sábado, 18 de julho de 2015

Opinião do dia – Roberto Freire

É melhor evitar precipitações, pois investigados estão sendo a presidente e vários parlamentares. Essa sugestão sobre aqueles acusados que são presidentes de poderes pode ter um efeito bumerangue e atingir a própria presidente.

A crise se aprofunda com as acusações contra Eduardo Cunha e a abertura de investigação criminal do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva por favorecimento à Odebrecht no BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social)
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Roberto Freire é deputado federal por S. Paulo e presidente nacional do PPS

Após denúncia de delator, Cunha rompe com Planalto e autoriza CPIs

Acuado por denúncia de delator, Cunha rompe com Dilma e abre CPIs

• Crise. Presidente da Câmara, investigado pela Lava Jato e sob suspeita de ter recebido US$ 5 milhões como propina, anuncia sua ruptura com o governo, cria comissões de investigação e solicita a deputado aliado que reescreva pedido de impeachment da presidente

Daniel Carvalho, Victor Martins – O Estado de S. Paulo

Nem bem oficializou seu rompimento com o governo, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), deu início às retaliações ao Palácio do Planalto, acusado por ele de querer prejudicá-lo com as investigações da Operação Lava Jato da Polícia Federal. No fim da manhã de ontem, Cunha anunciou que estava rompendo com o Planalto. Foi a primeira resposta à denúncia de ter pedido propina de US$ 5 milhões, feita pelo lobista Julio Camargo. A segunda resposta veio na forma do anúncio de duas novas CPIs para tentar impor ainda mais desgaste ao governo: criou a CPI do BNDES e autorizou a dos Fundos de Pensão.

ara isso, ignorou quatro requerimentos que pediam a criação de comissões para apurar falhas no setor elétrico, violência contra mulheres, desabastecimento de água e problemas na telefonia. Cunha também encaminhou ofício ao deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ) e a outros dez "cidadãos" para que refizessem em dez dias, por erro de formatação, seus pedidos de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff. "Vou incluir mais uma justificativa no meu requerimento. Semana que vem, apresento ele atualizado", disse Bolsonaro ao Estado.

Aliados do presidente da Câmara esperam a rejeição das contas de 2014 de Dilma, a partir de recomendação do Tribunal de Chntas da União (TCU), o que pode acabar em impeachment por crime de responsabilidade da petisca. Pessoas próximas a Cunha já dão como certa a reprovação das contas da presidente. Na quinta-feira passada, o presidente da Câmara já havia dito que o julgamento no Congresso seria político. As retaliações, no entanto, não devem parar por aí. Dilma também deve enfrentar ainda mais dificuldades para aprovar projetos de interesse do governo na Câmara.

Na volta do recesso, o governo deve ver rejeitados projetos prioritários, como a reforma do ICMS e a repatriação de recursos no exterior, segundo aliados políticos. O pacote de retaliações ao governo deve se estender à CPI da Petrobrás, sob controle de um político de sua "tropa de choque", o deputado Hugo Motta (PMDB-PB). Aliados de Cunha querem aprovar a convocação do ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante. Aguardam a divulgação oficial da delação do dono da UTC, Ricardo Pessoa, que afirmou que o ministro recebeu R$ 250 mil para sua campanha ao governo de São Paulo em 2010 e que o dinheiro teria origem no esquema de corrupção na Petrobrás. Mercadante nega irregularidades.

Ao longo do dia, o governo tentou amenizar a virulência das declarações de Cunha nos pronunciamentos oficiais. Nos bastidores, porém, não escondeu a tensão com a declaração de guerra feita pelo peemedebista. Petistas apontaram sinais de enfraquecimento de Cunha como a ausência de aliados, como os líderes do PMDB, Leonardo Picciani (RJ), e do DEM, Mendonça Filho (PE), no anúncio do rompimento com o governo.

Apenas cinco parlamentares do "baixo clero" acompanhavam Cunha: André Moura (PSC-SE), Rogério Peninha (PMDB-SC), Hildo Rocha (PMDB-MA), Édio Lopes (PMDB-RR) e Roney Nemer (PMDB-DF). A oposição entende que o rompimento agrava a crise institucional. "A guerra fria virou guerra total. Haverá destruição de parte a parte", disse um líder oposicionista que preferiu o anonimato. Para eles, o vice-líder do governo, Sílvio Costa (PSC-PE) "tentou apagar incêndio jogando gasolina" ao defender o afastamento de Cunha da presidência da Casa. O governo desautorizou Costa.

Partido. O PMDB deu sinais de divisão. Para alguns, Cunha furou o sinal ao declarar o rompimento e deu um tiro no pé ao criticar o juiz Sérgio Moro, que comanda a Lava Jato, tido corno "paladino da ética". Para outros, o deputado reagiu na medida e no momento certos, dividindo o noticiário com as acusações contra ele.

No PMDB, há quem argumente que, ao ir para o confronto direto com Dilma e o PT, Cunha mantém apoio da opinião pública, insatisfeita com a presidente e seu partido. Também há divisão na bancada quanto ao rompimento. Há quem diga que Cunha terá a maioria a seu favor, já que o governo ainda não liberou cargos e emendas para os parlamentares.

No entanto, o temor de enfraquecimento pode isolar o parlamentar, sujeito a ser enfraquecido por novas acusações e pela formalização da denúncia ao Supremo Tribunal Federal. Em nota, o PMDB ressaltou que o rompimento é uma posição pessoal de Cunha. Isso também gerou interpretações diversas. Para alguns, o comunicado demonstra isolamento do presidente da Câmara.

Para outros, foi apenas uma nota burocrática, já que o presidente da legenda, Michel Temer, é vice-presidente da República e articulador político do governo. Cunha quer que Temer deixe a articulação política tão logo o governo conclua o ajuste fiscal. O vice-presidente estará nos EUA na segunda-feira e na terça-feira da próxima semana.

Deputado "alerta" Temer sobre rumo das investigações
Em uma conversa com o vice-presidente Michel Temer na quinta-feira passada, Eduardo Cunha disse que, pelo rumos que as investigações da Operação Lava Jato têm tomado, ele não se surpreenderia se o nome de Temer aparecesse em uma das delações premiadas. Cunha teria feito um comentário genérico, sem vincular o nome do vice a nenhuma delação específica. Temer estará nos Estados Unidos na segunda e terça-feira, onde vai proferir palestras a empresários em Nova York.

PMDB e opositores se mantêm distantes da ruptura de Cunha

Cunha rompe com governo; PMDB e oposição silenciam

• Presidente da Câmara retalia o Planalto ao autorizar criação de CPI do BNDES

• Acusado de ter recebido US$ 5 milhões do petrolão, deputado corre risco de ficar isolado, dizem aliados

Mariana Haubert, Valdo Cruz, Gabriela Guerreiro, Andréia Sadi e Marina Dias – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Acuado pela acusação de que recebeu US$ 5 milhões de propina do petrolão, o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), elevou a temperatura da crise política ao anunciar seu rompimento com o governo Dilma Rousseff e começar a tomar medidas de retaliação contra a presidente.

Desafeto do governo desde que chegou à presidência da Câmara, no início do ano, Cunha acusa os petistas de incentivar as investigações sobre as suspeitas de que foi beneficiado pelo esquema de corrupção na Petrobras, revelado pela Operação Lava Jato.

Mas o deputado chegou ao fim da sexta-feira (17) sem receber o apoio do próprio partido à decisão de romper com o governo, e com aliados temendo que ele fique isolado –apenas com seu grupo mais fiel– na trincheira que abriu contra o governo Dilma.

O peemedebista começou o dia cumprindo as ameaças feitas na véspera, quando foi divulgada a informação de que o lobista Julio Camargo afirmou ter pago a ele propina de US$ 5 milhões por contratos feitos com a Petrobras.

"Estou oficialmente rompido com o governo a partir de hoje. Teremos a seriedade que o cargo ocupa. Porém, o presidente da Câmara é oposição ao governo", afirmou em entrevista às 11h de sexta, último dia antes do recesso do Congresso, que só voltará ao trabalho em agosto.

Cunha disse que sua posição não o levará a patrocinar o "fim da governabilidade". Nos bastidores, ele indicou que pretende criar desconforto para a presidente, mandando organizar e atualizar os vários pedidos de impeachment de Dilma apresentados à Câmara neste ano.

Minutos depois da entrevista de Cunha, o PMDB veio a público dizer que continuará apoiando o governo. Principal aliado dos petistas no Congresso, o partido afirmou por meio de nota que a escolha do deputado é "a expressão de uma posição pessoal, que se respeita pela tradição democrática do PMDB".

A nota do partido enfatizou que a decisão de deixar a base governista só poderia ser tomada "após consulta às instâncias decisórias do partido: comissão executiva nacional, conselho político e diretório nacional".

Calma
Eduardo Cunha sabia que não teria a companhia da cúpula do seu partido ao abandonar o barco governista. Na noite de quinta (16), ele foi ao encontro do vice-presidente Michel Temer, principal articulador político do governo e presidente do PMDB, na base aérea de Brasília, onde ele embarcaria para São Paulo.

Acompanhado pelo presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), Cunha foi logo propondo a Temer que o PMDB fosse para a oposição. A seu estilo, o vice-presidente pediu calma ao deputado e disse que essa era uma decisão que não podia ser tomada de forma isolada por eles.

Presente ao encontro de quinta-feira, Renan preferiu não endossar o tom bélico de seu colega nesta sexta e desmarcou entrevista que convocara para fazer um balanço das atividades do semestre.

Em conversas reservadas, Renan, que tem imposto seguidas derrotas ao governo no Senado, confidenciou que prefere manter-se em silêncio temporariamente.

Principal alvo da ira de Cunha, que acusou o Planalto de abrigar um "bando de aloprados", o governo Dilma começou o dia sabendo da opção pelo rompimento do peemedebista e baixando ordem para que ninguém respondesse às provocações de Cunha.

Em nota divulgada no início da tarde, o Planalto disse esperar que a posição de Cunha "não se reflita nas decisões e nas ações" da presidência da Câmara, que "devem ser pautadas pela imparcialidade e pela impessoalidade".

Indiferente ao apelo do Planalto, Cunha autorizou na tarde de sexta a criação de duas CPIs que podem criar constrangimento para o governo, com a missão de investigar o BNDES e os fundos de pensão das empresas estatais. Elas devem começar a funcionar em agosto.

Silêncio
A oposição, que tem andado de mãos dadas com Cunha desde que ele derrotou o PT e o governo e conquistou a presidência da Câmara, em fevereiro, também não saiu em defesa do peemedebista.

Líderes oposicionistas classificaram como grave o anúncio do rompimento, afirmando temer uma crise institucional no país. "Há uma instabilidade institucional agravada", afirmou o líder do Democratas na Câmara, deputado Mendonça Filho (PE).

O presidente do PSDB, senador Aécio Neves (MG), não se manifestou. Até a noite desta sexta-feira, Cunha havia obtido o apoio oficial apenas do Solidariedade. Já o PSOL pediu o seu afastamento da presidência da Câmara.

O maior temor do peemedebista é que lhe seja retirada a principal fonte de seu poder, a presidência da Câmara. O deputado recebeu a informação de que o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, poderá pedir seu afastamento do cargo.

O argumento seria que Cunha usa a posição para intimidar testemunhas e atrapalhar as investigações da Lava Jato. Se isso ocorrer, Cunha ficaria isolado e mais vulnerável às acusações feitas pelos delatores contra ele.

O aumento da tensão entre o governo e o Congresso gerou preocupação no meio empresarial. Dois empresários de grande porte disseram à Folha que Eduardo Cunha, para não afundar sozinho, está querendo levar quase todo mundo junto. O problema, segundo eles, é que a crise econômica já é grave o suficiente e pode ficar ainda pior se houver uma crise institucional.

Cunha rompe com Dilma, fica isolado e agrava crise

Divórcio e isolamento

• Cunha anuncia rompimento com governo, mas PMDB e aliados afirmam que foi "gesto pessoal"

Isabel Braga, Simone Iglesias, Fernanda Krakovics, Maria Lima, Cristiane Jungblut, Júnia Gama e Washington Luiz – O Globo

BRASÍLIA - Acuado pela denúncia de que teria cobrado US$ 5 milhões do lobista Júlio Camargo, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), anunciou ontem o rompimento formal com o governo de Dilma Rousseff. Apesar de ter conseguido maioria na Casa para impor sucessivas derrotas ao Palácio do Planalto no primeiro semestre, Cunha recebeu modestos e dispersos apoios em sua decisão. A cúpula do PMDB, a começar pelo vice-presidente Michel Temer, que preside a legenda, imediatamente demarcou a posição dele como pessoal, distinta da do partido. O Planalto incentivou o isolamento de Cunha, destacando que "ministros e parlamentares do PMDB tiveram e continuam tendo um papel importante" no governo. Líderes dos partidos da base tentaram conter o incêndio e, quase uníssonos, reiteraram o alinhamento a Dilma, mesmo reconhecendo que Cunha pode dificultar a vida do governo no segundo semestre, agravando a crise política.

Cunha apresentou documentos para acusar o governo de estar por trás de pedido de informações da Receita Federal sobre suas contas. Na avaliação de ministros próximos à presidente, o fato é "terrível" para o governo, ainda que enfraqueça politicamente Cunha. Para o Planalto, o rompimento era a única saída política de Cunha diante de uma denúncia tão direta de recebimento de propina. O governo espera denúncia da Procuradoria-Geral da República contra o presidente da Câmara nos próximos dias e acha que ele tenta se "vitimizar", criando uma cortina de fumaça.

- O ideal seria céu de brigadeiro para aprovar os projetos (no Congresso), mas, para o que ele (Cunha) estava virando no cenário nacional, é bom para o governo. Ele se enfraquece - disse um ministro.

Mesmo no PMDB, o rompimento foi considerado uma demonstração de descontrole. A nota divulgada pelo vice Michel Temer, presidente do PMDB e articulador político do governo, deu o tom no partido, dizendo que a iniciativa de Cunha "é a expressão de uma posição pessoal, que se respeita pela tradição democrática do PMDB". Temer ressalta, no entanto, que "toda e qualquer decisão partidária só pode ser tomada após consulta às instâncias decisórias do partido".

O rompimento foi discutido na noite de quinta-feira, em jantar no Palácio do Jaburu, residência de Temer. O vice recebeu Cunha e o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). O presidente da Câmara comunicou que não tinha mais condições de permanecer na base do governo. Segundo relatos feito ao GLOBO, Temer ainda tentou, em vão, demovê-lo do anúncio de ontem, repetindo o apelo interno que tem feito pela "sobriedade" do PMDB em momento tão delicado. O vice deixou claro que não abandonará a coordenação política, como Cunha quer, e que conta com o apoio de ministros peemedebistas.

- É uma decisão isolada de Cunha. Todos nós temos que ter juízo com o momento que estamos vivendo. O PMDB não está no governo, é governo - reforçou o ministro Hélder Barbalho (Pesca).

Nem mesmo o PMDB do Senado, onde o presidente Renan Calheiros tornou-se um grande crítico de Dilma, aderiu a Cunha em sua estratégia radical. Renan cancelou uma coletiva de imprensa que daria ontem pela manhã e optou por divulgar uma nota crítica à gestão de Dilma, mas sem se expor como Cunha. À tarde, se reuniu com senadores mais próximos, como Romero Jucá (PMDB-RR), Delcídio Amaral (PT-MS) e Edison Lobão (PMDB-MA). Todos repetiram o tom ponderado.

- Não é o momento de romper. Esse é um momento muito delicado para a gente jogar gasolina na fogueira - disse Jucá.

- Se o PMDB fez uma aliança com o PT, tem que sair da forma como entrou, pela porta da frente, não num momento de dificuldade - avaliou o líder do partido no Senado, Eunicio de Oliveira (CE).

Nem mesmo o maior aliado de Cunha no Congresso, o líder do PMDB, Leonardo Picciani (RJ), o apoiou. Dirigentes dos partidos da base, como PDT e PP, mantiveram apoio ao governo, embora achando que a situação de Dilma vai piorar. Eles rejeitam, no entanto, a tese de que Cunha tenha de se afastar do cargo, como defenderam o PSC e o PSOL.

Beneficiária mais clara da crise, a oposição manteve cautela desde quinta-feira. O líder do DEM, Mendonça Filho (PE), demonstrou preocupação:

- A gente sai de uma crise política para virar agora uma crise institucional. Temos que agir com responsabilidade. Não estou aqui para passar a mão na cabeça de ninguém, mas que o curso normal do processo de investigação avance sem interferência e manipulações e buscando a verdade dos fatos.

Entre as principais lideranças da Câmara, apenas o presidente do Solidariedade, Paulo Pereira da Silva (SP), divulgou nota em apoio a Cunha

Um futuro para a crise

Leticia Fernandes e Julianna Granjeia – O Globo

O que pode acontecer depois do rompimento de Cunha com o governo?

Cenário 1: base aliada acompanha Cunha
A adesão do PMDB e de outros partidos ao rompimento é improvável. A tradição do PMDB é a negociação, não o confronto direto. Para analistas, seguir Cunha seria um gesto "suicida" de governadores e ocupantes de cargos no governo. O PMDB não vai se desgastar por um líder "novato", diferentemente do que fez por figuras como José Sarney.

- Tentar atuar com a mesma força do furacão que o atingiu é não entender as leis da Física. Se continuar pensando com o fígado, vai virar Severino Cavalcanti - diz o cientista político Fernando Abrucio (FGV-SP), citando o ex-presidente da Câmara que renunciou em 2005.

Cenário 2: rompimento se mantém restrito a Cunha
A tendência mais forte é ele ficar isolado, já que não tem tanto poder de barganha com os correligionários como outros líderes do PMDB. No tempo de mandato que lhe resta, pode usar o cargo para fazer sangrar ainda mais o governo. Mas, com o desgaste, o partido pressionará menos o Planalto. O vice-presidente Michel Temer tende a se aproximar do círculo mais estratégico de Dilma.

- Esse cenário é o mais imediato. Cunha sinaliza que pretende fazer sangrar o governo, mas não apenas para se fortalecer. Ele quer enfraquecer o adversário, que é o PT - avalia Cláudio Couto, cientista político da FGV-SP.

Cenário 3: novos golpes da lava-jato enfraquecem Cunha
O enfraquecimento de Eduardo Cunha poderia levar a uma recuperação do governo Dilma, com o enfraquecimento do fogo até então amigo do presidente da Câmara.

O semestre começou exuberante para Cunha e o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), também investigado na Lava-Jato, mas o peso deles deve se alterar após o recesso com o aprofundamento das acusações.

- Um semestre que começou com dois príncipes feudais estrelando no poder pode mudar rapidamente - diz a historiadora Marly Motta.

Cunha organiza pedidos de impeachment contra Dilma

Folhapress - Valor Econômico

BRASÍLIA - O presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), está organizando os pedidos de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff que foram entregues à Casa nos últimos meses. O peemedebista, que anunciou nesta sexta-feira o seu rompimento com o governo, quer ter um parecer sobre o assunto em 30 dias.

Cunha enviou um ofício na tarde desta sexta ao deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ) para que ele atualize a denúncia apresentada em março pedindo o impedimento da presidente da República, sob a alegação de que ela influenciou em votações no Congresso e que, após os escândalos de corrupção envolvendo a Petrobras, ela não possui mais condições de governar.

Na avaliação do deputado, Dilma foi beneficiada pelos desvios da estatal e cometeu crimes contra a administração pública ao não atuar contra os desmandos.

Bolsonaro tem dez dias para enviar uma resposta com correções à sua denúncia. De acordo com a assessoria da presidência da Câmara, Cunha mandou fazer uma análise em todos os pedidos porque alguns contêm erros processuais, e até mesmo para indeferir e arquivar os pedidos, o presidente precisa cumprir este rito processual. O pedido de Bolsonaro é o único assinado por um parlamentar.

Nesta quinta-feira, Cunha afirmou em café da manhã com jornalistas que pretende ter um parecer jurídico sobre o assunto em 30 dias. O parecer será referente a um pedido feito por militantes do Movimento Brasil Livre (MBL). Segundo Cunha, já foram negados "três ou quatro" pedidos de cassação do mandato da petista.

Apesar da iniciativa, Cunha diz que o impeachment não pode ser usado como "recurso eleitoral" e defende que a tramitação de algo neste sentido deve seguir estritamente regras constitucionais. Um dos argumentos do MBL é a análise das contas do governo de 2014 pelo TCU (Tribunal de Contas da União), em que foram identificadas manobras fiscais, chamadas de "pedaladas".

Cunha marcou para agosto o início das análises de contas de governos passados que nunca foram votadas pelo Congresso. Dessa forma, Cunha abrirá o caminho para que a Casa analise as contas de 2014. Nesta quinta, ele afirmou que a análise do TCU deve ser técnica mas que, no Congresso, o julgamento será político.

O TCU só rejeitou as contas do governo federal uma vez, em 1937, quando o presidente era Getúlio Vargas. O Congresso tem cumprido raramente seu papel de julgar as contas do governo. Existem 16 processos pendentes hoje.

A última vez que o Congresso julgou as contas de um presidente foi em 2002, quando o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) teve o balanço de 2001 aprovado, como já havia acontecido com as contas dos anos anteriores de sua administração.

Nenhuma das contas apresentadas por Dilma e pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que governou entre 2003 e 2010, foi analisada pelo Congresso até hoje.

Algumas ainda nem foram examinadas pela Comissão Mista de Orçamento, etapa preliminar que precisa ser cumprida antes que o processo seja submetido ao plenário da Câmara ou do Senado.

Eduardo Cunha disse que pretende seguir a ordem cronológica dos processos até esgotar a pauta, mas afirmou que as contas de Dilma poderão ser apreciadas antes se um deputado pedir e o plenário da Câmara assim decidir.

Vice-líder do governo e bancada do PSOL já pedem afastamento

• Costa aproveitou coletiva de Cunha para, logo em seguida, dizer que ele não tem "condições morais" de presidir a Câmara

- O Estado de S. Paulo

Parlamentares ligados ao governo ou que têm se posicionado contra a atuação de Eduardo Cunha na presidência da Câmara defenderam ontem o afastamento do peemedebista da função, em consequência da acusação de que teria pressionado o lobista Julio Camargo a lhe pagar US$ 5 milhões em propina do esquema de corrupção na Petrobrás. A informação foi dada pelo próprio Camargo, um dos delatores da Operação Lava Jato. O vice-líder do governo na Câmara, Sílvio Costa (PSC-PE), aproveitou os jornalistas reunidos na Casa, logo após uma entrevista coletiva de Cunha, pela manhã, para expor sua posição. "Peço o afastamento temporário de Cunha pela tranquilidade do Parlamento", disse.

O deputado afirmou que vai procurar juristas para saber se "cabe um impeachment" do peemedebista. Depois de explicar que falava por si, e não pelo governo, Costa disse que Cunha "perdeu as condições morais de ficar a frente da Câmara", mesmo tendo a seu favor a presunção legal de inocência. Para o vice-líder, se se afastasse do cargo, Cunha mostraria que "não tem apego ao poder". Costa afirmou que a Câmara destituiu Severino Cavalcanti (PP-PE) do cargo por "muito menos". Em 2005, Cavalcanti renunciou em meio a denúncias de recebimento de um "mensalinho" pela concessão de um restaurante da Casa.

Pressão. Além do vice-líder do governo, a bancada do PSOL defendeu a mesma medida, Em nota intitulada "Eduardo Cunha deve se afastar", o partido disse ser "inaceitável que se confundam denúncias feitas contra Eduardo Cunha e Renan Calheiros (do PMDB alagoano e presidente do Senado;) como um "ataque ao Congresso Nacional". "Cada parlamentar e seu partido têm que responder pelas acusações que eventualmente sofram. Eduardo Cunha não tem direito de confundir suas posições e ódios com a função que ocupa institucionalmente de presidente da Câmara dos Deputados", afirmou a nota do PSOL, cujos deputados estão entre os que mais se opõem à pauta tocada pelo peemedebista em sua gestão na Casa.

"A confusão deliberada que Cunha produz, à guisa de defesa, evidencia sua incompatibilidade entre a função de presidente da Casa, que exige equilíbrio e postura de magistrado, e a condição de investigado na Operação Lava Jato." Na nota, a bancada do PSOL disse que, "não havendo expectativas no gesto de grandeza que seria ele próprio licenciar-se temporariamente", os parlamentares do partido seguirão fazendo essa cobrança.

Para Renan, economia alimenta crise

• Senador critica ajuste fiscal de Dilma e afirma que Congresso não é o responsável pela atual situação do governo

Ricardo Brito, Isadora Peron – O Estado de S. Paulo

Após o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), anunciar o rompimento com o governo Dilma Rousseff, ontem, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), reafirmou a necessidade de re discutir o atual modelo de coalizão. Renan criticou o ajuste fiscal, chamou os juros praticados no País de "pornográficos" e avaliou que é a crise econômica que alimenta a crise política. Renan, Cunha e dezenas de parlamentares são investigados na Operação Lava Jato, que apura corrupção na Petrobrás.

"Precisamos rediscutir o modelo de coalizão existente. O método do atual, de aparelhamento e fisiologia, está exaurido e precisamos, sempre, qualificar programaticamente as coalizões a fim de preservar a independência dos Poderes e a solidez democrática", disse Renan, em balanço do primeiro semestre distribuído à imprensa.

O presidente do Senado cancelou a entrevista coletiva que daria por causa do pronunciamento de Cunha aos jornalistas na manhã de ontem. O presidente da Câmara foi citado por um dos delatores da Lava Jato como recebedor de propina do esquema na estatal. Renan também atacou o ajuste fiscal de Dilma. "Em um sistema presidencialista, o chefe do governo pediu a autorização do Parlamento a fim de implementar medidas apontadas como imprescindíveis para fazer faca à crise.

Aprimorando-as, como é de sua atribuição, o Congresso, no seu limite, forneceu estas ferramentas, mas o resultados, como alertamos, são muito modestos. O ajuste fiscal caminha celeremente para ser um desajuste social com a explosiva combinação recessão, inflação alta, desemprego e juros pornográficos. Até aqui só o trabalhador pagou a conta e não há ainda horizonte após o ajuste."

Mesmo tendo patrocinado uma série de retaliações ao Planalto, por acreditar em interferência do governo ao implicá-lo na Lava Jato, Renan disse que o Legislativo "não é um agente de instabilidade". Para ele, as dificuldades que todos enfrentam não foram criadas no Congresso. "As dificuldades que ora enfrentamos não foram criadas aqui, mas nem por isso nos omitimos. Não é a política que contamina a economia. Quem alimenta a crise política é a crise econômica."

Cunha tentou, na conversa que teve na quinta-feira com o vice-presidente Michel Temer e Renan, trazê-los para a briga que ele trava com, o governo e com o Ministério Público Federal. Temer e Renan, porém, não quiseram endossar publicamente a atitude do deputado.

A guerra só começou e a economia pode ser a maior vítima

Marcelo de Moraes – O Estado de S. Paulo

A declaração de guerra feita pelo presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), ao Palácio do Planalto torna imprevisível o cenário político do País e aponta para a dificuldade cada vez maior de aprovar projetos que ajudem a fortalecer a economia nacional. Acusado por Julio Camargo, um dos delatores da Operação Lava Jato, de pedir propina de US$ 5 milhões, Cunha teve reação furiosa que fechou os canais para qualquer tipo de relacionamento entre o hoje principal protagonista do Poder Legislativo com o Palácio do Planalto. Se, inegavelmente, Cunha foi atingido politicamente pela divulgação dessa delação, também é certo que o governo terá, a partir de agora, um inimigo declarado dentro do Congresso.

O presidente da Câmara poderá até definhar e desaparecer por conta das acusações que Camargo fez contra ele. Mas, até lá, tentará produzir o máximo possível de estragos ao governo, a quem responsabiliza pelas acusações que sofreu. No primeiro dia da guerra, operou para criar duas CPIs que têm o governo como alvo: a do BNDES e a dos Fundos de Pensão. O ponto é esse. Se Cunha perde força com as denúncias, o governo também se enrola mais nas dificuldades com o Legislativo. E isso pode se transformar num abraço de afogados, repetindo, por exemplo, a briga que derrubou politicamente os então senadores Antonio Carlos Magalhães e Jader Barbalho.

Planalto e Cunha brigam desde o fim do ano passado, quando o deputado peemedebista colocou na rua sua candidatura à presidência da Câmara e viu o governo e o PT torpedearem sua campanha sem sucesso. Como presidente da Câmara, Cunha aproveitou a fragilidade do governo para ocupar espaços e trazer para o Congresso o comando da agenda política do País. Agenda essa que o governo espera retomar agora com uma eventual derrocada do deputado, provocada pelas investigações da Lava Jato. Um dado político importante, porém, é que Eduardo Cunha não foi eleito presidente da Câmara apenas por conta de sua personalidade forte.

Ele chegou aonde chegou por ser a voz de todos os parlamentares do Congresso que se sentem escanteados pelo governo nas suas reivindicações - seja de apoio, cargos, verbas, espaço, etc. Cunha tem funcionado como uma espécie de aríete do Congresso nas portas do Executivo, representando seus colegas e seus companheiros do PMDB. E, por conta disso, controla importante força política. E, nos movimentos de Cunha na guerra contra o governo, o impacto imediato poderá ser sentido na economia, já bastante combalida no primeiro semestre.

Com suas articulações políticas, Cunha vai operar para barrar a aprovação de medidas do interesse da equipe econômica dentro do ajuste fiscal. Pode, também, contribuir para ampliar o clima de baixa confiabilidade de investidores externos que poderiam se interessar em atuar no Brasil. Isso é tudo o que o governo não precisa. Neste momento, o maior desafio da presidente Dilma Rousseff é justamente fazer a economia dar algum tipo de sinal de vida. Principalmente num momento em que os fantasmas do desemprego e da inflação voltaram a assombrar o dia a dia dos brasileiros. Dados do Caged, referentes ao mês de junho, mostram que o País perdeu 111.199 vagas com carteira assinada neste mês.

É o pior junho desde 1992 para o emprego. Isso já representa o fechamento de quase 350 mil postos com carteira no primeiro semestre. Com o desemprego se ampliando, o governo precisa de todo o seu esforço para aquecer a economia. Com a guerra política deflagrada, entretanto, é impossível garantir a serenidade necessária para que as medidas econômicas possam avançar.

Lobista só delatou políticos após risco de perder benefício

A guinada do delator

• Acuado pela Lava Jato, Julio Camargo decidiu incriminar os políticos quando os procuradores viram que ele não havia contado tudo que sabia

Graciliano Rocha, Bela Megale – Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - O lobista Julio Camargo, que acusa o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e o ex-ministro José Dirceu de receber dinheiro sujo desviado da Petrobras, só decidiu incriminá-los depois que os procuradores da Operação Lava Jato o convenceram de que teria problemas na Justiça se não contasse tudo que sabe.

Camargo, que trabalhou para fornecedores da Petrobras e diz ter pagado R$ 137 milhões em propina para o PMDB, o PT e funcionários da estatal, colabora com as investigações da Lava Jato desde outubro do ano passado, quando assinou um acordo de delação premiada e confessou vários dos seus crimes.

Mas ele resistiu por meses a incriminar os políticos com quem se relacionou, como Cunha e Dirceu. Sua guinada começou a ser produzida na última semana de junho, quando foi chamado pelos procuradores da Lava Jato para uma reunião em Curitiba.

Os investigadores mostraram a Camargo que tinham evidências de que ele vinha escondendo informações comprometedoras sobre políticos, e lembraram ao lobista que isso poderia levar ao rompimento do acordo de delação, que garante redução de pena e outros benefícios.

Outro lobista, Milton Pascowitch, que aproximou a empreiteira Engevix do PT e da Petrobras e decidiu colaborar com as autoridades neste ano, disse que pagou R$ 4 milhões em propina a Dirceu, e afirmou que parte do dinheiro passou antes por empresas de Julio Camargo.

De acordo com o relato de um dos participantes, a reunião foi tensa, mas o lobista cedeu e afirmou ter pagado propina ao ex-ministro.

Camargo também disse aos procuradores que emprestou um avião particular a Dirceu depois que ele deixou o governo Lula, em meio ao escândalo do mensalão. Em depoimentos anteriores, ele negara ter prestado esse favor.

Dirceu, que foi condenado no julgamento do mensalão e hoje cumpre pena de prisão domiciliar em Brasília, nega ter recebido propina para facilitar negócios na Petrobras e diz que pagou pelo avião.

Mesmo depois de incriminar Dirceu, o lobista deixou os procuradores temendo pelo futuro, sem ter a segurança de que o acordo de delação premiada seria mantido. Isso influenciou seu movimento seguinte, em julho.

No início do mês, Camargo voou em seu jatinho até Brasília com a advogada Beatriz Catta Preta para se reunir com investigadores da Procuradoria-Geral da República, que conduz investigações sobre Cunha e outros políticos acusados de envolvimento com a corrupção na Petrobras.

Eduardo Cunha foi o tema principal do encontro. No ano passado, o doleiro Alberto Youssef, um dos principais operadores do esquema de corrupção, disse que Camargo foi chantageado por Cunha e pagou propina ao deputado para preservar um contrato da coreana Samsung em 2011.

Em pelo menos quatro ocasiões anteriores, Camargo negou ter recebido pressões de Cunha, que teria mandado uma aliada apresentar requerimentos na Câmara para exigir informações da japonesa Mitsui, parceira da Samsung.

Questionado novamente pelos procuradores de Brasília, e preocupado depois do que ouvira em Curitiba, Camargo aceitou prestar novo depoimento, em que confirmou a história de Youssef e detalhou seus encontros com Cunha e outros operadores.

Sua nova versão tornou-se pública na quinta-feira (16), quando ele a repetiu numa audiência para o juiz federal Sergio Moro, que conduz os processos da Lava Jato no Paraná. Cunha, que preside a Câmara dos Deputados, acusou Camargo de mentir após ser coagido pelos procuradores.

Encerrada a audiência, Camargo trocou de advogado. No lugar de Beatriz Catta Preta, que o assessorava desde o ano passado, entrou Antonio Figueiredo Basto, o mesmo advogado do doleiro Youssef.

Inimigos
Apesar dos benefícios jurídicos, o acordo de delação premiada trouxe consequências para Camargo. Ele ficou sem dinheiro e cheio de inimigos, segundo um fornecedor da Petrobras que o conhece. O lobista teve que devolver R$ 40 milhões aos cofres públicos depois de fechar o acordo.

Em outubro, logo depois de virar delator, ele mandou recados a políticos para justificar a decisão de colaborar. A um de seus interlocutores no meio político o lobista disse que ficou sem saída depois que os investigadores rastrearam pagamentos de propina feitos pelas suas empresas.

Integrante da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, o procurador Carlos Fernando Lima afirmou que o acordo de colaboração de Camargo será revisto e disse que ele terá de prestar novo depoimento sobre fatos que negou anteriormente. A manutenção dos benefícios do acordo dependerá das justificativas que ele oferecer para as omissões.

Após rompimento, Cunha autoriza quatro CPIs, entre elas a do BNDES

• Peemedebista diz na TV que demandas da sociedade pautam a Câmara

Júnia Gama, Isabel Braga, Juliana Castro e Cássio Bruno

BRASÍLIA e RIO - O ato inicial do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB), como oposicionista foi a autorização para que quatro novas CPIs passem a funcionar na Casa em agosto, após o recesso. As mais preocupantes para o governo são as que pretendem apurar desvios nos empréstimos concedidos pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e a que vai apurar supostas irregularidades nos fundos de pensão.

A primeira CPI já foi criada ontem, junto com outras duas comissões de pouco impacto para o Planalto: uma sobre maus-tratos contra animais, outra sobre crimes cibernéticos. No caso da CPI dos Fundos de Pensão, Cunha autorizou sua instalação, mas ela só será criada formalmente no dia 7 de agosto, após o recesso.

A CPI do BNDES foi pedida por quatro partidos de oposição - PSDB, PSB, DEM e PPS - em abril, quando eles conseguiram 191 assinaturas de apoio. O mesmo ocorreu semanas depois com a dos Fundos de Pensão, que teve apoio de 186 deputados de 24 partidos. Para haver uma CPI, é preciso o apoio de 171 deputados. Desde então, as duas ficaram na gaveta, pois cinco CPIs, entre elas a da Petrobras, estavam em funcionamento.

Em pronunciamento em rede nacional de rádio e TV ontem à noite, Cunha disse que "a Câmara de hoje é um poder com muito mais iniciativa" e que "as principais demandas da sociedade estão pautando o trabalho dos parlamentares".

Durante o pronunciamento de Cunha, houve protestos pontuais em áreas das regiões metropolitanas de Rio e São Paulo. O pronunciamento tinha sido gravado antes de o deputado anunciar seu rompimento com o governo.

Cunha citou projetos aprovados recentemente pelos deputados. Na Segurança, falou da aprovação da redução da maioridade penal de 18 para 16 anos para crimes hediondos, homicídio doloso e lesão corporal seguida de morte.

- Com coragem e maturidade, debatemos a redução da maioridade penal e aprovamos o projeto com 323 votos - disse.

A redução da maioridade penal foi aprovada após manobra de Cunha, um dia depois de ter sido rejeitada.

Cunha citou ainda a votação da reforma política, que teve pontos polêmicos aprovados em plenário também por conta de manobras regimentais.

- Trouxemos ao debate nacional mais um tema importante e urgente para a vida do país: a reforma política. Entre as medidas já aprovadas, estão o fim da reeleição, o limite de gastos, e reduzimos o tempo de campanha eleitoral.

Durante o pronunciamento, apitos e panelas foram ouvidos em algumas residências de bairros da Zona Sul do Rio, como Botafogo, Humaitá, Flamengo e Leme. Em Laranjeiras e Santa Teresa, ouviram-se gritos, vaias, panelas batendo e também xingamentos. Na Praça São Salvador, 15 manifestantes se reuniram para protestar contra Cunha. Foram manifestações tímidas.

Em São Paulo, o protesto foi concentrado em bairros do Centro e da Região Oeste. Em Pinheiros, algumas pessoas foram às janelas do prédios com gritos de "Fora, PT e PMDB", "PT ladrão" e "PMDB ladrão", acompanhados de batidas de panelas. Também foram registradas manifestações no Alto da Lapa, na Consolação e na Bela Vista. Na Lapa, ouviram-se buzinas de veículos no momento da fala de Cunha.

As adesões no Rio e em São Paulo foram muito menores do que as registradas nos protestos contra o pronunciamento da presidente Dilma Rousseff em 8 de março e no programa de televisão do PT, em maio.

À noite, o presidente da Câmara despachou 11 pedidos de impeachment já apresentados na Casa contra a presidente Dilma Rousseff no primeiro semestre, por crime de responsabilidade. O despacho concede prazo de 10 dias para que os autores dos pedidos - cidadãos, movimentos sociais e o deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ) - apresentem um complemento aos requisitos formais. Entre os complementos pedidos estão, por exemplo, o reconhecimento de firmas e a indicação de testemunhas. (Colaborou Bruno Góes)

Lula recorre para tentar suspender inquérito do MP

• Ex-presidente diz que ação de procurador foi irregular; investigação agora está sob sigilo

- O Globo

SÃO PAULO e BRASÍLIA - Os advogados do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva apresentaram ontem uma reclamação ao Conselho Nacional do Ministério Público, para pedir a suspensão do inquérito aberto pela Procuradoria da República do Distrito Federal para investigar tráfico de influência internacional em benefício da Odebrecht.

O Instituto Lula alega que os procuradores que avaliaram o caso expuseram, em despacho, que não há nenhum indício de crime. Por causa disso, os advogados pedem a apuração da conduta do procurador Valtan Timbó Furtado, autor do pedido de abertura do inquérito criminal.

Os defensores de Lula alegam que houve "violação dos deveres funcionais" por parte do procurador, porque ele teria interferido na apuração preliminar conduzida pela procuradora titular Mirella de Carvalho Aguiar e desconsiderado prazos e instâncias do próprio Ministério Público. O Instituto Lula afirma que Furtado instaurou o inquérito contra o ex-presidente antes de esgotado o prazo final para apresentação de esclarecimentos aos questionamentos do MP na apuração preliminar.

Os advogados do petista alegam ainda que Furtado não estava habilitado para substituir a procuradora titular do caso, Mirella Aguiar, que estava de férias. Dizem também que o procurador tentou quebrar o sigilo fiscal e de correspondência de Lula e de seu instituto por meio de pedido de compartilhamento de informações com a Operação Lava-Jato. "Vê-se, com isso, que houve um verdadeiro atropelamento, desrespeito e tumulto ocasionado pelo procurador Valtan Furtado nas investigações preliminares em curso", diz o texto.

Procurador não vai se pronunciar
O MP do Distrito Federal diz que não é necessário esperar o prazo final da investigação preliminar para converter a apuração em procedimento investigatório criminal. Sobre a representação no Conselho Nacional do MP, o procurador Valtan Furtado disse, por meio da assessoria do MPF, que não foi notificado e que não vai se pronunciar.

A procuradora Mirella Aguiar decretou ontem o sigilo da investigação que apura se Lula praticou tráfico de influência. No dia 8 de julho, a investigação preliminar aberta contra o ex-presidente avançou, sendo convertida em procedimento investigatório. Em abril, O GLOBO revelou que o ex-diretor de Relações Institucionais da Odebrecht Alexandrino Alencar levou Lula em um périplo por Cuba, República Dominicana e Estados Unidos, em janeiro de 2013. A viagem foi paga pela construtora e, oficialmente, não tinha relação com atividades da empresa nesses países. A suspeita é que Lula possa ter atuado junto ao BNDES e a agentes públicos estrangeiros para que a empreiteira conseguisse contratos no exterior.

Lula pede investigação de procurador a conselho

• Valtan Furtado abriu inquérito sobre petista

- Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - A defesa do ex-presidente Lula apresentou nesta sexta (17) reclamação ao Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) pedindo a apuração da conduta do procurador Valtan Timbó Mendes Furtado. A informação foi divulgada pelo Instituto Lula.

Furtado, da Procuradoria da República do DF, pediu a abertura de investigação de Lula por suspeita de tráfico de influência em favor da Odebrecht em obras financiadas pelo BNDES. O caso já era analisado em caráter preliminar.

A representação de Lula pede a suspensão do inquérito, abertura de sindicância e processo administrativo disciplinar para o procurador.

Para os advogados do petista, Furtado "violou deveres funcionais" ao interferir na apuração preliminar, que era conduzida pela procuradora Mirella Aguiar, e ao desconsiderar prazos e instâncias do Ministério Público.

A defesa também reclama que o procurador ignorou a defesa de Lula, já que a investigação foi instaurada antes que fossem apresentados os esclarecimentos do petista.

Por fim, os advogados apontam ainda que Furtado errou ao tentar promover a quebra de sigilos fiscal e de correspondência de Lula e de seu instituto com um pedido de compartilhamento de informações com a Operação Lava Jato –já que esta não está investigando o ex-presidente ou o Instituto Lula.

Marcelo Odebrecht organizou jantar a pedido de Lula

• Entre os convidados estavam responsáveis pela Gráfica Atitude, investigada pela PF no âmbito da Lava Jato

Ricardo Brandt, Julia Affonso e Fausto Macedo – O Estado de S. Paulo

CURITIBA - Relatório de análise de mídia elaborado pela Polícia Federal revela os bastidores de um jantar em São Paulo, na residência do empresário Marcelo Odebrecht, presidente da maior empreiteira do País, em 28 de maio de 2012, do qual participou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Também foram convidados o ex-ministro Antonio Palocci, empresários, banqueiros, o presidente do Instituto Lula, Paulo Okamotto, e dois sindicalistas mencionados na Operação Lava Jato. "Através da leitura das mensagens acerca deste evento foi possível inferir, grosso modo, que: a) O jantar foi realizado a pedido do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva", aponta o relatório da PF. "d) Foram enviadas mensagens individuais para cada um dos convidados por I.B.G." A relação entre Lula e a construtora Odebrecht é alvo de um procedimento investigatório criminal (PIC) aberto pela Procuradoria da República no Distrito Federal.

A suspeita é de que a empreiteira teria obtido vantagens com agentes públicos de outros países por meio de suposto tráfico de influência do petista, que deixou o Planalto no fim de 2010. A Odebrecht nega ter sido favorecida. Lula não é investigado na Lava Jato. Nas buscas que realizou na casa do empreiteiro, na manhã de 19 de junho, durante a 14.ª etapa da Lava Jato, a PF apreendeu documentos, correspondências e mídias. Um HD que estava em um cofre no quarto de Marcelo Odebrecht armazenava troca de mensagens sobre o jantar. "Emílio e Marcelo Odebrecht têm o prazer de convidá-la para um jantar com a presença do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, no qual será discutida a situação da economia brasileira face a conjuntura internacional", diz o e-mail enviado pela presidência da Odebrecht para Juvandia Moreira Leite, presidente do Sindicato dos Bancários de São Paulo, em 17 de maio de2012.

"Confirmo a minha presença no jantar com a presença do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Saudações sindicais", respondeu Juvandia. Ontem, o relatório de análise de mídia foi anexado aos autos da Lava Jato. No documento, a PF aponta para a presença de Juvandia Leite e Sergio Aparecido Nobre, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC. "Os dois sindicalistas convidados para o evento são também sócios da Editora Gráfica Atitude, empresa apontada pelo empresário Augusto Ribeiro de Mendonça Neto como intermediária de pagamentos de propina destinados ao Partido dos Trabalhadores", registra a PF. Juvandia Leite e Sergio Nobre são administradores da Editora Gráfica Atitude.

Segundo denúncia do Ministério Público Federal, uma parte da propina paga para o ex-diretor de Serviços da Petrobrás Renato Duque na Diretoria de Serviços foi direcionada por empresas do grupo Setal Óleo e Gás, controlado por Augusto Mendonça – delator da Lava Jato – para a Editora Gráfica Atitude Ltda. O pagamento teria sido feito a pedido do então tesoureiro do PT João Vaccari Neto. Os procuradores da força-tarefa sustentam que existem, ainda, "vários indicativos de ligação da Gráfica Atitude com o PT". O Instituto Lula afirmou, por meio de nota, que "é de conhecimento público que o ex-presidente tem por hábito reunir pessoas de diversos segmentos para debater a conjuntura nacional". A Odebrecht informou que repudia "o vazamento seletivo e malicioso de informações que buscam cobrir de suspeitas até mesmo um evento absolutamente comum no meio empresarial e político".

Conduta. A defesa de Lula entrou ontem com uma reclamação disciplinar no Conselho Nacional do Ministério Público para requerer apuração da conduta do procurador Valtan Timbó Mendes Furtado – autor do pedido de Procedimento de Investigação Criminal (PIC) contra Lula por suposto tráfico de influência em favor da empreiteira Odebrecht no exterior. O Instituto Lula pediu "nulidade de inquérito

PT defende ex-presidente e tucanos criticam
Em nota divulgada ontem, a bancada de senadores do PT afirmou que o ex-presidente Lula é vítima de uma "armação" no caso da investigação aberta pelo Ministério Público Federal do DF. "Trata-se de um procedimento claramente irregular e intempestivo, pois o Instituto Lula já havia apresentado à procuradora titular do caso todas as informações solicitadas, muito antes do esgotamento do prazo previsto para a entrega, dia 18 de setembro do corrente", diz o texto.

Ainda de acordo com os senadores petistas, a apuração "é mais um factoide que engendram contra o presidente mais bem avaliado da história do País". A oposição, por sua vez, apoiou a investigação.

"Chegou a hora de o ex-presidente responder pelo balcão de negócios que, com sua ascensão à Presidência da República, o PT armou no poder e transformou o governo federal num antro de corrupção", diz texto do Instituto Teotônio Vilela, braço do PSDB. "O estado atual de degradação em que o País foi posto tem as nove digitais de Lula.

“Lula, a sua hora chegou”

- ITV

Luiz Inácio Lula da Silva é, desde o último dia 8, alvo de investigação criminal aberta pela Procuradoria da República no Distrito Federal. Chegou a hora de o ex-presidente responder pelo balcão de negócios que, com sua ascensão à presidência da República, o PT armou no poder e transformou o governo federal num antro de corrupção.

Lula é investigado por crime de tráfico de influência, sob a suspeita de ter ajudado a Odebrecht, uma das principais envolvidas no escândalo da Operação Lava-Jato, a obter contratos no exterior financiados com dinheiro do BNDES. O Código Penal estipula pena de dois a cinco anos de reclusão para quem for condenado.

A abertura de investigação já é um passo adiante na apuração sobre a atuação do petista. Em maio, diante de suspeitas publicadas na imprensa, a Procuradoria havia solicitado informações a diversos órgãos e agora, com o que recebeu como resposta, resolveu transformar o procedimento preliminar numa investigação criminal formal. Lula, sua batata está assando…

O ex-presidente voou nas asas da Odebrecht para diversos destinos ao redor do mundo. Entre os já sabidos estão Cuba, Venezuela, República Dominicana, Angola e Panamá – justamente aqueles melhor aquinhoados com os empréstimos camaradas do BNDES nos últimos anos. Entre início de 2011 e fim de 2014, há 38 registros de saída de Lula do país.

O total de dinheiro emprestado pelo BNDES para obras da Odebrecht fora do Brasil soma R$ 31,3 bilhões, segundo a Folha de S.Paulo. As operações do banco ligadas à empresa no exterior atingem US$ 9,5 bilhões. Pelo visto, o investimento da empreiteira na contratação da mãozinha do ex-presidente compensou…

Em companhia de Lula nas viagens estava Alexandrino Alencar, ex-diretor da Odebrecht hoje preso sob a acusação de movimentar pagamentos de propinas no exterior. Na investigação aberta pela Procuradoria, o petista pode ter seu sigilo quebrado e ser alvo de busca e apreensão. Há muito mais a elucidar.

No início de junho, já haviam vindo a público pagamentos feitos pela Camargo Correa ao Instituto Lula e à empresa do ex-presidente, a LILS. Documentos apreendidos pela Lava-Jato registram repasses de R$ 4,5 milhões a título de “bônus eleitorais”, “contribuições e doações”. O petista também é alvo de mais duas investigações da mesma Procuradoria no DF relacionadas ao mensalão. Lula tem muito a esclarecer perante a Justiça.

O estado atual de degradação em que o país foi posto tem as nove digitais – e muito mais – de Luiz Inácio Lula da Silva. Que as investigações da Procuradoria da República avancem e ganhem em breve, também, o auxílio da tão aguardada CPI que a oposição tenta criar no Congresso para descobrir como e onde, afinal de contas, foram parar os bilhões de reais dos brasileiros que o BNDES movimentou de forma suspeita nos últimos anos a mando de Lula e do PT.

Se Cunha deve ser afastado, Dilma também tem que ser, pois ambos são investigados, disse Freire

Por: Valéria de Oliveira -Portal do PPS

O presidente nacional do PPS, deputado Roberto Freire (SP) declarou, nesta sexta-feira (17), que é preciso ter cuidado e evitar precipitações “neste momento em que se agrava ainda mais a crise política no país, com acusações contra Eduardo Cunha, abertura de investigação criminal contra Lula pelo Ministério Público e investigação das contas da presidente da República no TSE”.

Segundo Freire, “o PPS acompanha com toda atenção o desenrolar dos fatos e apoia os que investigam a podridão da corrupção no Brasil: Polícia Federal, Ministério Público e Justiça Federal”.

Para Freire, a se considerar a proposta do vice-líder do governo na Câmara, deputado Sílvio Costa (PSC-PE), de que o presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) deve se afastar do cargo, é necessário que a presidente Dilma também deixe a Presidência da República, pois as contas de campanha dela também estão sendo investigadas no Tribunal Superior Eleitoral e ela foi citada mais de uma dezena de vezes nas delações da Operação Lava Jato.

“É melhor evitar precipitações, pois investigados estão sendo a presidente e vários parlamentares. Essa sugestão sobre aqueles acusados que são presidentes de poderes pode ter um efeito bumerangue e atingir a própria presidente”, disse Freire. “A crise se aprofunda com as acusações contra Eduardo Cunha e a abertura de investigação criminal do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva por favorecimento à Odebrecht no BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social)”.

No entender de Freire, a Câmara deve estar preparada para, se houver denúncia dos acusados, avaliar que medidas podem ser tomadas. “Se alguns se transformarem em réus em processos judiciais, talvez sejam necessárias licenças”.

Luxo com nosso dinheiro

Rodrigo Rangel e Robson Bonin – Revista Veja

• As fraudes na Petrobras financiaram campanhas eleitorais, subornos e a mordomia de políticos desonestos em um processo que fez da estatal o bolso profundo da corrupção

Nas projeções mais otimistas, calcula-se que corruptos e corruptores envolvidos no escândalo da Petrobras tenham desviado algo perto de 19 bilhões de reais dos cofres da empresa. A estatal era o paraíso, o nirvana para gente desonesta, incluindo os empreiteiros, os servidores públicos e os políticos já identificados como parceiros da partilha do dinheiro roubado. Na semana passada, o lobista Julio Camargo, um dos delatores do caso, tentou explicar ao juiz Sergio Moro a essência do petrolão. Na visão dele, a corrupção na Petrobras poderia ser ilustrada pela figura do fruto proibido. Os contratos eram como maçãs que os empreiteiros ansiavam saborear em sua plenitude. O que os impedia eram os partidos e os políticos da base do governo. "É aquela história, olhar a maçã e dizer: "Como vou pegar essa maçã? Tem uma regra do jogo que eu preciso atender. Do contrário, não vou comer a maçã"", disse Camargo. A "regra do jogo", o caminho mais curto para alcançar a árvore e apoderar-se dos frutos, como as investigações da Operação Lava-Jato já revelaram, era pagar propina. Durante os dois primeiros mandatos de Lula e ao longo de todo o primeiro mandato de Dilma Rousseff, o PT usou o pomar para governar. Distribuir as maçãs virou um método, um atalho que o partido encontrou para garantir a fidelidade dos amigos e seduzir eventuais adversários, transformando-os em cúmplices de um crime contra toda a sociedade. Na semana passada, a polícia bateu na porta de alguns convivas do banquete.

Os investigadores cumpriram 53 mandados de busca e apreensão nas residências e nos escritórios de políticos suspeitos de corrupção no escândalo da Petrobras. Entre os alvos estavam parlamentares e ex-parlamentares, incluindo dois ex-ministros do governo da presidente Dilma. No episódio mais emblemático da ação, os agentes devolveram ao noticiário político-policial a antológica Casa da Dinda, a residência do ex-presidente Fernando Collor, cenário do escândalo que, nos anos 90, levou ao primeiro impeachment de um presidente da República. Os policiais apreenderam documentos, computadores e três carros de luxo da frota particular do atual senador: um Lamborghini Aventador top de linha (3,5 milhões de reais), uma Ferrari vermelha (1,5 milhão de reais) e um Porsche (700 000 reais). Nem o bilionário empresário Eike Batista em seus tempos de bonança exibia modelos tão exclusivos — e caros.

Collor, até onde se sabe, é um empresário de sucesso. Sua família é proprietária de emissoras de televisão e rádio em Alagoas, terrenos, apartamentos, títulos, ações, carros... A relação de bens declarados pelo senador soma 20 milhões de reais, o suficiente para garantir vida confortável a qualquer um.

Collor, apesar disso, não resistiu à tentação e adentrou o pomar petista. Em 2009, ele assumiu a presidência da Comissão de Infraestrutura do Senado. Com significativo poder para fiscalizar os destinos das obras do PAC, a vitrine de campanha da então candidata Dilma Rousseff, o senador se apresentava como um obstáculo para o governo. A maçã lhe foi oferecida. O ex-presidente Lula entregou ao senador duas diretorias da BR Distribuidora, uma subsidiária da Petrobras — a diretoria da Rede de Postos de Serviço e a de Operações e Logística. No comando desse feudo, segundo os investigadores, Fernando Collor criou o seu balcão particular de negócios dentro da maior estatal brasileira, o que lhe renderia milhões em dividendos.

Segundo depoimentos colhidos na Lava-Jato, o esquema obedecia a uma lógica simples. As empresas que tinham interesse em assinar contratos com a BR acertavam antes "a parte do senador". Foram dezenas de contratos. A polícia já identificou dois que passaram por esse crivo. Num deles, de 300 milhões, um empresário do ramo de combustíveis pagou a Collor 3 milhões de reais em propinas para viabilizar a compra de uma rede de postos em São Paulo. A operação foi revelada pelo doleiro Alberto Youssef em acordo de delação premiada. Encarregado de providenciar o suborno ao senador, Youssef fez a entrega de "comissões" em dinheiro, depósitos diretos na conta do parlamentar e transferências para uma empresa de fachada que pertence a Collor. O Lamborghini, até recentemente o único do modelo no Brasil, está em nome da tal empresa, o que fez os investigadores suspeitar que o carro foi bancado com dinheiro desviado da Petrobras. Desde o ano passado, quando explodiu a Operação Lava-Jato e as torneiras da corrupção se fecharam, o IPVA do carro não é pago pelo ex-presidente. A dívida acumulada é de 250000 reais. Mas não é desapego do senador. Zeloso, ele só usava o carro para passeios esporádicos a um shopping de Brasília. Quando isso acontecia, o Lamborghini permanecia sob a vigilância de dois seguranças do senador, que fixavam um perímetro de isolamento em torno do veículo para evitar a aproximação dos curiosos. A frota de luxo de Collor — revela Lauro Jardim, na seção Radar — conta com um Rolls-Royce Phantom 2006, mais exclusivo ainda do que o Lamborghini.

O segundo caso envolve um contrato de 650 milhões de reais. Para conquistá-lo, Ricardo Pessoa, o dono da UTC, uma das empreiteiras envolvidas no escândalo, disse ao Ministério Público que repassou ao grupo do senador 20 milhões de reais em propina. Pessoa afirmou que o ardil nesse caso foi tão escancarado que ele foi levado a conversar sobre o tal "acerto" diretamente com o diretor da BR Distribuidora indicado pelo senador. O intermediário do encontro foi Pedro Paulo Leoni Ramos, amigo do ex-presidente e seu ex-assessor, que também teve a casa e o escritório vasculhados pela polícia. Como prova do que revelou, o empresário entregou à Justiça uma planilha na qual estão registrados todos os repasses de dinheiro feitos para quitar o "acerto" com o senador. Resumindo, em apenas dois negócios na Petrobras, Collor ganhou mais dinheiro do que tudo o que declara ter conseguido juntar como patrimônio em seus 65 anos de vida.

"Fui submetido a um atroz constrangimento, fui humilhado. Depois de tudo o que passei em minha vida política, tive de viver uma situação jamais por mim experimentada", afirmou, ao acusar o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, de persegui-lo injustamente. Os investigadores informaram que os carros foram apreendidos como forma de garantir o futuro ressarcimento do dinheiro desviado dos cofres públicos. A ação sobre o ex-presidente é o início de uma nova etapa da investigação, que mira um lado do esquema de corrupção que até a semana passada continuava impune. Empreiteiros estão presos, os partidos envolvidos foram identificados, os operadores contaram boa parte do que sabiam, mas quase meia centena de políticos que participaram da partilha continuava impune. As investigações já revelaram que o dinheiro desviado da Petrobras foi usado para financiar planos de poder megalomaníacos, campanhas eleitorais e, como mostram as primeiras investidas sobre deputados e senadores, mordomias, variadas mordomias.

Assim como Collor, que converteu sua lucratividade no petrolão em uma frota de carros de luxo, outros políticos com mais ou com menos influência e poder, mas igualmente inseridos na quadrilha, usaram a Petrobras para financiar uma vida de sonhos. O ex-presidente Lula, por exemplo, tornou-se dono de um tríplex à beira-mar, no Guarujá (SP), e hóspede freqüente de um confortável sítio no interior de São Paulo, graças à relação promíscua com o empreiteiro Léo Pinheiro, da OAS, preso e acusado de pagamento de propinas. A pedido do ex-presidente, o empreiteiro baiano patrocinou uma reforma no sítio e deu uma mão para terminar a construção do prédio em São Paulo. A Bancoop, a cooperativa ligada ao PT e responsável pela obra, havia falido, deixando milhares de mutuários sem receber seus imóveis. Lula pediu uma ajuda ao empreiteiro, que prontamente o atendeu. O apartamento ganhou um elevador privativo para que o ex-presidente acessasse a cobertura e o sítio recebeu móveis modernos, piscina aquecida, tanque de peixes, pedalinhos...

O dinheiro desviado financiou a revolução — na vida — de alguns revolucionários de outrora. José Dirceu, o mensaleiro que se tornou "consultor de sucesso", embolsou 39 milhões de reais. Parte generosa dessa quantia, estranhamente paga por seus serviços enquanto ele estava preso, sabe-se agora, foi desviada dos cofres da Petrobras com a ajuda do ex-tesoureiro nacional do PT João Vaccari Neto, que também fez a família enriquecer e conseguiu seu apartamento na praia graças à OAS. Apreciador de bons vinhos, o ex-ministro experimentou os prazeres que o dinheiro farto pode proporcionar. Desde que deixou o governo Lula, ele fez inúmeras viagens pelo Brasil e ao exterior, sempre a bordo de jatos particulares financiados por seus "clientes" preferenciais, os empreiteiros do petrolão. Dirceu só se hospedava em resorts de luxo, preferia as roupas de grife e fazia questão de dividir as mordomias com outro companheiro de luta. Na foto da página anterior, ele está numa praia da Bahia com Rosemary Noronha (de chapéu), a ex-chefe do escritório da Presidência, amiga íntima de Lula e demitida também por corrupção. A tentação dos carros importados, dos jatos e das bebidas caras seduziu a nova elite da corrupção brasileira. O ex-deputado petista André Vargas, hoje preso, não dispensava um jatinho nem nas férias com a família. A polícia descobriu que seu patrimônio reunia mansões, sítios e, claro, carros importados. A exemplo dos petistas, outros políticos da "base aliada", como o ex-deputado Luiz Argôlo, levavam uma vida de fausto com o dinheiro oriundo da Petrobras. Ele chegou a ganhar um helicóptero de presente de seus patrocinadores. Os corruptos são todos iguais.

23 milhões de reais
Inimigo visceral de Lula e do PT nos anos 90f o ex-presidente Fernando Collor converteu-se gostosamente em um dos mais fiéis aliados de Lula e do PT quando retomou à política corno senador. A reviravolta teve um preço: um feudo bilionário na Petrobras. No controle de duas diretorias da BR Distribuidora, uma subsidiária da estatal, Collor estabeleceu o próprio balcão de negócios no petrolão Em apenas dois contratos, faturou uma verdadeira fortuna. No primeiro, levou 3 milhões de reais para favorecer uma rede de postos de gasolina de São Paulo. No segundo, embolsou 20 milhões de reais para manipular uma licitação em favor da construtora UTC do empreiteiro Ricardo Pessoa. O ex-presidente apeado do poder aplacou seus fantasmas nos milhões do petrolão. De caçador de marajás, revelou-se ao país, na semana passada, como o mais bem-acabado deles. Em sua garagem na Casa da Dinda, a polícia apreendeu uma Ferrari 458 Italia, um Porsche Panamera e um Lamborghini Aventador Roadsíer avaliados em quase 6 milhões de reais. Dos tempos de presidente aos tempos de aliado petista, só o valor do Fiat Elba é que mudou.

1 milhão de reais
O ex-deputado Luiz Argôlo, preso no Paraná, era considerado um dos mais vorazes políticos do petrolão. Quase que diariamente, Argôlo recebia pacotes de dinheiro no apartamento funcional da Câmara, em eventos políticos e até no estacionamento do Congresso. A fartura era tanta que ele viajava pelo menos três vezes por semana a São Paulo para buscar as malas de dinheiro no escritório de Alberto Youssef. Em algumas viagens, fretava um avião particular para conseguir carregar as malas, que, de tão pesadas, rebaixavam o porta-malas do carro durante o transporte. O dinheiro sujo jorrava tão facilmente que Argôlo ganhou do doleiro um helicóptero avaliado em quase 1 milhão de reais. Com tantos luxos bancados por Youssef, Bebê Johnson, como ele era chamado no grupo, não escondia sua admiração pelo doleiro. "Queria ter falado isso ontem. Acabei não falando. Te amo", disse certa vez a Youssef, por mensagem de celular, logo depois de receber um pacote de dinheiro. O doleiro retribuiu: "Eu amo você também. Muitoooooooooo".

500 milhões de reais
O ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto sempre foi uma figura respeitada por sua competência em arrumar dinheiro. Diferentemente dos colegas, diziam os cardeais do PT, ele não usava sua função para encher os próprios bolsos, como faziam os mensaleiros. Disciplinado, dedicado e, acima de tudo, discreto, Vaccari foi o motor das eleições petistas na última década. Desviando recursos da Cooperativa dos Bancários (Bancoop) ou cobrando propinas das empreiteiras do petrolão, ele era o principal responsável pela estrutura financeira que elegeu e reelegeu Dilma Rousseff. Em apenas uma das diretorias da Petrobras, amealhou 500 milhões de reais em propinas. Mas o tesoureiro não era de ferro. Os investigadores descobriram que sua filha, uma universitária, acumulava 1,6 milhão de reais em patrimônio. A bolada tinha origem em remessas de Vaccari, que, assim como o amigo Lula, virou um feliz proprietário de um apartamento no Guarujá (SP), imóvel construído pela OAS, uma das empreiteiras envolvidas no esquema.

4 milhões de reais
Um dos políticos mais influentes do PT, André Vargas está entre os muitos petistas que mudaram de vida depois do petrolão. Vargas foi o primeiro político a cair na teia da Lava-Jato. Pilhado em conversas "estranhas" com integrantes da quadrilha, ele renunciou à vice-presidência da Câmara, foi obrigado a deixar o PT e ainda teve o mandato cassado pelos colegas. Mas a ruína política não prejudicou sua saúde financeira. Proprietário de um Monza velho e batido nos primeiros anos como parlamentar, Vargas saiu da política milionário, dono de mansões, fazendas e carros importados. À custa do dinheiro sujo do petrolão, o ex-deputado cruzou várias vezes o país em jatos particulares financiados por Alberto Youssef, seu amigo. Apenas duas de suas empresas de fachada, abertas para mascarar o recebimento de propina, faturaram pelo menos 4 milhões de reais. 0 ex-deputado, preso em Curitiba, sonhava em presidir a Câmara.

2,4 milhões de reais
O empreiteiro Léo Pinheiro, ex-presidente da construtora OAS, foi durante muitos anos um dos mais fiéis amigos de Lula no poder. Ao longo dos dois governos do petista, transformou a construtora em um império com milhões de dólares do BNDES em investimentos no Brasil e no exterior. A proximidade entre os dois era tal que Lula ficava à vontade para pedir toda sorte de favor. Preso em novembro do ano passado, Pinheiro sentiu-se abandonado e começou a rascunhar o esboço do que seria uma possível delação premiada. Essas anotações revelaram como era lucrativa a amizade de Lula com o empreiteiro. Logo depois de deixar o governo, Lula ocupou um sítio em Atibaia, no interior de São Paulo. O empreiteiro também construiu o tríplex de Lula no Guarujá (SP). A pedido do petista, Léo Pinheiro realizou uma reforma de luxo na propriedade de Atibaia sem cobrar do ex-presidente um único tostão. Outro empreiteiro generoso com Lula foi Ricardo Pessoa. O dono da UTC admitiu ter entregue 2,4 milhões de reais em dinheiro vivo para a campanha do petista à reeleição, em 2006. Desviada da Petrobras, a bolada saiu de uma conta na Suíça.

43 milhões de reais
Depois de cair em desgraça no escândalo do mensalão, em 2005, o ex-ministro José Dirceu decidiu refazer a vida como "consultor". Sua carteira de clientes era um dos segredos mais bem guardados da República - e não por acaso. Descobriu-se que as consultorias nada mais eram que uma forma de as grandes empresas pagarem propina ao ex-ministro por obras no governo. Em sete anos, ele juntou uma fortuna de 39 milhões de reais. Antes de ser preso, viajava apenas em jatos particulares e curtia a vida nos melhores resorts do pais. Nas últimas semanas, as investigações da Lava-Jato desmontaram de vez a farsa. O empreiteiro Ricardo Pessoa apresentou documentos que mostram que Dirceu recebeu dinheiro desviado da Petrobras no período em que estava preso na Papuda. Para acobertar o pagamento de propina, simulava contratos de consultoria. Na semana passada, o lobista Julio Camargo admitiu ao juiz Sergio Moro que repassou 4 milhões de reais em dinheiro vivo a Dirceu. Novamente, era propina do petrolão.

O fio da meada assusta

• Lula é investigado por ajuda a empreiteira no exterior. Isso é legítimo para um candidato a melhor ex-presidente do Brasil. Mas há detalhes mal contados nessa história

Daniel Pereira – Revista Veja

O ex-presidente Lula nomeou os quatro diretores da Petrobras que foram presos e acusados de participar do maior esquema de corrupção da história do país. Ele também recebeu favores pessoais de empreiteiras investigadas no petrolão e foi contratado por elas para fazer palestras no Brasil e no exterior. Em sua campanha à reeleição, em 2006, contou com uma doação de 2,4 milhões de reais da UTC, dinheiro que, segundo o próprio dono da construtora, Ricardo Pessoa, teve origem no petrolão e não foi declarado à Justiça Eleitoral. Apesar de tantas evidências, Lula não é oficialmente investigado na Operação Lava-Jato. Sua paz de espírito, porém, não está garantida. O petista confidenciou a aliados ter medo de ser preso.

A Procuradoria da República no Distrito Federal abriu, na semana passada, um procedimento criminal para apurar a suspeita de tráfico de influência de Lula em favor da Odebrecht, a maior empreiteira do país e cliente preferencial de recursos do BNDES. Nesse caminho, os investigadores muito provavelmente vão por uma rua sem saída. Não há nada de errado, a princípio, em um ex-presidente se tornar, para ficar na expressão usada por Lula, "um caixeiro-viajante" do Brasil no exterior — e cobrar por isso. Esse é um papel esperado de ex-presidentes dispostos a continuar construindo seu legado mesmo depois de apear do poder. Mas, como suspeitam os promotores, o diabo pode estar nos detalhes.

Ao deixar o Planalto, Lula fez viagens a países da América Latina e da África, pagas pela Odebrecht, com o objetivo declarado de abrir caminho para negócios da construtora e fazer palestras. Em 2011, Lula visitou o Panamá na companhia do ex-ministro José Dirceu — até então com a roupagem pública de consultor de sucesso — e de Alexandrino Alencar, diretor da Odebrecht. Com Alencar, Lula também viajou a Angola, Gana e Portugal. Houve ainda uma empreitada em que os papéis foram invertidos. Ao representar o governo brasileiro em missão oficial à Guiné Equatorial, o ex-presidente convidou Alencar a integrar a comitiva, o que causou desconforto entre funcionários do Itamaraty. A dupla dinâmica Lula e Alexandrino Alencar mostrava grande eficiência — e abria o caminho da riqueza para outras pessoas ligadas ao ex-presidente. VEJA revelou que a Odebrecht contratou Taiguara Rodrigues dos Santos, sobrinho de Lula, para trabalhar na construção de uma hidrelétrica em Angola, obra financiada com dinheiro do BNDES. Essa cortesia ajudou a transformar o sobrinho empresário especializado na reforma de varandas de apartamentos em empreiteiro internacional de sucesso. Não deixa de ser mais um feito do lulopetismo em sua missão sagrada de promover a ascensão social das massas.

A convite de Alencar, Taiguara fez parte de uma comitiva de empresários e representantes do governo brasileiro que visitou as obras do Porto Mariel, em Cuba, também tocadas com dinheiro do BNDES. A Procuradoria da República no Distrito Federal agora quer saber que vantagens o ex-presidente obteve da Odebrecht pelos serviços de lobby. Para isso, recorrerá aos colegas que participam da Operação Lava-Jato. Se a Justiça autorizar, a Procuradoria terá acesso a documentos, mensagens, planilhas e depósitos que façam referência a obras da Odebrecht financiadas pelo BNDES ou que tenham sido negociadas com a intermediação de Lula. Haverá também o compartilhamento de depósitos feitos pelas empreiteiras investigadas no petrolão em contas de Lula, de seu instituto e de sua empresa de palestras. Os investigadores já sabem que a Camargo Corrêa repassou, entre 2011 e 2013, 4,5 milhões de reais ao instituto e à empresa de palestras de Lula, inclusive sob a sugestiva rubrica de "bônus eleitoral". Delegados e procuradores também têm dados intrigantes sobre Alexandrino Alencar.

Os delatores Alberto Youssef e Rafael Ângulo Lopez disseram que Alencar organizava o esquema de pagamento de propinas no exterior. Lopez, encarregado de entregar dinheiro vivo a beneficiários do petrolão, contou que fazia o controle dos pagamentos diretamente com Alencar na sede da Odebrecht. Ao ser abordado pelos policiais no momento de sua prisão, Alencar fez três telefonemas. Um deles para o Instituto Lula.

Um terremoto que seja para o bem

• Personagens Fernando Collor, Eduardo Cunha e Luiz Inácio Lula da Silva. Os três políticos criticaram, por razões diferentes, o Ministério Público e a Polícia Federal

• Feita dentro da legalidade, a ação coordenada da Policia Federal e do Ministério Público gerou uma crise no curto prazo - mas pode ser o marco de um processo de depuração no país

Um terremoto varreu Brasília na semana passada. Em ação coordenada, a Procuradoria-Geral da República e a Polícia Federal cumpriram uma série de mandados de busca e apreensão contra um grupo de políticos. Entre eles estavam os senadores Fernando Collor (PTB-AL) e Ciro Nogueira (PP-PI). O Congresso reagiu como se a instituição houvesse sido atacada. Na grita contra a Polícia Federal e a PGR, os parlamentares investigados ganharam a companhia do presidente da Câmara, Eduardo Cunha. Ele foi acusado, numa delação premiada, de pedir US$ 5 milhões em propinas. Para completar, o Ministério Público abriu um Procedimento Investigatório Criminal contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O MP suspeita, como ÉPOCA noticiou em abril, que o ex-presidente pode ter praticado tráfico internacional de influência em favor da empreiteira Odebrecht. A exemplo de Cunha e Collor, Lula criticou os investigadores.

A soma de tudo isso gerou uma crise em Brasília. Essa crise pode ser entendida de duas maneiras - como fica claro ao longo de várias reportagens que estão nesta edição de ÉPOCA. No curto prazo, criou-se uma turbulência política, com o rompimento de Eduardo Cunha com o governo. Essa turbulência, como rastreou a agência de classificação Moody"s, pode afetar a economia . No longo prazo, o terremoto pode representar uma depuração no país. A investigação sobre os políticos vem sendo realizada com respeito a todos os procedimentos legais . Por causa da Lava Jato, alguns homens de Collor na Petrobras já foram afastados . É um começo. Que continue.

A ação da polícia contra os políticos foi arbitrária?

• Não Havia abundância de provas - como ÉPOCA revelou com exclusividade - e respaldo do Supremo Tribunal Federal

Filipe Coutinho – Época

Eram 4 horas da madrugada da terça-feira, dia 14. Depois de 13 dias de preparação, a Procuradoria-Geral da República e a Polícia Federal iniciavam uma ação coordenada. Cerca de 50 policiais estavam no auditório da Superintendência Regional da PF no Distrito Federal, para repassar as missões. A reunião de orientação dos policiais apresentava os últimos detalhes da Operação Politeia, desdobramento da Operação Lava Jato e primeiro grande passo na investigação contra políticos. Alguns dos investigadores ficaram 40 horas acordados, entre preparar e executar a operação. Chegaram ao limite da exaustão, mesmo sabendo que a investigação ainda tem muito a avançar. Um grupo de procuradores participou da reunião na PF, incluindo o procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Às 5 horas, Janot encerrou sua fala, e os policiais e procuradores foram às ruas cumprir mandados de busca e apreensão contra um grupo de políticos. Entre eles estavam os senadores Fernando Collor (PTB-AL), Ciro Nogueira (PP-PI), Fernando Bezerra (PSB-PE) e o deputado Eduardo da Fonte (PP-PE). Em Curitiba, a força-tarefa responsável pela Lava Jato, àquela hora, já sabia que em um par de dias outro alvo dos investigadores seria alcançado pelo escândalo. O empresário e delator do esquema Júlio Camargo, da Toyo Setal, afirmou na quinta-feira que o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB--RJ), pediu a ele US$ 5 milhões em propinas. Tudo somado, a Lava Jato atingiu o Congresso - e a crise policial pode gerar uma crise política.

A gritaria no Legislativo foi imediata. Eduardo Cunha atribuiu a delação a uma ação coordenada de Janot com o Planalto, para enfraquecê-lo - e anunciou seu rompimento e retaliações (leia mais na página 44). Ignorou o fato de que a delação fora prestada ao juiz Sérgio Moro e coordenada pela frente da força-tarefa de Curitiba, que já mandou para a prisão o tesoureiro do PT, João Vaccari Neto. Janot, é certo, fez dessa investigação uma causa pessoal, e a presidente Dilma Rousseff, com seu círculo mais próximo, regozija-se com o novo desdobramento do caso. Nada disso muda a realidade de que há indícios contundentes contra congressistas.

Collor também retornou a seu velho ato de misturar grandiloqüência verbal e ataque destemperado aos que considera oponentes (desta vez, os investigadores), em vez de explicar os fatos. "Fui humilhado", disse o ex-presidente, logo após a operação. "Isso é degradante, isso é atitude de covardes, de facínoras que se dizem democratas, que se aproveitam da democracia, mas que, na prática, aplicam a autocracia e dela se aproveitam", disse. O ex-presidente afirmou que a ação dos procuradores tem intuito "mesquinho e mentiroso". Ele apelou ao corporativismo dos congressistas. "Não se iludam, pois ninguém está livre disso. Daqui mesmo desta Casa, novas vítimas podem sair, novas histórias poderão ser maldosamente construídas." Cunha foi na mesma toada de Collor. Acusou Janot de usar ameaças contra delatores, a fim de obter confissões falsas, e disse haver no Palácio do Planalto um "bando de aloprados". O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), também reagiu. "Causam perplexidade alguns métodos que beiram a intimidação", afirmou, em nota. E classificou as ações de policiais e procuradores como "violência contra as garantias constitucionais em detrimento do estado democrático de direito". As reclamações dos parlamentares, porém, chocam-se com a robustez das provas contra eles.

A investigação mostra, em detalhe, fluxos de dinheiro que passam por envolvidos no desvio de verbas da Petrobras, como o doleiro Alberto Youssef e o empreiteiro Ricardo Pessôa, e terminam engordando contas bancárias e patrimônio de parlamentares, como ÉPOCA on-line revelou na quinta-feira passada com exclusividade. Por causa dessa fundamentação sólida, a PF conseguiu autorizações de três ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), Teori Zavascki, Celso de Mello e Ricardo Lewandowski. As autorizações permitiram o cumprimento de 53 mandados, componentes de seis inquéritos diferentes na Operação Lava Jato. Teori, famoso pelo estilo comedido, mostrou-se satisfeito com as provas da operação até agora, que considera numerosas e consistentes, e afirmou que, cada vez que os investigadores "puxam uma pena, vem uma galinha".

Collor não ousou criticar Teori, relator da Lava Jato no STF, que julgará os detentores de foro privilegiado eventualmente denunciados por Janot. Assim como Cunha silenciou sobre Moro. Se Collor ler a decisão de Teori, saberá que todas as "arbitrariedades" de que acusa a Procuradoria-Geral da República (PGR) e a PF foram autorizadas pelo ministro. Na operação desencadeada naquela madrugada, havia um alvo especial: a Casa da Dinda, residência de Collor. O ex-presidente removido do cargo em 1992 conseguiu a proeza de entrar novamente para a história política, em um novo verbete. Da Casa da Dinda saíram uma Ferrari, um Lamborghini e um Porsche, levados pela PF. Nisso não houve nenhum abuso ou espetacularização Era uma ordem expressa de Zavascki, e não um arroubo de policiais e procuradores. Há suspeita de que sejam fruto de lavagem de dinheiro.

Collor é suspeito de receber propina por meio de contratos da BR Distribuidora, subsidiária da Petrobras. O algoz de Lula na campanha de 1989 tinha dois indicados na diretoria da empresa, Luiz Cláudio Caseira Sanches, ex-diretor da rede de postos de serviço, e José Zonis, ex-diretor de Operações e Logística, ambos ainda atuantes na companhia. Além dos dois, atuava em nome de Collor um operador, figura conhecida de seu período na Presidência da República, o ex-ministro Pedro Paulo de Leoni Ramos.

Segundo a investigação, Collor se valia de uma empresa de fachada para lavar dinheiro. Trata-se da empresa Água Branca Participações, usada pelo senador para comprar um Lamborghini (R$ 3 milhões), uma Ferrari (R$ 2 milhões), um Bentley (R$ 1 milhão) e um Range Rover (R$ 570 mil). "Trata-se, provavelmente (...) de "pessoa jurídica de fachada", usada especificamente para lavagem de dinheiro", afirma o relatório da investigação . Há mais. O Bentley foi pago por uma firma chamada Phisical Comércio, sediada em São Paulo. Era mais uma empresa de fachada. Tinha dois sócios, que morreram em 2013, não tem funcionários, nem registro na Receita. Apesar de não existir, a Phisical recebeu R$ 930 mil das empresas de Youssef há dois anos.

Segundo a investigação, um contrato de ao menos R$ 140 milhões, firmado com uma rede de postos da DVBR Derivados, ligada ao banco BTG Pactuai, era uma das origens da propina - como ÉPOCA revelou em fevereiro. O BTG negou qualquer conhecimento das acusações feitas por Youssef.

De acordo com Youssef, delator na Lava Jato, a propina foi de R$ 6 milhões. Ele não é o único delator a complicar Collor. Rafael Angulo, responsável pelas entregas de dinheiro a mando de Youssef, descreveu uma entrega de R$ 60 mil. O relatório da delação surpreende pela forma prosaica com que parece ser tratado um malote de dinheiro vivo. "O declarante disse: "eu trouxe sessenta, o senhor sabe?"; Que ele respondeu: "Sei" (...) o declarante entregou o valor diretamente para Collor (...) Collor pegou os valores e apenas disse "tudo bem" (...) Collor não contou os valores e apenas colocou ao lado."

Uma terceira trilha de dinheiro aponta o rumo do senador. Ricardo Pessôa, presidente da empreiteira UTC e também delator, diz que pagou pelo menos R$ 20 milhões de propina a um diretor da BR Distribuidora - também indicado por Collor. "O declarante sabia que por trás da indicação de (José) Zonis (funcionário de carreira da Petrobras e ex-diretor de Operações e Logística da BR Distribuidora) estava Collor, do contrário não aceitaria pagar 20 milhões de propina", diz trecho do pedido de Janot de autorização do STF para a ação policial. A investigação descobriu ainda que Collor fez sucessivos depósitos em dinheiro vivo nas contas de suas empresas. Para isso, usava dois assessores do Senado, a fim de fracionar os depósitos. Entre 2011 e 2014, os valores somam R$ 770 mil. "Os fatos se relacionam a complexo esquema de recebimento e repasse de valores ilícitos para várias pessoas, mediante a utilização de diversas empresas, com a finalidade de ocultar a origem e o destino final dos recursos envolvidos", afirma o relatório dos procuradores. Diante de tantas evidências, a PF obteve autorização também para fazer buscas nas residências de Zonis e Sanches. A Petrobras informou que ambos foram, agora, afastados dos cargos que ocupavam na empresa - eles deixaram a diretoria da BR Distribuidora em 2013.

Com a mesma leva de mandados, a PF visitou um colega de Collor, o senador Ciro Nogueira (PP-PI). Ele estava escovando os dentes quando foi informado por uma funcionária de que havia um delegado no portão. Quando saíram, os policiais levavam dezenas de milhares de dólares, dinheiro que Nogueira havia separado para viajar com a família para o exterior nesta semana. Ele é suspeito de receber R$ 2 milhões em propina, segundo transcrição inédita da delação premiada do empreiteiro Ricardo Pessôa, da UTC. Segundo o empresário, Nogueira havia pedido o dinheiro alegando precisar ajudar um parente com problemas de saúde. "Ciro Nogueira se mostrou agradecido, afirmando que "haveria contrapartida", afirma o relatório da Procuradoria. De acordo com Ricardo Pessôa, a casa do senador em Brasília - a mesma que recebeu a visita de policiais - era o local das entregas. Foram três, totalizando R$ 1,4 milhão. O empreiteiro disse ainda que uma pessoa chamada "Fernando" era o responsável pelo recebimento. Os investigadores não se contentaram com as palavras de Pessôa, como tanto reclamam os críticos da delação premiada. Em diligência na casa do senador, descobriu-se um Golf estacionado na garagem, registrado em nome de um Fernando Mesquita, ex-assessor de Nogueira quando ele era deputado.

Outro delator, Rafael Angulo, disse que fez entregas no mesmo endereço. A ordem era do doleiro Alberto Youssef, e o dinheiro também vinha de Pessôa, da UTC. Os depoimentos dos delatores convergem. Uma anotação de Angulo obtida pelos investigadores trata da entrega de valores na casa de Nogueira, com a observação de "Fernando". Além das entregas em dinheiro vivo, Pessôa disse ter feito um contrato fictício de R$ 780 mil com um escritório de advocacia apontado por Nogueira. O contrato foi entregue aos investigadores. O senador nega. "Com relação às afirmações feitas pelo delator Ricardo Pessôa divulgadas na imprensa, esclareço que as acusações são totalmente infundadas, sem base em qualquer prova, e que confio plenamente que, ao final desse processo, a verdade irá vir à tona e corrigir a injustiça de que estou sendo vítima", afirmou.

Na Câmara, o principal alvo da Operação Politeia foi o deputado Eduardo da Fonte (PP-PE). Ele é duplamente suspeito, acusado de receber dinheiro para melar uma CPI da Petrobras em 2009 e de ganhar propina com o esquema que a CPI deveria descobrir. De acordo com a investigação, o doleiro Carlos Habib Chater usou seu posto de gasolina para fazer dois depósitos em 2011, totalizando R$ 46 mil. O destino do dinheiro foi uma empresa de Eduardo da Fonte, a ADPL Motors. Essa mesma empresa foi usada, depois, para bancar a campanha do deputado em 2014, com doação de R$ 250 mil. "A necessidade de busca e apreensão nos endereços da empresa ADPL surge da necessidade de que sejam colhidos outros elementos de convicção referentes aos depósitos já identificados e, eventualmente, de outros fatos de natureza semelhante", diz o pedido do procurador-geral da República. Em nota, o deputado disse estar "à disposição da justiça para colaborar no que for possível para esclarecer logo todos os fatos". "Esclarecer os fatos" é o objetivo central da Lava jato em sua nova fase.