclusive no Brasil, mostra-se ainda bastante vigoroso. Foi o que constatou uma ampla pesquisa do instituto Ipsos, de cujos resultados se pode depreender que eventuais reveses eleitorais de alguns populistas não significarão necessariamente o fim da onda que os impulsionou.

Realizada entre março e abril deste ano, a pesquisa ouviu 18.528 adultos em 27 países de todos os continentes, entre os quais o Brasil. No geral, 70% dos entrevistados consideram que a economia de seus países está capturada pelos interesses dos ricos e dos poderosos. Além disso, 66% entendem que a política tradicional ignora “pessoas como eu”, e 54% afirmam que a sociedade de seus países está “fraturada”. A região do mundo que teve os piores resultados nessas questões foi a América Latina.

No Brasil, 78% dos entrevistados disseram ver a sociedade “fraturada”, o segundo índice mais alto entre os países pesquisados – fica atrás somente da Polônia, com 84%, e muito à frente dos Estados Unidos (60%), país que tem apresentado forte polarização desde a campanha eleitoral à presidência que consagrou Donald Trump. Em 2016, ano do impeachment da presidente Dilma Rousseff, 77% dos brasileiros disseram considerar a sociedade “fraturada”. Ou seja, nada mudou de lá para cá.

Poesia | Fernando Pessoa - Natural que não se pense

Acho tão natural que não se pense
Que me ponho a rir às vezes, sozinho,
Não sei bem de quê, mas é de qualquer cousa
Que tem que ver com haver gente que pensa ...

Que pensará o meu muro da minha sombra?
Pergunto-me às vezes isto até dar por mim
A perguntar-me cousas. . .
E então desagrado-me, e incomodo-me
Como se desse por mim com um pé dormente. . .

Que pensará isto de aquilo?
Nada pensa nada.
Terá a terra consciência das pedras e plantas que tem?
Se ela a tiver, que a tenha...
Que me importa isso a mim?
Se eu pensasse nessas cousas,
Deixaria de ver as árvores e as plantas
E deixava de ver a Terra,
Para ver só os meus pensamentos ...
Entristecia e ficava às escuras.
E assim, sem pensar tenho a Terra e o Céu.

Música | Ana Costa - Samba dos Ancestrais