No Brasil encantado em que vive o Planalto, as obras do trem-bala estariam adiantadas, e ele rodaria em 2016, para a Olimpíada. Felizmente, continua no papel. Depois do Enem deste fim de semana haveria outro (ou já houvera). Infelizmente, foi só promessa da doutora Dilma e do ministro Fernando Haddad. Seu substituto, o comissário Mercadante disse que prefere gastar construindo creches. Por falar em creche, durante a campanha eleitoral, a doutora prometeu mais seis mil (quatro por dia). Em abril, ela disse o seguinte: "Queremos mais, muito mais. (...) Vamos chegar a 8.685 creches." A repórter Maria Lima fez a conta e mostrou que seria necessário entregar 31 novas unidades a cada dia até julho do ano que vem (13 por dia até o fim do governo). A doutora zangou-se: "Minha meta é seis mil creches. Quem foi que aumentou para oito mil?" Ela.
Sua conta era a seguinte: em abril, havia 612 creches prontas, 2.568 em obras e 2.117 contratadas. Somando, chegava-se a 5.397. Se obras em andamento e contratadas são obras concluídas, 2010 foi um grande ano. Terminaram-se as obras da refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, e as águas do rio São Francisco foram transpostas.
Promessas.
Para ficar na conta da meta de campanha, admitindo-se que a doutora já entregou três mil creches, até o fim do seu mandato precisa entregar pelo menos oito por dia.
O mundo encantado do Planalto desencadeia uma compulsão mistificadora. Se o governo terminar só quatro mil creches, atire a primeira pedra quem acha esse programa um fracasso. Será um grande resultado que partiu de uma promessa exagerada. Trocando o mundo real (a obra entregue) pelo virtual (a promessa, ou o contrato), o comissariado intoxica-se numa euforia que desemboca na irritação. A última bruxaria do encantamento partiu da doutora Magda Chambrard, diretora da Agência Nacional do Petróleo. Ela anunciou que, nos próximos 30 anos, o Campo de Libra renderá R$ 1 trilhão. Em maio passado a mesma doutora disse que "gostaria de ter mais Eikes" no setor petrolífero. Uma semana depois, começou o inferno astral de Eike Batista e de quem acreditou nele.
O encantamento desenvolve nos governantes uma síndrome de sítio, como se o mundo estivesse contra eles. De onde Maria Lima tirou a referencia às oito mil creches? De uma fala da doutora.
Uma aula de FH para os comissários
Em agosto de 1995, na mesma arapuca em que caiu a doutora Dilma, o programa "Café com o presidente", Fernando Henrique Cardoso disse o seguinte: "Passados seis meses de governo, eu quero anunciar os primeiros resultados positivos dos esforços que nós estamos realizando para combater uma triste realidade brasileira: a mortalidade infantil. E quero começar falando do município de Jaramataia, que fica lá no interior do estado de Alagoas. Até o ano passado, 333 crianças, de cada mil que nasciam, morriam antes de completar 1 ano de idade. De janeiro para cá, esse número caiu para três. Vou repetir, é isso mesmo, caiu para três crianças em cada mil."
Lorota do mundo encantado. Três crianças mortas para mil nascidas vivas, nem na Suíça. Esse era o número de mortes por diarreia em Jaramataia, onde a mortalidade caíra de 333 para 249. Quando a fraude foi revelada, a máquina do encantamento mobilizou-se, e uma médica recebeu um telefonema intimando-a a "não deixar o presidente passar por mentiroso"
FH paralisou a máquina, dizendo mais ou menos o seguinte: "O número estava errado? Então estava errado, e nós não temos que responder à crítica".
No caso dá doutora Dilma, o Planalto explicou que, entre as 8.685 creches mencionadas por ela, havia obras contratadas por Lula. Fica combinado assim.
Aviso amigo
Há sinais de que será necessária uma chacoalhada de pessoas e políticas na condução da economia.
Depois da repercussão dos leilões aguados e das dificuldades de Eike Batista, dividem-se os empresários em dois grupos: um torce por um novo quadro, outro quer que fique tudo como está, para continuar tirando fatias do presunto de um governo atrás de credibilidade.
Alstom
Ou o tucanato paulista tem uma estratégia capaz de causar inveja ao comissariado petista que pretende livrar seus caciques das penitenciárias pelo mensalão ou está numa tática suicida, jogando o escândalo do propinoduto denunciado pela Siemens para dentro da campanha eleitoral do ano que vem.
Pelas provas, depoimentos e cifras, esse caso ultrapassa, de longe, o mensalão. Ali não há domínio do fato, o que há são só fatos dominantes.
Em silêncio
A Arquidiocese do Rio tirou a sorte grande por trabalhar em silêncio. Há cinco anos, ela fez uma faxina nas suas contas, afastou um padre que administrava seu bens e transferiu para uma casa em São José dos Campos o cardeal Eusebio Scheid, substituído por D. Orani Tempesta. Scheid deixou o apartamento de 500 metros quadrados (R$ 2,2 milhões) que fora comprado no Flamengo. O administrador, padre Edvino Steckel, foi acusado de ter gastado R$ 14 milhões em móveis, carros e enfeites. Em 2010, seu substituto foi detido no Galeão quando embar-cava para Portugal com 52 mil euros nas roupas e nas malas.
Agora o Papa Francisco detonou publicamente o bispo da diocese alemã de Limburg, que torrou 31 milhões de euros num palácio episcopal.
John Kennedy
Começa na semana que vem j a avalanche dos 50 anos da ; morte, no dia 22 de novembro, do presidente americano John Kennedy. Juntando mito e mistério, girará em torno de dois grandes temas: Foi Lee Oswald, sozinho, quem o matou? E, se ele não tivesse ido à Dallas, como ficariam os Estados Unidos?
O mistério do crime prosseguirá, e metade dos americanos continuará acreditando que houve uma conspiração. Chegará às livrarias a tradução de "11/22/1963" de Stephen King. (Na rede, em inglês, sai por US$ 12,38.) Conta a história de um sujeito que viajava no tempo e foi a Dallas para impedir que Oswald atirasse. Seu melhor momento está na conclusão, escrita com a ajuda de Ri-chard Goodwin, que foi assessor de Kennedy. Ele especula como ficaria o país se a viagem a Dallas tivesse sido cancelada.
Existem 40 mil livros sobre o presidente. Os melhores estão mais para o estilo Roberto Carlos, e a maioria é ruim. Muito acima da média, está na rede por US$ 15,20 o "Camelot"s Court — Inside the Kennedy White House" ("A Corte de Camelot —Por dentro da Casa Branca de Kennedy"), de Robert Dallek.
Dallek, um moderado de-oto da tese segundo a qual os tiros vieram de Lee Oswald, acrescenta mais um se.
Kennedy teria sobrevivido "se" não estivesse com o colete ortopédico que o mantinha com o tronco erecto. Por quê? Porque, ao levar o primeiro tiro, que entrou pelas costas e saiu pelo nó da gravata, teria se curvado, e o novo tiro não lhe explodiria o crânio.
Fonte: O Globo