Política e cultura, segundo uma opção democrática, constitucionalista, reformista, plural.
sábado, 23 de agosto de 2008
ADMINISTRADORES E POLÍTICOS
Marco Aurélio Nogueira
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO
Ainda que se deva reconhecer a persistência das cenas hilárias de sempre, dos personagens improváveis e das promessas surrealistas, invariavelmente presentes em todas as eleições, dá para admitir que melhoraram o perfil e o desempenho dos candidatos a prefeito, ao menos nas grandes cidades do País, como é o caso de São Paulo.
Apoiados por especialistas em marketing e pesquisa de opinião, por estrategistas de comunicação e por um não desprezível arsenal tecnológico, os candidatos estão-se mostrando mais à altura dos cargos que almejam. Apresentam propostas concretas, buscam equacionar problemas, exibem informações e conhecimento específico, parecendo ter nas mãos as cidades que pretendem governar.
Até os partidos políticos, esses entes tão feridos em sua integridade, tão sem alma e espinha dorsal, saíram a campo em melhor forma. Posicionam-se com cautela diante de um eleitor mais informado e menos disposto a se entregar passivamente a qualquer um que lhe peça o voto. Não despejam palavrório inócuo sobre ele, nem o submetem a uma sobrecarga de pressões ideológicas. Não conseguiram aperfeiçoar substancialmente a seleção dos candidatos que integram suas listas para as Câmaras Municipais, mas se esforçaram para cumprir esse papel no que diz respeito aos que postulam o Executivo. Estão a revelar que algo se passa em seus bastidores, como se estivessem finalmente a sentir os sinais de mudança e insatisfação que há tempo têm sido emitidos pela vida social.
Elogios também para a cobertura jornalística, especialmente a da mídia escrita. Todos os grandes jornais do País se estão superando. Facilitam o contraste entre as candidaturas, mostram as frestas por onde passam as demandas da cidadania, explicam o funcionamento dos Poderes políticos e dos órgãos de governo. Além disso, funcionam como excepcionais tribunas de debates, preenchendo o vazio de discussão democrática deixado pelas campanhas mais pirotécnicas dos tempos atuais. Um canal como o que começou a ser disponibilizado pelo portal estadao.com.br pesa de modo expressivo na elevação da qualidade do processo eleitoral.
Apesar desses avanços, no entanto, as eleições transcorrem como se fossem um fardo que os cidadãos precisam carregar. Não despertam paixão cívica ou maior interesse. Ainda que mais bem informado, o eleitor parece distante, indiferente, sem estabelecer empatia com candidatos ou partidos políticos. Numa comparação arriscada, seria possível dizer que se comporta como um condômino ante a necessidade de eleger o próximo síndico.
Sempre haverá quem pondere que cidades são mesmo condomínios em escala ampliada, que os prefeitos devem cuidar delas como se fossem sua casa, mas fazendo escolhas que beneficiem a todos, sem se preocupar em favorecer este ou aquele bairro, este ou aquele partido. Muitos pensam que governar cidades é um exercício mais técnico e administrativo que político, algo que se cumpre com sucesso quanto menos política nele existir. Não é bem assim.
Primeiro de tudo, porque governar é sempre mais que administrar. Não significa apenas cuidar da casa ou pôr os papéis em ordem. É mais que manutenção e empenho para fazer os os sistemas funcionarem, mais que sabedoria para escolher auxiliares ou utilizar as finanças públicas. Prefeitos não deveriam agir como gerentes, sobretudo porque sua tarefa não é simplesmente fazer a máquina andar, e sim criar condições para que uma comunidade lute por uma vida melhor.
Gerentes administram, prefeitos governam. Mais que jogo de palavras, a frase sugere que prefeitos existem para coordenar processos abrangentes de tomada de decisões, que envolvem milhares ou milhões de pessoas, muitos interesses e expectativas. Devem lidar com correlações de forças complicadas e situações de alta complexidade, e em muitíssimos casos somente se saem bem se contarem com o apoio da população. Precisam desse apoio, aliás, desde logo, como do ar que respiram. E não podem obtê-lo se agirem como técnicos especializados em gestão e administração, pessoas talentosas em arrumar gavetas, mas sem qualquer brilho particular, sem carisma, sem liderança e, especialmente, sem um projeto que mexa com a comunidade, desperte alguma paixão e facilite engajamentos.
Tudo isso é fazer política, não administrar. Mas é fazer grande política: agir com os olhos no Estado, na comunidade política, não nos próprios interesses ou nos pequenos negócios de intermediação e favor. É ir além da rotina.
Se uma população mantém com as eleições uma relação fria e distante, encarando-as mais como obrigação do que como dever, não temos uma situação confortável. Temos, na verdade, um problema. Podemos examiná-lo lembrando que, no modo de vida atual, o eleitor é dispersivo e flutuante, não tem grupos consistentes de referência ou identidade fixa nem causas claras ou vínculos coletivos fortes. Não interage com instituições políticas qualificadas para responder às suas demandas e às questões que mexem com sua existência e com sua cabeça. É atacado sem trégua pelo mercado, que o fisga e o enreda num verdadeiro frenesi consumista. Olha a política e o Estado com desconfiança, quem sabe com a mesma postura de compra e venda que está habituado a ter no mercado.
Não se trata, portanto, de culpar o eleitor. Partidos, estrategistas e candidatos deveriam enfrentar esta “despolitização”, em vez de se amoldar a ela. Adaptando-se, contribuem para reforçá-la. Quando se apresentam como técnicos e administradores competentes sem acenar com uma proposta de cidade - ou seja, de polis, comunidade política -, somente estão a prolongar uma situação que, no limite, esvaziará a vida de sentido público.
O processo eleitoral em curso fornece excelente oportunidade para que exceções amadureçam e comecem a alçar vôo.
Marco Aurélio Nogueira, professor de Teoria Política da Unesp, é autor dos livros Em Defesa da Política (Senac, 2001) e Um Estado para a Sociedade Civil (Cortez, 2004).
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO
Ainda que se deva reconhecer a persistência das cenas hilárias de sempre, dos personagens improváveis e das promessas surrealistas, invariavelmente presentes em todas as eleições, dá para admitir que melhoraram o perfil e o desempenho dos candidatos a prefeito, ao menos nas grandes cidades do País, como é o caso de São Paulo.
Apoiados por especialistas em marketing e pesquisa de opinião, por estrategistas de comunicação e por um não desprezível arsenal tecnológico, os candidatos estão-se mostrando mais à altura dos cargos que almejam. Apresentam propostas concretas, buscam equacionar problemas, exibem informações e conhecimento específico, parecendo ter nas mãos as cidades que pretendem governar.
Até os partidos políticos, esses entes tão feridos em sua integridade, tão sem alma e espinha dorsal, saíram a campo em melhor forma. Posicionam-se com cautela diante de um eleitor mais informado e menos disposto a se entregar passivamente a qualquer um que lhe peça o voto. Não despejam palavrório inócuo sobre ele, nem o submetem a uma sobrecarga de pressões ideológicas. Não conseguiram aperfeiçoar substancialmente a seleção dos candidatos que integram suas listas para as Câmaras Municipais, mas se esforçaram para cumprir esse papel no que diz respeito aos que postulam o Executivo. Estão a revelar que algo se passa em seus bastidores, como se estivessem finalmente a sentir os sinais de mudança e insatisfação que há tempo têm sido emitidos pela vida social.
Elogios também para a cobertura jornalística, especialmente a da mídia escrita. Todos os grandes jornais do País se estão superando. Facilitam o contraste entre as candidaturas, mostram as frestas por onde passam as demandas da cidadania, explicam o funcionamento dos Poderes políticos e dos órgãos de governo. Além disso, funcionam como excepcionais tribunas de debates, preenchendo o vazio de discussão democrática deixado pelas campanhas mais pirotécnicas dos tempos atuais. Um canal como o que começou a ser disponibilizado pelo portal estadao.com.br pesa de modo expressivo na elevação da qualidade do processo eleitoral.
Apesar desses avanços, no entanto, as eleições transcorrem como se fossem um fardo que os cidadãos precisam carregar. Não despertam paixão cívica ou maior interesse. Ainda que mais bem informado, o eleitor parece distante, indiferente, sem estabelecer empatia com candidatos ou partidos políticos. Numa comparação arriscada, seria possível dizer que se comporta como um condômino ante a necessidade de eleger o próximo síndico.
Sempre haverá quem pondere que cidades são mesmo condomínios em escala ampliada, que os prefeitos devem cuidar delas como se fossem sua casa, mas fazendo escolhas que beneficiem a todos, sem se preocupar em favorecer este ou aquele bairro, este ou aquele partido. Muitos pensam que governar cidades é um exercício mais técnico e administrativo que político, algo que se cumpre com sucesso quanto menos política nele existir. Não é bem assim.
Primeiro de tudo, porque governar é sempre mais que administrar. Não significa apenas cuidar da casa ou pôr os papéis em ordem. É mais que manutenção e empenho para fazer os os sistemas funcionarem, mais que sabedoria para escolher auxiliares ou utilizar as finanças públicas. Prefeitos não deveriam agir como gerentes, sobretudo porque sua tarefa não é simplesmente fazer a máquina andar, e sim criar condições para que uma comunidade lute por uma vida melhor.
Gerentes administram, prefeitos governam. Mais que jogo de palavras, a frase sugere que prefeitos existem para coordenar processos abrangentes de tomada de decisões, que envolvem milhares ou milhões de pessoas, muitos interesses e expectativas. Devem lidar com correlações de forças complicadas e situações de alta complexidade, e em muitíssimos casos somente se saem bem se contarem com o apoio da população. Precisam desse apoio, aliás, desde logo, como do ar que respiram. E não podem obtê-lo se agirem como técnicos especializados em gestão e administração, pessoas talentosas em arrumar gavetas, mas sem qualquer brilho particular, sem carisma, sem liderança e, especialmente, sem um projeto que mexa com a comunidade, desperte alguma paixão e facilite engajamentos.
Tudo isso é fazer política, não administrar. Mas é fazer grande política: agir com os olhos no Estado, na comunidade política, não nos próprios interesses ou nos pequenos negócios de intermediação e favor. É ir além da rotina.
Se uma população mantém com as eleições uma relação fria e distante, encarando-as mais como obrigação do que como dever, não temos uma situação confortável. Temos, na verdade, um problema. Podemos examiná-lo lembrando que, no modo de vida atual, o eleitor é dispersivo e flutuante, não tem grupos consistentes de referência ou identidade fixa nem causas claras ou vínculos coletivos fortes. Não interage com instituições políticas qualificadas para responder às suas demandas e às questões que mexem com sua existência e com sua cabeça. É atacado sem trégua pelo mercado, que o fisga e o enreda num verdadeiro frenesi consumista. Olha a política e o Estado com desconfiança, quem sabe com a mesma postura de compra e venda que está habituado a ter no mercado.
Não se trata, portanto, de culpar o eleitor. Partidos, estrategistas e candidatos deveriam enfrentar esta “despolitização”, em vez de se amoldar a ela. Adaptando-se, contribuem para reforçá-la. Quando se apresentam como técnicos e administradores competentes sem acenar com uma proposta de cidade - ou seja, de polis, comunidade política -, somente estão a prolongar uma situação que, no limite, esvaziará a vida de sentido público.
O processo eleitoral em curso fornece excelente oportunidade para que exceções amadureçam e comecem a alçar vôo.
Marco Aurélio Nogueira, professor de Teoria Política da Unesp, é autor dos livros Em Defesa da Política (Senac, 2001) e Um Estado para a Sociedade Civil (Cortez, 2004).
NECESSIDADES ESPECIAIS
Dora Kramer
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO
Na pressa de reagir ao corte na farra da contratação de parentes imposto pelo Supremo Tribunal Federal, muita gente no Congresso se esqueceu de pôr a máscara da compostura antes de abrir a boca.
Resultado: começou a circular principalmente na Câmara a idéia de um projeto de lei para a instituição de um nepotismo mitigado, mediante o qual havia uma cota reservada à contratação de parentes em cargos de confiança nos três Poderes.
Parece brincadeira, fruto de um devaneio qualquer, mas trata-se da insolência - para não falar em descaramento - de sempre.
O Congresso se faz de morto, não toma nenhuma providência que signifique a subtração de “direitos adquiridos” sobre deformações velhas de guerra e, quando o Judiciário atua nesse vácuo, corre para ver se salva um pedaço das mazelas.
Nos últimos tempos isso tem sido recorrente: a Justiça põe e o Legislativo dispõe o que é possível.
No caso do nepotismo, no entanto, a ousadia ultrapassou qualquer limite. Tanto que muitos falaram, mas poucos tiveram coragem de assinar embaixo da proposta de cotas.
Desse grupo restrito faz parte o deputado José Carlos Aleluia, ex-líder do DEM. Defende cotas pequenas, talvez até de um parente só. “Não se pode nomear a família toda”, pondera.
Aleluia acha a nova norma muito rigorosa. “Em cidades pequenas, por exemplo, são quase todos parentes uns dos outros”, argumenta. Não seja por isso, submetam-se a concursos.
Seja um ou um milhão, o parente fere o princípio da impessoalidade estabelecido para a administração pública na Constituição e quebra o preceito da igualdade uma vez que não considera o mérito profissional como regra acima de todas as outras.
Se o instrumento das cotas já é questionável em alguns setores como garantia para a inclusão de minorias, o que dizer da aplicação do conceito à parentela de agentes públicos com acesso ao robusto naco de postos a serem preenchidos pelo critério único do arbítrio?
A prosperar tal entulho, familiares de poderosos deverão ser vistos como pessoas portadoras de necessidades especiais. No caso, necessidade de levar vantagem sempre que possível, de preferência com o dinheiro dos outros.
A boa notícia é que os presidentes da Câmara e do Senado não aceitaram abrir o debate a respeito da decisão do Supremo. O senador Garibaldi Alves mandou saber quem são os parentes a serem demitidos e começou pelo próprio sobrinho que, a rigor, nem deveria ter sido empregado na Casa.
O deputado Arlindo Chinaglia aplaudiu a decisão do STF e avisou que não põe em votação projetos para mitigar o nepotismo. “Será um erro político dramático”, avalia.
Queira o bom senso que o passar do tempo, a saída do assunto do noticiário e as necessidades decorrentes da disputa pelas presidências da Câmara e do Senado daqui a seis meses não alterem posições.
De Minas
O juiz Marcos Flávio Lucas, do Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais, não entende que o governador Aécio Neves infrinja a lei quando aparece no horário gratuito de televisão do candidato da coligação PSB-PT, da qual o PSDB não faz parte.
Dessa forma, o prefeito petista de Belo Horizonte, Fernando Pimentel, não seria avalista de uma ilegalidade por aparecer ao lado de Aécio no mesmo programa.
Para o juiz, não havendo candidato tucano no páreo, Aécio Neves está livre para participar.
Elegante, o governador envia mensagem para contestar análise em artigo de quinta-feira sobre o tema, sem tentar se escorar na decisão judicial.
Diz Aécio Neves: “O impedimento a que você se referiu objetiva coibir a infidelidade partidária. Penso que você se equivocou na análise sobre minha participação no programa de TV do candidato Márcio Lacerda. Tenho participado ativa, e publicamente, da campanha por estar convicto de que ajo dentro da legalidade. O apoio à candidatura foi aprovado em convenção municipal do PSDB, que não integra qualquer coligação na capital. Jamais o faria se houvesse impedimento da lei”.
Tanto o juiz quanto o governador traduzem com liberalidade o artigo 54 da lei eleitoral, que diz o seguinte: “Dos programas destinados à propaganda eleitoral gratuita poderá participar qualquer cidadão não filiado a outra agremiação partidária ou a partido de outra coligação”.
O governador é filiado a uma agremiação partidária e esta não faz parte da coligação. Aécio escolheu Márcio Lacerda e não quis formalizar a aliança para fugir aos efeitos legais do já esperado veto do PT nacional.
Mas sobrou artigo 54, que exclui os integrantes de um partido do rol dos legalmente credenciados a aparecer no horário reservado a outra legenda ou coligação.
Não proíbe o governador de apoiar quem quiser. Apenas não o autoriza a fazê-lo no programa gratuito de televisão.
Fosse tão liberal a legislação, a formalidade seria um dado secundário na construção de alianças eleitorais.
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO
Na pressa de reagir ao corte na farra da contratação de parentes imposto pelo Supremo Tribunal Federal, muita gente no Congresso se esqueceu de pôr a máscara da compostura antes de abrir a boca.
Resultado: começou a circular principalmente na Câmara a idéia de um projeto de lei para a instituição de um nepotismo mitigado, mediante o qual havia uma cota reservada à contratação de parentes em cargos de confiança nos três Poderes.
Parece brincadeira, fruto de um devaneio qualquer, mas trata-se da insolência - para não falar em descaramento - de sempre.
O Congresso se faz de morto, não toma nenhuma providência que signifique a subtração de “direitos adquiridos” sobre deformações velhas de guerra e, quando o Judiciário atua nesse vácuo, corre para ver se salva um pedaço das mazelas.
Nos últimos tempos isso tem sido recorrente: a Justiça põe e o Legislativo dispõe o que é possível.
No caso do nepotismo, no entanto, a ousadia ultrapassou qualquer limite. Tanto que muitos falaram, mas poucos tiveram coragem de assinar embaixo da proposta de cotas.
Desse grupo restrito faz parte o deputado José Carlos Aleluia, ex-líder do DEM. Defende cotas pequenas, talvez até de um parente só. “Não se pode nomear a família toda”, pondera.
Aleluia acha a nova norma muito rigorosa. “Em cidades pequenas, por exemplo, são quase todos parentes uns dos outros”, argumenta. Não seja por isso, submetam-se a concursos.
Seja um ou um milhão, o parente fere o princípio da impessoalidade estabelecido para a administração pública na Constituição e quebra o preceito da igualdade uma vez que não considera o mérito profissional como regra acima de todas as outras.
Se o instrumento das cotas já é questionável em alguns setores como garantia para a inclusão de minorias, o que dizer da aplicação do conceito à parentela de agentes públicos com acesso ao robusto naco de postos a serem preenchidos pelo critério único do arbítrio?
A prosperar tal entulho, familiares de poderosos deverão ser vistos como pessoas portadoras de necessidades especiais. No caso, necessidade de levar vantagem sempre que possível, de preferência com o dinheiro dos outros.
A boa notícia é que os presidentes da Câmara e do Senado não aceitaram abrir o debate a respeito da decisão do Supremo. O senador Garibaldi Alves mandou saber quem são os parentes a serem demitidos e começou pelo próprio sobrinho que, a rigor, nem deveria ter sido empregado na Casa.
O deputado Arlindo Chinaglia aplaudiu a decisão do STF e avisou que não põe em votação projetos para mitigar o nepotismo. “Será um erro político dramático”, avalia.
Queira o bom senso que o passar do tempo, a saída do assunto do noticiário e as necessidades decorrentes da disputa pelas presidências da Câmara e do Senado daqui a seis meses não alterem posições.
De Minas
O juiz Marcos Flávio Lucas, do Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais, não entende que o governador Aécio Neves infrinja a lei quando aparece no horário gratuito de televisão do candidato da coligação PSB-PT, da qual o PSDB não faz parte.
Dessa forma, o prefeito petista de Belo Horizonte, Fernando Pimentel, não seria avalista de uma ilegalidade por aparecer ao lado de Aécio no mesmo programa.
Para o juiz, não havendo candidato tucano no páreo, Aécio Neves está livre para participar.
Elegante, o governador envia mensagem para contestar análise em artigo de quinta-feira sobre o tema, sem tentar se escorar na decisão judicial.
Diz Aécio Neves: “O impedimento a que você se referiu objetiva coibir a infidelidade partidária. Penso que você se equivocou na análise sobre minha participação no programa de TV do candidato Márcio Lacerda. Tenho participado ativa, e publicamente, da campanha por estar convicto de que ajo dentro da legalidade. O apoio à candidatura foi aprovado em convenção municipal do PSDB, que não integra qualquer coligação na capital. Jamais o faria se houvesse impedimento da lei”.
Tanto o juiz quanto o governador traduzem com liberalidade o artigo 54 da lei eleitoral, que diz o seguinte: “Dos programas destinados à propaganda eleitoral gratuita poderá participar qualquer cidadão não filiado a outra agremiação partidária ou a partido de outra coligação”.
O governador é filiado a uma agremiação partidária e esta não faz parte da coligação. Aécio escolheu Márcio Lacerda e não quis formalizar a aliança para fugir aos efeitos legais do já esperado veto do PT nacional.
Mas sobrou artigo 54, que exclui os integrantes de um partido do rol dos legalmente credenciados a aparecer no horário reservado a outra legenda ou coligação.
Não proíbe o governador de apoiar quem quiser. Apenas não o autoriza a fazê-lo no programa gratuito de televisão.
Fosse tão liberal a legislação, a formalidade seria um dado secundário na construção de alianças eleitorais.
PRAGA DO NEPOTISMO É PIOR QUE A SAÚVA
Villas-Bôas Corrêa
DEU NO JORNAL DO BRASIL
Um velho conselho do tempo em que se levava a sério a experiência dos mais velhos, recomendava evitar brigas com quem veste saia: mulher, padre e juiz.
O Congresso, um dos piores de todos os tempos, parece que não acreditou na sabedoria dos cabelos brancos e andou cutucando os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) com as caducas picuinhas da invasão da toga na área da exclusiva competência do Legislativo.
Pois, o troco custou, mas, valeu a pena esperar. Em decisão histórica, que equivale a uma varredura na praga do nepotismo que contamina os três poderes, o STF aprovou, por unanimidade, a redação definitiva da súmula vinculante, a do número 13 - que é o do azar e o da sorte - que estende a proibição da prática desavergonhada da nomeação de parentes, sem o aborrecimento do concurso público, em todos os poderes da União e não apenas no Judiciário.
Na longa caminhada do despudor, desde a derrubada do Estado Novo de Getúlio Vargas, em 45, até os nossos dias, com interrupção dos quase 21 anos da ditadura militar do rodízio dos cinco generais-presidente, a nomeação da parentela até os primos consangüíneos de casamento atravessou as pausas da austeridade. E caiu no deboche da interinidade de presidente do STF, ministro José Linhares que durou pouco - de 29 de outubro de 45 a 31 de janeiro de 1946, com a posse do presidente Eurico Gaspar Dutra - da gaiata convocação por edital dos parentes para a distribuição das últimas vagas, sob pena da nomeação à revelia.
Não se pode descuidar da vigilância da imprensa e do Congresso. Mas, se o Legislativo em todos os níveis entra na libertinagem, com o passo na cadência do governo e com o Judiciário fechando o desfile, sobra a imprensa para as denúncias que geram as CPIs que nunca chegam ao fim da linha.
Ainda agora, a irretocável resposta do STF atende às denuncias de jornais, revistas e redes de TV, como a recente reportagem do JB sobre a prática do tráfico de influência no Tribunal de Justiça do nosso maltratado Estado do Rio de Janeiro (TJ-RJ).
O STF cimentou a sua unanimidade ao acolher, no mérito, a ação declaratória de constitucionalidade proposta pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) para obrigar o cumprimento por tribunais regionais recalcitrantes e que nadavam nas águas da distribuição de cargos públicos para os parentes, desobedecendo a resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que proíbe a nomeação de parentes até o terceiro grau, cônjuges, companheiros e familiares e por afinidade para cargos em confiança e de comissão em todos os tribunais federais ou estaduais.
O nepotismo tem sete fôlegos e não desiste da briga pelas mordomias e mutretas que encontram no Congresso o canteiro perfeito para proliferar. Um bom exemplo de defesa dos seus privilégios foi pinçado de uma decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, que considerou que não era aplicável ao Executivo e ao Legislativo do município de Água Nova - que assim estréia na história - a proibição de nomear parentes até o terceiro grau na rifa dos cargos públicos.
Com a pisadela no calo de estimação, o STF aproveitou a deixa do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte para estabelecer a sua competência para, na falta de lei específica, aplicar a interpretação do Art. 37 da Constituição, que é de clareza meridiana ao definir que "a administração pública, direta ou indireta de quaisquer dos poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios obedecerá aos princípios da legalidade, da impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência".
Da lei à realidade, o pântano das trampas dos espertos, que sempre encontram o atalho para atravessar o atoleiro.
Se desta vez, a ofensiva moralizadora do Supremo for mesmo para valer vamos assistir ao espetáculo inédito de um regime drástico de emagrecimento da burocracia, com buracos em ministérios, autarquias e seus derivados, abrindo vagas para a urgente realização de concursos para a nomeação dos substitutos.
Confesso meu ceticismo na rendição do Congresso, com a boca torta por tantos anos e décadas de viciado no uso e abuso do nepotismo. E que gera filhotes espúrios de cabos eleitorais, os amigos de fé e os que são úteis na caça ao voto que garante a reeleição para o emprego milionário da semana útil de três dias.
Quem viver, verá. Com os acolchoados para amortecer a queda na buraqueira da decepção.
DEU NO JORNAL DO BRASIL
Um velho conselho do tempo em que se levava a sério a experiência dos mais velhos, recomendava evitar brigas com quem veste saia: mulher, padre e juiz.
O Congresso, um dos piores de todos os tempos, parece que não acreditou na sabedoria dos cabelos brancos e andou cutucando os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) com as caducas picuinhas da invasão da toga na área da exclusiva competência do Legislativo.
Pois, o troco custou, mas, valeu a pena esperar. Em decisão histórica, que equivale a uma varredura na praga do nepotismo que contamina os três poderes, o STF aprovou, por unanimidade, a redação definitiva da súmula vinculante, a do número 13 - que é o do azar e o da sorte - que estende a proibição da prática desavergonhada da nomeação de parentes, sem o aborrecimento do concurso público, em todos os poderes da União e não apenas no Judiciário.
Na longa caminhada do despudor, desde a derrubada do Estado Novo de Getúlio Vargas, em 45, até os nossos dias, com interrupção dos quase 21 anos da ditadura militar do rodízio dos cinco generais-presidente, a nomeação da parentela até os primos consangüíneos de casamento atravessou as pausas da austeridade. E caiu no deboche da interinidade de presidente do STF, ministro José Linhares que durou pouco - de 29 de outubro de 45 a 31 de janeiro de 1946, com a posse do presidente Eurico Gaspar Dutra - da gaiata convocação por edital dos parentes para a distribuição das últimas vagas, sob pena da nomeação à revelia.
Não se pode descuidar da vigilância da imprensa e do Congresso. Mas, se o Legislativo em todos os níveis entra na libertinagem, com o passo na cadência do governo e com o Judiciário fechando o desfile, sobra a imprensa para as denúncias que geram as CPIs que nunca chegam ao fim da linha.
Ainda agora, a irretocável resposta do STF atende às denuncias de jornais, revistas e redes de TV, como a recente reportagem do JB sobre a prática do tráfico de influência no Tribunal de Justiça do nosso maltratado Estado do Rio de Janeiro (TJ-RJ).
O STF cimentou a sua unanimidade ao acolher, no mérito, a ação declaratória de constitucionalidade proposta pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) para obrigar o cumprimento por tribunais regionais recalcitrantes e que nadavam nas águas da distribuição de cargos públicos para os parentes, desobedecendo a resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que proíbe a nomeação de parentes até o terceiro grau, cônjuges, companheiros e familiares e por afinidade para cargos em confiança e de comissão em todos os tribunais federais ou estaduais.
O nepotismo tem sete fôlegos e não desiste da briga pelas mordomias e mutretas que encontram no Congresso o canteiro perfeito para proliferar. Um bom exemplo de defesa dos seus privilégios foi pinçado de uma decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, que considerou que não era aplicável ao Executivo e ao Legislativo do município de Água Nova - que assim estréia na história - a proibição de nomear parentes até o terceiro grau na rifa dos cargos públicos.
Com a pisadela no calo de estimação, o STF aproveitou a deixa do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte para estabelecer a sua competência para, na falta de lei específica, aplicar a interpretação do Art. 37 da Constituição, que é de clareza meridiana ao definir que "a administração pública, direta ou indireta de quaisquer dos poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios obedecerá aos princípios da legalidade, da impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência".
Da lei à realidade, o pântano das trampas dos espertos, que sempre encontram o atalho para atravessar o atoleiro.
Se desta vez, a ofensiva moralizadora do Supremo for mesmo para valer vamos assistir ao espetáculo inédito de um regime drástico de emagrecimento da burocracia, com buracos em ministérios, autarquias e seus derivados, abrindo vagas para a urgente realização de concursos para a nomeação dos substitutos.
Confesso meu ceticismo na rendição do Congresso, com a boca torta por tantos anos e décadas de viciado no uso e abuso do nepotismo. E que gera filhotes espúrios de cabos eleitorais, os amigos de fé e os que são úteis na caça ao voto que garante a reeleição para o emprego milionário da semana útil de três dias.
Quem viver, verá. Com os acolchoados para amortecer a queda na buraqueira da decepção.
ETAPA DECISIVA
Merval Pereira
DEU EM O GLOBO
NOVA YORK. A campanha presidencial americana entra em sua fase decisiva na próxima semana, quando democratas e republicanos formalizarão a escolha de seus candidatos. Este ano há algumas novidades que podem influenciar na repercussão política das escolhas, a começar pelo fato de que, pela primeira vez, os dois partidos farão suas convenções em seguida - os democratas de 24 a 29 deste mês em Denver, no Colorado, e os republicanos, de 1 a 6 de setembro em St. Paul, Minneapolis. Historicamente, após a convenção, o candidato desafiante pode ganhar até dez pontos nas pesquisas eleitorais, e também o partido que realiza a convenção por último leva uma vantagem, pois pode neutralizar o ganho do adversário. Não se sabe qual será o efeito de uma convenção seguida da outra.
NOVA YORK. A campanha presidencial americana entra em sua fase decisiva na próxima semana, quando democratas e republicanos formalizarão a escolha de seus candidatos. Este ano há algumas novidades que podem influenciar na repercussão política das escolhas, a começar pelo fato de que, pela primeira vez, os dois partidos farão suas convenções em seguida - os democratas de 24 a 29 deste mês em Denver, no Colorado, e os republicanos, de 1 a 6 de setembro em St. Paul, Minneapolis. Historicamente, após a convenção, o candidato desafiante pode ganhar até dez pontos nas pesquisas eleitorais, e também o partido que realiza a convenção por último leva uma vantagem, pois pode neutralizar o ganho do adversário. Não se sabe qual será o efeito de uma convenção seguida da outra.
Também pela primeira vez um dos candidatos, o democrata Barack Obama, fará o discurso de aceitação em um estádio, o Invesco Field, com capacidade para 75 mil pessoas. Esses momentos são sempre muito emocionais, e Obama está jogando tudo nos seus recursos de oratória para voltar a ter uma diferença sobre o adversário John McCain, que nos últimos dias conseguiu reverter a situação e já é apontado como o líder em algumas pesquisas de opinião.
Uma novidade com cada vez menos chance de acontecer seria o anúncio da senadora Hillary Clinton como sua vice. O nome do companheiro (a) de chapa de Obama, que estaria escolhido, seria anunciado este fim de semana. O mais cotado até a noite de ontem era o senador Joe Biden, um especialista em política externa e presença forte no mundo político de Washington, o que demonstraria que Obama teria optado por uma escolha tradicional, com capacidade de neutralizar a ação política do clã Clinton na capital.
Apenas duas vezes na história das primárias adversários do mesmo partido reconciliaram-se, formando uma chapa vencedora: John F. Kennedy escolheu Lyndon Johnson como seu companheiro de chapa em 1960 e Ronald Reagan colocou George Bush pai em 1980.
A escolha de Lyndon Johnson foi a mais surpreendente, e também a mais fundamental para a vitória do Partido Democrata. Naquele ano Kennedy derrotou Richard Nixon, o candidato republicano, por 0,2% dos votos, e muitos acreditam que, muito mais do que a performance de Kennedy no debate de televisão, se não fosse o controle absoluto que Johnson tinha do Partido Democrata no Texas, eles não teriam vencido.
Embora tenha se mostrado um companheiro de chapa cooperativo, Johnson, um texano milionário e rude, nunca escondeu suas diferenças de Kennedy, especialmente com relação ao elitismo intelectual que ele levou para a Casa Branca.
Quando assumiu a Presidência, com o assassinato de Kennedy, Johnson costumava despachar com os intelectuais antigos assessores de Kennedy sentado na privada.
Já Reagan chamou George Bush pai para sua chapa para unir o partido, embora haja um consenso sobre o fato de que venceria fosse qual fosse o candidato a vice, tal sua popularidade.
O mais provável, porém, é que aconteça com a senadora Hillary o que aconteceu com o mesmo Reagan em 1976, quando perdeu a indicação do Partido Republicano para Gerald Ford e permaneceu sem apoiá-lo, o que muitos consideram ter sido fator fundamental para a derrota de Ford para Jimmy Carter. Quatro anos depois, Reagan era escolhido o candidato republicano e derrotaria Jimmy Carter.
Há quem veja na atitude permanentemente hostil por parte dos Clinton a tentativa de se manter como uma alternativa viável para os democratas em caso de derrota de Obama em novembro, ou se um futuro eventual governo democrata vier a ser um fracasso, exatamente como no caso de Carter, que muitos vêem com semelhanças a Obama.
Causam desconforto nos partidários de Barack Obama dentro do partido as muitas exigências que foram obrigados a aceitar, até mesmo incluir o nome da senadora Hillary Clinton na cédula de votação para que os delegados seus partidários possam votar nela.
Oficialmente, ela pede espaço para "uma catarse" de seus eleitores. Mas há quem relembre que, ainda durante as primárias, ela, num ato falho para justificar sua insistência em não desistir da candidatura apesar da dianteira de Obama, lembrou que Bob Kennedy estava praticamente escolhido candidato quando foi assassinado em junho.
Embora os dois candidatos comecem a campanha oficial das convenções com bastante dinheiro em caixa, os partidos tiveram dificuldades semelhantes para levantar dinheiro para as festas grandiosas que estão promovendo.
O mais afetado, porém, foi o candidato Barack Obama, que teve que aceitar que o partido pedisse financiamento a empresas, sindicatos e associações, usando a legislação do "soft Money", que permite o financiamento aos partidos, e não diretamente aos candidatos.
Obama, que recusou o financiamento público que dará a McCain nada menos que U$84 milhões nesta parte decisiva da campanha, sempre criticou a utilização dessa brecha legal, mas teve que encarar o fato de que os US$60 milhões necessários para cobrir as despesas da convenção não surgiriam se não por intermédio de grandes contribuições.
O Partido Democrata está vendendo lugares em camarotes especiais no estádio para ouvir o discurso de aceitação de Barack Obama e contribuições de U$1 milhão dão direito, além de lugares especiais no estádio, a hotéis também especiais e até mesmo a encontros com assessores do candidato democrata.
O CASSINO MIRA A RÚSSIA
Clóvis Rossi
DEU NA FOLHA DE S. PAULO
MADRI - O presidente George Walker Bush esperneia, grita, ameaça -e as tropas russas mexem-se com provocadora lentidão na retirada da Geórgia. A Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte, criada justamente para fazer frente à então União Soviética) ameaça, mas nenhum soldado russo treme.
O único poder que faz tremer a Rússia é o do dinheiro. Desde o início da guerra, o país perdeu US$ 16,4 bilhões em reservas, a maior sangria desde o colapso de 1998, ano em que a Rússia deu o calote (que, por sua vez, foi o gatilho para o colapso do real meses depois).
É verdade que a sangria não foi provocada apenas pela guerra. Há também o temor de que o sufoco creditício que ocorre nos Estados Unidos e na Europa esteja chegando veloz e assustadoramente à Rússia. Mas, de todo modo, até Gennady Melikyan, vice-presidente do Banco Central, disse ao jornal britânico "Financial Times" que a queda de reservas havia sido provocada pela "situação política", eufemismo para a guerra.
É mais uma evidência de que os poderes de fato remanescentes no planeta não estão na Casa Branca, em Pequim, em Moscou, mas, sim, em Wall Street e nas demais ruas em que se localizam os braços do tentacular mundo financeiro.
Há um remoto parentesco entre a Rússia e o que George Soros disse à Folha durante a campanha eleitoral de 2002 no Brasil: "Ou Serra ou o caos", provocado pela especulação dos agentes financeiros. "Não é antidemocrático?", perguntei, então, tolinho como sempre. "É -respondeu Soros-, mas é como na Roma antiga: votam os patrícios" (no caso, os meninos do mercado).
No Brasil, Lula ganhou, aplacou a sede de sangue das piranhas e tudo se acalmou. Na Rússia, basta dar lucro aos apostadores que ninguém vai ligar para Geórgia, Ossétia do Sul, Putin, Bush, Medvedev, Sarkozy ou quem quer que seja.
MADRI - O presidente George Walker Bush esperneia, grita, ameaça -e as tropas russas mexem-se com provocadora lentidão na retirada da Geórgia. A Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte, criada justamente para fazer frente à então União Soviética) ameaça, mas nenhum soldado russo treme.
O único poder que faz tremer a Rússia é o do dinheiro. Desde o início da guerra, o país perdeu US$ 16,4 bilhões em reservas, a maior sangria desde o colapso de 1998, ano em que a Rússia deu o calote (que, por sua vez, foi o gatilho para o colapso do real meses depois).
É verdade que a sangria não foi provocada apenas pela guerra. Há também o temor de que o sufoco creditício que ocorre nos Estados Unidos e na Europa esteja chegando veloz e assustadoramente à Rússia. Mas, de todo modo, até Gennady Melikyan, vice-presidente do Banco Central, disse ao jornal britânico "Financial Times" que a queda de reservas havia sido provocada pela "situação política", eufemismo para a guerra.
É mais uma evidência de que os poderes de fato remanescentes no planeta não estão na Casa Branca, em Pequim, em Moscou, mas, sim, em Wall Street e nas demais ruas em que se localizam os braços do tentacular mundo financeiro.
Há um remoto parentesco entre a Rússia e o que George Soros disse à Folha durante a campanha eleitoral de 2002 no Brasil: "Ou Serra ou o caos", provocado pela especulação dos agentes financeiros. "Não é antidemocrático?", perguntei, então, tolinho como sempre. "É -respondeu Soros-, mas é como na Roma antiga: votam os patrícios" (no caso, os meninos do mercado).
No Brasil, Lula ganhou, aplacou a sede de sangue das piranhas e tudo se acalmou. Na Rússia, basta dar lucro aos apostadores que ninguém vai ligar para Geórgia, Ossétia do Sul, Putin, Bush, Medvedev, Sarkozy ou quem quer que seja.
UMA NOVA 'LEI DE EMERGÊNCIA'
Editorial
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO
Para tentar coibir a expansão das milícias no Rio de Janeiro, a Câmara dos Deputados acaba de aprovar por votação simbólica um projeto que altera dispositivos do Código Penal que tratam de delitos coletivos, tipificando como crime a formação de grupos de extermínio e os atos de violência por eles cometidos. A proposta, que tramitou em regime de urgência e foi votada em tempo recorde pela Comissão de Segurança e pelo plenário, prevê pena de quatro a oito anos de reclusão, que pode ser aumentada de um terço à metade caso o crime tenha sido cometido “sob pretexto de oferecer serviços de segurança”.
O texto, que será enviado ao Senado, é a fusão de dois projetos, um apresentado pelo deputado Luiz Couto (PT-PB), que presidiu a CPI dos Grupos de Extermínio, e outro de autoria do deputado Raul Jungmann (PPS-PE), presidente da Comissão de Segurança. Ao justificar a iniciativa, eles alegaram que os assassinatos cometidos por milícias e quadrilhas do narcotráfico afrontam a autoridade do poder constituído, o Estado de Direito e a própria democracia.
“Em algumas regiões do Rio de Janeiro, há situações de exceção, em que eleitores não podem escolher seus candidatos e são reféns da milícia e do tráfico”, diz Jungmann. “Hoje há uma matança de jovens. São pessoas que pertencem ao narcotráfico e, quando querem sair, são exterminadas, ou porque sabem demais ou por decidirem romper com aquele grupo e ter vida própria”, acrescenta Couto.
O projeto aprovado classifica como crime a criação, a organização e o financiamento de “organização paramilitar, grupo ou esquadrão”. Também estabelece que a oferta de serviços de segurança sem autorização legal é crime passível de pena de detenção de um a dois anos. A medida mais importante classifica esses dois delitos como “crime federal”, por serem “ofensa de interesse da União”. Com isso eles não podem ser investigados pela Polícia Civil, denunciados pelo Ministério Público Estadual e julgados pela Justiça comum, passando a ser de competência exclusiva da Polícia Federal, do Ministério Público Federal e da Justiça Federal.
Na realidade, esse é mais um exemplo do que os juristas chamam de “legislação penal de emergência”, ou seja, inovações legais concebidas açodadamente para aplacar a comoção popular e “mostrar serviço” à sociedade. Votadas às pressas, essas inovações muitas vezes se justapõem a medidas já previstas no Código Penal ou em leis especiais. Como conseqüência, ficam comprometidas a unidade doutrinária e a racionalidade lógico-formal do sistema jurídico, o que dificulta a aplicação da lei por parte dos juízes criminais.
Além disso, ao aumentar o rigor das punições aplicáveis a determinados delitos, inovações legais votadas às pressas acabam desequilibrando o sistema de penas da legislação criminal. Por fim, elas também criam problemas de competência entre os órgãos policiais, gerando zonas cinzentas entre as diferentes instâncias encarregadas de zelar pela segurança pública e disputas entre corporações policiais.
Em outras palavras, na maioria das vezes a “legislação de emergência” é desnecessária, dificultando, em vez de facilitar, o combate à violência criminal. A tipificação do crime de formação de milícias, grupos de extermínio, esquadrões da morte e “polícias mineiras” já está no Código Penal de 1940, no dispositivo que trata do delito de formação de bando, gangue ou quadrilha. O artigo 288 prevê expressamente que, quando mais de três pessoas se associarem para cometer crimes, elas serão condenadas a pena de reclusão de 1 a 3 anos. Se agirem armadas, a pena é de três a seis anos, sendo a ela acrescida a punição prevista para outros delitos cometidos - no caso de homicídio simples, por exemplo, de 6 a 20 anos de cadeia.
A proliferação de milícias e grupos de extermínios nada tem a ver com falhas e omissões da legislação penal. O problema decorre basicamente da inépcia dos encarregados da segurança pública e da falta de rigor da Justiça. Dificilmente medidas aprovadas a toque de caixa pelo Congresso, tipificando crimes já previstos pelo Código Penal, surtirão efeitos práticos.
O que pensa a mídia
EDITORIAIS DOS PRINCIPAIS JORNAIS DO BRASIL
http://www.pps.org.br/sistema_clipping/mostra_opiniao.asp?id=1066&portal=
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