quinta-feira, 27 de julho de 2023

Merval Pereira - Fogo amigo

O Globo

Simone Tebet, representante do suposto projeto de governo de centro democrático, acaba de receber um torpedo pela proa com o anúncio de que o economista Marcio Pochmann será o novo presidente do IBGE

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, está se saindo um político melhor do que a encomenda. Dividir a melhoria da avaliação da economia brasileira pela agência Fitch com os presidentes da Câmara e do Senado, pelo apoio às reformas, além de justo, é um gesto de quem tem o entendimento do real sentido da proposta de governo de centro democrático escolhido pelas urnas.

Da mesma maneira, ao repetir várias vezes que o presidente Lula é o candidato do PT para a reeleição em 2026, o ministro da Fazenda procura afastar as intrigas internas que o apontam como o presumível candidato petista caso Lula não queira ou não possa disputar a reeleição. Nada mais natural que o nome de Haddad surja na lista de possíveis candidatos, já que ele disputou o cargo em 2018 e hoje é o quadro do PT mais em evidência com o sucesso inicial da política econômica.

A ministra do Planejamento, Simone Tebet, representante desse suposto projeto de governo de centro democrático, acaba de receber, porém, um torpedo pela proa com o anúncio de que o economista Marcio Pochmann será o novo presidente do IBGE. Uma briga interna silenciosa contra Haddad, o verdadeiro alvo desse torpedo, acabou encontrando uma brecha na equipe econômica por uma ingenuidade política de Tebet.

Míriam Leitão - A visão de Tebet da economia à política

O Globo

A ministra lembra que o governo ganhou a eleição por ‘milésimos’ e, por isso, tem sim de negociar com outras forças políticas

A ministra Simone Tebet, do Planejamento, define como “decepcionante” a campanha feita por integrantes do governo de recondução de Augusto Aras para a Procuradoria-Geral da República. Conta que os partidos do centro democrático que apoiaram o presidente Lula precisam ter altruísmo em 2024 na construção de alianças. “Sabemos que o embate de 2026 começa em 2024.”

Ao mesmo tempo que está de olho na política, Tebet prepara o Orçamento, que, este ano, será difícil tecnicamente. A meta é de déficit zero, mas as receitas não estão garantidas. Ela, contudo, acha que “o desafio é factível”.

Luiz Carlos Azedo - Reforma ministerial vira jogo de intrigas na Esplanada

Correio Braziliense

O caminho crítico das negociações é a escolha dos ministérios a serem ocupados, ou seja, dos ministros que serão defenestrados no novo desenho político da Esplanada

É certa a entrada do Centrão no governo Lula, não se sabe ainda em quais ministérios. As conversas de bastidor com os caciques do PP e do PR estão praticamente concluídas, de maneira a garantir uma maioria governista segura na Câmara, onde a governabilidade do país tem seu ponto mais vulnerável. As pressões para acelerar a mudança refletem as contradições entre o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e os caciques do MDB e do União Brasil no Senado, principalmente os senadores Renan Calheiros (MDB-AL) e Davi Alcolumbre (União-AP).

As indicações de Lira estão consolidadas, fazem parte de seu acordo com os presidentes do PP, Ciro Nogueira (PI), e do Republicanos, Marcos Pereira (SP). Cotados para a Esplanada, os deputados Sílvio Costa Filho (Republicanos-PE) e André Fufuca (PP-MA) têm como características boas relações com o PT nos seus estados. O aval de Lira e suas bancadas, porém, não garante que os 49 votos do PP e os 41 do Republicanos sejam carreados automaticamente para as propostas do governo. Os dois ministros são políticos muito jovens e terão que exercer uma liderança compartilhada.

Bruno Carazza - Até quando valerá a pena para Simone Tebet continuar no governo?

Valor Econômico

Nomeação a contragosto de Pochmann para o IBGE colocará ministra num dilema

Nunca saberemos quantos dos 4.915.423 eleitores de Simone Tebet decidiram votar em Lula no segundo turno depois que a ex-senadora do MDB declarou seu apoio ao petista. No entanto, levando-se em conta que a vitória sobre Bolsonaro se deu pela margem apertadíssima de 2.139.645 votos (1,8% do total), é justo atribuir a Tebet o papel de fiel da balança nas eleições presidenciais de 2022.

A adesão de Simone Tebet à campanha lulista fez com que seu nome fosse tido como certo nas bolsas de apostas para a composição do governo durante a transição. Só não se sabia qual seria o prédio da Esplanada que ela comandaria. Pela sua importância na votação, Tebet pleiteava um cargo de peso, e cogitou-se o Ministério do Desenvolvimento Social, responsável pelo Bolsa Família, ou outra pasta de impacto social e orçamento robusto, como Saúde e Educação.

Malu Gaspar - Marielle e uma fissura no crime organizado

O Globo

As revelações do ex-PM Élcio Queiroz sobre o assassinato de Marielle Franco, tornadas públicas nos últimos dias, impressionam pela quantidade de detalhes. Lacunas importantes foram preenchidas a respeito do que se passou antes e depois da noite de 14 de março de 2018, quando a vereadora e seu motorista, Anderson Gomes, morreram. Soube-se, por exemplo, que os assassinos passaram meses planejando o homicídio, que a placa do carro usado na ação foi “picotada”, com os pedaços espalhados numa linha férrea, e que o matador, Ronnie Lessa, foi tomar cerveja num bar logo depois de executar Marielle. Também veio à tona que o intermediário utilizado pelo mandante era outro matador, executado em 2021 num episódio até hoje sem solução. Para quem conhece o submundo do crime no Rio de Janeiro, porém, o enredo tem um quê de flashback, que só reforça o simbolismo do caso para a história do combate ao crime organizado no Brasil.

Maria Cristina Fernandes - Com artrose, Lula dribla Centrão

Valor Econômico

Ciclo federativo que espraia PPPs com garantia da União prejudica o negócio do Congresso

O crédito adquirido pelo Centrão com a aprovação da reforma tributária se desvaloriza na mesma velocidade com a qual se produzem boas notícias na economia. O país registra deflação, o câmbio mantém-se aquém de R$ 4,80, o PIB de 2023 foi revisado de 1,9% para 2,5%, e finalmente, registre-se a segunda elevação da nota de crédito de uma agência internacional.

Quando o governo, por fim, se sentar com o Centrão para fechar os cargos terá deflacionado seu preço. Celso Sabino (União-PA), por exemplo, confirmado no Turismo, nem posse tomou. E já faz 20 dias que a reforma tributária, passe da nomeação, foi aprovada na Câmara.

Não é uma circunstância pontual que impulsiona a deflação do Centrão. No lançamento do “ciclo de cooperação federativa” ficou claro que está em curso o resgate da União como eixo da relação com Estados e municípios que havia sido transferido ao Congresso. Dois ministros, Fernando Haddad e Rui Costa, se revezaram para mostrar como as PPPs podem se transformar num instrumento para reformular a relação ineficiente e promíscua entre o Orçamento e a execução de obras públicas.

William Waack - A força do ajuntamento

O Estado de S. Paulo

Lula ainda não digeriu totalmente a natureza do Centrão

Lula assim definiu o Centrão: não existe como organização. Não possui endereço ou um gerente. Trata-se, segundo o presidente, de um “ajuntamento de partidos”, dependendo da situação.

A definição de Lula ignora, porém, a natureza desse ajuntamento. Consiste, como se sabe há décadas, em manter esses agrupamentos privados (chamados de partidos) o mais próximo possível dos cofres e da máquina pública.

O Centrão precede Lula em muitos anos, mas ambos ostentam trajetórias opostas. A de Lula, enquanto chefe do Executivo, é a da perda de poder relativo. A trajetória do Centrão exibe a conquista, pelo Legislativo, de poderes inéditos na história política brasileira.

Lula já havia se convencido 20 anos atrás de que não governaria sem o Centrão. Mas se encontra hoje na situação de ter de governar pelo Centrão. É notória a “continuidade” desse ajuntamento de partidos, não importa a alternância no poder de dois personagens tão distintos como Bolsonaro e Lula.

José Serra* - A sombra da estagnação

O Estado de S. Paulo

Para inserirmos de forma positiva nossa economia nas transformações mundiais, precisamos reinventar o Estado brasileiro

O Banco Central do Brasil apresentou, na semana passada, sua projeção do PIB para maio deste ano com a divulgação do IBC-Br, que é considerado a prévia para o Produto Interno Bruto. A estimativa foi uma queda de 2% ante o mês anterior. O pior resultado para maio registrado nos últimos cinco anos – atrás apenas de 2018, quando caiu 3,08%. Trata-se também do pior desempenho mensal desde março de 2021, quando a prévia do PIB despencou 3,5%.

Os comentários lacônicos da instituição monetária nacional caíram como um balde de água fria sobre o otimismo acerca do desempenho da economia brasileira, embora o mercado esperasse uma certa queda nos resultados. As explicações apontaram como razão o fim da supersafra de grãos e seus efeitos sobre a renda e o consumo da economia. Mas o varejo também registrou resultado negativo.

Celso Ming – A Fitch melhora a nota do Brasil

O Estado de S. Paulo

A Fitch foi nesta quarta-feira a primeira das três grandes agências de classificação de risco a reconhecer a melhora da qualidade da economia brasileira desde 2018. Aumentou em um degrau a nota da economia do Brasil, de BB-, para BB.

As mais importantes agências de avaliação de risco, além da Fitch, são a Standard & Poor’s e a Moody’s. Elas existem para avaliar o grau de confiança de um título de dívida, ou seja, o tamanho do risco de calote que um devedor pode passar no mercado. Quando ganha reputação de altamente confiável, um título obtém grau de investimento. Quando não, é considerado título especulativo.

Os títulos do Tesouro do Brasil ainda são considerados especulativos, embora entre 2008 e 2015, tivessem mantido grau de investimento. Essas classificações se tornaram necessárias porque grande número de instituições e de fundos exige que suas carteiras de aplicações financeiras sejam carregadas apenas com títulos altamente confiáveis. A referência é o título do Tesouro dos Estados Unidos, o T-bond. Quanto mais confiável um título, maior a procura dos investidores por ele. Por isso, pode pagar juros mais baixos.

Bruno Boghossian - Uma visita ao submundo

Folha de S. Paulo

Para achar mandantes, investigação terá que ir fundo numa estrutura embrenhada em regiões inteiras do Rio

A etapa mais recente da investigação das mortes de Marielle Franco e Anderson Gomes ajudou a completar o desenho da cena do crime, mas não foi só isso. A delação que detalhou a execução dos assassinatos também ofereceu uma visita ao submundo em que será preciso mergulhar para encerrar o caso.

O ex-PM Élcio Queiroz narrou com naturalidade a conexão entre os responsáveis pelos assassinatos e as atividades de milícias do Rio. Descontado o espírito de propaganda, foi isso que levou o ministro Flávio Dino a dizer que "é indiscutível" o vínculo entre esses grupos e as mortes.

Maria Hermínia Tavares* - Democracia? Tanto faz

Folha de S. Paulo

Nada de novo na existência de um número de brasileiros indiferentes quanto ao tipo de regime político

Com o sombrio título "A recessão democrática na América Latina", o Latinobarómetro acaba de publicar seu informe de 2023. A cada ano, desde 1995, o instituto chileno, dirigido pela economista Marta Lagos, toma o pulso político da opinião pública em 18 países da região. A ideia é aferir as atitudes em relação à democracia, suas instituições e aos governos que dão ou deixam de dar vida a seus princípios e regras.

Trata-se de um acervo precioso que proporciona uma visão comparada de como evoluíram as percepções dos cidadãos de cada país nas três décadas do grande experimento democrático fora dos Estados Unidos, Canadá e Europa Ocidental.

A pesquisa confirma esperadas variações por países. Mas, na média, aponta declínio do apreço pela democracia, em quaisquer circunstâncias; insatisfação com seu funcionamento no país do entrevistado; aumento da indiferença pela forma do regime. Também mostra a percepção de que os partidos funcionam mal, podendo ser dispensados sem grande prejuízo para o sistema.

Ruy Castro - Queridas Leny e Doris

Folha de S. Paulo

Elas nunca puseram uma palavra ou nota no papel. Contentavam-se em ser fabulosas intérpretes

Esta coluna não quer ser uma seção de obituários. Com frequência deixo de escrever sobre alguém que morreu, mesmo tendo o que dizer a respeito. Mas a bruxa está voando baixo. João Donato se foi no dia 17, Tony Bennett no dia 21 e, nesta segunda (24), com diferença de horas, Leny Andrade e Doris Monteiro.

Os artigos na imprensa disseram tudo: eram artistas insubstituíveis, únicos em seus gêneros e deixaram uma obra que ficará para sempre. Eu só acrescentaria: desde que, nesse para sempre, não se torne de vez proibido associar a música à beleza.

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

Lula deveria zelar por seu próprio decreto sobre armas

O Globo

É um exagero defender o fechamento de clubes de tiro, o que a nova legislação não prevê

O governo precisa calibrar seu discurso antiarmamentista. Na última terça-feira, numa transmissão ao vivo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse ter pedido ao ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, para fechar “quase todos” os clubes de tiro do país, deixando abertos apenas “aqueles que são da Polícia Militar, do Exército e da Polícia Civil”. Para Lula, é a polícia que necessita de lugar para treinar tiro, não a sociedade. “Não estamos preparando uma revolução”, justificou.

A declaração pegou de surpresa até o próprio ministro da Justiça, que vinha dialogando com representantes do setor e garantindo que o objetivo do governo não era acabar com os clubes de tiro. Às vésperas da publicação do novo decreto sobre armas, Dino reiterou a meta: “A orientação do presidente foi de que não é para fechar o negócio. Tanto que os clubes de tiro e as lojas de armas vão continuar existindo”, disse.

É sabido que os clubes de tiro tiveram forte expansão durante o governo Jair Bolsonaro, acompanhando os inúmeros decretos que ampliaram o acesso a armas e munições, inclusive algumas de uso restrito. Entre 2019 e 2022, o Exército autorizou 1.483 clubes de tiro, o que representa em média um por dia. Em 2018, último ano do governo Michel Temer, haviam sido concedidas 165 licenças. Em 2022, foram 475. Aumentar a fiscalização sobre as autorizações é dever do governo. Decretar o cancelamento de todas é um exagero.

Poesia | Fernando Pessoa - Se eu pudesse

 

Música | Fafá de Belém - Coração do Agreste