terça-feira, 29 de novembro de 2022

Merval Pereira - Hora de parar

O Globo

Bolsonaristas sentiram-se abandonados e reagiram à presença de Eduardo Bolsonaro no Catar

A revolta que a aparição do deputado Eduardo Bolsonaro no jogo do Brasil contra a Suíça na Copa do Mundo do Catar provocou em bolsonaristas nas redes sociais mostra bem o clima delirante em que se envolvem os que buscam um “terceiro turno” da eleição presidencial, acampando em torno de quartéis, reivindicando uma intervenção militar para evitar a posse do presidente eleito Lula em 1º de janeiro. Sentiram-se abandonados pelo filho Zero Três de Bolsonaro, entendendo que ele estar vibrando com o futebol do Brasil no Catar é sinal de que nada acontecerá no país nos próximos dias. Mas é preciso que esses lunáticos parem de agir como guerrilheiros, perseguindo seus supostos inimigos pelo mundo afora.

O que aconteceu no Catar com um dos maiores ícones da cultura brasileira, Gilberto Gil, é repugnante. Mais perigoso ainda é justificar a perseguição política como se ela nada significasse. O empresário de Volta Redonda Ranier Felipe dos Santos Lemache admitiu que fazia parte do grupo que assediou moralmente Gil e sua mulher, Flora, mas negou tê-lo xingado.

Ele não entende (ou finge não entender) que perseguir uma pessoa para criticá-la ou xingá-la em locais públicos ou privados é crime, pois todos têm o direito de pensar e agir como quiserem sem ser perseguidos ou moralmente atacados. É preciso desnaturalizar essas atitudes, pois a vida em sociedade pressupõe a convivência entre contrários. A liberdade de expressão não permite ataques e acusações levianas, que devem ser reparadas na Justiça.

Míriam Leitão - Hora da política e da conciliação

O Globo

Em Brasília, Lula começa articulações para base de apoio. Em São Paulo, empresários buscam conciliação com novo governo

A PEC da Transição foi protocolada, mesmo sem consenso, para ser negociada. Agora a discussão passará a ser sobre um fato concreto. O presidente eleito Lula começou ontem uma maratona de reuniões e conversas nesta semana, que é decisiva. Além de negociar a PEC, ele passará a fechar os nomes dos ministérios. Na área política, Lula está montando a sua coalizão de governo. No meio empresarial, um encontro realizado no fim de semana em São Paulo permitiu que integrantes do novo governo e empresários, mesmo os que tiveram posições públicas a favor de Bolsonaro, conversassem e se entendessem. O vice-presidente eleito Geraldo Alckmin e o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, tiveram uma conversa a sós por cerca de quarenta minutos.

Carlos Andreazza - E orçamento secreto?

O Globo

É preciso lembrar que o orçamento secreto não acabou. Não acabou com a derrota eleitoral de Jair Bolsonaro. Por que vai subitamente esquecido? Não ficou de repente menos grave. Não pode haver se tornado, de ontem para hoje, admissível. Criado por Bolsonaro, a própria assinatura no contrato que pactuou a sociedade entre o governo e o consórcio parlamentar que tinha em Ciro Nogueira, senador feito ministro, o embaixador, o orçamento secreto não acabou.

Está aí. Nunca tão influente. Adensando-se no ocaso do governo. Tornando-se incontornável para a ascensão do próximo.

O orçamento secreto. Um dos grandes vencedores da eleição, sob as barbas do Supremo Tribunal Federal (STF). O maior vencedor do primeiro turno, impondo-se aos cálculos políticos — sim, temos isso — de nossa Corte constitucional. Grande vitorioso e também grande eleitor. O orçamento secreto. Reelegeu-se, como sistema de controle de poder concentrado, e reelegeu o Parlamento. Reelegeu o esquema autoritário que reelegerá Arthur Lira presidente da Câmara.

Cristovam Buarque* - Um estadista para o mundo

Correio Braziliense

Os grandes novos problemas são planetários, mas a solução para cada um deles requer decisões que se chocam com os propósitos e prazos dos eleitores nacionais

Na COP15, em Copenhague, o presidente Obama disse que "não há presidente do mundo". Mostrava a dificuldade para cuidar do problema planetário das mudanças climáticas, usando políticos comprometidos com suas respectivas nações para atender desejos imediatos e individuais de seus eleitores.

As revoluções científica, tecnológica e geopolítica integraram os países e suas populações e criaram problemas que se tornaram planetários e de longo prazo, mas a política continua restrita a cada país e ao prazo da próxima eleição.

Não há presidente do mundo, nem diplomata planetário. Os diálogos entre nações continuam sem visão do conjunto dos seres humanos e seu futuro comum. Os grandes novos problemas são planetários, mas a solução para cada um deles requer decisões que se chocam com os propósitos e prazos dos eleitores nacionais.

Luiz Carlos Azedo - PEC mantém Bolsa Família fora do teto por quatro anos

Correio Braziliense

Depois de muitas negociações, o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) decidiu mesmo propor que o Bolsa Família fique fora do teto de gastos por quatro anos. Ontem, o senador Marcelo Castro (MDB-PI) protocolou a PEC da Transição, que mantém o pagamento de R$ 600 do Auxílio Brasil, rebatizado como Bolsa Família, seu nome de origem. Pela proposta, o valor referente ao programa fica fora do cálculo do teto de gastos entre 2023 e 2026. A proposta de emenda à Constituição retira do Orçamento da União até R$ 175 bilhões do programa de transferência de renda para não estourar o teto de gastos. Castro levou em conta o projeto inicial elaborado pela equipe de transição de Lula.

Segundo o ex-ministro Nelson Barbosa, um dos economistas de equipe de transição, a estratégia adotada foi definida pelos senadores e deputados petistas. “Vamos ver a evolução da PEC”, disse. O texto precisa ser aprovado a tempo de ser incluído no Orçamento da União de 2023. “É a estratégia que foi considerada mais viável do ponto de vista político”, explicou Barbosa.

A PEC da Transição precisa ser aprovada no Congresso até 10 de dezembro para que haja tempo hábil para os parlamentares analisarem o Orçamento de 2023, que precisa ser aprovado ainda este ano.

Andrea Jubé - A dupla aposta de Lula para 2026

Valor Econômico

PT levará Fazenda e Casa Civil, Alckmin terá o Planejamento

Em política, diz-se que a próxima sucessão presidencial começa a partir do resultado da eleição atual. Essa regra emerge ainda mais forte se o candidato vitorioso antecipa que não disputará a reeleição, como fez o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Nessa lógica, as especulações quanto aos seus potenciais sucessores já fervilham com frenesi antes mesmo dele tomar posse.

O cenário mais provável esboçado para o primeiro escalão de Lula prevê uma dupla de petistas à frente das pastas mais influentes: Fernando Haddad no Ministério da Fazenda e o governador da Bahia, Rui Costa, na chefia da Casa Civil. Se esse desenho sair do papel, Lula governará com dois potenciais sucessores na direção dos ministérios de maior visibilidade.

Daniela Chiaretti - COP27: um sucesso e várias esquisitices

Valor Econômico

Em Sharm El-Sheikh, elogios a Lula e críticas ao número exagerado de brasileiros pelos corredores

Tuvalu, no Pacífico sul, é uma nação de nove ilhas. Fica perto de Kiribati, das Ilhas Salomão, de Fiji, daqueles lados do mundo de lá, na perspectiva brasileira. No pequenino país polinésio vivem 12 mil pessoas. Um dado importante: a altura máxima das ilhas é de sete metros. Fica fácil entender por que Tuvalu, Maldivas, Vanuatu e todo o grupo de pequenas nações insulares do Pacífico e do Caribe se tornam estridentes a cada conferência do clima das Nações Unidas. São territórios condenados a serem engolidos pelo mar - se as previsões científicas dos impactos climáticos estiverem, infelizmente, certas - e populações sem futuro em um mundo que aqueça além de 1,5°C neste século.

Eliane Cantanhêde – Agora, vai!

O Estado de S. Paulo

A mil por hora, Lula dá aval à PEC, ao anúncio de ministros e ao apoio a Arthur Lira na Câmara

O presidente eleito Lula deu aval nesta segunda-feira, 28, ao texto da PEC do Bolsa Família e para dois outros grandes anúncios previstos para esta terça-feira: quem serão os ministros-chave e, ora, ora, o apoio do PT e do PSB à candidatura do deputado Arthur Lira (PP-AL) para a reeleição à presidência da Câmara em fevereiro.

Essas três novidades desembocam numa única palavra: governabilidade. A manutenção do Bolsa Família em R$ 600 é um compromisso inadiável da campanha de Lula (como foi de Jair Bolsonaro também) com sua maior base de apoio, os pobres – nesse caso, miseráveis.

O mercado pode gritar o quanto quiser, mas Lula não tem alternativa, é garantir ou garantir os R$ 600 e, além de tudo, não é o novo governo que está estourando o teto de gastos. Quem explodiu o teto, a responsabilidade fiscal e, de quebra, a lei eleitoral foi o atual presidente Bolsonaro, em favor de sua reeleição, ou seja, dele próprio. E com o mesmo Congresso que está aí.

Maílson da Nóbrega* - Graves dramas fiscais que nem todos percebem

O Estado de S. Paulo

Um grande desafio do novo governo será mobilizar a sociedade e o sistema político em favor da diminuição dos gastos obrigatórios.

O tema fiscal tem ganhado proeminência. Ressurgiram definições estapafúrdias do gasto público, percepção de inevitável aumento da carga tributária e propostas para uma nova âncora fiscal. Coube a Lula reviver o equívoco de que gasto em educação e saúde é investimento (portanto, não deve se sujeitar a limites). É como se um rótulo pudesse mudar a natureza da despesa. Se mal financiada, não importa seu objetivo, ela impactará o endividamento e pode colocar em risco a solvência do Tesouro.

Economistas defenderam ideias sem atentar para as características do sistema tributário e para a delicada situação fiscal. No caso da carga tributária, fala-se em elevar o Imposto de Renda (IR) via tributação de dividendos e/ou eliminação de privilégios como o abatimento de despesas de educação e saúde. Não se considera, todavia, que 49,25% (50% em 2025) dessa receita vai para Estados e municípios e fundos regionais de desenvolvimento. No Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), os Estados recebem mais 10% para compensar supostas perdas de receitas nas exportações. Até 1974, transferia-se apenas 10% de ambos os impostos.

Pedro Fernando Nery – A nova política industrial

O Estado de S. Paulo

Só poderiam ser beneficiados setores que, pelos dados, de fato são mais ‘complexos’

Queríamos Steve Jobs, terminamos com Joesley. O sonho de empresas inovadoras, liderando o desenvolvimento nacional e famosas globalmente, era a aspiração da política industrial.

Esta se refere ao conjunto de incentivos dados pelo Estado a setores específicos do empresariado, diante da avaliação de que o resultado será positivo para a coletividade. Depois de Dilma, a política industrial foi desidratada, mas agora o governo eleito prometeu reeditá-la. Como fazer?

A academia oferece um possível saída. Difundida nos últimos anos, a área conhecida como “economia da complexidade” defende que a estrutura produtiva de um país de fato determinaria, de forma causal, o seu crescimento. Afasta-se nesse sentido da ortodoxia, mas, por uma ênfase mais forte em dados e computação, não se aproxima também da heterodoxia.

Hélio Schwartsman - China desafia economistas

Folha de S. Paulo

Atos poderiam levar a uma mudança de regime, dando razão aos institucionalistas

Protestos na China se generalizam. Já faz algum tempo que a maioria dos filósofos da ciência não utiliza a capacidade de fazer predições como critério definitivo a separar a ciência de outros tipos de discurso. Ainda assim, cientistas adoram elaborar um prognóstico não óbvio e acertá-lo. Fazê-lo, mesmo que não tenha impacto decisivo em termos epistemológicos, conserva grande força retórica.

Uma previsão até aqui não realizada sobre a China que avexa economistas liberais, particularmente os da escola institucionalista, é a de que ditaduras são, no longo prazo, incompatíveis com a prosperidade econômica. Para eles, o crescimento sustentável só é possível quando as instituições políticas de um país são inclusivas e seus cidadãos gozam de liberdade para decidir o que farão de suas vidas e recursos. Isso ocorre porque a prosperidade duradoura depende de estabilidade social e de um fluxo constante de inovações, que resulte em ganhos de produtividade.

Cristina Serra - A violência que nos dilacera

Folha de S. Paulo

Lula terá que tirar as instituições da inércia para reverter o ambiente de insanidade

massacre em Aracruz, no Espírito Santo, nos dilacera como sociedade e nos lembra que escolas deixaram de ser o lugar seguro onde crianças, jovens e mestres devem florescer juntos.

O Brasil foi inscrito no mapa dessa tragédia em abril de 2011, numa escola do bairro de Realengo, no Rio de Janeiro, quando um ex-aluno abriu fogo e matou 12 crianças e adolescentes. De lá para cá, contam-se, pelo menos, mais 11 atentados e carnificinas em escolas e creches. Há diferenças nas motivações e execução, mas os crimes se assemelham na brutalidade e covardia contra vítimas indefesas.

Alvaro Costa e Silva - 'Patriotas' querem que a Copa se dane

Folha de S. Paulo

Num bom sinal para a seleção, eles desistiram de usar a camisa canarinho

golpismo financiado é a única razão de viver para os bolsonaristas que não suportam a realidade nem aceitam passar à condição democrática de oposição ao futuro governo.

Para manter a ilusão acesa se alimentam de teorias conspiratórias e soluções inexistentes e delirantes: intervenção federal, artigo 142, regaste do código-fonte, mensagens cifradas, ajuda divina. Na visão distorcida deles, o Brasil já virou uma ditadura — "as saídas constitucionais se encerraram", escreveu no Twitter um golpista que vive nos EUA — e é preciso enfrentar um arquivilão de história em quadrinhos: o Cabeça de Ovo.

Joel Pinheiro da Fonseca - O Brasil de Neymar e de Gilberto Gil

Folha de S. Paulo

A paixão político-partidária está ditando a aprovação ou reprovação de dois gênios

Nada me tira da cabeça que o jogo contra a Suíça teria sido mais fácil se Neymar estivesse em campo. O craque fez falta. E olha que teve gente comemorando quando ele se machucou.

Ninguém é obrigado a admirar ninguém, e Neymar —assim como tantas estrelas— tem sua cota de atos pouco admiráveis. Mas não foram eles o que realmente gerou a antipatia atual de parte da opinião pública, e sim seu apoio ostensivo a Bolsonaro. Assim como o que motivou os xingamentos baixos a Gilberto Gil, também no Qatar, foi seu apoio a Lula.

Não que os dois atos sejam moralmente equivalentes. Gritar insultos a um senhor de idade que passa é uma agressão consideravelmente mais baixa. O equivalente à comemoração pela ausência de Neymar da Copa seria se pessoas celebrassem Gil ter perdido alguma premiação internacional da música. Diferenças à parte, em ambos os casos o que vimos foi a paixão político-partidária ditando a aprovação ou reprovação de dois gênios de suas áreas.

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

Novo ministro da Fazenda precisará ter tarimba política

O Globo

São preocupantes declarações recentes de Lula e Fernando Haddad sobre contexto econômico

O futuro ministro da Fazenda, cujo nome deverá ser anunciado nesta semana pelo presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, precisa ter qualidades mínimas para que o governo tenha chance de sucesso. A primeira é entender os desafios. Na corrida das nações, o Brasil avança lentamente há várias décadas. Sem expansão sustentada do PIB, as oportunidades de emprego minguam, a renda cai, pobreza e fome se espalham.

Para colocar o país no rumo, o novo ministro terá primeiro de compreender os acertos e erros do passado. No lado positivo, vencemos a hiperinflação; criamos reservas cambiais para proteger a economia; melhoramos a capacidade da mão de obra graças a avanços na educação; promovemos uma reforma da Previdência e a reforma trabalhista que aperfeiçoou o mercado de trabalho; e demos independência ao Banco Central para que persiga as metas de inflação sem interferência política. Uma avaliação não ideológica dessas e de outras medidas benéficas será crucial para que não haja retrocesso.

É, por isso, preocupante que tanto Lula quanto o principal cotado para o cargo, o petista Fernando Haddad, tenham decepcionado em declarações recentes sobre a economia. Lula,é verdade, faz bem em pretender escolher um político para o cargo, que exigirá alta capacidade de articulação com os setores produtivos e negociação com o Congresso. Mas é preciso que seja um político com tarimba, disposição para o diálogo e uma atitude de aprendizado humilde diante dos desafios.

Poesia | Bertolt Brecht - Perguntas de um operário que lê (Narração de Mundo dos Poemas)

 

Música | Roberta Sá e Zeca Pagodinho - Pago pra ver