quarta-feira, 4 de novembro de 2015

Opinião do dia – Luiz Werneck Vianna

Do ponto de vista político, no entanto, é inevitável constatar que isso chegou a seu sistema nervoso central (do PT), sua liderança maior partidária. Que sua defesa seja feita fora dos trâmites policiais e passe a ser feita no fórum da política. O PT passou da hora de fazer uma autocrítica. A esta altura, as lideranças mais pesadas não ignoram os elementos de erro que se introduziram. O PT não vai acabar, aliás, não deve acabar, mas deve mudar.
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Luiz Werneck Vianna, sociólogo, professor da PUC-Rio, em entrevista. Estado de S. Paulo, 3 de novembro de 2015.

Aliados tentam evitar convocação de Luís Cláudio

• Senadores governistas articulam para impedir depoimentos de filhode Lula e ex-ministrosna CPI do Carf

- O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Governistas se articulam para impedir a convocação dos ex-ministros Gilberto Carvalho e Erenice Guerra, além de Luís Cláudio, filho do ex-presidente Lula para deporem na CPI do Carf. O presidente da comissão, senador Ataídes de Oliveira (PSDB-TO), disse que vai colocar os requerimentos para votação na reunião de amanhã, mas deve ser derrotado. Senadores o acusam de tentar criar fato político.

O objetivo é evitar que o envolvimento de ex-ministros cause novo mal estar para a presidente Dilma Rousseff e seu antecessor, Luiz Inácio Lula da Silva. A estratégia dos governistas é obstruir sessões e apontar ausência de relação entre as denúncias e o alvo das investigações da CPI, que são fraudes no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf).

Os esforços do governo, entretanto, talvez não precisem ser dos mais agudos. Quase metade da CPI é composta por membros da base aliada, além da relatora, Vanessa Grazziotin (PC do B-AM), que já adiantou que não vai votar favoravelmente aos requerimentos. “A minha análise continua a mesma. Os requerimentos fogem completamente ao objetivo central da CPI”, afirmou.

O líder do PT, Humberto Costa (PE), seguiu o discurso da relatora. “Ele (Ataídes) tem duas alternativas. Ou colhe assinaturas para abrir uma nova CPI de medidas provisórias, ou garante um aditivo para investigar esses temas que ele quer”, justificou. Acir Gurgacz (PDT-RO), vice-líder do governo, afirmou ainda não ter opinião formada sobre o assunto, mas o senador, que não é assíduo na CPI, confirmou presença para a votação desta semana e deve encorpar os interesses do governo.

Acusação. Senadores acusam o presidente da CPI de não querer, de fato, aprovar as convocações, mas apenas atingir o governo. Ao anunciar que faria os requerimentos, Ataídes assumiu compromisso de dialogar com demais senadores para tentar aprová-los. Até a tarde de ontem, no entanto, ele disse ainda não ter conversado com ninguém.

Em outubro, outros requerimentos de convocação de Erenice, Carvalho e Luís Cláudio já haviam sido rejeitados. Na ocasião, a maioria dos parlamentares argumentou que a possível compra de medidas provisórias não estava ligada ao objetivo central da CPI.

A nova fase da Operação Zelotes, realizada pela Polícia Federal na semana passada, não parece ter convencido os senadores. Semana passada, a força-tarefa fez buscas e apreensões na LFT Marketing Esportivo, empresa de Luís Cláudio, e apontou suposta ligação dos ex-ministros em um esquema de compra de MPs para favorecer o setor automotivo. / I.B.

A juíza que deu novo fôlego à Operação Zelotes

• Magistrada que autorizou busca e apreensão nas empresas de filho de Lula deu novo ritmo à investigação e não se intimida em suas decisões. Entre elas, a proibição de que procuradores usassem classe executiva em viagens internacionais

Jailton de Carvalho - O Globo

-BRASÍLIA- A juíza substituta da 10ª Vara Federal, Célia Regina Ody Bernardes, de 41 anos, que autorizou a Polícia Federal a fazer busca e apreensão de documentos na sede das empresas de um dos filhos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e mudou o curso da Operação Zelotes, está há apenas quatro anos na magistratura, mas já tem no currículo uma série de decisões consideradas arrojadas. Na curta carreira, ela contrariou interesses de grandes empresas em conflitos contra índios e sem-terra e, mais recentemente, proibiu procuradores da República de usar dinheiro público para comprar passagens de classe executiva em viagens internacionais.

Seguindo “padrão Sérgio Moro”
Mestre em Filosofia, Célia Regina começou a atuar como juíza em Cuiabá em 2011. Em 2013, foi transferida para Brasília, onde passou a oficiar na 21ª Vara Federal. Em setembro, ela foi chamada para reforçar a 10ª Vara Federal, assumiu as rédeas da Zelotes e, desde então, mudou o curso da segunda maior investigação criminal do país num momento em que seu andamento parecia condenado ao fracasso. Numa linha de atuação diferente do juiz anterior, Célia Regina determinou as primeiras prisões de advogados e lobistas acusados de manipular decisões do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf ) e comprar benesses em medidas provisórias para montadoras de carros.

No mesmo despacho, a juíza atendeu a um pedido de dois procuradores da República e autorizou busca e apreensão na sede da LFT Marketing Esportivo e de mais duas outras empresas de Luis Claudio Lula da Silva, um filhos de Lula. A medida causou forte reação nos meios políticos. Ativistas políticos passaram a associar a decisão da juiz a um de seus irmãos, Napoleão Bernardes, prefeito pelo PSDB de Blumenau. Mas o rótulo de conservadora dificilmente colará na juíza. Célia Regina é ligada à associação Juízes para a Democracia, movimento de juízes mais afinados com ideias humanistas.

Simples e direta no trato pessoal, Célia Regina não se deixou envolver pela repentina fama adquirida a partir da busca e apreensão no escritório das empresas de um dos filhos do ex-presidente Lula. Na semana passada, O GLOBO perguntou o que, com base na experiência dela, seria necessário para tornar eficaz o combate à corrupção no país. Ela preferiu não dar receita: “pelo curto período de tempo em que atuo em vara criminal, não tenho a experiência de outros processos”.

A chegada de Célia Regina à 10ª Vara Federal foi festejada por alguns procuradores e delegados. Há algum tempo alguns deles vinham pedindo “padrão Sérgio Moro” de decisão judicial em Brasília, numa referência ao juiz que está à frente da Lava-Jato em Curitiba. Mas, mesmo com as boas-vindas dos investigadores, não é certo que a juíza permanecerá no caso até o final das investigações. Na segunda-feira, o juiz titular da 10ª Vara, Vallisney de Souza Oliveira, retorna ao cargo depois de passar um ano como juiz auxiliar no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Ela deve, então, assumir a vaga do primeiro juiz substituto Ricardo Leite, que entrará em férias.

Quando Leite voltar ao trabalho, haverá um novo arranjo, e, a partir daí, não se sabe se a juíza continuará ou não à frente da Zelotes, disse ao GLOBO um dos auxiliares da magistrada. “Enquanto permanecer inalterado o ato do presidente do TRF1 que me designou, eu sou a única juíza com atribuição para os procedimentos judicializados da Operação Zelotes. Digo procedimentos, e não processos, pois ainda não foi oferecida nenhuma denúncia por parte do MPF”, explicou Célia Regina em nota semana passada.

Célia Regina se graduou em Direito e fez mestrado em Filosofia na Universidade Federal de Pernambuco com uma tese sobre preconceito racial. A tese originou o livro “Racismo de Estado: uma reflexão a partir da crítica da razão governamental de Michel Foucault” (Juruá Editora, 2013). Após ingressar na magistratura, Célia rejeitou pedido de reintegração de posse de um consórcio de empresas contra os índios Enawenê-Nawe na bacia do Alto Juruena. Também suspendeu o licenciamento da usina hidrelétrica de Teles Pires, obra do PAC, até consulta prévia aos indígenas que seriam atingidos pela obra.

Executivo da Mendes Junior é condenado a 19 anos de prisão na Lava-Jato

Por André Guilherme Vieira – Valor Econômico

SÃO PAULO - O acionista e membro do conselho de administração da Mendes Júnior Engenharia, Sergio Cunha Mendes, foi condenado a 19 anos e quatro meses de prisão por cinco atos de corrupção ativa, 11 de lavagem de dinheiro e associação criminosa em processo decorrente da Operação Lava-Jato. A decisão é do juiz Sergio Moro, titular das ações penais e inquéritos do caso Petrobras na primeira instância da Justiça Federal do Paraná. Mendes, no entanto, poderá recorrer em liberdade. O juiz autorizou que ele retirasse a tornozeleira eletrônica usada como alternativa ao cárcere.

Rogério Cunha Pereira, ex-diretor de Óleo e Gás da empreiteira, foi condenado a 17 anos e quatro meses de reclusão pelos mesmos delitos. Alberto Elísio Vilaça Gomes, que o antecedeu no cargo, recebeu 10 anos de prisão.

O magistrado estipulou em R$ 31,4 milhões o valor mínimo necessário para que os condenados indenizem os danos causados pelos crimes, a serem restituídos à Petrobras. A decisão não é definitiva e cabe recurso.

Ângelo Alves Mendes - acionista da holding e vice-presidente corporativo - e o engenheiro José Cruvinel Resende foram absolvidos por falta de provas. Segundo a decisão, a corrupção "envolveu o pagamento de propina de R$ 31,4 milhões à diretoria de Abastecimento da Petrobras".

Moro foi categórico ao refutar o álibi apresentado pelos réus, de que os pagamentos teriam sido resultado de extorsão. "Quem é extorquido, procura a polícia e não o mundo das sombras", disse.

"Quem teria ameaçado a Mendes Júnior para que ela pagasse propina até 2013?", indagou Moro, na sentença. "José Janene [deputado federal pelo PP do Paraná, responsável pela indicação de Costa à área de Abastecimento] estava morto desde 2010 e Paulo Roberto Costa afastado da diretoria da Petrobras desde abril de 2012. Já Alberto Youssef, o intermediador, não teria potencial para intimidar a Mendes Júnior. Ainda que saiba, por outro lado, que os valores eram também distribuídos a agentes políticos, isso não foi admitido por Sergio Mendes e por Rogério Cunha em seus interrogatórios, tornando toda a versão inconsistente com a realidade provada", entendeu o magistrado.

Costa e Youssef foram condenados, mas terão as penas revistas como parte de suas delações. A Mendes Júnior informou que "não se pronuncia sobre inquéritos e processos em andamento".

(Colaborou Marcos de Moura e Souza, de Belo Horizonte)

Moro condena executivos da Mendes Júnior

• Sérgio Mendes, vice-presidente da empreiteira, recebe pena de 19 anos e 4 meses; Lava-Jato tem 52 condenados

Renato Onofre - O Globo

-SÃO PAULO- O juiz Sérgio Moro condenou ontem o 12º executivo das empreiteiras acusadas de envolvimento no escândalo de corrupção na Petrobras. Sérgio Cunha Mendes, ex-vice-presidente da Mendes Júnior e herdeiro do clã, e outros dois ex-executivos da empreiteira foram considerados culpados pelo envolvimento no pagamento de R$ 31,5 milhões em propina a dirigentes da Petrobras. Mendes, assim como os outros 11 condenados, poderá recorrer da sentença em liberdade. Até o momento, Moro já condenou 52 réus da Operação Lava-Jato.

Sérgio Mendes foi o primeiro empreiteiro preso durante a 7ª fase da Lava-Jato, batizada de Juízo Final, a admitir o pagamento de propina no esquema. Assim que foi preso, ainda em novembro do ano passado, Mendes disse em depoimento à Polícia Federal ter sido extorquido pelo doleiro Alberto Youssef. Na época, o executivo admitiu ter pagado R$ 8 milhões às empresas do doleiro com “medo de retaliação” em contratos da Mendes Júnior com a Petrobras.

As investigações mostram que a Mendes Júnior, através de seus executivos, pagou suborno em cinco obras da Petrobras. Entre elas estão o Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj), no Rio, e a Refinaria de Paulínia (Replan), em São Paulo. Na sentença de condenação, Moro refuta o argumento da extorsão:

“Ora, quem é vítima de extorsão não honra compromissos de pagamento com o algoz. Falta, portanto, ao álibi uma justificativa para esses pagamentos”, escreveu o juiz. “Quem teria ameaçado a Mendes Júnior para que ela pagasse propina até 2013?”.

Sérgio Mendes, que deixou a cúpula da empresa após a prisão, foi condenado a 19 anos e quatro meses de prisão pelos crimes de corrupção ativa, lavagem de dinheiro e associação criminosa. De acordo com a sentença, o executivo cometeu o crime de corrupção ativa ao pagar propina a funcionários da Diretoria de Abastecimento da Petrobras e a políticos ligados ao PP.

Rogério Cunha de Oliveira, ex-diretor de Óleo e Gás da Mendes Júnior, foi condenado a 17 anos e quatro meses. Alberto Elísio Vilaça Gomes, também ex-diretor de Óleo e Gás, recebeu sentença de dez anos de prisão. Também foi condenado o operador Enivaldo Quadrado, que já havia sido condenado no mensalão. Quadrado pegou sete anos e seis meses de prisão por lavagem de dinheiro.

O juiz Sérgio Moro absolveu outros dois executivos da construtora: Ângelo Alves Mendes, ex-vice-presidente, e o engenheiro José Humberto Cruvinel Resende. O doleiro Alberto Youssef foi condenado mais uma vez, mas teve a pena suspensa por Moro por conta do acordo de delação premiada. Paulo Roberto Costa também obteve a suspensão da sentença.

“É pior tentar encobrir”
No fim da sentença, Moro recomendou à construtora Mendes Júnior tentar acertar sua situação junto ao Ministério Público Federal, ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), à Petrobras e à Controladoria Geral da União (CGU).

O juiz ressaltou que a empresa não estava sendo julgada: “A Mendes Júnior, por sua dimensão, tem uma responsabilidade política e social relevante e não pode fugir a elas, sendo necessário, como primeiro passo para superar o esquema criminoso e recuperar a sua reputação, assumir a responsabilidade por suas faltas pretéritas. É pior para a reputação da empresa tentar encobrir a sua responsabilidade do que assumi-la”.

Moro citou o recente caso da montadora alemã Volkswagen, que admitiu publicamente adulterações nos resultados de medições de poluentes de seus carros: “É ilustrativo do comportamento apropriado de uma grande empresa quando surpreendida na prática de malfeitos”.

Em nota, a Mendes Júnior informou que não se pronuncia sobre inquéritos e processos em andamento. A defesa dos executivos informou que irá recorrer da sentença.

Os 12 executivos de empreiteiras condenados
A lava-Jato já condenou 52 envolvidos no esquema de corrupção na Petrobras

*Fizeram acordo de delação e tiveram a pena reduzida em troca de obrigação de colaborar com a Justiça

Juiz da Lava Jato diz que propina na Petrobrás era a ‘regra do jogo’

• Na sentença contra a cúpula da empreiteira Mendes Júnior, Sérgio Moro destaca que pagamentos eram realizados até por empresas não cartelizadas

Por Ricardo Brandt, Julia Affonso e Mateus Coutinho – O Estado de S. Paulo

CURITIBA - A propina na Petrobrás era ‘regra do jogo’, escreveu o juiz federal Sérgio Moro, da Operação Lava Jato, na sentença em que impôs nesta terça-feira, 3, pesada condenação criminal a três importantes executivos da empreiteira Mendes Júnior, entre eles Sérgio Cunha Mendes (19 anos e quatro meses de reclusão), por corrupção, lavagem de dinheiro e associação criminosa.

“A prática (da propina), de tão comum e sistematizada, foi descrita por alguns dos envolvidos como constituindo a ‘regra do jogo'”, destaca o juiz.

Segundo Moro, ‘grandes empreiteiras do Brasil, entre elas a Mendes Junior Trading e Engenharia S/A, formaram um cartel, através do qual teriam sistematicamente frustrado as licitações da Petrobrás para a contratação de grandes obras’.

Em síntese, diz Sérgio Moro, as empresas, em reuniões prévias às licitações, definiram, por ajuste, a empresa vencedora dos certames relativos aos maiores contratos da estatal petrolífera. “Às demais cabia dar cobertura à vencedora previamente definida, deixando de apresentar proposta na licitação ou apresentando deliberadamente proposta com valor superior aquela da empresa definida como vencedora.”

No processo envolvendo os dirigentes da Mendes Júnior a investigação revelou pagamento de R$ 31,4 milhões em propinas para o ex-diretor de Abastecimento da Petrobrás, Paulo Roberto Costa. A comissão foi paga sobre cinco contratos firmados pela empreeiteira com a estatal.

“O ajuste prévio entre as empreiteiras propiciava a apresentação de proposta, sem concorrência real, de preço próximo ao limite aceitável pela Petrobrás, frustrando o propósito da licitação de, através de concorrência, obter o menor preço”, escreveu Moro na sentença desta terça, 3.

Ele registra que as empresas componentes do cartel, pagariam sistematicamente propinas a dirigentes da empresa estatal calculadas em porcentual, de um a três por cento em média, sobre os grandes contratos obtidos e seus aditivos.

A ação penal envolvendo a Mendes Júnior ‘abrange somente uma fração desses fatos’, segundo Moro.

A denúncia da força-tarefa do Ministério Público Federal diz que a Mendes Júnior participava do cartel e ganhou, mediante ajuste, obras contratadas pela Petrobrás, pagando propina de cerca de 1% sobre o valor dos contratos e dos aditivos à Diretoria de Abastecimento comandada por Paulo Roberto Costa.

Os procuradores da República afirmam que a propina foi distribuída a partir dos contratos ganhos pela Mendes Júnior, isoladamente ou em consórcio com outras empresas, na Refinaria Presidente Getúlio Vargas/PR – REPAR, na Refinaria de Paulínea/SP – REPLAN, no Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro – COMPERJ, no Refinaria Gabriel Passos/MG – REGAP, no Terminal Aquaviário de Barra do Riacho, em Aracruz (ES),e nos Terminais Aquaviários de Ilha Comprida e Ilha Redonda, na Baía de Guanabara, no Rio de Janeiro.

“Como, porém, há notícias de que as propinas eram pagas até por empresas não cartelizadas, de se concluir, na esteira das declarações de alguns dos acusados, que as propinas haviam se tornado ‘rotina’ ou a ‘regra do jogo’, sequer tendo os envolvidos exata compreensão do porquê se pagava ou do porquê se recebia”, anotou Sérgio Moro.

Segundo o juiz da Lava Jato, ‘quando a corrupção é sistêmica, as propinas passam a ser pagas como rotina e encaradas pelos participantes como a regra do jogo, algo natural e não anormal, o que reduz igualmente os custos morais do crime’.

Ele ressalta que ‘fenômeno semelhante foi descoberto na Itália a partir das investigações da Operação Mani Pulite, com a corrupção nos contratos públicos tratada como uma regra ‘geral, penetrante e automática’.

“O que se tem presente, porém, é que a propina destinada à corrupção da Diretoria de Abastecimento foi paga com dinheiro sujo, procedente de outros crimes antecedentes, aqui identificados como crimes de cartel e de frustração, por ajuste, de licitações.”

Oposição derrota governo e exclui planejamento tributário de MP

Por Raphael Di Cunto - Valor Econômico

BRASÍLIA - Em um dos primeiros testes após a reforma ministerial, a oposição contou com apoio de parte da base para derrotar o governo e excluir, durante a análise da Medida Provisória (MP) 685, que institui um programa para pagamento de impostos em litígio, os artigos que determinavam que as empresas informassem à Receita Federal as operações e atos adotados para pagar menos impostos - o chamado planejamento tributário.

Os deputados aprovaram ainda, por apenas um voto, emenda do PSDB para alterar o texto da MP que autoriza o governo a reajustar por decreto taxas cobradas pela administração federal, como a de Fiscalização de Serviços de Energia Elétrica. O único limite era no primeiro ano, quando o relator da medida, senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), estabeleceu que não poderia ser superior a 50% da recomposição. Com a emenda, o reajuste anual estará restrito ao índice inflacionário.

O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, encaminhou a MP ao Congresso como parte do ajuste fiscal. Argumentou que a desatualização monetária das taxas colocava em risco o financiamento das finalidades para as quais foram criadas e que o planejamento tributário era uma recomendação da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

"A revelação de estratégias de planejamento tributário visa aumentar a segurança jurídica no ambiente de negócios e gerar economia de recursos públicos em litígios desnecessários e demorados. O acesso a tais informações oferece oportunidade de responder rapidamente aos riscos de perda de arrecadação tributária por meio da fiscalização ou mudança na legislação", justificou Levy.

O texto foi modificado por Tasso Jereissati já na comissão mista, ao propor que as empresas só teriam que informar sobre atos ou negócios jurídicos de elisão fiscal considerados ilegais se estivessem em uma lista a ser publicada pela Receita Federal.

Mesmo assim, a oposição, articulou contra o texto, criticado pelas empresas e escritórios de advocacia por aumentar a carga tributária. "O governo deveria estar mais preocupado em controlar a evasão fiscal do que a elisão, que é prevista em lei e não é ilegal", afirmou o deputado Bruno Covas (PSDB-SP). "É como se houvesse uma rodovia pedagiada e a Receita me informasse a dizer que fui por uma outra avenida para colocar pedágio lá", criticou.

Já o deputado Paulo Pimenta (PT-RS) criticou a postura da oposição, que estaria "defendo as grandes empresas". "Com esse mecanismo da MP queremos dificultar a sonegação e a vida daqueles que buscam uma interpretação da lei que seja prejudicial ao Poder Público", disse.

O destaque supressivo foi do PPS, com apoio da oposição, mas os votos decisivos para derrubar a proposta foram de deputados da própria base - foram 239 votos a 179. PSD e PRB orientaram seus deputados contra o projeto e o PMDB liberou seus deputados. No PP, que se manifestou a favor, 15 dos 28 presentes traíram o Palácio do Planalto.

Com críticas do PT sobre a postura do PSD, o deputado Ricardo Izar (PSD-SP) rebateu que não era a posição da legenda que estava em questão. "Quem não entende a posição do governo somos nós, que só somos lembrados na hora de 'carcar' a população", disse.

O governo poderia trabalhar para reincluir os trechos retirados pelos deputados na votação no Senado, mas a votação precisa ser rápida - a MP perde a validade se não for aprovada até dia 18. E seria necessário submeter as mudanças a nova votação na Câmara.

Os deputados só não mexeram nos artigos referentes ao Programa de Redução de Litígios Tributários (Prorelit), que prevê o pagamento de impostos atrasados com incentivos, como a quitação de apenas 30% do valor devido - com parcelamento em três vezes- e o resto pago com créditos de prejuízos fiscais e de base de cálculo negativo da CSLL. O governo estimava arrecadar R$ 10 bilhões com o programa, mas a adesão ficou abaixo do esperado.

Parecer do TCU pede correção de pedaladas

João Villaverde, Adriana Fernandes Fábio Fabrini - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - A área técnica do Tribunal de Contas da União (TCU) manteve decisão tomada pelos ministros da corte, exigindo que o governo Dilma Rousseff corrija as “pedaladas fiscais”. Os pareceres técnicos, obtidos pelo Estado, negam, portanto, o recurso impetrado pelo governo em abril, mas permitem que a equipe econômica entregue, em 30 dias, um cronograma de correção das pedaladas.

A forma de pagamento das pedaladas é decisiva para o resultado das contas públicas em 2015 e nos próximos anos. Se o governo optar por pagar tudo de uma vez até dezembro, o déficit fiscal poderá chegar a R$ 117,9 bilhões, uma vez que o total de pedaladas é da ordem de R$ 55 bilhões neste momento. No entanto, se seguir um cronograma de pagamento parcelado, o resultado será “menos pior” em 2015, mas a correção das pedaladas vai contaminar as contas federais de 2016 em diante, dificultando ainda mais o ajuste fiscal.

O parecer técnico ainda terá que ser analisado pelo ministro Vital do Rêgo antes de ser levado a plenário. Antes dessa decisão, ele também ouvirá o Ministério Público de Contas (MPC) sobre o recurso do governo. O ministro quer levar seu voto ao plenário ainda neste mês.

Depois dessa análise do recurso do governo pelos ministros do TCU, a corte ainda vai decidir sobre a responsabilidade de cada uma das 17 autoridades do governo, entre elas o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, os ministros do Planejamento, Nelson Barbosa, e os presidentes da Petrobrás, Aldemir Bendine, e do BNDES, Luciano Coutinho, além do ex-ministro da Fazenda, Guido Mantega, e do ex-secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin. Entre as penas, o TCU pode aplicar multas financeiras e também a inabilitação para a administração pública. / Colaborou Ricardo Brito

Governo diverge sobre antecipação de defesa de contas

• Base discorda de decisão do governo de entregar hoje documento à comissão que analisa parecer do TCU que rejeitou prestação de 2014

Isabela Bonfim, Isadora Peron - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O Palácio do Planalto e sua base no Senado divergiram ontem sobre a melhor estratégia de defesa do governo na Comissão Mista do Orçamento do Congresso, que irá analisar o parecer do Tribunal de Contas da União (TCU) pela rejeição das contas de governo da presidente Dilma Rousseff referentes a 2014. Alguns senadores da base consideraram a decisão “arriscada” e “descabida”.

Apesar de ter recebido do presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL), prazo de 45 dias para apresentar sua defesa, o governo decidiu por entregar o documento ainda hoje ao colegiado, o 28.º dia do prazo. Após reunião de coordenação política no Planalto, ficou acertado que o ministro da Casa Civil, Jaques Wagner, entregaria pessoalmente a defesa ao peemedebista. A decisão de abrir mão do prazo de mais de um mês, alcançado após manobra do presidente do Senado, foi tomada com base em uma avaliação de que é possível reverter a decisão do TCU e conseguir a aprovação das contas na Comissão.

Oficialmente, o Planalto afirma que decidiu antecipar a entrega para mostrar que não trabalha para postergar a análise do caso e está confiante na aprovação das contas do governo pelo Congresso. O governo, no entanto, tem trabalhado para dar sinais positivos para o mercado. Não aprovar a alteração da meta seria mais um motivo que poderia levar ao agravamento da crise econômica.

Risco. Entretanto, segundo alguns parlamentares, não há no momento nenhuma indicação de que o governo tenha maioria na Comissão e a melhor estratégia é utilizar ao máximo o prazo que foi recebido para fortalecer o apoio à presidente dentro do colegiado. Nesse sentido, um grupo de senadores se mobilizava ontem para convencer a Casa Civil de que não havia nenhum motivo para antecipar a defesa.

Inicialmente, a Advocacia-Geral da União (AGU) havia informado que a entrega seria feita ontem. A decisão de deixar para hoje foi tomada após reunião de Dilma com ministros do núcleo duro do governo.

A entrega da defesa faz com que comece a tramitar na Comissão Mista de Orçamento a análise do parecer do TCU, que rejeitou, de forma unânime, as contas de Dilma. A Comissão será responsável por elaborar um novo parecer, que será analisado pelos deputados. Caso o Congresso também rejeite as contas da presidente, isso poderia dar força a um eventual processo de impeachment contra Dilma.

No dia 21 do mês passado, Renan havia concedido 45 dias para o governo apresentar a defesa ao Congresso.

Perda de hegemonia petista será lenta, diz pesquisadora

Por Cristiane Agostine - Valor Econômico

CAXAMBU (MG) - Em meio à crise política enfrentada pelo PT e pelo governo federal, ainda não surgiu nenhuma força política ou partido capaz de atrair o contingente eleitoral dependente de programas sociais como o Bolsa Família, nem a classe média que ascendeu nos governos do PT. Dessa forma, a perda da hegemonia petista sobre esse eleitorado tende a ser lenta, analisa a cientista política Marta Arretche, diretora do Centro de Estudos das Metrópoles da USP.

O processo de identificação do eleitorado com um partido é lento, diz Marta, e apesar do desgaste do PT com o mensalão, petrolão e o ajuste fiscal implementado pela presidente Dilma Rousseff, "nenhum agrupamento político está vocalizando o mal-estar" da população mais vulnerável.

"O espaço político que o PT poderá vir a perder terá que ser ocupado por uma força política que vocalize os problemas desse contingente, que hoje não tem", afirma Marta. "Podemos ter um processo de acomodação e de realinhamento de forças partidárias que dure uma, duas, três eleições. 

Esses processos não são movimentos rápidos, porque dependem da identificação do eleitorado com forças políticas, com grupos que venham a se viabilizar ou não. O fato é que a preferência do eleitorado por ter alguma proteção social não vai desaparecer", diz. "É um contingente importante e não está claro qual será a força política que ocupará a preferência desse eleitorado num curto espaço de tempo. É muito pouco provável que ocorra no espaço de uma eleição".

O próprio PT levou de 1980 até 2002 para se viabilizar como alternativa eleitoral da esquerda, afirma Marta, em entrevista ao Valor, durante encontro da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais (Anpocs), em Caxambu (MG), na semana passada.

Nas mobilizações de rua, o que sobrou das jornadas de junho de 2013 foram grupos sociais mais conservadores, mobilizados pelo impeachment de Dilma e que deixaram de lado as demandas dos mais pobres e da nova classe média. O PSDB, com forte atuação anti-petista, tem dificuldade para atrair esse contingente. A ala mais ativa do partido, representada pelo senador Aécio Neves (MG) e pelo líder da bancada na Câmara, Carlos Sampaio (SP), tem buscado o eleitor anti-PT, que têm críticas ao Bolsa-Família.

O impacto eleitoral das denúncias, no entanto, deve ser sentido com força pelo PT nas urnas próximas eleições e mesmo o eleitorado beneficiado diretamente nas gestões petistas, como a nova classe média, tende a "punir" o partido pelo fato de Dilma ter trocado sua política econômica, além dos escândalos. "A inclusão social que tivemos recentemente tem um custo também para a chamada classe média, formada por pessoas com grau de vulnerabilidade social. Eles culpam o Bolsa Família porque acreditam que os que ganham o benefício estão melhores do que eles. O preocupante é que não tem nenhum agrupamento político que está vocalizando o mal-estar e as preferências políticas desse contingente", diz.

O desgaste eleitoral do PT poderá ser diluído pelo fato de os escândalos atingirem também PSDB. PMDB, PP e DEM. "É possível que o eleitor assuma que todos são igualmente corruptos e vote naquele do qual ele tem algum registro que tenha melhorado no seu bem-estar", afirma.

O cenário a médio prazo, no entanto, é diferente e a crise enfrentada pelo PT poderá abrir espaço para que outra força política ocupe o espaço que hoje é da sigla.

Marta analisa que no centro da crise está a disputa sobre quem pagará pelo ajuste fiscal. A tensão social deve durar enquanto o ajuste for a aposta do governo. "Enquanto imperar o ajuste fiscal - e vai imperar por um longo tempo-, a temperatura dos conflitos será alta", diz. "Teremos disputas políticas pesadas em torno de quem pagará tributos e quem receberá benefícios".

Para Marta, a manutenção de programas sociais está garantida por uma questão eleitoral, apesar do desgaste do PT. "O contingente eleitoral beneficiado pelas políticas sociais é um colchão político importante para impedir a retração dos programas sociais", diz. "Votar medidas que afetem negativamente esses setores têm custo eleitoral importante".

Caminhoneiros ameaçam greve e preocupam governo federal

Valdo Cruz, Marina Dias e Gustavo Uribe – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - A presidente Dilma Rousseff está preocupada com uma nova ameaça de greve dos caminhoneiros, programada inicialmente para a próxima segunda-feira (9), e orientou sua equipe a monitorar e iniciar conversas com líderes do movimento para tentar evitar a paralisação.

O Planalto teme que a greve cause desabastecimento no país, o que pode agravar ainda mais o quadro de recessão econômica.

O ministro Ricardo Berzoini (Secretaria de Governo) já conversou com alguns líderes do setor e obteve deles a informação de que a tentativa de greve está sendo comandada por grupos independentes, o que diminuiria a força do movimento.

O ministro José Eduardo Cardozo (Justiça), a quem é subordinada a Polícia Rodoviária Federal, também participa do grupo de assessores encarregado de criar uma estratégia para evitar que a paralisação de caminhoneiros ganhe força e crie dificuldades de abastecimento no país.

O tema foi objeto de discussão em reunião, nesta terça-feira (3) em Brasília, da presidente com ministros e líderes do governo no Congresso Nacional.

A mais recente manifestação do caminhoneiros ocorreu em abril deste ano e durou cinco dias, gerando bloqueios em estradas e prejudicando o abastecimento em algumas cidades.

Na ocasião, o movimento perdeu força após o governo prometer intermediar a negociação, com o setor contratante, de uma tabela referencial de preços do frete.

Desta vez, a ordem da presidente é monitorar os movimentos para que nenhuma paralisação desse tipo pegue o governo de surpresa.

No final de outubro, o Comando Nacional do Transporte, grupo de caminhoneiros que se declara independente de sindicatos, divulgou nota em seus perfis nas redes sociais prometendo greve geral para o dia 9.

Segundo o comunicado, os principais movimentos que pedem o impeachment da presidente Dilma Rousseff, como o Vem Pra Rua, o Revoltados Online e o MBL (Movimento Brasil Livre), apoiam a paralisação da classe.

Esse apoio é outra preocupação do Planalto, porque pode gerar uma agenda política negativa no momento em que perdeu força, dentro do Congresso, a estratégia da oposição para tentar abrir um processo de impedimento contra a presidente .

Reivindicação
O grupo de caminhoneiros reivindica desde o início do ano a redução do preço do óleo diesel, a criação do frete mínimo, salário unificado em todo o país e a liberação de crédito com juros subsidiados no valor de R$ 50 mil para transportadores autônomos. Querem também ajuda federal para refinanciamento de dívidas de compra de seus veículos.

A página do Facebook do Comando Nacional do Transporte conta hoje com cerca de 25,5 mil seguidores.

Greve já reduz produção de petróleo e gás natural, diz Petrobras

• Estatal afirma que paralisação vai afetar arrecadação de tributos

Bruno Rosa - O Globo

A greve de trabalhadores da Petrobras já afeta em cheio a produção de petróleo da estatal. Em comunicado enviado à Comissão de Valores Mobiliários (CVM), a companhia destacou que anteontem deixou de produzir 273 mil barris de petróleo por dia, o que equivale a uma queda de 13% na sua produção no país. Além disso, houve recuo de 14% na produção de gás natural. “Adicionalmente, 7,3 milhões de metros cúbicos de gás natural deixaram de ser disponibilizados”, disse a estatal em nota.

Ontem, segundo estimativas da própria companhia, a produção de petróleo foi reduzida em mais 8,5%. No caso do gás natural, o recuo chega a mais 13%, se comparado com o que estava sendo produzido antes do início da greve, na última quinta-feira.

O recuo ocorre em um momento de queda na produção e de pesados cortes de investimento para manter o caixa da empresa. Em meados de outubro, a Petrobras havia informado que a produção em setembro registrou queda de 6,7% em relação ao mês anterior, para 2,06 milhões de barris por dia de petróleo, devido a paradas programadas de plataformas.

Perda de US$ 25 milhões por dia
Ontem, a Petrobras destacou que o recuo de produção, com a greve, vai afetar a “arrecadação de tributos recolhidos em favor da União Federal, estados e municípios, como os royalties e a participação especial”. A Petrobras, no entanto, descartou o risco de desabastecimento do mercado.

Cálculos da Federação Única dos Petroleiros (FUP), porém, indicam que a greve de trabalhadores da Petrobras reduziu a produção de petróleo da empresa em cerca de 25% entre domingo e segunda-feira. Nas receitas da estatal, o óleo que deixou de ser produzido significa menos US$ 25 milhões por dia. A estimativa de perda de receita foi feita por consultores, considerando o preço do barril de petróleo Brent, referência no mercado, a US$ 50.

— (Nesse cálculo) estamos falando só sobre o que ela deixou de arrecadar pelo valor da mercadoria, fora as margens, que são difíceis de calcular, porque dependem de cada produto, mas no mínimo foi isso — afirmou o sócio-diretor da consultoria DZ Negócios com Energia, David Zylbersztajn.

De acordo com o coordenador-geral da FUP, José Maria Rangel, nas primeiras 24 horas, a greve fez com que a Petrobras deixasse de produzir 500 mil barris de petróleo, 450 mil só na Bacia de Campos. Rangel ainda não tinha um levantamento do avanço da paralisação ontem. Segundo o sindicalista, também há relatos de adesão à greve nas refinarias da Petrobras de Cubatão (São Paulo) e na Bahia, mas não foram registrados problemas com distribuição.

A paralisação dos funcionários filiados à FUP tem como principal objetivo protestar contra o corte no plano de desinvestimentos da Petrobras. A Federação congrega 12 sindicatos e diz representar 70% da categoria.

Zylbersztajn questionou a atitude dos sindicalistas:

— Essa greve não é nem um tiro no pé, é um tiro na cabeça.

Indústria recua 10,9% em um ano, pior queda desde abril de 2009

Produção industrial cai 1,3% em setembro e tem recuo de 7,4% no ano

Por Robson Sales – Valor Econômico

RIO - (Atualizada às 9h54) A produção industrial diminuiu 1,3% em setembro na comparação com o mês anterior, na série com ajustes sazonais. Foi o quarto resultado negativo seguido da indústria, que acumulou nesse período perda de 4,8%. Em agosto, a produção caiu 0,9% ante julho (dado revisado). As informações são do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Os 22 economistas consultados pelo Valor Data esperavam retração de 1,4%, em média. O intervalo das estimativas era de recuo de 2% a retração de 0,4%.

Na comparação com setembro de 2014, a produção industrial brasileira caiu 10,9%. É a primeira redução de dois dígitos no ano e a maior nessa comparação desde abril de 2009, quando a atividade nas fábricas recuou 14,1%. Nessa comparação, é também o pior setembro da série, iniciada em 2003. Na média, os economistas esperavam queda de 11,2%.

Ainda nesse tipo de confronto, 24 de 26 segmentos da indústria registraram baixa. Houve recuo em 68 dos 79 grupos e em 76,8% dos 805 produtos pesquisados.

"Os índices do setor industrial foram negativos tanto para o fechamento do terceiro trimestre de 2015 (-9,5%), como para o acumulado dos nove meses do ano (-7,4%), ambas as comparações contra iguais períodos do ano anterior. A taxa anualizada, indicador acumulado nos últimos 12 meses, com o recuo de 6,5% em setembro de 2015, assinalou a perda mais intensa desde dezembro de 2009 (-7,1%) e manteve a trajetória descendente iniciada em março de 2014 (2,1%)", destacou o IBGE em nota.

Categorias econômicas
A comparação entre setembro e agosto mostrou alta de 1% na produção de bens de capital, já com ajustes sazonais. Na mesma base de comparação, a produção de bens intermediários caiu 1,3%, enquanto a de bens de consumo duráveis recuou 5,3% e a de semi e não duráveis avançou 0,5%.

Em relação a setembro de 2014, a produção de bens de capital recuou 31,7%, a de bens intermediários caiu 7,2%, ao passo que a produção de bens de consumo duráveis recuou 27,8% e a de semi e não duráveis caiu 7,4%.

Veículos
A produção de veículos automotores, reboques e carrocerias teve forte queda em setembro e influenciou o resultado médio da indústria brasileira, segundo o IBGE.

Ante agosto, o recuo nesse segmento foi de 6,7%, o segundo consecutivo, acumulando nesse período perda de 15,9%. Na comparação com o setembro do ano passado, o tombo foi de 39,3%.

Também influenciou, na comparação, anual, o fato de setembro de 2015 ter tido um dia útil a menos (21) do que igual mês do ano anterior (22).

Economistas veem inflação a 10% este ano

• Pesquisa do BC mostra que, para bancos, índice só volta à meta em 2019

Gabriela Valente – O Globo

-BRASÍLIA- Após o Banco Central (BC) abandonar o compromisso de levar a inflação para o centro da meta em 2016, o mercado financeiro piorou as expectativas para o controle de preços no Brasil. O grupo de economistas consultados para o boletim Focus que mais acerta as apostas, o chamado “Top 5”, prevê inflação de dois dígitos este ano, o que não acontecia desde 2002. Na visão geral, o índice só atingirá o centro da meta, de 4,5%, em 2019. Segundo a pesquisa semanal do BC, a estimativa para o IPCA, o índice oficial de inflação, este ano subiu de 9,85% para 9,91%, a sétima deterioração consecutiva. Para o “Top 5”, o IPCA ficará em 10,03%. Até a semana passada, o esperado era 9,95%.

Remédio amargo para inflação
Para 2016, o “Top 5” vê uma inflação resistente, em 7,33%. O boletim mostra que este grupo está um pouco mais pessimista que as demais instituições. Na mediana, os economistas esperam um IPCA de 6,29% para o próximo ano, contra 6,22% na semana passada.

Pesa nas estimativas a avaliação de que o tarifaço deste ano terá impacto bem maior na inflação do que o projetado anteriormente. Só em 2015, a inflação dos preços administrados (como água e energia) deve ser de 16,5%. O percentual foi revisado após o BC projetar um aumento de mais de 50% na conta de luz este ano. Em 2016, as tarifas públicas devem ter alta de 6,75%.

O pessimismo contaminou outras projeções. A economia deve encolher 3,05% neste ano (a aposta anterior era de 3,02%) e 1,51% em 2016 (1,43% anteriormente). Esse é um argumento favorável para a convergência da inflação para a meta em 2017: com menos renda e emprego, o brasileiro deve consumir menos, e os empresários não elevarão mais os preços.

— Com a recessão de 1,5% no ano que vem, é possível que haja convergência para a meta em 2017. Serão dois anos de recessão, coisa que não acontece desde a crise dos anos 1930. A inflação será controlada por uma situação terrível. É um efeito positivo de uma situação dramática — afirmou Alcides Leite, professor da Trevisan.

Merval Pereira - Circo armado

- O Globo

“Vou provar que não faltei com a verdade na CPI”, afirmou o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, diante da abertura do processo de cassação de seu mandato por quebra de decoro parlamentar. Como as contas na Suíça que ele nega serem suas, mas têm sua assinatura e até foto do passaporte para não deixar dúvidas, têm data muito anterior ao depoimento de Cunha na CPI da Petrobras, meses atrás, é difícil imaginar um truque que permita a ele provar que à época da declaração as contas não existiam e que, portanto, não mentiu.

O ex-presidente Clinton, dos Estados Unidos, alegou que não mantivera relações sexuais com a estagiária da Casa Branca porque não considerava nessa categoria o sexo oral. O deputado Paulo Maluf ficou indignado por ter sido comparado a Cunha, alegando que nunca encontraram uma assinatura sua, muito menos registros de seu passaporte, nas contas no exterior que ele continua dizendo que não são suas.

As provas já vazadas das investigações da Procuradoria-Geral da República, com base nas informações vindas da Suíça, são tão avassaladoras que, a princípio, parecia questão de tempo para a clássica saída dos políticos enrascados apanhados com a boca na botija: renúncia à presidência da Câmara e negociação para não perder o mandato no Conselho de Ética.

Mas Eduardo Cunha é mais ousado do que o senador Renan Calheiros, que abriu mão da presidência do Senado numa negociação em que preservou seu mandato e ganhou tempo para voltar à presidência do Senado anos mais tarde. O processo de que era acusado ainda está em curso.

Cunha é mais ousado que Antonio Carlos Magalhães e Jader Barbalho, que também renunciaram à presidência do Senado a seus tempos. Quer repetir a façanha do ex-senador José Sarney, que se manteve firme na presidência do Senado mesmo sendo julgado pelo Conselho de Ética pela edição de decretos secretos.

Mas aquela era uma questão que poderia ser tratada como administrativa, e Sarney era um ex-presidente da República que tinha todo o apoio do então popular presidente Lula, que considerava que ele não podia ser tratado como “uma pessoa comum”.

Eduardo Cunha tem o apoio disfarçado do PT e de áreas da oposição, e até mesmo apoios declarados, como o de Paulinho da Força Sindical, que vai assumir a vaga do Solidariedade no Conselho de Ética com a disposição declarada de ajudar Cunha a se livrar das acusações.

Arma-se um circo no Conselho de Ética que pode levar até mesmo ao arquivamento do processo antes do que a opinião pública imagina, a começar pela escolha do relator, que pode nem mesmo iniciar o processo com a sugestão de arquivamento dentro dos próximos 10 dias.

Entre os três sorteados para a função, todos são ligados de uma maneira ou outra a Cunha, que já fez uma declaração que tem cheiro de ameaça. Segundo ele, cerca de 150 deputados respondem a processo neste momento, e todos deveriam ser submetidos ao Conselho de Ética se prevalecesse a tese que vingou para ele.

É uma versão reduzida dos “300 picaretas” que Lula identificou no Congresso quando lá esteve como deputado constituinte. É o caso de dois deles: Vinicius Gurgel, do PR, é investigado por crimes eleitorais e contra a ordem tributária. Fausto Pinato, do PRB, é acusado de falso testemunho. Já Zé Geraldo, do PT, tem proximidades ideológicas com Cunha, pelo menos em relação ao juiz Sérgio Moro, a quem acusa de “trabalhar fortemente para desestabilizar nossa democracia”.

O petista acha que a Lava-Jato “vem causando prejuízos enormes ao país, quebrando empresas, produzindo um exército de desempregados e desfalcando dia a dia um dos nossos maiores patrimônios, a Petrobras”.

Como o ex-deputado André Vargas conseguiu levar por oito meses seu processo na Comissão de Ética até ser condenado, o mais provável é que Eduardo Cunha, antes de ser cassado por seus companheiros, terá que prestar contas mesmo é à Justiça.

Dora Kramer - Léguas a percorrer

- Estado de S. Paulo

Politicamente baleado, o deputado Eduardo Cunha segue inabalável na presidência da Câmara mantido pelas mesmas circunstâncias que levarão o processo contra ele por quebra de decoro se arrastar ao máximo no Conselho de Ética da Casa antes de ir à votação no plenário. Isso se chegar até lá.

As referidas circunstâncias se resumem à conjugação de interesses de parlamentares de oposição e de situação, aliada ao fato peculiar de que o denunciado desta vez é o dono da faca e do queijo. A fim de facilitar o entendimento, note-se o seguinte: a representação do PSOL e da Rede foi levada à Corregedoria da Câmara no dia 7 de outubro. De acordo com levantamento do jornal O Globo, a Secretaria-Geral da Mesa (presidida por Cunha) reteve o documento por 21 dias, a pretexto de conferir assinaturas.

Ontem o caso finalmente chegou ao Conselho de Ética. O presidente do colegiado, José Carlos Araújo, promete escolher o relator ainda hoje. Feito isso, os “conselheiros” deverão se manifestar sobre a admissibilidade do pedido. Caso aceito, Eduardo Cunha será notificado e, no prazo de dez dias úteis, deve apresentar defesa. A partir daí, correm 40 dias úteis para investigações.

O Congresso entra em recesso no dia 17 de dezembro, daqui a um mês e poucos dias. Portanto, antes de março ou abril de 2016 nada se resolve no âmbito do Parlamento. O ano que vem é eleitoral. Prefeitos e vereadores vão precisar de dinheiro para as campanhas eleitorais que, segundo as novas regras, não poderão ser financiadas por pessoas jurídicas.

A pessoa física de Eduardo Cunha deu ajuda substanciosa a vários deputados federais. De muitos partidos, incluído aí o maior de oposição: PSDB. Eleição de deputados tem correlação direta com eleição de prefeitos e vereadores. São preciosos sustentáculos. Em ano de pleito municipal, toda ajuda será celebrada. E provavelmente recompensada.

Quero dizer o quê? Que os fatos conspiram contra o andamento do processo de cassação. Cunha provavelmente vai se safar. Com a ajuda de deputados de oposição que a direção do PSDB não consegue controlar. E por quê? Porque fala mais alto o dinheiro das respectivas campanhas.

No pulo. Há cerca de 40 dias, o vice-presidente, Michel Temer, e o presidente do PSDB, senador Aécio Neves, tiveram uma conversa sobre um eventual governo de transição. O encontro aconteceu na casa do senador Romero Jucá, em condomínio nos arredores de Brasília.

O assunto não prosperou, inclusive porque nesse meio tempo entrou em cena o fator Eduardo Cunha. O vice-presidente quase foi pego de calças curtas em pleno exercício da “conspirata” por um dos agentes de sua equipe de segurança que, preocupado com o sumiço, conseguiu falar com ele por telefone, mas não obteve a localização exata do chefe.

Balzaquiana. Tantas falas desprovidas de sentido comete a presidente Dilma Rousseff que algumas passam batidas. Não mereceu destaque a consideração feita por ela semanas atrás a respeito da democracia brasileira, uma “adolescente” a ser preservada na figura da manutenção de seu mandato.
Sempre é tempo de observar: a democracia no Brasil tem 30 anos de idade. Uma adulta, cuja maturidade se expressa justamente na independência dos Poderes e no estrito cumprimento da lei. Práticas que Luiz Inácio da Silva e companhia condenam com veemência.

Hélio Schwartsman - Contra a civilização

- Folha de S. Paulo

Qual a melhor coisa que aconteceu à humanidade? Embora eu padeça de simpatias anarquistas, não hesito em responder que, historicamente, a maior bênção que caiu sobre nós foi o surgimento de Estados fortes, com aparelhos repressivos. Foi isso que fez com que as pessoas contivessem drasticamente o pouco civilizado hábito de matar umas às outras.

Em tempos modernos, um dos primeiros proponentes dessa teoria foi o sociólogo Norbert Elias, em "O Processo Civilizatório" (1939). Para Elias, à medida que o Estado passou a exercer o monopólio da violência, indivíduos foram se autodomesticando. Aos poucos, foi deixando de ser uma reação normal assassinar o rival por causa de um insulto, por exemplo. Esse processo de autocontrole não se limitou à violência, atingindo também outros aspectos da vida, como o comportamento sexual, as funções corporais e até as maneiras à mesa.

Nos últimos anos, o fulcro da tese de Elias, que passara décadas em semiesquecimento, vem ganhando adeptos, com destaque para autores como Steven Pinker, Michael Shermer, Ian Morris, e algum apoio empírico. Evidências arqueológicas apontam que as taxas de homicídio de sociedades pré-Estado tendem a ser bem maiores que as observadas atualmente até nos países mais violentos do planeta. Em alguns sítios pré-históricos, 60% das ossadas pertencem a pessoas que foram assassinadas. Morris estima índices na escala dos 10% a 20% para a Idade da Pedra, 2% a 5% para os grandes impérios da Antiguidade e de 1% a 2% para o século 20, com suas duas guerras mundiais e inúmeros genocídios. Em países ultracivilizados como a Dinamarca, ele está hoje em 0,027%.

Ao tentar decepar o Estatuto do Desarmamento, norma que consubstancia o monopólio estatal da violência, a bancada conservadora esboça um movimento contrário àquele que possibilitou a mais importante conquista da civilização.

Eliane Cantanhêde - 'Mais liberdade'

- O Estado de S. Paulo

A presidente Dilma Rousseff tinha dito que não, mas o ministro Joaquim Levy diz agora que sim, é preciso mudar as regras para a exploração do pré-sal para que haja “mais liberdade” e a coisa comece a andar. Com tantas crises, tantos Cunhas e tantos Lulinhas, esse assunto passa sempre batido pela maioria e é tratado como questão ideológica pelo PT e setores da “esquerda”, mas é da maior importância.

O objetivo de projetos em tramitação, como o do senador tucano José Serra, é simplesmente inverter a lógica: a Petrobrás não será proibida de ser a operadora única do pré-sal, mas deixará de ser obrigada a sê-lo. Tudo passará a ser uma questão de opção, não de obrigação. Quando for do interesse estratégico da Petrobrás e do País, ela será; quando for um empecilho para a empresa e para o País, não será mais. A Petrobrás terá sempre a preferência, mas outras poderão participar.

Isso significa parar de engessar e de achatar o plano de investimentos da maior e mais simbólica companhia brasileira, tão machucada nos anos Lula, pelo assalto de partidos, de empreiteiras e de diretores inescrupulosos, que precisa desesperadamente se recuperar. Não é questão ideológica, mas estratégica.

“O meu projeto não discute o regime de exploração, só faz uma única coisa: retira da Petrobrás a obrigatoriedade de estar presente em todos os poços e de bancar 30% do investimento”, diz Serra, lembrando que, neste momento, a Petrobrás não tem como sustentar todo esse porcentual de investimento. Sem contar, cá para nós, os bilhões em refinarias como Abreu e Lima e Pasadena, envoltas em intensas suspeitas de desvios e má-fé.

A Petrobrás passou a ser o principal alvo da Polícia Federal, do Ministério Público e da Justiça e trocou a condição de maior vitrine pela de maior vidraça do Brasil no exterior. De empresa exemplar, orgulho de gerações, virou a mais endividada do mundo, tendo que cortar investimentos e vender ativos e áreas de operação. O resultado é em cadeia, em todos os setores que dependem da Petrobrás, e desemboca nos índices crescentes – e preocupantes – de desemprego.

Enquanto precisa tanto do que o pré-sal pode oferecer à Petrobrás e ao País, fica-se nesse lengalenga de “nacionalismo” à antiga, muito apropriado aos anos 50, não mais a um mundo global, dinâmico, em que a perda de um minuto hoje pode significar anos de atraso amanhã. Ao invés de privilegiar o interesse realmente nacional, discutem-se velhas ideias populistas.

Segundo ainda Serra, desde a descoberta do pré-sal até a implantação do modelo de partilha, foi realizado apenas um leilão e, desde 2010 até meados deste ano, a produção de petróleo no País cresceu apenas 12,6%. Ou seja, o setor está parado. É preciso revigorá-lo, arejá-lo, concordam o ministro de Minas e Energia, Eduardo Braga, e os governadores peemedebistas Paulo Hartung (ES) e Luiz Fernando Pezão (RJ) – que defendem mudanças para a retomada dos investimentos no setor, tão fundamental a seus Estados e para o País.

Ok. Então, por que essa correção não anda? Porque, além da resistência de setores ditos de “esquerda”, que equivocadamente se imaginam defendendo a Petrobrás, há um obstáculo ainda mais subjetivo: a resistência da presidente Dilma Rousseff.

A troca do regime de concessões pelo de partilha, com a obrigação da Petrobrás de estar em todos os consórcios e entrar com 30% do investimento é de... 2010. Ou seja, foi uma outra bandeira defendida com unhas e dentes pela campanha do PT e de Dilma, que, como se sabe, é dura na queda, detesta reconhecer erros e raramente volta atrás. Mas vamos ser otimistas. Se Dilma cedeu a Lula, empurrou Mercadante para a Educação e engoliu o baixíssimo clero do PMDB no ministério, quem sabe não decide agora ouvir o seu próprio ministro da Fazenda?

Luiz Carlos Azedo - Mais perto do perigo

• Enquanto Dilma faz todos os esforços para se manter longe das investigações e é supostamente blindada por Cardozo, as investigações se aproximam de Lula

- Correio Braziliense

As pressões do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para que a presidente Dilma Rousseff substitua o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, vão recrudescer. No xadrez de sua estratégia para voltar à Presidência, está convencido de que o ministro é um cavalo que se movimenta apenas para proteger a rainha, embora o futuro político do PT esteja umbilicalmente ligado ao rei, ou seja, à sua candidatura em 2018.

Lula não engoliu a visita de agentes da Polícia Federal à casa de seu filho Luís Cláudio, no último dia 27, às 23h, para entregar uma intimação. Ele acabara de sair da sua festa de aniversário, no Instituto Lula, à qual compareceu a presidente Dilma Rousseff, que estava empenhada em livrar a cara de Cardozo em outro episódio que desagradou o ex-presidente: a operação de busca e apreensão realizada na empresa do filho.

O ex-presidente da República já andava cabreiro com a Operação Lava-Jato, a cargo do juiz federal Sérgio Moro, de Curitiba; e descobriu que a juíza federal substituta Célia Regina Ody Bernardes, da 10ª Vara Federal de Brasília, especializada em crimes financeiros e lavagem de dinheiro, responsável pela Operação Zelotes, também tem a mão pesada.

Os altos índices de desaprovação da presidente Dilma Rousseff e a paralisia de seu governo, num contexto de recessão — a maior desde 1930, que deve se aprofundar em 2016 —, fazem com que a expectativa de poder em relação ao PT sobreviva apenas em função do prestígio de Lula. Ao mesmo tempo, porém, enquanto o petista for um candidato competitivo, Dilma terá melhores condições para manter sua coalizão de governo.

Do ponto de vista político, portanto, ambos estão no mesmo barco. O problema é que a Lava-Jato e a Zelotes alteram a situação. Enquanto Dilma faz todos os esforços para se manter longe das investigações e é supostamente blindada por Cardozo, as investigações se aproximam de Lula. Parece um cerco se fechando: aliados políticos, empresários amigos e dois filhos do ex-presidente da República já estão enrolados.

O cerco
A Operação Zelotes investiga pagamentos recebidos por Luís Claudio, filho do ex-presidente, e a suspeita de que seu ex-chefe de Gabinete, Gilberto Carvalho, posteriormente ministro da Secretaria-Geral da Presidência na gestão Dilma, tenha supostamente atuado para tráfico de influência e corrupção com empresas do setor automotivo.

A Lava-Jato investiga o caso do navio-sonda da Petrobras Vitoria 10.000, entregue para operação da Schahin sem licitação, supostamente por intermediação do pecuarista José Carlos Bumlai, amigo de Lula. Como contrapartida, o banco Schahin teria quitado a dívida de R$ 60 milhões da campanha de Lula de 2006. O empresário é acusado de ter solicitado R$ 2 milhões ao lobista Fernando “Baiano” Soares para uma nora de Lula, o que deixou o petista indignado. Bumlai nega a acusação.

Os pagamentos de empresas investigadas à LILS, de propriedade do ex-presidente, e ao Instituto Lula, entidade mantida pelo ex-presidente “para o desenvolvimento nacional e a redução de desigualdades” e dirigida por Paulo Okamotto, ex-presidente do Sebrae, também são investigados. O Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) do Ministério da Fazenda identificou movimentações de cerca de R$ 300 milhões consideradas atípicas, em transações bancárias de Lula e dos ex-ministros Antônio Palocci (Fazenda), Erenice Guerra (Casa Civil) e Fernando Pimentel (Desenvolvimento).

Um procedimento investigatório criminal (PIC) foi aberto no Distrito Federal sobre suposto tráfico de influência internacional de Lula em favor da Odebrecht. Em 15 de outubro, Lula prestou depoimento espontâneo ao MPF do Distrito Federal, dando a sua versão dos fatos. O Tribunal de Contas da União (TCU) questiona a regularidade do crédito de quase US$ 750 milhões concedido pelo BNDES à Odebrecht. A empreiteira, descrita pela Lava-Jato como à frente de suposto cartel na Petrobras, pagou cerca de R$ 4 milhões a Lula por 10 palestras

As investigações são mais traumáticas do que as delações premiadas, cujas denúncias são contestadas e ironizadas por Lula. É que as operações de busca e apreensão, condução coercitiva e prisões de pessoas próximas, que acabaram associadas ao seu nome, são corrosivas para sua imagem e vão criando um ambiente de suspeita na opinião pública, mesmo que não obtenham provas robustas de seu envolvimento. Além disso, são pessoas que não têm direito a foro privilegiado. O próprio ex-presidente, sem mandato, começa a passar pelo constrangimento de ter que comparecer ao Ministério Público para prestar esclarecimentos.

Rosângela Bittar - Não foi bom para ninguém

• Informação óbvia das pesquisas: Lula, hoje, é inviável

- Valor Econômico

Intrigante como já se passou quase um ano de exercício do segundo mandato da presidente Dilma Rousseff, num governo claudicante, ameaçado de impeachment sem ter tido, na verdade, a oportunidade sequer de começar, e ainda não apareceu um sucessor bem situado e com perspectiva de se colocar na disputa de uma forma segura. Os três anos que faltam para a campanha formal são um tempo longo demais para deixar candidatos na rua, expostos às intempéries, mas se o governo continuar neste funcionamento vazio, uma engrenagem que só faz ratear, será inevitável que a escolha do próximo presidente da República tome conta do espaço político do país e nem a crise econômica mobilizará eleitos e eleitores.

Isso só não aconteceu, ainda, porque não há um nome em nenhum partido com o seu destino ligado a esta cadeira. As legendas, também, como o governo, soluçam, e não conseguem informações precisas sobre quem e o quê quer o eleitorado.

As pesquisas de opinião mais recentes mostraram o cenário oco do momento, em que todos os possíveis candidatos, do governo ou da oposição, estão mais ou menos situados no mesmo patamar de intenção de voto e de rejeição.

O cientista político e sociólogo Antonio Lavareda desestimula, nos seus estudos, que se considere, nas vastas listas submetidas ao eleitorado nesses levantamentos, os nomes que não participaram da última eleição. "Os que não foram candidatos, independentemente de a pesquisa dizer que o eleitor o conhece bem, não são conhecidos", afirma. Na maioria das vezes, submetem-se ao eleitor os nomes em lista estimulada, e em seguida pergunta-se se conhece aquelas figuras. Ora, quem respondeu à intenção de voto estimulada acabou de conhecer, não fazem nem três minutos, aquele candidato, portanto é uma resposta inócua para referência.

No caso das pesquisas deste fim de ano, seria necessário então, por esse princípio, separar o senador José Serra e o governador Geraldo Alckmin, ambos do PSDB. Foram citados pelo nível de conhecimento mas já vai longe o ano em que foram candidatos a presidente.

Restaria considerar, no grupo do governo, o candidato Luiz Inácio Lula da Silva, e no da oposição, Aécio Neves (PSDB) e Marina Silva (Rede). A única constatação, óbvia, que as pesquisas permitem fazer, é que os dados apurados mostram que a candidatura do ex-presidente Lula é inviável, hoje, e o PT bem faria se começasse a testar outros nomes, de preferência escolhendo-os entre os seus filiados que não participaram da cúpula partidária, nos últimos anos, por razões evidentes por si.

Por que a candidatura Lula se mostra inviável? O ex-presidente está com uma rejeição inédita, até mesmo no Nordeste, seu reduto mais fiel. Hoje, 55% do eleitorado diz que não votaria em Lula de jeito nenhum. Esse percentual era de 33% em maio do ano passado, uma queda vertiginosa para alguém carismático que cultiva a fama de pai dos pobres, que se vitimiza ainda com sucesso a qualquer obstáculo com que se depara na sua carreira política.

Só a rejeição, porém, não é tudo. Lula aparece nas respostas de 67% dos eleitores como tendo responsabilidade nos fatos criminosos em investigação na operação Lava-Jato.

São, então, 55% de rejeição, 67% que o responsabilizam pelo maior escândalo que sangrou a maior estatal brasileira. Um veredicto que torna inviável sua candidatura, hoje. A Lava-Jato, bem como agora a Operação Zelotes, no caso do Lula, constituem o fato político, jurídico, policial mais importante dessa conjuntura que vai empurrar o país até a sucessão e sobre ela exercer uma influência decisiva. As duas taxas combinadas são mortais para Lula, mas não o tirarão da campanha que se desenvolve hoje até que possa trabalhar por alguém. Vai ficar reservando lugar até o fim. Quem sabe não fica? Tudo depende.

Há, na cúpula do PT, com todas as ressalvas de que esse quadro pode mudar a partir do ano que vem, se houver recuperação econômica do país, quem defenda que, se o PT quiser ter a chance de manter o poder federal, melhor faria se encontrasse um nome, ou alguns nomes para serem testados desde já. Alguém, inclusive, a ser adotado pelo ex-presidente num grupo de petistas insuspeitos, fora da máquina partidária e do governo.

Da oposição são dois os candidatos que participaram da eleição do ano passado, e as pesquisas têm respostas diferentes para Aécio Neves (PSDB) e Marina Silva (Rede).

Aécio teve 33,55% dos votos válidos no primeiro turno e 48,36% dos votos válidos, no segundo turno. Houve um crescimento substantivo do primeiro para o segundo turno. As pesquisas deste mês, contudo, mostram o senador Aécio Neves reduzido à votação do primeiro turno que, de resto, é a votação padrão do PSDB em eleições presidenciais, seja quem for o candidato.

Na pesquisa MDA/CNT, Aécio aparece com 32% das intenções de voto, provando que tudo o que agregou em outubro de 2014, cerca de 15 pontos percentuais, ele não conseguiu reter.

É fato que na disputa do segundo turno o candidato recebe parte da votação do terceiro lugar e a adesão de quem não vota no seu adversário de jeito nenhum. Mas não conseguir agregar um votinho desses, conquistados fora do eleitorado do PSDB, é um fenômeno altamente negativo, cujas causas é preciso procurar. O senador Aécio Neves, que quase venceu a eleição presidencial, teve mais de 51 milhões de votos, e num espaço de um ano não conseguiu construir uma relação com esse eleitorado.

Marina Silva, outra candidata de 2014 no campo da oposição, terceiro lugar no primeiro turno, não está bem, mas em melhor situação que seus adversários, por enquanto na pesquisa, não se sabe se na eleição. Talvez até pelo silêncio que se impôs (ganhou com isso), só quebrado para revelar posições inaceitáveis para os eleitores, como condenar o impeachment (perdeu com isso), tornou-se incompreensível e no lusco fusco manteve-se em equilíbrio. No primeiro turno de 2014 teve 21,32% dos votos, e na pesquisa de agora 21,3% das intenções de voto.

O fato de não assumir posições e manter-se discreta por algum tempo pode tê-la ajudado a escapar da implacável opinião pública.

Elio Gaspari - A fábrica de trapalhadas da doutora

• O governo botou no ar um sistema sinistro e autoritário para o cadastramento dos empregados domésticos

- O Globo

Simples Doméstico é autoritário e sinistro. Quando o governo da doutora Dilma parece ter esgotado seu arsenal de encrencas, ele inventa uma nova. A última chama-se “Cadastro de Empregados Domésticos” e atende pelo apelido de “Simples Doméstico”. Os çábios de burocracia da Receita Federal e do Ministério da Previdência puseram no ar um sistema de cadastramento que obriga as vítimas a padecer num processo com pelos menos 15 etapas, lidando com siglas como CPF, CEP, NIT, GRF, DIRF, DAE, PIS, e FGTS.

Se o CPF de um empregado estiver suspenso, ele deverá ir a uma agencia do Banco do Brasil, da Caixa ou dos Correios e a audiência custará R$ 7. As agencias do Poupa Tempo não fazem esse serviço. Claro, o cidadão não tem o que fazer e, portanto, não há por que lhe poupar o tempo.

O empregador deve ter à mão suas declarações de Imposto de Renda de 2014 e 2015. O empregado que já estiver registrado no FGTS deve informar a data em que se inscreveu. Para os çábios, essa é uma data inesquecível, como o 7 de setembro.

Mesmo que o infeliz tenha a sua vida organizada, ao preencher os formulários pode receber a seguinte mensagem:

“Ocorreu um erro, informe o ticket do erro aos administradores.”

Afora o mau português, o tal ticket podia ser o seguinte: “2015110113714DU1WTPZGE4” Noutra travada, a mensagem disse: “Não foi possível efetuar a operação. Por favor, tente de novo mais tarde. Anote o número do ticket, ele será solicitado pela Central de Atendimento.”

Em muitas ocasiões a Central simplesmente não atendia.

O sistema encrencou desde o primeiro dia. O sujeito fazia tudo direito, recebia uma senha, e ela era imprestável.

Toda essa burocracia derivou da inépcia, da megalomania e do autoritarismo. Da inépcia porque trava. Da megalomania porque embutiram um censo socioeconômico dos trabalhadores domésticos no que deveria ter sido um simples cadastro. Do autoritarismo porque o çábios tiveram 18 meses para organizar o site e deram seis dias aos cidadãos para cadastrar os empregados. (Se alguém estiver de férias, dançam todos.) A doutora já deixou 28 embaixadores estrangeiros na fila para a cerimônia de entrega de credenciais. Alguns esperaram por mais de um ano, mas na hora de botar os outros para trabalhar, os prazos do seu governo são curtos, com direito a multa.

Encrencas com sistemas fazem parte da vida. Em 2013, o presidente Barack Obama passou pelo vexame de ter colocado no ar um site bichado. Humildemente, pediu desculpas.

O governo não pode dizer que a lambança é coisa da elite ou de Eduardo Cunha. Não se deve esperar que a doutora peça desculpas, mas seria razoável que, já na segunda-feira, tivesse estendido o prazo para preenchimento do cadastro. Só um doido poderia pensar que os çábios trabalham num feriado.

Dilma Rousseff deve reler o que diz. Em junho de 2014 (ano eleitoral) ela informou:

“A burocracia distorceu as necessidades do Estado brasileiro por mais de 50 anos. Para avançarmos, é necessário tornar o Estado brasileiro não um Estado mínimo, como querem alguns, mas um Estado eficiente, transparente e moderno".

Eleita, retomou o tema em janeiro passado. Prometia ação:

“Lançaremos um Programa de Desburocratização e Simplificação das Ações do Governo. Menos burocracia representa menos tempo e menos recursos gastos em tarefas acessórias e secundárias.”
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Elio Gaspari é jornalista

José Nêumanne - No cavalo de Agamenon,às portas de Troia

- O Estado de S. Paulo

Na quinta-feira 29 de outubro, em Brasília, onde assumiu a Presidência de fato no segundo mandato de sua substituta conveniente e conivente, Dilma Rousseff, Luiz Inácio Lula da Silva divertiu sua claque no Diretório Nacional do Partido dos Trabalhadores (PT) com as metáforas de hábito e a grosseria de praxe. Nesse discurso, confessou que a afilhada praticara estelionato eleitoral na campanha vitoriosa da reeleição em 2014. “Tivemos um problema político sério, porque ganhamos a eleição com um discurso e depois das eleições tivemos que mudar o nosso discurso e fazer aquilo que a gente dizia que não ia fazer”, disse.

Na ocasião, proibiu investidas do PT contra o presidente da Câmara, deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), tido como o maior desafeto de Dilma e do partido. “Tudo o que interessa à oposição é que a gente arrume quinhentos pretextos para discutir qualquer assunto e depois não discutir o que interessa, que é aprovar o que a Dilma mandou para o Congresso Nacional. A não ser que tenha alguém aqui que ache que isso não é importante. Primeiro, vamos tentar derrubar o Eduardo Cunha, depois derrubar o impeachment e, depois, se der certo, a gente vota nas coisas que a Dilma quer”, ironizou. E recuou das rudes críticas que antes fazia ao ministro da Fazenda, Joaquim Levy.

Nunca antes em sua vida pública, desde que assumiu a presidência do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo e Diadema, em 1975, Lula foi tão claro, estratégico e cuidadoso em qualquer discurso. Fez-se muito barulho em relação ao reconhecimento do estelionato, crime definido no Código Penal. Com a agravante de ter sido um estelionato que vitimou a Nação, em especial o eleitorado que não anulou voto, votou em branco ou se absteve de votar e, em particular, os brasileiros mais pobres e menos esclarecidos que acreditaram em sua candidata. E daí? Qualquer advogadinho do PT sabe e, na certa, lhe informou que estelionato não basta para abrir processo de impeachment contra a presidente.

Além disso, Lula recebe de novo inestimável apoio de quem se apresenta à cidadania como adversário. Há um vácuo jurídico na Constituição de 1988: inexiste lei que regulamente o impedimento de presidente. O texto legal de 1950, aos 65 anos de vigência, serviu de base para levar Collor a renunciar. Mas não é suficiente para depor Dilma de forma democrática. E é nesse argumento incontestável que os dependentes da miríade de boquinhas do governo lulodilmopetista se apoiam para chamar de “golpista” quem não suporta mais a presidente (7 em 10 brasileiros). A Constituição vige há 27 anos, o oitavo mandato presidencial está começando e nunca parlamentar algum cuidou desse detalhe.

Este não é, definitivamente, um pormenor para a oposição, que não encontrou até agora base jurídica séria para fazer o que a Nação quase inteira exige: retirar a estelionatária de palanque do cargo poderoso do qual comanda esta nossa marcha da insensatez para monumentais crises moral, econômica, política e quase à beira de outra, a institucional. Lula sabia disso quando confessou o delito da preposta. Os adversários, tudo indica, não.

Em relação à reeleição, recorde-se ainda que o líder do PSDB na Câmara, Carlos Sampaio (SP), requereu recontagem dos votos para verificar se não houve fraude na vitória da presidente sobre o senador Aécio Neves (PSDB-MG) no segundo turno do pleito de 2014. Qualquer usuário de computador em jardim de infância sabe que, no sistema de coleta e contagem de votos no Brasil, recontar votos é simplesmente impossível. Um ano depois, com a vencedora enredada em outras suspeitas, Sua Excelência disse o que todos já sabiam: não dá para recontar. Não contou, porém, por que, do alto de sua sapiência legislativa, não empreendeu alguma lei que ao menos dificultasse as fraudes que qualquer hacker iniciante pode praticar no Brasil.

O pior é que, mesmo sem o haver dito explicitamente, o ex no poder avalizou o mais asqueroso pacto de conivência criminosa de nossa História. Nele, a primeira mandatária da República e o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, dois degraus abaixo dela na escada sucessória, achincalham as instituições garantindo um a impunidade da outra, e vice-versa. Em sua frase aqui citada, Lula não precisou de nenhum argumento para mandar seus asseclas evitarem incômodos a Cunha, fazendo ouvidos de mercador às evidências que brotam no seu prontuário policial como capim em pasto farto. A aceitação muda e mansa dos petistas à ordem do chefe, que, tal qual um Ulysses Guimarães do século 21, passou a comandar o governo federal, o partido e a oposição, é a maior prova de que apenas emudeceu o óbvio que, apud Nelson Rodrigues, ulula.

E se havia alguma dúvida de que o ex resolveu assumir, mantendo a preposta como rainha da Inglaterra de plantão, esta foi dirimida por sua guinada de 180 graus ao apoiar os ajustes e o ministro da Fazenda, Joaquim Levy. O padimaceitou outro óbvio – de que a cabeça de Dilma está sob a espada de Dâmocles, suspensa pelo fio do rabo de um cavalo. O fio é dos bancos, que com a crise têm lucrado como nunca ninguém lucrou. Nisso ele é craque: há 40 anos o clã Lula da Silva morava numa vila operária e hoje se espalha em apartamentos de luxo, até na praia, mercê de sua carreira de palestrante para empresas acusadas de delinquir – o que lhe permitiu movimentar R$ 52,3 milhões em quatro anos, conforme o Coaf.

O descalabro de quatro desgovernos do PT, delatado nas Operações Lava Jato e Zelotes e com 3 mil brasileiros perdendo o emprego todo dia, mostra que o cavalo de cujo rabo pende a espada, e que Lula monta, após destruir tudo ao redor – empresas, empregos, crédito de agências de risco, honra e pudor –, não é de Átila, mas de Agamenon. Pois, às portas de Troia, abertas com a conivência de adversários néscios, ele planeja invadir-lhe as ruínas.
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José Nêumanne é jornalista, poeta e escritor