domingo, 2 de outubro de 2016

Opinião do dia – Luiz Werneck Vianna

Agora, não resta outra solução que não a de atravessar, pé ante pé, a pinguela estreita que se tem à frente, de que falou em entrevista o ex-presidente Fernando Henrique, travessia perigosa que, para ser segura, está a exigir outra bibliografia e uma imaginação bem diversa da que nos trouxe até aqui.


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Luiz Werneck Vianna é sociólogo, PUC-RJ. ‘De quando é bom ter uma pinguela segura’, O Estado de S. Paulo, 2/10/2016

Adversário de Crivella no 2º turno continua indefinido

• Ibope e Datafolha mostram que Freixo está numericamente em segundo lugar

Pedro Paulo, Indio da Costa, Bolsonaro e Osorio também brigam para enfrentar o candidato do PRB, que ainda lidera com folga a disputa; institutos apontam cenários divergentes nas simulações para o confronto final

Numa disputa ainda imprevisível para a prefeitura do Rio, os cariocas decidirão hoje quem irá para o segundo turno ao lado de Marcelo Crivella (PRB), que mantém a liderança, de acordo com as pesquisas divulgadas ontem, feitas depois do debate da TV Globo. Marcelo Freixo (PSOL) está numericamente à frente de Pedro Paulo (PMDB) tanto no levantamento do Ibope (14% a 11% dos votos válidos) quanto no do Datafolha (16% a 12%). Nos dois casos, há empate técnico. Segundo o Ibope, Indio da Costa (PSD) e Flávio Bolsonaro (PSC), ambos com 10%, aparecem embolados neste grupo. O Datafolha registrou crescimento de Indio (7% para 11%) e de Osorio, do PSDB (7% para 10%), colocandoos diretamente na briga. 

São Paulo chega à votação com 2º turno indefinido

• Pesquisa Ibope na véspera do 1° turno mostra tucano que João Doria ampliou vantagem e tem 35% dos votos válidos; Russomanno tem 23%, Marta 19% e Haddad, 15%

Redação - O Estado de S. Paulo

Na maior cidade do País, a eleição para a Prefeitura de São Paulo ocorre hoje em clima de indefinição. Pesquisa Ibope/Estado/TV Globo divulgada ontem mostra o candidato do PSDB, João Doria, com 35% dos votos válidos (sem considerar votos brancos, nulos e indecisos), isolado na liderança. A disputa pelo segundo lugar, porém, segue em aberto. Celso Russomanno, candidato do PRB, tem 23%; Marta Suplicy, do PMDB, aparece com 19% dos votos válidos, e o prefeito Fernando Haddad (PT), com 15%. Os mais recentes levantamentos mostram oscilação das preferências na reta final do primeiro turno, o que abre espaço para o voto útil.

O Datafolha mostrou que o tucano disparou na liderança e subiu para 44% das intenções de votos válidos. Russomanno caiu para 16%, empatado com Haddad. A candidata do PMDB também recuou em relação à pesquisa anterior e aparece com 14%.

Doria dispara e chega a 44%; Haddad sobe e 2º lugar tem empate, diz Datafolha

Thais Bilenky - Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - Na véspera do primeiro turno da eleição para a Prefeitura de São Paulo, pesquisa Datafolha mostra o candidato João Doria (PSDB) na liderança isolada, com 44% das intenções de votos válidos. Fernando Haddad (PT) alcançou 16% e está em empate técnico com Celso Russomanno (PRB), que também tem 16%, e Marta Suplicy (PMDB), com 14%.

O levantamento, feito na sexta-feira (30) e no sábado (1º) com 4.022 pessoas, tem margem de erro de dois pontos percentuais para mais ou para menos.

Nas simulações de segundo turno, o tucano agora venceria os três oponentes com folga. Doria teria 54% contra 25% de Russomanno, 54% contra 29% de Marta e 59% contra 26% de Haddad.

Os votos válidos, que excluem brancos, nulos e indecisos, são os contabilizados nas urnas e por isso espelham melhor o cenário real da eleição. Doria está a seis pontos de levar no primeiro turno.
Luiza Erundina (PSOL) registrou 5% das intenções de votos válidos. Major Olímpio (SD) teve 2%, seguido por Levy Fidelix (PRTB) e Ricardo Young (Rede), com 1%. Henrique Áreas (PCO), Altino (PSTU) e João Bico (PSDC) não atingiram 1%.

De quando é bom ter uma pinguela segura - *Luiz Werneck Vianna

- O Estado de S. Paulo

• Agora não resta solução senão a de atravessar, pé ante pé, essa pinguela estreita que se tem à frente...

Para um observador desavisado, inexperiente de como aqui se vivem as coisas da política, diante do cenário que aí está, nada de estapafúrdio que se lhe dê na telha a ideia de estarmos na iminência de uma revolução.

Nas salas de aula das universidades os estudantes exibem adesivos estampando um “fora Temer”, professores das escolas de ensino médio cumprimentam seus alunos com o mesmo bordão, artistas e cantores populares não começam seus espetáculos sem ele, também presente nas salas de cinema e nos teatros. Uma ex-presidente da República que teve seu mandato cassado, num trâmite que passou pela Câmara dos Deputados e pelo Senado, que decretou o seu impeachment, em julgamento presidido pelo presidente do Supremo Tribunal Federal, participa de comícios eleitorais de candidatos às eleições municipais, quando se declara vítima de um golpe, todos são sinais que levam nosso observador a ruminar suas impressões.

É tempo para ousar - *Fernando Henrique Cardoso

- O Estado de S. Paulo

• O espectro de uma sociedade incivil e uma política de demagogos é um risco real

A semana que ontem terminou foi pródiga em debates eleitorais. O mais significativo em termos globais foi o duelo Hillary Clinton versus Donald Trump. Entre nós, a multiplicidade de candidatos a prefeito é tanta e a fragmentação do eleitorado é tão grande que fica difícil até mesmo acompanhar o que dizem.

Vendo o debate americano, ficou claro que Trump quer ser o candidato do “contra tudo isso que está aí”, muito especialmente contra a globalização, e dos que não gostam dos imigrantes. Com jeito, Hillary mostrou, a quem tem olhos para ver, que a intolerância racial se junta ao blend de arrogância e beligerância do candidato republicano. Experiente e bem preparada, Hillary exibiu racionalmente suas qualidades como eventual “comandante em chefe” das Forças Armadas e chefe de Estado e de governo. Mostrou-se também mais comprometida com os valores da igualdade democrática. Uma estadista.

As ilusões perdidas - Fernando Gabeira

- O Globo

Hoje é dia de votar. Participei, diretamente ou não, de todas as campanhas do período democrático. Nunca vi nada assim. Para começar, é a primeira eleição sem dinheiro legal das empresas. E num momento em que os indivíduos não parecem propensos a contribuir. A imprensa mostra que o número de doadores é três vezes menor do que o número de candidatos. Sem contar que há muitos mortos entre os doadores e mais de um terço deles, 90 mil, são beneficiários do Bolsa Família. Dinheiro mesmo não veio da sociedade. Muito possivelmente a parte mais pobre dela contribuiu com CPFs para dar um verniz de legalidade às doações eleitorais.

“Na rua, parece que somos transparentes. As pessoas olham como se não existíssemos.” A confissão é de um amigo que faz campanha. A indiferença é pesada para os que sonhavam em empolgar a cidade. Mas é também um alívio. A hostilidade seria bem pior. O traço central da campanha não é falta de grana, mas de credibilidade. Quase ninguém parece acreditar em alguma saída num sistema político que envelheceu e caducou.

Um novo mapa político - Eliane Cantanhêde

- O Estado de S. Paulo

Foi uma eleição sem motivação, sem dinheiro, embolada e acossada pela Lava Jato, que atinge a política em geral, mas sobretudo o PT e os governos Lula e Dilma Rousseff, previamente os grandes derrotados. É assim que chegamos a este domingo, quando 16.568 candidatos (sem contar os candidatos a vereador) disputam as prefeituras e os votos de mais de 140 milhões de eleitores no País todo, exceto no Distrito Federal. Está em jogo não apenas o futuro dos candidatos, mas também, ou principalmente, dos seus padrinhos.

São Paulo, principal capital e um dos maiores orçamentos da República, é o melhor exemplo de como Lula réu, o impeachment de Dilma e as prisões e agruras de ministros decisivos da era petista – José Dirceu, Antonio Palocci, Guido Mantega, Paulo Bernardo, Gleisi Hoffmann... – danificam a imagem do PT e a confiança do eleitorado em todo o País. Vários petistas pularam do barco e a única capital onde o partido nada de braçada é a distante Rio Branco, no Acre.

Tudo junto e misturado - Merval Pereira

- O Globo

Mesmo com uma inesperada recuperação de Haddad nos instantes finais da campanha, detectada pelo Datafolha mas não pelo Ibope, nada indica que o PT venha a recuperar-se. O mais provável é que tenha o pior desempenho desde 1996, elegendo menos prefeitos em centros relevantes do que naquela ocasião.

Quando o PT escolheu para candidato a prefeito de São Paulo Fernando Haddad, em 2012, Lula disse a Fernando Henrique que era uma tentativa de ter um candidato com jeito de tucano para ver se dava certo. Deu, em termos eleitorais, já que a avaliação do prefeito é das piores.

Agora, o candidato com menos cara de PT em todo o país pode dar um fôlego ao partido, se for para o segundo turno da eleição em São Paulo, embora esta possibilidade não seja uma certeza.

Onde está o erro? - Luiz Carlos Azedo

- Correio Braziliense

• Todos os municípios têm que ter a mesma estrutura, com prefeituras, câmaras, comarcas, não importa se tenha dimensões de grande metrópole ou seja uma simples vila nos cafundós do Brasil

O Brasil vai às urnas hoje com 144 milhões de cidadãos aptos a votarem, em 5.568 municípios, dos quais 1.541 terão identificação biométrica, ou seja, pela impressão digital. Antes da meia-noite, com raras exceções, os eleitores já saberão os nomes dos eleitos e dos candidatos que disputarão o segundo turno, no caso das cidades com mais de duzentos mil eleitores, graças às urnas eletrônicas e à apuração instantânea. Não há outro país capaz de realizar eleições dessa envergadura num só dia, sem fraudes nas votações. China, Índia, Rússia, México e mesmo os Estados Unidos, a democracia mais antiga, não têm uma democracia de massas mais representativa.

A inocente útil - Dora Kramer

- O Estado de S. Paulo

Justiça seja feita aos ministros que andaram falando mais e menos corretamente do que deveriam, foi o próprio Michel Temer quem disse em sua primeira reunião ministerial, logo depois de aprovado o impeachment de Dilma, que – observados os interesses do governo – todos teriam autonomia para agir e liberdade para se expressar.

Na ocasião, o interesse contido na declaração parece ter sido o de se diferenciar do estilo centralizador (para dizer de forma amena) da antecessora. Temer falou como quem dissesse “acabou a era do terror, daqui em diante teremos uma administração democrática”. Isso se refletiu de imediato no acesso da imprensa aos titulares das pastas, bem como na circulação de informações e trânsito no ambiente do Palácio do Planalto.

Negar a política dá voto – Bernardo Mello Franco

- Folha de S. Paulo

A suspeita de que a crise de 2016 daria na negação da política começa a se revelar acertada. Nas duas maiores cidades brasileiras, candidatos que fogem do perfil tradicional chegam às urnas com ampla vantagem nas pesquisas.

Em São Paulo, um dublê de milionário e apresentador de TV disparou na liderança com 44% das intenções de voto. João Doria, do PSDB, explora dois sentimentos em alta na cidade: a antipolítica e o antipetismo.

"Não sou um político, sou um empresário", ele repete, desde o início da campanha. O tucano também capitalizou o cerco da Lava Jato ao PT. "Lula é um sem-vergonha, um cara de pau", ataca, como se estivesse num trio elétrico na avenida Paulista.

No Rio, um bispo da Igreja Universal que ganhou fama como cantor gospellidera a corrida à prefeitura. Marcelo Crivella, do PRB, tem 32%. Após uma longa temporada de transformações urbanas para a Olimpíada, ele baseia sua campanha num lema curioso: "Chega de obras, chegou a hora de cuidar das pessoas".

O fenômeno do eixo Rio-SP se repete em Belo Horizonte, onde dois personagens do futebol dominam a disputa. O ex-goleiro João Leite, do PSDB, e o cartola Alexandre Kalil, do PHS, devem ir ao segundo turno. O slogan do ex-presidente do Atlético Mineiro é direto: "Chega de político".

Há uma longa distância entre a conversa dos candidatos e a realidade. Doria já exerceu cargos nos governos Covas e Sarney. Deve sua escolha a outro cacique, o governador Alckmin. Crivella é senador há 14 anos, e Leite está no sexto mandato de deputado. O discurso de negação da política é furado, mas parece dar voto.

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No primeiro teste pós-impeachment, o PT teme sofrer o maior revés em eleições municipais desde 1985. A única capital em que o partido lidera isolado é Rio Branco, no Acre. Por isso, levar Fernando Haddad ao segundo turno em São Paulo se tornou vital para o futuro da sigla.

Eleição difícil - Míriam Leitão

- O Globo

Hoje, 146 milhões de brasileiros estão escolhendo os prefeitos e vereadores entre 500 mil candidatos. Esta eleição está sendo uma das mais difíceis. O crime comum invadiu a política provocando mortes, aumentou o desinteresse do eleitor, principalmente dos jovens, a corrupção está abalando a confiança no processo de representação, apareceram novas formas de fraude.

O presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Gilmar Mendes, alertou para uma contradição que assusta quem espera ver, em cada processo de escolha coletiva, um novo avanço da democracia:

— Os jovens foram para as ruas pedir mudanças, mas caiu o registro do eleitor facultativo, aquele que tem 16 e 17 anos.

Na última eleição municipal, em 2012, registraramse para votar 2,9 milhões jovens nesta faixa etária. Agora, foram 2,31 milhões. Quase 600 mil a menos.

— O desinteresse dos jovens pela política tradicional é um fenômeno mundial, mas no Brasil há partidos falsos, sem vida, que não têm programas, legendas que fraudam a participação da mulher, colocando o nome delas apenas para constar, fundações partidárias que só existem para cumprir a lei — disse Gilmar Mendes.

Questões em branco - José de Souza Martins

O Estado de S. Paulo / Aliás

Faz tempo que não se ouve neste País a palavra do verdadeiro educador. As reações ao projeto de reforma do ensino médio reiteram essa ausência. As carências da nação estão longe das cogitações e dos palpites atuais. Ninguém pensou nos ganhos significativos da educação brasileira, desde a proclamação da República, um dos quais a Universidade de São Paulo, uma revolução educacional que não dependeu de palpite e sim de ousadia, decisão, vontade.

Nós saímos da escravidão e de uma sociedade de braçais e analfabetos e chegamos a universidades que conseguiram em cerca de meio século o que universidades tradicionais levaram meio milênio para conseguir. Ninguém fala nos marcos e conquistas de escolas primárias e médias de pequenas localidades do interior do Brasil, que têm conseguido o reconhecimento dos primeiros lugares na escala do padrão de ensino. São escolas cujos êxitos não se explicam pela opinião dos palpiteiros, mas sim pelo calor afetivo da comunidade e das famílias, dos pais, que esperam que os filhos e netos tenham mais do que eles tiveram. Tradicionalmente, o Brasil é um país que valoriza a escola e a educação. Ainda há recantos da pátria em que crianças pobres da roça fazem sacrifícios enormes, longas caminhadas, para ir a uma escola. Vi nos confins do Maranhão e do Acre, em ranchos cobertos de palha, crianças de pés descalços sentadas em tamboretes, usando os joelhos como carteira escolar para escrever no caderno e aprender a lição.

Transformar São Paulo – Editorial / Folha de S. Paulo

Os candidatos que pretendem ocupar a Prefeitura de São Paulo pelos próximos quatro anos prometem ampliar ou melhorar os serviços oferecidos aos cidadãos sem deles exigir como contrapartida maior pagamento de impostos.

Com melhor gestão e mais vontade, prossegue o lugar-comum, haverá ônibus mais rápidos e menos congestionamento, mais creches para as crianças e menos filas na saúde, mais casas populares e menos lixo nas ruas.

Raramente a discussão se demora em programas que talvez nem requeiram despesas adicionais, embora demandem inovações regulatórias. Na campanha, os recursos não são escassos e o aspirante a alcaide não elege prioridades.

No entanto, a inércia dos valores destinados às grandes prioridades do Orçamento e o lento progresso dos indicadores de desempenho desmoralizam voluntarismos de curto prazo.

Eleitor precisa votar com uma cabeça municipal – Editorial / O Globo

Poucas eleições municipais estiveram tão contaminadas por temas da política nacional quanto esta. Realizadas na sequência do segundo impeachment de presidente da história republicana, foi uma consequência natural que candidatos incluíssem no discurso referências à crise política em Brasília. No Rio, Jandira Feghali (PCdoB), apoiada pelo PT, desfilou de braço dado à cassada Dilma e ainda levou Lula, réu em dois processos, para cima do palanque. Pesquisas indicaram que foi mau estratagema — um indicativo de que o PT não terá um domingo risonho, nem uma segunda-feira relaxada. No debate da GLOBO, de quinta para sexta, em que Pedro Paulo (PMDB), Freixo (PSOL), Feghali e Osório (PSDB), principalmente, digladiaram na disputa para saber quem irá a um provável segundo turno contra Crivella (PRB), este aspecto da nacionalização da campanha apareceu. Mas a temática municipal se impõe.

O valor do eleitor – Editorial / O Estado de S. Paulo

Há muito tempo os brasileiros comuns pouco ou nada se identificam com a política. Para a maioria dos cidadãos, a política é coisa distante, dos políticos profissionais, geralmente mais empenhados em atender a seus interesses do que aos do País. De grande parte dos candidatos o eleitor nem lembra o nome depois de votar, porque deduz que o sufragado também esquecerá de quem nele votou assim que assumir o cargo. Logo, o ato de votar não é senão uma tediosa obrigação, deixando de servir como o elo fundamental entre o eleitor e o eleito, razão de ser de uma democracia representativa. 

Talvez por esse motivo tão poucos cidadãos até agora se dispuseram, nesta eleição, a doar dinheiro para a campanha de algum candidato. Afinal, não se estabelece da noite para o dia um vínculo que só existe e se solidifica quando o eleitor se convence de que seu candidato fará jus ao voto recebido, na forma de atitudes políticas e de projetos que representem os legítimos anseios da população.

Obras da Bienal pretendem expressar traço essencial de nossa época – Ferreira Gullar

- Folha de S. Paulo / Ilustrada

Sem pretender questionar a importância da 32ª Bienal de São Paulo como acontecimento cultural, permito-me tecer aqui algumas considerações que a sua realização me suscita.

Pelo que li a respeito do projeto e de sua realização, a mostra difere radicalmente do que se entende por simples exposição de arte, uma vez que, meses antes de sua inauguração, foi precedida de viagens, pesquisas e discussões sobre os diversos problemas da nossa atualidade caracterizada pelas mudanças rápidas –tanto da vida social quanto das relações predatórias do homem em relação à natureza.

Por esse motivo, a Bienal que foi franqueada ao público no começo de setembro seria a expressão de todas aquelas pesquisas, descobertas e discussões dos problemas da vida atual, tanto no plano da sociedade como no planetário.

Outra originalidade desta exposição está no fato de que as obras nela expostas –não sei se todas– foram realizadas no próprio espaço da mostra, transformando-o por assim dizer num amplo ateliê, o lugar onde os artistas costumam realizar suas obras.

Trem de ferro – Manuel Bandeira

Café com pão
Café com pão
Café com pão

Virge Maria que foi isso maquinista?

Agora sim
Café com pão
Agora sim
Voa, fumaça
Corre, cerca
Ai seu foguista
Bota fogo
Na fornalha
Que eu preciso
Muita força
Muita força
Muita força
(trem de ferro, trem de ferro)

Oô...
Foge, bicho
Foge, povo
Passa ponte
Passa poste
Passa pasto
Passa boi
Passa boiada
Passa galho
Da ingazeira
Debruçada
No riacho
Que vontade
De cantar!
Oô...
(café com pão é muito bom)

Quando me prendero
No canaviá
Cada pé de cana
Era um oficiá
Oô...
Menina bonita
Do vestido verde
Me dá tua boca
Pra matar minha sede
Oô...
Vou mimbora vou mimbora
Não gosto daqui
Nasci no sertão
Sou de Ouricuri
Oô...

Vou depressa
Vou correndo
Vou na toda
Que só levo
Pouca gente
Pouca gente
Pouca gente...
(trem de ferro, trem de ferro)

(Manuel Bandeira in "Estrela da Manhã" 1936)

Edu Lobo - O trenzinho do caipira (Villa Lobos e letra de Ferreira Gullar