segunda-feira, 31 de dezembro de 2018

FELIZ ANO NOVO


Carlos Drummond de Andrade: Receita de Ano Novo

Para você ganhar belíssimo Ano Novo
cor do arco-íris, ou da cor da sua paz,
Ano Novo sem comparação com todo o tempo já vivido
(mal vivido talvez ou sem sentido)
para você ganhar um ano
não apenas pintado de novo, remendado às carreiras,
mas novo nas sementinhas do vir-a-ser;
novo
até no coração das coisas menos percebidas
(a começar pelo seu interior)
novo, espontâneo, que de tão perfeito nem se nota,
mas com ele se come, se passeia,
se ama, se compreende, se trabalha,
você não precisa beber champanha ou qualquer outra birita,
não precisa expedir nem receber mensagens
(planta recebe mensagens?
passa telegramas?)

Não precisa
fazer lista de boas intenções
para arquivá-las na gaveta.
Não precisa chorar arrependido
pelas besteiras consumadas
nem parvamente acreditar
que por decreto de esperança
a partir de janeiro as coisas mudem
e seja tudo claridade, recompensa,
justiça entre os homens e as nações,
liberdade com cheiro e gosto de pão matinal,
direitos respeitados, começando
pelo direito augusto de viver.

Para ganhar um Ano Novo
que mereça este nome,
você, meu caro, tem de merecê-lo,
tem de fazê-lo novo, eu sei que não é fácil,
mas tente, experimente, consciente.
É dentro de você que o Ano Novo
cochila e espera desde sempre.

Vinicius Mota: Da Áustria contra o autoritarismo

- Folha de S. Paulo

Intelectuais nascidos há mais de cem anos advertiram sobre ameaças à liberdade individual

Parte da turma que assume o governo federal nesta terça admira uma linhagem de acadêmicos nascidos no Império Austro-Húngaro entre o final do século 19 e o início do 20, entre eles Ludwig von Mises (1881-1973), Friedrich Hayek (1899-1992) e Karl Popper (1902-1994).

Em comum, além da defesa intransigente do liberalismo econômico, eles professaram lições importantes contra a tirania, seja a dos poderosos, seja a dos próprios intelectuais.

É uma pena que, rebaixados pelo marxismo dominante, seus principais escritos tenham circulado pouco aqui. Menosprezaram-se alguns rebentos do Iluminismo, como estes:

1. O mecanismo que faz os homens cooperarem no mundo moderno é essencialmente complexo e não pode ser apreendido pelo intelecto mais treinado, a não ser em contornos grosseiros. Por isso o desfecho dos processos históricos e sociais se reveste de crônica indeterminação.

2. Não há doutrina “científica” eficaz aplicável ao juízo político. A passagem dos especialistas, inclusive militares, e dos intelectuais para o governo deveria ser vista com cautela, para que a autoridade adquirida em campos específicos não se transforme em verniz do arbítrio.

3. A escala de valores do indivíduo, que determina suas escolhas, não pode ser substituída pela de outra pessoa, que é diversa. Tampouco um ente coletivo a suprirá. Quando o governo invade o domínio das decisões particulares —e dita padrões de produção, consumo, opinião ou conduta—, incide em autoritarismo.

4. A boa norma é simples, impessoal e instrumental. Pela proliferação descontrolada de regulamentos e burocratismos se estabelecem de antemão vencedores e vencidos no jogo econômico e social. O efeito, para os indivíduos e as organizações tolhidos em sua liberdade de ação, pode ser similar ao do despotismo.

5. Integra o ânimo propagandístico autoritário, escreveu Hayek, despojar as palavras “de qualquer significado preciso, podendo designar tanto uma coisa como o seu oposto”.

Leandro Colon: Bolsonaro e o Congresso

- Folha de S. Paulo

Nenhum presidente governou nas últimas décadas sem a parceria do Legislativo

O decreto para permitir a posse de arma de fogo a pessoas sem ficha criminal é apenas um pedaço da avalanche de medidas a serem anunciadas nos primeiros dias do governo de Jair Bolsonaro.

A expectativa é que os novos ministros revelem agora na largada ações de impacto nas pastas. Estrelas da Esplanada, Paulo Guedes(Economia) e Sergio Moro (Justiça) devem dividir o protagonismo em janeiro.

Conforme mostrou reportagem da Folha no domingo (30), a equipe de Guedes quer fazer um gesto ao setor produtivo na busca da melhoria do ambiente de negócios no país.

A primeira impressão (sobretudo para um governo novo) é importante e o ministro sabe que não há outro colega com mais responsabilidade do que ele para que Bolsonaro tenha uma perspectiva de sucesso.

Entretanto, para pouca coisa servirá um clima de euforia econômica nas primeiras voltas da corrida se Guedes não revelar até fevereiro qual é de fato a reforma da Previdência à mesa. Não há medida capaz de superar um fiasco na aprovação da mudança na aposentadoria.

Marcus André Melo: Presidente vs. Congresso

- Folha de S. Paulo

Bolsonaro será o primeiro presidente mais conservador que o Congresso

No quadriênio 2019-22 teremos o primeiro presidente eleito dentro de um novo padrão de relações Executivo-Legislativo no país: um chefe do Executivo mais conservador do que o próprio Congresso.

De Vargas a Dilma, todos os presidentes eleitos democraticamente têm sido mais moderados em relação à preferência ideológica mediana do Congresso.

Celso Furtado foi o primeiro analista a identificar um padrão nas relações Executivo-Legislativo no Brasil. No ensaio “Obstáculos Políticos ao Crescimento Econômico no Brasil”, escrito em 1964 na Universidade Yale, ele identificou um conflito irresolúvel entre o presidente —eleito por um eleitorado urbano— e um Congresso conservador, comprometido com o statu quo.

Instaura-se o conflito porque, “para legitimar-se, o governo tem que operar dentro dos princípios constitucionais. Para corresponder às expectativas da grande maioria que o elegeu, o presidente da República teria que alcançar objetivos que são incompatíveis com as limitações que lhe cria o Congresso dentro das regras do jogo constitucional”.

Furtado enxergava na Constituição de 46 “um poderoso instrumento das oligarquias”, o que enfraquece sua análise.

Celso Rocha de Barros: Os livros sobre política de 2018

- Folha de S. Paulo

Os melhores livros sobre política deste ano foram sobre crise

O livro-símbolo de 2018 foi “Como as Democracias Morrem”, de Steve Levitsky e Daniel Ziblatt. Trata-se de uma análise dos riscos que a eleição de Trump trouxe para a democracia americana feita por cientistas políticos que conhecem como poucos a história dos retrocessos democráticos recentes em lugares como Venezuela, Turquia, Hungria e Polônia.

Já sobre a crise da democracia mesmo onde ela ainda funciona, o destaque fica com “The People vs. Democracy”, de Yascha Mounk, que sairá no Brasil em abril de 2019. Entre os vários insights do livro, destaque para a discussão sobre “liberalismo não democrático” (a tecnocracia, a judicialização) e “democracia não liberal” (os variados populismos).

Na mesma linha, “Como a democracia chega ao fim”, de David Runciman, já valeria só pela discussão das dificuldades políticas trazidas por questões que talvez sejam grandes demais (aquecimento global) ou pequenas demais (epidemia de drogas) para um governo democrático.

“Fascismo: um Alerta”, da ex-secretária de Estado americana Madaleine Albright, é um alerta antiautoritário muito bem-feito por uma autora que conheceu os totalitarismos do século 20 e sabe o quanto o consenso democrático dos anos 90, apesar de tudo, merece ser defendido.

Fernando Gabeira: Políticos para se falar bem

- O Globo

Arinos e Nabuco, no meu entender, têm muito em comum. Longas passagens pela Europa, famílias de políticos ilustres

Hoje gostaria de elogiar dois políticos brasileiros. Não se assustem: estão mortos. Um deles é Afonso Arinos, cujas memórias, “A alma do tempo”, acabam de ser publicadas na íntegra pela Top Books, um feito editorial, pois constam de 1.779 páginas, incluídas as notas. Nos últimos dez dias, consegui ler 400. Não posso falar ainda sobre o livro no conjunto. Mas o que li até agora é o bastante para lamentar ter perdido, por alguns anos, a chance de conviver com Arinos no Congresso. Quando cheguei, já não estava mais.

Essa hipótese de convivência nem existiu com Joaquim Nabuco, autor de “Minha formação”. Só mesmo na fantasia poderia estar ao seu lado, fazendo perguntas, ouvindo e anotando seus discursos.

Arinos e Nabuco, no meu entender, têm muito em comum. Longas passagens pela Europa, famílias de políticos ilustres. Nabuco e Arinos escreveram sobre seus pais. Nabuco, “Um estadista do Império”, Arinos, “Um estadista da República”, dois livros já indicam uma certa continuidade histórica entre os dois.

Nabuco foi um dos líderes da campanha pela Abolição. Afonso Arinos é o autor da lei brasileira contra a discriminação racial. O que José Guilherme Merquior diz sobre Arinos, num dos prefácios de “A alma do tempo”, talvez seja válido também para Nabuco: “o sabor das elites que aprendem com a história e acabam por liderar as mudanças construtivas.”

A principal tentação é a de afirmar que existem políticos interessados no país, capazes de se bater por grandes ideias, algo bastante diferente do que se pensa hoje. Gilberto Freyre destaca essa qualidade em seu conterrâneo Nabuco, acentuando que é importante conhecê-lo num momento em que os políticos parecem mistificadores e o Congresso, uma inutilidade dispendiosa.

Minha vontade de estudar e escrever sobre as semelhanças entre Nabuco e Arinos não é tanto extrair uma lição de moral de sua experiência política e sua passagem brilhante pela vida pública.

Cacá Diegues: O serviço público da cultura

- O Globo

Respeitar o resultado produzido pelo desejo da maioria da população não quer dizer obrigar-se ao silêncio

Amanhã, quando o sol nascer, vai estar começando um novo dia, um novo ano, um novo governo no Brasil. O novo presidente foi eleito por uma maioria significativa de brasileiros, mais de 57 milhões deles. Se bem que, no segundo turno, quando apenas dois candidatos, somente duas concepções de mundo opostas se enfrentaram decidindo para onde vamos, pouco mais de 42 milhões de nossos cidadãos optaram por não votar em nenhum dos dois. Os 8,6 milhões de votos nulos, mais os 2,4 milhões em branco e as 31,3 milhões de abstenções decidiram não escolher ninguém.

Acontece que temos um presidente eleito democraticamente por uma maioria legal e legítima, é preciso respeitar os dois — ele e a maioria de brasileiros que o elegeu. O que não nos impede de fazer certas observações talvez polêmicas. Respeitar o resultado produzido pelo desejo da maioria da população não quer dizer obrigar-se ao silêncio, aceitando o que quer que os vencedores decidam fazer. Na atividade cultural, aquela à qual me dedico, por exemplo, estamos num momento delicado, que não foi inventado pelo presidente de amanhã.

Estimulada pela malícia ou ignorância de alguns críticos perversos, grande parte da população conta satisfeita com o fim da Lei Rouanet no novo governo. Ouvi isso da boca sorridente de um taxista: acabou-se a mamata, o fim da Lei Rouanet vai acabar com a sopa de quem vive às custas do dinheiro público. Uma tolice, pois, de uma forma ou de outra, de um modo direto ou indireto, todo cidadão vive às custas do dinheiro público. E viverá cada vez mais às custas do dinheiro público, na medida em que o Estado for mais eficaz na saúde, educação, transporte, habitação, segurança, em tudo o que for um dever do Estado para com a nação e o povo. E a cultura também é um serviço público, sem o qual uma nação não sobrevive como tal.

Cida Damasco: Muito além do desmanche

- O Estado de S.Paulo

Palavra de ordem do governo é desregulamentar. Que não signifique eliminar controles

Começa nesta terça-feira um novo governo, cercado de muita expectativa e de muita incerteza sobre os rumos que Bolsonaro e suas tropas vão imprimir ao País. Que o presidente está mirando em vários alvos ao mesmo tempo, não há a menor dúvida. Às vésperas da posse, porta-vozes formais e informais do governo deixam “vazar” intenções que vão de propostas para a reforma da Previdência ao aumento do prazo de validade da carteira nacional de habilitação (CNH) – reforçando a imagem de um ativismo nem sempre efetivo que caracterizou os dois meses de transição.

Por enquanto, o documento divulgado na semana passada com o roteiro de Bolsonaro para o começo do mandato – ou seja, para os simbólicos 100 primeiros dias –, embora genérico, é o que há de mais estruturado nesse sentido. Pelo menos em termos de alguns princípios que devem reger 2019. Entre as palavras-chave que sobressaem nesse documento estão desregulamentação, desburocratização, simplificação e outras da mesma categoria. Tudo que muita gente quer ouvir, notadamente na área econômica e seu entorno.

Conforme adiantou o novo ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, nos primeiros 100 dias serão apresentadas 22 medidas, exatamente com o objetivo de destravar a máquina pública, selecionadas por Bolsonaro entre 50 sugestões recolhidas da equipe. Ou seja, se não houver mudança de rumo, a partir de 1.º de janeiro estaremos entrando num período de desmanche, nas palavras do vice-presidente Hamilton Mourão. Desmanche de peças que foram montadas ao longo de vários governos, algumas por sinal bastante danificadas. O que não se sabe é como elas serão restauradas ou substituídas.

Pode isso?: “Posse de arma se assemelha à posse de automóvel”, diz general Heleno

Andrea Jubé | Valor Econômico

BRASÍLIA - O futuro ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Augusto Heleno, afirmou na tarde deste domingo, que a “posse de uma arma [de fogo]se assemelha à posse de um automóvel”. Ele deu a declaração durante uma coletiva de imprensa num intervalo do segundo ensaio da posse presidencial.

O general Heleno ponderou que as estatísticas sobre vítimas de homicídio por arma de fogo e acidente de carro indicam números aproximados. Ele disse que, aproximadamente, 50 mil pessoas são vítimas de acidentes de automóveis ao ano. “Se for considerar isso, vão proibir alguém de dirigir”, completou.

Heleno lembrou que o decreto que vai liberar a posse de arma de fogo aos brasileiros que não tenham antecedentes criminais foi uma promessa de campanha do presidente eleito Jair Bolsonaro. Ele ressaltou que a medida é comum em dezenas de países para a “defesa da vida e da propriedade” do cidadão.

Neste sábado, Bolsonaro antecipou o anúncio da medida - que tem o aval do futuro ministro da Justiça, Sérgio Moro - pelas redes sociais.

Segundo dados do Atlas da Violência 2018, o Brasil tem uma média de homicídios 30 vezes maior que os países europeus. Em 2016 - último ano alcançado pelo levantamento -, 62,5 mil brasileiros foram vítimas de mortes violentas. Desse total, 71% por armas de fogo.

Em contrapartida, segundo dados do Observatório de Segurança Viária relativos a 2017, cerca de 3,5 mil pessoas morreram ao mês no Brasil vítimas de acidentes de trânsito. O número sobe 12% em dezembro - totalizando cerca de 43 mil mortes no trânsito em 2017.

Para Roberto Freire, comparar posse de arma a de carro “é um despautério”

- Portal do PPS

"Luto para termos uma policia eficiente na manutenção da segurança pública", diz Freire

Em sua conta no Twitter, o presidente do PPS, Roberto Freire, criticou a comparação feita pelo futuro ministro do GSI (Gabinete de Segurança Institucional), general Augusto Heleno, de que a posse de arma é similar à posse de um automóvel, ao defender, neste domingo (30), a ampliação do direito do porte de armamento no País.

“Comparar a posse de arma a uma posse de carro é um despautério. Foi o que fez um ministro de Bolsonaro sobre a polêmico decreto de liberação das armas. Carro é para transportar e servir seres humanos; armas para matar”, afirmou Freire na rede social.

“A posse de uma arma, não é o porte, desde que ela seja concedida a quem está habilitado legalmente, se assemelha à posse de um automóvel”, comparou o general, em defesa ao decreto que o presidente eleito Jair Bolsonaro diz que vai editar para facilitação da compra de armas no Brasil.

“Luto para termos uma policia eficiente na manutenção da segurança pública e uma Justiça eficaz”, completou o presidente do PPS em outro post no Twitter.

Marcus Pestana: Ao dobrarmos a esquina de 2018, o que nos espera?

- O Tempo (MG)

O ano de 2018, sem dúvida, foi incomum. A panela de pressão, que acumulava calor desde as jornadas de rua de 2013, explodiu. A temperatura foi às alturas, num festival de intolerância e radicalismo. As cenas lamentáveis nas solenidades de diplomação dos novos eleitos em São Paulo e Minas Gerais chamam a atenção sobre o quanto será difícil reconstituir os canais de diálogo, respeito mútuo e negociação.

Nas últimas eleições, o padrão de comportamento do eleitorado mudou substancialmente. O brasileiro, em geral, avesso a aventuras e radicalismos, apostou no confronto dos extremos. E não só elegeu diversos governadores desconhecidos, como colocou na Presidência um até então apagado deputado, com 30 anos de mandatos sem marca relevante, sem experiência governamental, mas que soube se identificar com a maior parte da população, determinada a virar o jogo. Decepcionada com os partidos que lideraram a Nova República, desprezaram predicados como trajetória pessoal, experiência, legado, realizações. A aposta foi no novo pelo novo.

Mas qual é o estado da arte na última esquina de 2018? Na sociedade, não temos muito a comemorar. Fechamos o ano com mais de 13 milhões de desempregados, o padrão de vida caiu desde 2014, a qualidade das políticas públicas declinou, a violência explodiu, o crime organizado cresceu. Mas a resistência do povo brasileiro é impressionante, e essa é sempre a melhor notícia.

Brexit representa uma ameaça à difícil paz entre as duas Irlandas: Editorial | O Globo

Pelo fato de a Irlanda do Norte ser do Reino Unido, a separação força a volta da fronteira física

A impressão de que os responsáveis pelo projeto do Brexit pouco ou nada pensaram nas implicações práticas da separação entre a Grã-Bretanha e a União Europeia se fortalece sempre que se analisa algum aspecto concreto do divórcio.

Por exemplo, o caso de incontáveis cadeias de suprimento que interligam linhas de produção instaladas em território britânico com fornecedores europeus do continente. E vice-versa.

A saída britânica do bloco — sob pressões essencialmente xenófobas — poderá se traduzir em barreiras tarifárias, sinônimo de aumento de custos em exportação e importação, que se traduzirá em perda de competitividade no mundo, em recessão e inflação. O próprio Banco da Inglaterra, BC britânico, não é otimista em seus relatórios.

Há, ainda, o caso da República da Irlanda e da Irlanda do Norte, separadas durante as últimas três décadas do século XX por um forte conflito entre católicos e protestantes, que militarizou a fronteira, com intervenção militar inglesa.

Burocracia maior e mais cara: Editorial | O Estado de S. Paulo

O número de funcionários públicos na ativa, em todos os níveis de governo, aumentou muito mais do que a população; o salário médio desses servidores cresceu mais do que a remuneração média dos trabalhadores do setor privado; o pessoal empregado pela União, pelos Estados e pelos municípios se apropria de uma fatia maior de tudo o que o País produz.

Se essa evolução da burocracia pública em duas décadas – entre 1995 e 2016 –, aferida pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), tivesse sido acompanhada da correspondente expansão dos serviços públicos prestados à população, bem como de sua melhoria, certamente as condições de vida no País seriam melhores.

No entanto, indicadores sociais bem conhecidos – como os referentes ao desempenho do sistema público de ensino, à segurança da população, à qualidade dos serviços de saúde prestados por instituições públicas e à eficiência dos sistemas de transportes públicos – mostram que os ganhos para a sociedade, quando existem, são muito limitados. O contribuinte gasta cada vez mais para manter uma máquina administrativa que não lhe devolve, na mesma proporção, o adicional que dele retira na forma de tributo.

O Atlas do Estado Brasileiro, lançado há pouco pelo Ipea, com uma análise da evolução do quadro de pessoal das três esferas de governo, mostra que, entre 1995 e 2016, o número de funcionários públicos na ativa passou de 6,264 milhões em 1995 para 11,492 milhões em 2016. O aumento de 83,5% corresponde a mais do dobro da evolução da população brasileira no período, de cerca de 30%.

A prova de Doria: Editorial | Folha de S. Paulo

Tucano terá de inovar se quiser ver suas ambições levadas a sério no futuro

João Doria foi bem-sucedido até aqui ao transportar para a política o estilo impetuoso que desenvolveu primeiro como homem de negócios.

Eleito prefeito de São Paulo há dois anos, ele abandonou o cargo antes de chegar à metade do mandato e conseguiu se eleger governador, apesar da decepção de muitos eleitores com seu prematuro afastamento da capital.

Ao receber as chaves do Palácio dos Bandeirantes nesta terça (1º), o tucano passará a ser responsável pela administração do estado mais rico do país e assumirá o papel mais desafiador de sua trajetória.

O novo governador, que se viu obrigado a deixar de lado seus sonhos presidenciais neste ano, dificilmente terá suas pretensões levadas a sério novamente se não mostrar que pode ser mais do que um mero colecionador de troféus.

Após uma vitória apertada nas urnas, Doria se movimenta para tomar o controle do partido e trabalha para alinhar o discurso tucano ao sentimento expresso pela avassaladora onda direitista que levou Jair Bolsonaro (PSL) ao poder.

No campo administrativo, cercou-se de políticos e profissionais experientes, recrutando sete ex-integrantes do primeiro escalão do governo Michel Temer (MDB) para posições chave em seu secretariado.

Demétrio Magnoli: As Oprahs e o marketing de Deus

- O Globo

João Teixeira de Faria, o João que usa o nome de Deus em vão, ganhou fama mundial em 2012, graças a uma reportagem da apresentadora americana Oprah Winfrey. Antes e, sobretudo, depois dela, inúmeras celebridades periféricas conferiram a credibilidade indispensável à expansão dos negócios do charlatão. A história subterrânea do médium, tal como exposta por centenas de acusações de ataques sexuais, ainda precisa de comprovação judicial. Mas todos sabiam sobre sua história pública de prática ilegal da medicina. A Oprah mais badalada e o resto do séquito de celebridades não se envergonham do papel que desempenharam na ascensão do João charlatão?

Todas pediram desculpas — mas, invariavelmente, pelo motivo errado. Oprah, a original, divulgou sua “empatia pelas mulheres que estão se apresentando agora”. Bruna Lombardi imagina que “todos perdemos um pouco”, e Camila Pitanga declarou sua “solidariedade” às mulheres agredidas. Xuxa Meneghel declarou-se “até um pouco envergonhada”, Maria Cândida disse ter ficado “horrorizada” e Ana Furtado, “decepcionada”. Elas, porém, não tinham como saber sobre a história oculta de assédios sexuais. Por outro lado, sabiam perfeitamente que a “figura muito especial com dom divino e abençoado” (Ana Furtado) praticava cortes e perfurações sem cuidado algum de esterilização. Sobre isso, os crimes indiscutíveis, nenhuma abriu o bico.

Samba da Portela 2019