terça-feira, 20 de novembro de 2018

Gilvan Cavalcanti: Mudar é preciso

Amanhã (21/11/2018) a executiva nacional do partido, do qual sou filiado, se reunirá para discutir e tomar uma decisão. O tema: ‘Convocação do Congresso Extraordinário para implementar a mudança de nome do Partido e novos Estatutos, aprovado no 19º Congresso Nacional’.

Aproveito o momento para colocar algumas inquietações e duvidas: como é sabido fui um dos que votaram pela mudança do nome de PCB, lá atrás, no idos de 1992. O nome de PPS não era de meu agrado. Junto, com uma grande parte do Congresso de criação do PPS, fui voto vencido. Era uma circunstância concreta de novo tempo, novo mundo: dissolução do campo do “socialismo real”. Fim da bipolaridade e afirmação da globalização. Hoje, vivemos outro tempo: a consolidação da democracia e seus valores dos direitos sociais e civis ampliaram-se.

No Brasil, não foi diferente. Nossa Constituição, cidadã, já é balzaquiana, do romance, A mulher de trinta anos, do escritor francês Balzac (1799-1850), É a mais longa da nossa história. Motivo de muita alegria e comemoração. Mas, ao mesmo tempo, desafios e preocupações. Hoje são tempos de ondas: negação da política, dos partidos, afirmação de nacionalismo, contra o cosmopolitismo, da intolerância. Além de avanço de valores e costumes conservadores, na sociedade e nos agentes públicos. São ondas que devemos conhecê-las, estudá-las e, ao mesmo tempo, unir os democratas radicais para bloqueá-las.

Nessa circunstância, há um tema que tomou conta de dirigentes partidários: retirar o nome de Partido de suas siglas. Assim, o PFL, transformou-se em Democratas (DEM), o Partido Popular (PP) em Progressistas, o Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), virou MDB. Outros surfaram na onda: Podemos, Rede, Avante, Novo e Patriotas, etc.

Lembrei-me da origem autoritária dessa onda: os teóricos do regime militar de 1964. O Ato Institucional nº 2, de 27/101965. No art. 18 diz: ‘ficam extintos os atuais partidos políticos e cancelados os respectivos registros’. Já o Ato Complementar nº 4 de 20/11/1965, em seu motivo afirma: ‘Delega aos membros efetivos do Congresso Nacional a iniciativa de promover a criação de organizações com atribuições de partidos políticos...’ No art. 13, declara: ‘os nomes, siglas, legendas e símbolos dos partidos extintos não poderão ser usados para designação das organizações de que trata este Ato’. E no parágrafo único diz: ‘E vedada a designação ou denominação partidária’. Eram tempos tenebrosos, de coações.

O tema ressurge em plena democracia, como uma ideia de uma coisa nova, contra a chamada ‘velha política’. Mas, em concreto, como uma resposta equivocada ao sentimento do senso comum, associado aos escândalos da Lava-Jato, envolvendo dirigentes de muitos partidos. Esta onda contou com a colaboração eficiente dos partidos inorgânicos – as mídias antigas e novas -, que substituíram os partidos orgânicos na luta para influenciar o conhecimento do senso comum, como já afirmava o filósofo Hegel (1770-1831), era um ‘conhecimento defeituoso’. Ou como descreveu Gramsci (1891-1937), uma mistura de crenças antigas e novas, religiões, misticismos, etc, historicamente conhecidas.

O jornalista Fernando Gabeira em recente artigo de jornal, referindo-se a frase do cantor Mano Brown: ‘é preciso encontrar o povo’, dirigida ao PT, perguntava: ‘Mas não vale também para o sistema partidário, a academia, a mídia, os especialistas? Como reconciliá-los com o homem comum?’ Mas, não é só ouvir. Também influenciar na correção do ‘conhecimento defeituoso’ Parece-me ser esse o drama da conciliação entre os que não sabem e os que sabem. Portanto, não é suficiente mudar o nome das siglas. Essa relação é mais complexa e a longo prazo.

Especificamente, sobre a mudança de nome do PPS. Não me agrada, Movimento. Em primeiro lugar, já há o MDB e em segundo lugar, o nome ficará ligado ao título do pessoal ligado ao Trump que se articula, mundialmente, com o mesmo nome. Vamos pensar, pensar e agir.
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*É membro efetivo do diretório nacional e do Conselho Consultivo da FAP e editor do Blog Democracia Política e novo Reformismo

Marcus Pestana: O governo Bolsonaro, as reformas e o Congresso

- O Tempo (MG), Publicado em 19/11/18

Fechadas as urnas, é hora de cuidar do país. Mergulhado em profunda crise, o Brasil precisa de ações imediatas e urgentes. A economia e seus gargalos não ficarão na arquibancada aplaudindo os vitoriosos nas últimas eleições.

Nas políticas monetária e cambial estamos bem-equacionados. O sistema de metas inflacionárias, com a relativa autonomia do Banco Central conquistada, dá conta da defesa da moeda nacional. O câmbio flutuante, com intervenções tópicas da autoridade monetária contra ondas especulativas, assegura o equilíbrio nas contas externas. Portanto, o foco tem que ser na verdadeira tragédia fiscal instalada. Para restabelecermos o ambiente favorável à retomada do crescimento econômico, há que se atacar o imenso déficit fiscal do setor público e recuperar a confiança e a credibilidade da política econômica, com o restabelecimento da segurança jurídica e da estabilidade institucional. Sem isso, não haverá a retomada tão necessária e desejada.

No front fiscal, é preciso reduzir a máquina do governo, cortar gastos, potencializar a receita sem aumento da carga tributária, mas principalmente aproveitar o cacife conquistado pelo novo governo nas urnas para empreender, no primeiro semestre de 2019, as duas reformas essenciais: a previdenciária e a tributária.

Dois problemas, a meu ver, se colocam no caminho da aprovação das inevitáveis reformas estruturantes.

Primeiro, a dispersão da energia com a pulverização das discussões em inúmeros assuntos polêmicos. Se o esforço prioritário em torno das reformas previdenciária e tributária se diluir em meio à abordagem de temas como a reforma política, desarmamento, maioridade penal, Escola sem Partido, aborto, mudanças na legislação penal, será o atalho mais curto para o fracasso. Como bem ensinou Sun Tzu, em sua obra “A Arte da Guerra”, não se deve abrir vários flancos de conflito ao mesmo tempo.

Eliane Cantanhêde: Os sem-partido

- O Estado de S.Paulo

Planalto assume ar militar, enquanto Guedes replica Campos, Delfim e Simonsen

O governo Jair Bolsonaro pode até não ser um “governo militar”, como generais, almirantes e civis ligados ao futuro presidente fazem fila para garantir, mas que está ficando parecido, lá isso está. Até com um superministro civil definindo a pauta, a cara e a personalidade da economia.

No regime militar, havia uma divisão clara entre os generais que presidiram o País e os grandes economistas todo-poderosos: Roberto Campos, Delfim Netto e Mário Henrique Simonsen. Os dois grupos tinham poderes bem definidos e eram obviamente de direita, mas como se fossem de dois mundos diferentes. Os economistas, por exemplo, nunca perguntaram sobre tortura e repressão.

Hoje, o economista Paulo Guedes vai assumindo poderes equivalentes a Campos, Delfim e Simonsen, com o presidente eleito cumprindo à risca sua promessa de dar independência ao ministro. Ou “carta branca”, como o próprio Bolsonaro definiu ontem.

E assim vão chegando ao novo governo economistas que comungam a mesma filosofia liberal, com prioridade fiscal, Estado enxuto e três desafios-chave do mundo moderno: eficiência, produtividade e competitividade. Isso significa, entre outros, combater privilégios, promover reformas e assumir o ônus político das privatizações. Mas e o “social”, palavrinha mágica num país tão desigual como o Brasil?

José Eduardo Faria: O Brasil pós-eleição

- O Estado de S. Paulo

É preciso entender a dinâmica da política para julgá-la no âmbito do regime democrático

Pelo que disseram os candidatos em suas campanhas, o resultado da eleição presidencial não trouxe novidades. Mostrou a crise da democracia representativa, que não atende aos valores e às aspirações dos eleitores. Revelou que as paixões políticas cederam vez ao maniqueísmo, ao desconcerto e à perplexidade. Sinalizou que a radicalização dos extremos só foi possível por causa da decomposição das bases de centro-esquerda e centro-direita. E deixou claro que, num contexto de fragmentação partidária, que marca um ponto de inflexão na crise de legitimidade das instituições, o desafio é refletir sobre a política e suas possibilidades e seus limites.

Mas em que medida a insatisfação generalizada pode produzir transformações democráticas, a começar pela reconstrução do sentido de responsabilidade, pela recuperação da noção de estratégia e pela formulação de um projeto de nação? Teria sido possível evitar que o segundo turno se resumisse à alternativa entre ceticismo e melancolia, cinismo e pragmatismo?

A votação obtida pelo candidato da direita, cujo discurso se resumiu à promessa de ordem e à manifestação do desejo de que o País de hoje volte a ser o de 40 anos atrás, apontou a disseminação, num segmento expressivo do eleitorado, da ideia de que a política é corrupta e dispensável. Nesse sentido, basta ver o que têm afirmado os parlamentares eleitos por esse eleitorado. O problema, contudo, é outro. Até que ponto uma postura antipolítica é melhor do que uma má política? Desqualificar a política não é também um modo de renunciar à representação de interesses e às aspirações de igualdade, inclusão e justiça?

Merval Pereira: Projeto Nordeste

- O Globo

PT repete a Arena, partido da ditadura militar, ao ganhar no Nordeste e perder nos estados mais desenvolvidos e grandes cidades

O previsível projeto do governo Bolsonaro de investir no Nordeste, reduto político que restou ao PT, região em que o candidato Fernando Haddad recebeu 51% dos votos nas recentes eleições presidenciais, depende tanto ou mais da descentralização das verbas federais, quanto do Bolsa Família ou de obras de infraestrutura como a transposição do Rio São Francisco ou a Transnordestina, que o general Augusto Heleno, futuro chefe do Gabinete Civil, citou como exemplos.

O economista Winston Frischt, ex-secretário de Política Econômica no governo Itamar e colaborador do Plano Real, um estudioso da questão, destaca que o controle das regiões mais pobres do país pelo governo da vez é uma prática que vem do Império e continuou com a República até os dias de hoje. Mas não há dúvida de que, além da centralização das verbas, o Bolsa Família solidificou o domínio político petista na região, onde um em cada três domicílios recebe recursos do programa, de acordo com a PNAD.

Dos 18,3 milhões de domicílios da região, mais de 6 milhões recebem o benefício, o que corresponde a 31% da população. Nas outras regiões, essa proporção é bem menor: Centro-Oeste (9,2%), Sudeste (6,9%) e Sul (5,4%). O resultado é que Jair Bolsonaro venceu em 17 estados, nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste, e na maior parte da região Norte. Já o petista Fernando Haddad ganhou em oito dos nove estados do Nordeste e, no Norte, no Pará.

A vantagem de Bolsonaro no Sul, de mais de 600 mil votos, praticamente neutralizou a de Haddad no Nordeste, por volta de 700 mil votos. Mas, para o economista Winston Frischt, não é preciso controlar o Bolsa Família para controlar politicamente o Nordeste.

Ele destaca que desde a Primeira República a região é controlada, especialmente via suas elites políticas, por verbas federais em sua totalidade. O mapa da eleição do fim de cada era de governos muito impopulares, como o dos militares e os dos últimos anos, é o mesmo: a Arena e o PT levaram o Nordeste, mas perderam os estados mais desenvolvidos e os principais centros urbanos do país.

Fabio Giambiagi: A matemática das coalizões

- O Globo

Deixar de ter vários partidos com um, dois ou três parlamentares não vai mudar nada a complexidade

Em dezembro de 2017, antes da “janela” que fez com que muitos parlamentares mudassem de partido até o começo de abril, a Câmara dos Deputados — que, cabe lembrar, tem 513 membros, o que significa que o quorum constitucional para aprovar uma emenda com 60 % de apoio é de 308 votos — mostrava o seguinte quadro:

— 25 partidos com representação;

— Dois partidos “muito grandes”, com 50 deputados ou mais (PMDB e PT);

— Cinco partidos grandes e oito partidos médios, se definirmos partidos “grandes” como tendo de 30 a 49 deputados e “médios” como tendo de dez a 29 deputados;

— Dez partidos com menos de dez deputados.

Na ocasião, concluía-se também que:

— para ter no mínimo 308 votos e assumindo que todos os deputados de um partido votassem da mesma forma, era necessário construir uma coalizão entre sete partidos;

— levando em conta que entre os maiores partidos estavam alguns que se encontravam na oposição, ao não considerar estes e passar a incluir partidos menores, a montagem de uma coalizão com 308 votos na Câmara requeria a presença de dez partidos.

A percepção de que as coisas iriam mudar para melhor em 2019, exposta em algumas análises otimistas na época, se alicerçava em três premissas. A primeira, de que o Congresso sofreria uma grande renovação, com mudança de práticas por parte dos novos eleitos. A segunda, de que a cláusula de barreira reduziria o número de partidos. E a terceira, que o novo governo teria como primeira e inadiável tarefa a missão de aprovar uma reforma política que daria uma nova racionalidade ao jogo das alianças. Vejamos cada um desses pontos mais de perto.

Bernardo Mello Franco: A Petrobras na mira do Posto Ipiranga

- O Globo

Há cinco meses, o futuro presidente da Petrobras defendeu que era ‘urgente’ privatizar a estatal. Ontem ele disse que a ideia ‘não está em discussão’. Vale o falado ou o escrito?

O novo presidente da Petrobras vê uma “urgente necessidade” de privatizá-la. Roberto Castello Branco usou a expressão em junho, em artigo na “Folha de S.Paulo”. O texto defende, sem meias palavras, que a maior estatal brasileira seja passada nos cobres.

Ontem o economista disse que a privatização da Petrobras, que ele considerava urgente há cinco meses, “não está em discussão”. Vale o falado ou vale o escrito? Será preciso esperar para ver, como de resto em quase tudo no governo eleito.

Castello Branco é um dos homens de Paulo Guedes, o “Posto Ipiranga” de Jair Bolsonaro. O futuro superministro já havia emplacado os chefes do BC e do BNDES. Agora vai instalar outro ex-pupilo da Universidade de Chicago na petroleira, cujo valor de mercado ultrapassou os R$ 350 bilhões na sexta passada.

Míriam Leitão: A melhor reforma da Previdência

- O Globo

Proposta de Arminio e Tafner para a Previdência é a melhor sobre a mesa, e equipe de Bolsonaro faria um bem ao país se estudasse esse projeto

O Brasil terá que fazer uma reforma da Previdência no começo do próximo ano por razões objetivas e não ideológicas. A melhor ideia que apareceu até agora é a apresentada pelos economistas Armínio Fraga e Paulo Tafner. Ela propõe que a fórmula mude para todos, inclusive as Forças Armadas, ainda que elas estejam num projeto separado. Tira os parâmetros de aposentadoria e pensão da Constituição, porque não faz sentido que estejam.

A Previdência das Forças Armadas hoje não está na Constituição. Foi feita e pode ser alterada por Lei Complementar. E mesmo assim tem funcionado. Se diante de cada mudança de parâmetro, como a inclusão da idade mínima, o país ficar mais de duas décadas discutindo, seremos tragados pelo déficit. A primeira vez que o governo tentou aprovar a idade mínima foi em 1996. Ainda estamos rodando em torno disso.

A proposta surge descolada de qualquer grupo político. Quando alguns dos melhores especialistas em Previdência no Brasil se reuniram sob o comando de Armínio Fraga era fevereiro. Não havia candidaturas definidas, e o líder das pesquisas era Lula, que estava solto. Portanto, não foi feita sob encomenda para nenhum partido, mas de acordo com a necessidade de um país que gasta muito mais com aposentadorias e pensões, como proporção do PIB, do que o Japão, que têm o dobro do percentual de idosos que o Brasil tem.

Paulo Tafner explica que a proposta de reforma da Previdência do governo Temer é boa e elogia os trabalhos coordenados por Marcelo Caetano na PEC 287. Há pontos em comum entre as duas, mas, se a proposta atual mantém o assunto na Constituição, a nova proposta retira para ter mais liberdade para alterá-la conforme as mudanças na realidade do país.

Luiz Carlos Azedo: O enxugamento da Petrobras

- Correio Braziliense

Para Castello Branco, futuro presidente da estatal, a empresa precisa intensificar a exploração e a extração de petróleo, porque, em algumas décadas, o combustível “perderá relevância”

A indicação do economista Roberto Castello Branco para a presidência da Petrobras, confirmada ontem pelo presidente eleito, Jair Bolsonaro, consolidou o poder do futuro ministro da Economia, Paulo Guedes, na equipe econômica e sinaliza que nenhuma empresa estatal está a salvo de enxugamento e fora do programa de privatizações. “É uma indicação do Paulo Guedes. Eu estou dando carta branca a ele. Tudo que é envolvido com economia é ele que está escalando o time. Eu só, obviamente, e ele sabe disso, estamos cobrando produtividade. Enxugar a máquina e buscar, realmente, fazê-la funcionar para o bem-estar da nossa população”, disse Bolsonaro.

O futuro presidente da estatal, que é formado em Chicago, como Guedes, já anunciou que a empresa vai focar sua atuação nas áreas de exploração e extração de petróleo. Para Castello Branco, a Petrobras precisa intensificar a exploração e a extração de petróleo, porque, em algumas décadas, o combustível “perderá relevância”, ou seja, será substituído por outras fontes de energia. Também defende que a empresa, que praticamente monopoliza o refino, venda suas refinarias. Não adiantou se pretende privatizar a BR Distribuidora, mas esse é o espírito da coisa. O atual presidente da empresa, Ivan Monteiro, que também estava cotado para presidir a Petrobras, talvez seja indicado para comandar o Banco do Brasil.

A indicação de Castello Branco encerrou uma queda de braços entre Guedes e o grupo de militares encabeçado pelo vice-presidente eleito, Hamilton Mourão, e o general Augusto Heleno, futuro ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), pelo controle da estatal. Ícone do desenvolvimentismo brasileiro e fruto da maior campanha nacionalista da história do país, “O petróleo é nosso”, a Petrobras sempre foi uma linha divisória do nosso patriotismo, explorada em sucessivas campanhas eleitorais. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, por exemplo, alavancou sua campanha à reeleição contra o tucano Geraldo Alckmin, acusando-o de pretender privatizar a estatal e o Banco do Brasil.

A Petrobras, porém, foi alvo do maior escândalo de corrupção investigado pela Operação Lava-Lato, o que levou à prisão diversos executivos da empresa. Ontem mesmo, a juíza substituta Gabriela Hardt condenou o ex-diretor de Serviços da Petrobras Renato Duque em uma ação da Lava-Jato pelos crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e dissimulação de produto de crimes. Duque foi condenado a três anos e quatro meses apenas, e não a 6 anos e 8 meses, porque colaborou com a Justiça. Segundo as investigações, era o principal quadro ligado ao PT na operação de caixa dois da Petrobras. A juiza Hardt é a mesma que interrogou o ex-presidente Lula na semana passada.

Hélio Schwartsman: Bolsonaro sem médicos

- Folha de S. Paulo

Barreira mais difícil de quebrar é provavelmente o corporativismo

A dificuldade para levar médicos às áreas mais remotas do país fez com que o governo Dilma Rousseff apelasse aos profissionais cubanos. O discurso de campanha de Jair Bolsonaro, que prometeu rever o Mais Médicos e falou até em romper relações diplomáticas com Havana, fez com que o governo cubano cancelasse sua participação no programa, criando desde já um embaraço para a futura administração. A saída dos cubanos deixará em aberto 8.332 vagas em 2.885 municípios, dos quais 1.575 contam exclusivamente com estes profissionais.

Os médicos brasileiros sempre alegaram duas razões principais para não ir para os rincões. Prefeitos das localidades mais desassistidas prometiam salários nababescos para atrair os profissionais, mas rapidamente atrasavam os pagamentos, quando não deixavam de realizá-los inteiramente, e as condições de trabalho eram deploráveis, com postos de saúde que ofereciam pouco mais do que gaze, esparadrapo e meia dúzia de drogas.

O Mais Médicos, ao federalizar o pagamento do salário, resolveu a primeira dificuldade, mas não fez nem cócegas na segunda. E, diante das restrições fiscais e da própria lógica da gestão da saúde, não se vislumbra solução para este problema nem em curto nem em médio prazos.

Pablo Ortellado: Lei Rouanet

- Folha de S. Paulo

Para onda conservadora, políticas de promoção cultural e social são instrumentos de cooptação

A onda conservadora que elegeu Bolsonaro se assenta em uma sucessão de equívocos. Como precisa gerar indignação permanente, ela exagera, quando não falsifica fatos, adaptando a realidade ao discurso.

Segundo sua visão de mundo, para votar nos notórios ladrões da esquerda seria preciso que o eleitor ou apoiador estivesse levando algum tipo de vantagem. Lei Rouanet, Bolsa Família e cotas raciais não seriam, assim, políticas de promoção cultural e social, mas instrumentos de cooptação dos artistas, dos pobres e da população negra.

Confrontados com a objetividade do exercício do poder, os conservadores vão ter agora que fazer o percurso inverso, ajustando seu discurso delirante à realidade.

Nada exemplifica melhor esse descompasso do que a Lei Rouanet.

No discurso da direita, que Bolsonaro encampou, a Rouanet é um mecanismo de cooptação da classe artística. Músicos e atores receberiam polpudos recursos do governo e, em troca, emprestariam seu apoio.

Luiz Weber: Carta branca

- Folha de S. Paulo

Trunfo divide o bônus dos acertos com o presidente, mas o ônus do fracasso é de seu detentor

O mercado não cooptou Jair Bolsonaro. Nem os militares. Nem mesmo os deputados facebookeiros eleitos na esteira do capitão. O novo presidente não é uma raposa da política, que conhece todos os truques do centrão. Ele é um ouriço: sabe bem apenas uma coisa. Bolsonaro fica eriçado cada vez que suas redes sociais irradiam indignação.

Bolsonaro confunde as antenas tradicionais. Presidente eleito, comporta-se como um antipresidente. Criado na hierarquia da caserna, tornou-se um delegador de tarefas. Distribui cartas brancas como medalhas do Pacificador (a lista de beneficiários da comenda do Exército ocupou 22 páginas neste ano).
Paulo Guedes, futuro ministro da Economia, recebeu duas delas: uma para nomear Joaquim Levy para o comando do BNDES; outra, na nomeação do presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco.

Guedes tem usado a carta branca com prudência. Liberal de raiz, daqueles que leriam Milton Friedman na laje (na “penthouse”, mais apropriado), o economista montou um time experiente. Manterá no futuro governo quadros competentes da gestão Michel Temer e trará outros.

Joel Pinheiro da Fonseca: Aprendendo com os ingleses

- Folha de S. Paulo

É melhor não imitar abandono de acordos proveitosos por arroubo nacionalista

O nacionalismo está em alta no mundo. Trump segue com um discurso de protecionismo econômico, abandono de acordos internacionais, fechamento de fronteiras e mudança de postura dos EUA para com seus aliados. A China já se beneficia da retração americana e busca ocupar esse espaço na economia globalizada. Ainda é cedo, contudo, para avaliar as mudanças, pois poucas alterações concretas aconteceram.

A exceção é o Reino Unido. Lá, a ideologia nacionalista levou a melhor e o país se vê às vésperas de decidir como se dará a saída da União Europeia. O acordo que a primeira-ministra Theresa May conseguiu negociar com a UE não agrada a ninguém. O sonho romântico de uma Inglaterra livre das amarras europeias se esborrachou no chão duro da realidade.

Apenas sair de uma vez, sem acordo nenhum, seria catastrófico: o Reino Unido se tornaria um país isolado e sem os seus mais importantes laços econômicos. Hoje em dia, quase metade das exportações britânicas vai para a UE.

Se o Reino Unido quiser preservar seu acesso ao mercado europeu, terá que se submeter às regulamentações europeias, com a diferença de que não terá mais nenhuma influência em sua formulação. Novos acordos econômicos —ambição nutrida por uma minoria mais esclarecida dos defensores do Brexit, e não pela maioria que só queria uma Inglaterra protegida da concorrência internacional e sem imigrantes— também terão que esperar por anos a fio antes de sequer iniciar negociações, e ficarão igualmente limitados.

A tentação burocrática de tudo regulamentar e insistir no objetivo de uma união política que nunca foi desejada pela Inglaterra (e que encontra resistência entre os países continentais também) criou as bases para a decisão atabalhoada do Brexit. Dado o tamanho do fiasco, já se especula sobre a possibilidade de um novo referendo, o que seria um tapa na cara na ideia da soberania popular. Seja qual for a solução, para nós ficam algumas lições.

Ricardo Noblat: CUT na ilegalidade

- Blog do Noblat | Veja

A direita radical agradece

Ninguém teria prestado atenção se não fosse um vídeo de sucesso nas redes sociais gravado há uma semana durante ato de apoio a Lula em Curitiba. Vagner Freitas, o ensandecido presidente nacional da Central Única dos Trabalhadores (CUT), disse que sua entidade e filiados não reconhecem Jair Bolsonaro como presidente eleito. O que ele alega?

“Bolsonaro foi eleito com menos de 30% do povo brasileiro. Mancomunado com Moro, com a mídia, mudaram (sic) o resultado da eleição. Todos sabem que Lula seria eleito em 1º turno e por isso está preso”, argumentou Freitas de maneira tosca, mas perfeitamente adequada à sua formação. Para concluir:
– Logo, fique muito claro que nós não reconhecemos o senhor Bolsonaro como presidente da República. Vamos às ruas defender os direitos dos trabalhadores e a democracia, vamos libertar Lula, fazer caravanas pelo Brasil inteiro e colocar os fascistas no lugar deles.

Fernando Haddad, o candidato derrotado do PT à presidência da República, demorou 48 horas para reconhecer a vitória de Bolsonaro, mas o fez. A comissão de observadores da Organização dos Estados Americanos (OEA), convidada pelo governo brasileiro a acompanhar as eleições, declarou que elas foram limpas e justas. Mas se depender de Freitas…

Nada se parece mais com um radical de direita do que um radical de esquerda. É legítimo supor que Freitas não entenda isso, nem mesmo saiba o que é esquerda. De fascismo, claramente não entende. Ou não chamaria de fascistas os que elegeram Bolsonaro. Entre eles haverá fascistas. Mas o Brasil não tem 58 milhões de fascistas. Nem 10% disso.

Freitas é o “dono” de um exército de militantes que Lula convocou para ocupar as ruas contra o impeachment de Dilma. O tal exército não atendeu ao chamado. Se atendeu, revelou-se uma fraude de tão pequeno que era, de tão inútil para alcançar seus objetivos. Quer se goste ou não, Bolsonaro será o presidente do Brasil pelos próximos quatro anos. Ponto final.

Ao dizer o que disse, Freitas se põe na ilegalidade e ameaça arrastar para a ilegalidade a central que preside. Tão perverso ou pior: robustece o discurso da direita radical que só na ditadura subiu a rampa do Palácio do Planalto, e que se assanha na tentativa de subi-la mais uma vez.

Ivanir dos Santos: Para além do 20 de novembro

- O Dia

Mês de novembro, e lá vem inúmeros convites para que nós, homens e mulheres negros e negras, participemos de rodas de conversas, mesas de debates ou proferir palestras sobre o tema "consciência negra".

Obviamente, as nossas participações nesses eventos implicam, diretamente e indiretamente, na ação de ocupação de espaços nos quais, em vários momentos, somos invisibilizados.

Entretanto, para além da ocupação dos espaços, por nosso negros corpos, uma questão paira no ar: "Por que os temas das negritudes ganham uma maior e significativa relevância, principalmente nos espaço de formação intelectual, apenas no mês de novembro?".

Primeiramente precisamos compreender que por trás dos questionamento do "por que" necessitamos de datas, ações memorativas e rememorativas das estórias e histórias de personagens negros no Brasil. Existem séculos de silenciamentos históricos que nos condicionaram, enquanto sujeitos negros, a leituras marginais.

E para tal movimento reflexivo precisamos pontuar que existe uma grande diferença quanto pautamos 'consciência humana' e quando pautamos 'consciência negra'.

Abertura da economia não pode demorar: Editorial | O Globo

Defesa de mudanças graduais é uma forma de adiar sem prazo o aumento da competição interna

É parte da agenda do presidente eleito Jair Bolsonaro abrira economia para expor o empresário brasileiro, principalmente da indústria, à competição externa. No Brasil, país com tradição secular de protecionismo, toda vez que se propõe algo neste sentido, surgem clamores para que nada seja feito.

É certo que deve haver cuidados para impedir quebradeiras, porém, sem o choque da competição externa, empresários acostumados ao berço esplêndido do protecionismo verde e amarelo não se movimentarão para ganhar competitividade. Lembre-se de Collor, no início dos anos 1990, e da indústria automobilística. O presidente reduziu a proteção ao setor, e os veículos melhoraram de qualidade. Deixaram de ser “carroças”.

Cabe ao Estado dar condições para a realização dos investimentos necessários à modernização, como a redução da burocracia e da alta taxação na máquinas e software spa raque o país entre de fato na era da “indústria 4.0”, com o uso crescente de robôs e de tecnologia avançada em geral. Empresários que planejam dar saltos de produtividade recuam diante do emaranhado burocrático e das elevadas tarifas para importar maquinário que tenha “similar nacional”. Elas costumam estar no teto de 35% permitido pela Organização Mundial do Comércio (OMC). Este um motivo da baixa eficiência da economia brasileira.

Estudo feito pela própria Confederação Nacional da Indústria (CNI) junto a 750 empresas constatou que apenas 1,6% delas estava neste estágio tecnológico avançado. Na Alemanha, conhecida pelo avanço industrial, são 50%.

A jurisprudência e a lei: Editorial | O Estado de S. Paulo

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) editou a súmula 618 estabelecendo que “a inversão do ônus da prova aplica-se às ações de degradação ambiental”. Ou seja, nesse tipo de processo o réu terá de provar que não degradou o meio ambiente, e não quem o acusa. Sob a pretensa finalidade de ampliar a proteção do meio ambiente, o Tribunal se esqueceu do que diz a lei, em mais um exemplo de como a jurisprudência pode desequilibrar a relação entre as partes e causar insegurança jurídica.

O Código de Processo Civil (CPC, Lei 13.105/2015) define que o ônus da prova incumbe ao autor da ação, quanto ao fato constitutivo de seu direito, e ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor. Ou seja, como é natural, cabe a cada umas das partes provar aquilo que apresenta no processo. Se o Ministério Público afirma, por exemplo, que houve degradação ambiental em determinada área, é ele que deverá provar a existência do dano. Essa é a regra geral.

A lei também prevê que o juiz, “diante de peculiaridades da causa relacionadas à impossibilidade ou à excessiva dificuldade de cumprir o encargo nos termos do caput (a regra geral)”, poderá “atribuir o ônus da prova de modo diverso, desde que o faça por decisão fundamentada, caso em que deverá dar à parte a oportunidade de se desincumbir do ônus que lhe foi atribuído” (art. 373, § 1.º).

Servidores custosos: Editorial | Folha de S. Paulo

Gastos com pessoal caminham para ultrapassar a casa dos R$ 300 bi anuais

Está correto, em sua essência, o diagnóstico a respeito dos gastos federais com pessoal apresentado pelo governo Michel Temer (MDB) à equipe de transição do presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL).

Como reportou esta Folha, os economistas da atual administração alertaram que, acima da quantidade de servidores públicos, são os salários exagerados a principal anomalia a inflar essa despesa.

Segundo esse raciocínio, a futura gestão deveria rever os critérios da remuneração do funcionalismo, adequando-a à do setor privado. Além disso, seria importante adiar os reajustes de vencimentos programados para 2019.

Louvem-se a civilidade da transição de governo e a boa qualidade do material oferecido ao grupo de Bolsonaro. Lamente-se que a gestão Temer não tenha posto em prática o que agora receita.

Ana Costa: Disritmia (Matinho da Vila)

Carlos Drummond de Andrade: Três presentes de fim de ano

I

Querida, mando-te
uma tartaruguinha de presente
e principalmente de futuro
pois viverá uma riqueza de anos
e quando eu haja tomado a estígia barca
rumo ao país obscuro
ela te me lembrará no chão do quarto
e te dirá em sua muda língua
que o tempo, o tempo é simples ruga
na carapaça, não no fundo amor.

II

Nem corbeilles nem
letras de câmbio
nem rondós nem
carrão 69
nem festivais
na ilha d’amores
não esperes de mim
terrestres primores.
Dou-te a senha para
o dom imperceptível
que não vem do próximo
não se guarda em cofre
não pesa, não passa
nem sequer tem nome.
Inventa-o se puderes
com fervor e graça.

III

Sempre foi difícil
ah como era difícil escolher
um par de sapatos, um perfume.
Agora então, amor, é impossível.
O mau gosto
e o bom se acasalaram, catrapuz!
Você acha mesmo bacana esse verniz abóbora
ou tem medo de dizer que é medonho?
E aquele quadro (objeto)? aquela pantalona?
Aquela poesia? Hem? O quê? não ouço
a sua voz entre alto-falantes, não distingo
nenhuma voz nos sons vociferantes...
Desculpe, amor, se meu presente
é meio louco e bobo
e superado:
uns lábios em silêncio
(a música mental)
e uns olhos em recesso
(a infinita paisagem).