sábado, 20 de março de 2010

Reflexão do dia – Fernando Henrique Cardoso

"Nabuco até aprecia a monarquia na Inglaterra, mas seu lado de pensador político está colocando ênfase no direito dos cidadãos, na liberdade e na possibilidade de acesso à Justiça para todos".


(Fernando Henrique Cardoso, em palestra, 5ª feira, na Academia Brasileira de Letras)

O preço político:: Merval Pereira

DEU EM O GLOBO

O deputado federal Ibsen Pinheiro tem dito muitas coisas absurdas nos últimos dias, e parece inebriado pela súbita popularidade de que desfruta desde que apresentou um projeto de lei alterando a distribuição dos royalties do petróleo, provocando com isso uma desagregação federativa que está difícil de resolver.

Como aquele juiz de futebol que adorava ser xingado pela multidão,Ibsen a cada dia consegue dizer mais barbaridades do que no dia anterior, e parece especialmente satisfeito em afrontar o Rio de Janeiro e seus cidadãos.

Deve ter razões especiais, ou, como disse o senador Francisco Dornelles, está perdendo a sanidade mental e precisa da compaixão dos fluminenses. Mas ele tem razão quando insinua que seu projeto não teria a aprovação esmagadora que obteve na Câmara se o governo não quisesse, ou se pelo menos tivesse interesse em não aprová-lo.

O presidente Lula se colocou como o garantidor de um acordo que mantinha a distribuição dos royalties do petróleo como estavam até o momento nas áreas já licitadas, inclusive em 30% do pré-sal.

Pelo acordo, feito no relatório do deputado Henrique Alves, os estados produtores ficariam com 25% das receitas obtidas coma cobrança de royalties do pré-sal, em vez dos 18% anteriormente propostos.

Os municípios produtores teriam direito a 6% dos royalties; os municípios afetados pelas operações de embarque e desembarque de petróleo ficariam com 3%, e todos os demais estados e municípios da federação passariam a receber 44% dos royalties.

Em contrapartida, os royalties da União seriam reduzidos de 30% para 22%.

A emenda de Ibsen Pinheiro colocou abaixo o acordo com a oposição e abriu o apetite dos estados e municípios contra os estados produtores.

Esse acordo original foi alcançado graças ao trabalho conjunto dos três governadores de estados produtores, Sérgio Cabral, do Rio de Janeiro,Paulo Hartung, do Espírito Santo, e José Serra, de São Paulo, e saiu de uma reunião no Palácio da Alvorada, onde os ministros das Minas e Energia, Edison Lobão, e a chefe do Gabinete Civil, Dilma Rousseff,defenderam propostas semelhantes à do deputado Ibsen Pinheiro sobre a distribuição dos royalties do pré-sal.

Foi o governador José Serra quem sugeriu, obtendo o apoio dos governadores e do próprio presidente Lula, que não se mexesse na distribuição dos royalties num ano eleitoral.

O presidente Lula, aliás, disse em entrevista na sua viagem ao Oriente Médio que já antevia que em ano eleitoral muita gente ia querer fazer gracinha com o assunto.

O ministro Nelson Jobim, da Defesa, que também participou da reunião, redigiu pessoalmente uma mudança no projeto do governo, que garantia que nada seria alterado.

Mas sabia-se naquela reunião que o Congresso poderia fazer alterações. E mais que isso, que setores fortes do governo tinham entendimento distinto sobre a distribuição dos royalties.

O ministro Edison Lobão, por exemplo, chegou a ter uma discussão ríspida com o governador Sérgio Cabral, já relatada aqui na coluna, em que garantiu que havia conversado com ele sobre as alterações.

Não é verdade, reagiu Cabral, garantindo que já avisara ao ministro que não aceitava a mudança da repartição dos royalties dos estados produtores.

Os três governadores tinham como objetivo central naquela noite garantir que a divisão dos royalties se mantivesse inalterada, o que conseguiram, até que a emenda Ibsen Pinheiro alterasse o acordo.

O governador Sérgio Cabral agiu emocionalmente o tempo todo, inclusive naquela reunião do Alvorada, quando teve que ser acalmado várias vezes por Lula e teve discussão também com o ministro da Comunicação Social, Franklin Martins, que defendia a mudança para o sistema de partilha, dando como exemplo de sucesso a Líbia de Kadafi, arrancando uma risada de Cabral.

Depois,quando foi apresentado o projeto, o governador do Rio chegou a dizer que um grupo de parlamentares de vários partidos está com uma postura de como quem quer defender seu estado e quer roubar o Rio de Janeiro. Isso é um absurdo.

Quando, ao final de muitas idas e vindas, o projeto do deputado Ibsen Pinheiro foi aprovado, Cabral chegou a chorarem público, e convocou uma passeata de protesto.

Sua decidida defesa dos interesses do estado pode lhe trazer reconhecimento do eleitorado, mas a confiança que depositou no presidente Lula, sem ser correspondido, pode prejudicar sua imagem.

Até o momento, não tem demonstrado capacidade de negociação dentro do Congresso, se fiando muito no apoio do governo federal.

O governador paulista, José Serra, que se envolveu no primeiro momento da discussão, saiu de cena no decorrer do debate, dando a parecer que a definição da questão não interessava muito a seu estado.

A articulação paulista na Câmara foi pior que a do Rio, e muitos deputados, inclusive do PSDB, votaram a favor da emenda Ibsen.

Serra teve uma primeira reação inteiramente equivocada ao dizer que não sabia detalhes da questão dos royalties, pois só lera pelos jornais, e teve que tentar recuperar a posição no dia seguinte, quando deu uma declaração firme contra a alteração da distribuição, se reincorporando à luta ao lado do Rio e do Espírito Santo.

Já a ministra Dilma Rousseff não ficou em cima do muro, mesmo correndo o risco de ir contra a maioria dos estados.

Diferentemente do presidente Lula, ela antecipou sua posição a favor da manutenção do sistema atual de divisão dos royalties.

Quando o presidente Lula lavou as mãos e disse que cabia ao Congresso resolvera pendenga, ele já sabia que não tem muito a fazer.

Ou, como insinua o deputado Ibsen Pinheiro, não quer ter muito a fazer.

Todos os personagens dessa quase Secessão tupiniquim pagarão um preço político nas próximas eleições.

Para o que der e vier:: Dora Kramer

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Percebido por aliados e adversários como uma incógnita no cenário eleitoral, o deputado Ciro Gomes não vê razão para o mistério: é pretendente a candidato à Presidência da República pelo PSB.

Eventuais variações não serão decorrentes de sua vontade, mas uma imposição das circunstâncias. Se o partido preferir apoiar Dilma Rousseff, seguirá a orientação preservando, porém, a condição de “eleitor crítico”.

Quanto à candidatura ao governo de São Paulo, só existe uma “ínfima” possibilidade: se o presidente Luiz Inácio da Silva avaliar que é a melhor solução para atenuar a vantagem do candidato do PSDB à Presidência, José Serra, em São Paulo.

Aloizio Mercadante não daria conta desse recado? “Claro, acho que dá perfeitamente”, diz Ciro para acentuar a visão de que São Paulo “não precisa dele” e, ao mesmo tempo, deixar bem claro que não tem a menor identidade com o projeto.

Nada a ver com a reação contrária do PT paulista. Para esta, reserva ironia: “Rugas de preocupação.” Então, por que mudou o domicílio eleitoral do Ceará para São Paulo? Antes da explicação, um parêntese: o domicílio voltará ao Ceará assim que possível.

A mudança ocorreu porque em setembro, antes de vencer o prazo para a transferência do domicílio, foi feita uma avaliação conjunta entre o presidente Lula e a direção do PT. Chegou-se à conclusão de que a hipótese de Ciro ser candidato em São Paulo poderia levar José Serra a desistir da candidatura presidencial para não arriscar a perda do controle do PSDB no estado.

Ademais, como o irmão de Ciro, Cid Gomes, é governador do Ceará, Ciro só poderia concorrer a deputado federal, nunca a deputado estadual, senador ou governador, por razões legais. E da Câmara dos Deputados Ciro quer distância.

Além de se sentir um inútil – “ponho o terno, bato ponto, denuncio milhões de safadezas e a mídia não dá a menor bola” –, está farto de conviver com o ambiente de negociatas que testemunha diariamente e sustentam suas críticas à “moral frouxa”da parceria entre PT e PMDB, extensivas à aliança PSDB-DEM.

Uma das razões pela qual Ciro acha que contribui sendo candidato a presidente é que, ao contrário de Dilma Rousseff, pode levar a discussão sobre a necessidade de se alterar as relações promíscuas e viciadas entre os poderes. “Essas coisas não são feitas em nome da governabilidade coisa nenhuma. São feitas em nome da manutenção do poder puro e simples e acho que há espaço e possibilidade de se construir, com o poder da Presidência e a compreensão da sociedade, uma relação diferente.”

Muito bem, mas esse discurso, na campanha, não acabaria por ser de crítica a Dilma? “De fato. Se me perguntam, digo que tenho mais experiência, projeto, circunstância política e posso dizer coisas que ela não pode.”

Ciro vê Dilma como favorita, mas não enxerga o quadro como definido. Lembra que nas eleições anteriores as pesquisas de fevereiro não representaram os resultados das eleições e estabelece três fatores de definição: o clima, a persona política, a qualificação do candidato.

O clima, segundo ele, é favorável a Dilma. No quesito “persona”, ela e Serra se igualam na carência de empatia, “eu sou o docinho da vez”. No item qualificação do candidato, elogia o preparo dos concorrentes, reconhece a substância do principal oponente, mas quando o assunto é excelência não tem para ninguém: “Eu me basto.”

Pé no chão

O presidente não precisaria ir tão longe, até o Oriente Médio para mediar conflitos. Bastaria ter exercitado suas habilidades aqui mesmo, mediando no Congresso assuntos importantes como as reformas política, trabalhista, sindical e tributária.

Ou patrocinar o entendimento federativo em torno dos royalties do petróleo.

Fora dessa

A assessoria do líder do PMDB na Câmara e relator do projeto de regulamentação da exploração do petróleo, Henrique Eduardo Alves, esclarece que a emenda Ibsen Pinheiro não foi incluída por ele no relatório, mas apresentada direto ao plenário.

O PT e o tempo:: Fernando Rodrigues

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

BRASÍLIA - Ninguém duvida que o tempo opere milagres e cicatrize feridas. O PT sabe disso. Sigla lulo-dependente em grau máximo e capacidade de formulação mínima, decidiu seguir o conselho do presidente. Lançará novamente ao governo de São Paulo o nome do senador Aloizio Mercadante.

A ideia de Lula parece lógica: "Lancem sempre o mesmo nome para o governo de São Paulo que um dia o PT ganha". Nunca até hoje um petista disputou duas vezes o Palácio dos Bandeirantes. Mercadante será o primeiro. Com esperança de o tempo se incumbir de envernizar e lustrar sua biografia.

Economista, o senador petista tem como obra mais genial o conselho dado a Lula e ao PT em 1994. Recomendou ao partido atacar o Plano Real. Para ele, seria um fracasso certo. Errou feio. Lula foi derrotado por FHC no primeiro turno. Eleito senador em 2002, Mercadante teve 10,5 milhões de votos.

Quatro anos depois, em 2006, conseguiu a proeza de disputar o Palácio dos Bandeirantes e encolher sua marca para 6,8 milhões de votos -em meio ao escândalo da mala de dinheiro usada por um de seus assessores na tentativa de comprar um dossiê antitucano.

Líder do PT no Senado, Mercadante brilhou pouco. Sem poder, chegou a anunciar no microblog Twitter sua renúncia ao cargo em caráter irrevogável. Não concordava com alguns petistas a favor de salvar José Sarney de uma merecida investigação. A nobreza durou pouco. Enquadrado por Lula, humilhado, revogou o irrevogável.

Como senador, sua ação mais positiva foi um apoio tardio à lei que liberou o uso da internet nas eleições. Nesta semana, tirou proveito disso. Punido por aparecer na TV fazendo propaganda fora de hora, colocou seu comercial na web.

Esse será o candidato do PT ao governo paulista. Pois o tempo opera milagres -e Lula deu a ordem para o nome ser repetido à exaustão.

Verônica Ferriani - Me deixa em paz (Som Brasil Ivan Lins)

O blefe de Lula:: Villas-Bôas Corrêa

DEU NO JORNAL DO BRASIL

Irritado com a derrota na Câmara, articulada por mansos dissidentes da sua dispendiosa maioria, o presidente Lula aproveitou a viagem a Israel para, como mensageiro da paz, dar um aperto nos seus aliados na Câmara, que embarcaram na canoa furada do deputado Ibsen Pinheiro, outro que subiu à tona depois de anos em que não foi visto nem falado. Mas é de uma evidência que entra pelos olhos que Lula, com baralho na mão, deu as cartas marcadas para o blefe na hora certa.

É só raciocinar sem paixão: depois de uma ousada articulação internacional, em que tantos se destacaram, para trazer para o Brasil a Copa do Mundo de 2014, já no governo do seu sucessor, provavelmente sucessora, e os Jogos Olímpicos de 2016, o presidente não aceitará a jogada eleitoreira da oposição de virtualmente botar tudo a perder. O governador do Rio, Sérgio Cabral, não está tocando fogo na palha para espantar fantasmas quando repete à exaustão que, se com a punga, a verba dos royalties de petróleo for reduzida a uma esmola, ele não terá como realizar as obras para preparar a cidade para receber os dois maiores eventos esportivos do mundo.

E, sem o Rio, nem Copa do Mundo nem Olimpíada. Ora, Lula está em campanha, acaba até de ser multado em R$ 5 mil pelo discurso de comício na visita a obra do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) ao lado da candidata Dilma. As últimas pesquisas de opinião confirmam a ascensão da sua candidata, que se encosta no governador José Serra, de São Paulo, e virtual candidato da oposição.

A estratégia do presidente é transparente. A primeira guerrilha será no Senado, uma maioria que dá e sobra para uma articulação objetiva e direta: se não for derrubada ou negociada a emenda do deputado Ibsen Pinheiro, Lula cumprirá a palavra empenhada com o governador Sérgio Cabral de vetar o monstrengo. É a última porta a ser aberta.

Não é tudo: a passeata dos 150 mil do Rio, debaixo de chuva torrencial, aplaudida ao longo do trajeto da Candelária à Cinelândia é como tocar fogo em pólvora. Uma nova derrota no Senado de senhores e senhoras de cabelos grisalhos, e a população voltará às ruas. Muito mais bem informados pela imprensa, televisão, rádio e internet, os “traidores” da Copa e da Olimpíada não terão como fazer um comício em qualquer cidade do Rio. E vamos reviver a época das grandes passeatas. Das suas maiores desde a ditadura militar de 1964: a dos Cem Mil, que também saiu da Candelária e ocupou toda a Avenida Rio Branco até o Monroe, e acabou no AI-5. E a das Diretas Já, com 1 milhão de pessoas espremidas do palanque em frente à Igreja da Candelária até o Ministério da Guerra. As Diretas Já foram derrotadas pelo Congresso humilhado pelas cassações de mandato, no negrume da censura à imprensa e das violências, torturas e mortes nas masmorras dos Doi-Codi.

Assisti às duas. A dos Cem Mil caminhando pela Avenida Rio Branco entre os caras-pintadas do apoio dos estudantes e uma massa humana que era um corte em toda a sociedade, dos ricos aos populares já empanzinados de ditadura. E a do milhão do palanque ao lado dos dois líderes de temperamentos opostos. O visionário deputado Ulysses Guimarães, olhos marejados ao contemplar a multidão, sustentava o seu otimismo na certeza de que o Congresso não resistiria à pressão de 1 milhão que exprimiam toda a população. Do outro lado do palanque, a sabedoria mineira do senador Tancredo Neves racionava pelo avesso de Ulysses: o que eles teriam para dizer ao povo com a derrota inevitável das Diretas Já por um Congresso submisso à ditadura?

Acertou na mosca.

O que não é o caso. A crise política do Brasil está agora em Brasília. E o escândalo da distribuição de pacotes de notas pelo ex-governador José Arruda, hoje preso, aguardando julgamento é a mais clara advertência de que a população da capital, construída por Juscelino Kubitschek e reconhecida como Patrimônio da Humanidade, graças ao gênio de Oscar Niemeyer e à dança das suas curvas, tem uma dívida com o país.

Quando Brasília fará a passeata que está devendo ao Brasil? Pacífica, sem violência, conforme o modelo da do Rio de Janeiro, que não registra um único incidente. E não há tempo a perder. O presidente Lula e a candidata Dilma precisam ser cobrados pela população que a Câmara ultrajou.

Serra candidato: adversário não é Lula

DEU EM O GLOBO

Governador tucano admite pela 1ª vez disputar Presidência contra Dilma

O governador de São Paulo, José Serra (PSDB), que há meses vem sendo cobrado por seus aliados para assumir sua pré-candidatura à Presidência, enfim admitiu ontem que disputará a sucessão do presidente Lula. No dia em que completou 68 anos, Serra disse, em entrevista ao apresentador José Luiz Datena, da TV Bandeirantes, que sua candidatura será lançada em abril, e fez questão de frisar que concorrerá contra a ministra Dilma Rousseff, candidata do PT, e não contra Lula. "A população vai julgar não quem já foi presidente ou quem é, mas quem é candidato", afirmou o tucano.

Enfim, o jogo começa

Serra admite que será candidato e diz que disputará contra Dilma, e não contra Lula

Sergio Roxo

SÃO PAULO -No dia em que completou 68 anos, e se livrou de seu suposto inferno astral, o governador de São Paulo, José Serra (PSDB), falou como candidato e admitiu publicamente, pela primeira vez, que disputará a sucessão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Em entrevista ao apresentador José Luiz Datena, da TV Bandeirantes, o tucano disse que não teme enfrentar a popularidade do presidente Lula porque ele não será candidato nem vai governar, e que a comparação será, portanto,entre ele e a candidata do PT, a ministra Dilma Rousseff.

O tucano, que vinha resistindo há meses a confirmar que é candidato, disse que o lançamento da candidatura será no mês que vem.

Faltam poucos dias. No começo de abril respondeu.

Sobre o fato de Lula ser forte cabo eleitoral para Dilma, Serra afirmou: A população vai julgar não quem já foi presidente ou quem é, mas quem é candidato. Quem vai governar o Brasil no futuro.

E aí vai fazer o seu juízo melhor. Agora, decidi o seguinte: campanha para mim é só quando ela começar.

Eu não me antecipei. Meu trabalho de governador ficou sendo trabalho de governador. Vou fazer isso até o último momento.

O apresentador perguntou se ele não estaria demorando muito: Não, não estou demorando.

Tem seis meses depois ainda para fazer campanha eleitoral. É muito cedo para começar e aí você prejudica o trabalho que está fazendo, que no meu caso é o trabalho de governador.

Quando o apresentador concluiu que a estratégia da campanha de Serra então será evitar a comparação com Lula e insistir em fazer isso com Dilma,já que é ela quem vai governar, caso seja eleita, o tucano confirmou: É, e tem uma coisa: quando você é eleito, assim como eu fui prefeito e sou governador, quem toma as decisões, inclusive nos momentos difíceis, é o prefeito, o governador e o presidente.


Isso é insubstituível. Não há delegação nesse caso, e você responde ao povo que te deu o voto. Não há ninguém que governe com alguém paralelamente,nem acho que esse seja o caso, nem o Lula pretenderia fazer isso, mas isso não funcionaria no Brasil e em nenhum lugar do mundo.

Sempre falando como candidato, Serra minimizou a influência de Lula em outro momento da entrevista: A população vai escolher em função de como são os candidatos, porque o Brasil está decidindo o seu futuro.

Aconteceu muita coisa boa no Brasil, (mas) ainda tem problemas. (O povo vai escolher) quem é mais capaz de garantir as coisas boas e melhora-las e quem é capaz de enfrentar os problemas. Naturalmente, aí pesam as ideias, as propostas, e pesa o passado, o que cada um fez. Como é que foi provado na vida pública, e isso vai ser mostrado, vai ser julgado pelos diferentes candidatos, e o povão vai resolver.

Resolver bem como sempre fez.

Ao ser perguntado por que vinha negando a candidatura, disse: Não estou negando. Estou dizendo que, neste momento, enquanto estiver no governo,não vou fazer campanha.

O tucano também comentou o crescimento de Dilma nas pesquisas de intenção de voto.

Ela tem tido uma exposição bastante grande. A campanha eleitoral acelera depois da Copa do Mundo, quando a população começa a fazer um juízo mais pessoal dos candidatos.

Aí a gente vai ver o que acontece.

Perguntado por Datena se acha que leva vantagem diante do fato de já ter tido diversos cargos públicos, Serra evitou comparar: Seria meio pretensioso da minha parte dizer que sou melhor.

Sobre a possibilidade de o governador de Minas, Aécio Neves (PSDB), ser vice em sua chapa, disse: Essa coisa de vice é para muito mais adiante. Para o fim de maio, junho, ainda tem tempo pela frente.

Serra assume candidatura ao Planalto

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Em entrevista a emissora de TV, governador anuncia que iniciará campanha em abril e diz que alta da ministra Dilma Rousseff nas pesquisas não o assusta

O governador de São Paulo, José Serra (PSDB), assumiu pela primeira vez sua candidatura à Presidência. Em entrevista à TV Bandeirantes, Serra, questionado sobre quando lançaria a candidatura, disse: "No começo de abril". O tucano afirmou que o avanço da pré-candidata petista, Dilma Rousseff, nas pesquisas "não assusta" e que isso já era esperado "pelo grau de exposição dela". A respeito da campanha, Serra disse que seria "pretensioso" comparar-se a Dilma, mas afirmou que o eleitor vai decidir "quem é mais capaz de garantir as coisas boas e melhorá-las e quem é capaz de enfrentar os problemas", razão pela qual o que pesa "é o passado" dos candidatos, "como é que foi provado na vida pública". Sobre o vice em sua chapa, Serra disse que é uma escolha a ser feita "muito mais adiante".

Serra assume candidatura e diz que crescimento de Dilma não assusta

Sucessão. Anúncio sobre a saída do governo paulista no início de abril para se dedicar à campanha presidencial foi feito de maneira cautelosa, sem afirmação explícita, durante entrevista para a TV no diaem que o governador comemorou seu 68º aniversário

Silvia Amorim

O governador de São Paulo, José Serra (PSDB), falou ontem abertamente,pela primeira vez, sua candidatura à Presidência da República e disseque o crescimento da ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff,pré-candidata do PT ao Planalto, nas pesquisas de intenção de voto "não assusta".

"São cinco pontos de diferença. Mas não me assusta não, até porque eu estava prevendo", afirmou o tucano em entrevista ao jornalista José Luiz Datena, do programa SP Acontece, um dos mais populares da TV Bandeirantes. Pesquisa CNI-Ibope divulgada na quarta-feira mostrou Serra com 35% e Dilma com 30%. Em fevereiro, a vantagem do tucano era de 11 pontos porcentuais, segundo o mesmo instituto.

Depois de um silêncio absoluto sobre eleição nos últimos dias, Serra admitiu, no dia em que comemorou 68 anos, que será candidato quando confirmou a data de sua saída do governo estadual. "Faltam poucos dias. No começo de abril", afirmou o governador.

Diante da declaração do apresentador de que o tucano estava ali anunciando sua postulação, ele minimizou - a oficialização será em evento em Brasília no dia 10 -, mas falou como se fosse candidato no restante da entrevista. "Não estou negando. Apenas dizendo que neste momento, enquanto eu estiver no governo, não vou fazer campanha."

O tucano rechaçou críticas de que esteja demorando para iniciar a campanha. "Não estou demorando. Tem seis meses para fazer campanha eleitoral."

Em uma crítica indireta à adversária, o governador afirmou que não antecipará o enfrentamento. "Campanha para mim é depois. Eu não antecipei. Meu trabalho de governador ficou sendo meu trabalho de governador e vou fazer isso até o último momento." A oposição acusa Dilma e Lula usarem compromissos de governo para promover a candidatura petista.

Vice. Sobre a vaga de vice, disse que é uma escolha feita "muito mais adiante". "É assunto para ser resolvido no fim de maio, junho",afirmou. Os tucanos ainda esperam que o governador de Minas, Aécio Neves, aceite o convite de Serra para dividir a chapa tucana ao Planalto.

Repetindo discurso usado à exaustão pelas lideranças do PSDB nos últimos dias, Serra atribuiu a escalada de Dilma nas pesquisas a uma"grande exposição" na mídia. "Pela grande exposição dela e também pelo grau de crescimento que tem o PT. O PT tem sempre no mínimo 30%."

Ele mostrou-se confiante numa arrefecida desse avanço. "Acho que vaiter muito tempo pela frente e esse efeito (Dilma) vai passar."

Antecipando um discurso que deverá ser entoado muito na campanha tucana, o governador tentou descolar Dilma da imagem do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, dizendo que um chefe de Estado é"insubstituível". "Você tem que ver quem é que vai ser presidente,dirigir as coisas. Porque o presidente é insubstituível. Não há delegação nesse caso."

Biografias. Também defendeu que a população faça uma comparação de biografias ao escolher o próximo presidente e veja "quem é mais capaz de garantir as coisas boas e melhorá-las e quem é capaz de enfrentar os problemas". "Acho que fica meio pretensioso eu me comparar. Isso é coisa que a população que vai decidir. Eu tenho uma história, o pessoal vai conhecer, vai conhecer a história dela, da Marina, e vai julgar."

Depois da entrevista, em visita ao interior paulista, Serra negou que tivesse confirmado sua candidatura presidencial. "Quem disse foi o Datena", afirmou.

Aécio diz que tucanos precisam ter um discurso para norte e nordeste

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

O governador de Minas Gerais, Aécio Neves, disse ontem que o PSDB precisará ter um discurso para o Nordeste e o Norte para poder conter a popularidade do presidente Lula nas duas regiões:
"É claramente uma região onde encontraremos maior dificuldade, onde o presidente Lula tem maior poder de transferência de votos. Isso é notório".

Segundo ele, "temos que ter um discurso também para essa região que não negue o que foi feito [pelo governo Lula]", disse.

FHC exalta democracia de Nabuco

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Em palestra na ABL anteontem, ex-presidente diz que, embora aristocrata, pensador brasileiro priorizava a igualdade

Fernando Henrique Cardoso abriu ciclo de conferências sobre o centenário de morte de Joaquim Nabuco e o comparou a Tocqueville

Antônio Góis
Da Sucursal do Rio
Ao abrir o ciclo de conferências sobre o centenário de morte de Joaquim Nabuco na Academia Brasileira de Letras anteontem, o sociólogo e ex-presidente Fernando Henrique Cardoso comparou o pensamento de Nabuco com o do aristocrata francês Alexis de Tocqueville (1805-1859) para ressaltar que o abolicionista não pode ser considerado um conservador clássico.

Nabuco nasceu em 1849 no Recife. Em sua atuação como parlamentar no império e em seus textos, destacou-se principalmente pela luta abolicionista, mas foi também crítico da república e fiel à monarquia mesmo após sua queda.

Tocqueville é autor de estudos sobre o antigo regime e a Revolução Francesa, mas sua obra mais citada em estudos políticos é "A Democracia na América", em que analisa o sistema político e social dos EUA.

FHC lembrou que, apesar de terem feitos suas análises em períodos diferentes -Tocqueville na primeira metade do século 19 e Nabuco, principalmente na segunda-, os dois escreveram sobre o regime político na Inglaterra e nos EUA.

Para ele, essa comparação evidencia que, apesar de ser também aristocrata, Nabuco tinha um sentimento democrático e igualitário que não se via num conservador clássico como Tocqueville.

O ex-presidente destacou, por exemplo, que os dois se apaixonaram pela Inglaterra, mas por razões distintas. Enquanto Tocqueville ressaltava o papel da aristocracia inglesa, Nabuco se entusiasmava pelo país em função dos seus mecanismos democráticos, em especial o Poder Judiciário.

"Nabuco até aprecia a monarquia na Inglaterra, mas seu lado de pensador político está colocando ênfase no direito dos cidadãos, na liberdade e na possibilidade de acesso à Justiça para todos", afirmou FHC na palestra.

Já em suas análises sobre os EUA, o ex-presidente também destacou o fascínio que o país exerceu nos dois intelectuais.

"Mas Tocqueville não vê o que está acontecendo na América com empatia. Ele sabe que é inevitável a formação de uma sociedade democrática, mas faz duras críticas à igualdade e ao sistema que, como diz, está levando a uma cultura em que a classe média transforma o gozo dos bens materiais em fruição suprema e impede que se veja o interesse público."

Já no caso de Nabuco, FHC destaca que o brasileiro, mesmo se encantando com a ideia de igualdade na sociedade americana, percebeu que ela não era para todos, antevendo já no final do século 19 e no início do 20 um sentimento de superioridade dos norte-americanos sobre outros povos.

"Nabuco destaca que 7 milhões de negros, além de chineses e outros imigrantes, não tinham acesso a essa igualdade. Questiona também se os americanos realmente se sentem iguais aos vizinhos de Cuba ou do México. Mais uma vez, ele expressa um sentimento genuinamente forte de igualdade substantiva, se irmanando com negros, latinos e chineses."

O ex-presidente destacou que Nabuco, talvez influenciado por sua atuação como primeiro embaixador brasileiro em Washington, passou a defender nos últimos anos de vida uma maior aproximação com os EUA como estratégia para que o Brasil exercesse nas Américas papel de moderação.

Para FHC, pode até parecer estranho que Nabuco, que fizera críticas duras aos Estados Unidos, a partir de certa altura achasse que era melhor ter uma relação mais direta entre os dois países.

"Mas ele via nesse movimento uma oportunidade para que o Brasil exercesse nas Américas um papel de moderador", defendeu o ex-presidente.

Ciclo sobre Nabuco segue este mês

DEU NA FOLHA DE S. PAULO
O ciclo de conferências da ABL sobre Nabuco prosseguirá nas próximas semanas. No dia 30, o advogado e economista Roberto Cavalcanti de Albuquerque falará sobre "Nabuco em Recife".

Rubens Ricupero, economista e diplomata, tratará do tema "A diplomacia de Joaquim Nabuco e as questões de fronteiras", no dia 6/4.

A primeira fase do ciclo será encerrada pelo acadêmico Alfredo Bosi, em 13/4, com a palestra "Joaquim Nabuco memorialista".

Na terça, às 17h30, Tancredo Neves, cujo centenário se completou neste mês, é o personagem da palestra do acadêmico Eduardo Portella.

A ''verdade coletiva'' de Lula: Roberto Romano

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

No episódio que abalou a imagem do presidente - o símile entre presos cubanos em greve de fome e bandidos - não sigo os revoltados pelas suas frases. Agradeço por ele usar uma verdade insofismável sobre a sua atitude mental. Desconfio dos que, na tentativa de manter aparências, dizem ter Luiz Inácio da Silva cometido um "escorregão". Se falam de escândalo, talvez acertem. O termo "escândalo" vem do grego "skadzein", cujo significado é "mancar". Ninguém nega que o presidente tenha "mancado" ao perder o freio decoroso na língua. Ele, no entanto, abriu sua alma, exibindo diante do Brasil e do mundo a ideologia que de fato o move.

O público já testemunhou outras distrações do hoje presidente. Em histórica fala a um jornal paulista, ele proclamou que "a liberdade individual está subordinada à liberdade coletiva. Na medida em que você cria parâmetros aceitos pela coletividade, o individualismo desaparece. Ou seja, não há razão para a defesa da liberdade individual. O que você precisa é criar mecanismos para que a grande maioria da comunidade possa participar das decisões" (Lula, 4/1/1986). E acrescentou: "A capacidade de você atender aos desejos individuais sem que isso prejudique os interesses coletivos é uma questão sobre a qual tenho dúvidas. Precisamos promover esta discussão dentro do PT."

Segundo os debates partidários, amigos transformam-se em inimigos do coletivo ideado pelos petistas. "Você pode excluir o grande empresário, a multinacional, mas você precisa discutir se vai excluir o pequeno e médio proprietário do campo e da cidade."

"Eu não quero", disse o sindicalista, "ser o dono da verdade, o senhor da razão". A tolice torna-se ameaçadora no complemento da frase: "Eu tenho uma verdade que está subordinada à verdade coletiva." Treblinka, Auschwitz, o Gulag e Cuba resultam de tais "verdades coletivas". Segundo aquela doutrina, um preso político cubano só pode ser bandido, pois vai contra a verdade, propriedade do Estado.

A exclusão dos inimigos (todos os que não se encontram no partido) se enraíza na cultura petista. Mas após derrotas acachapantes, aconselhado por especialistas em marketing político, Lula maquiou a fala dogmática. Chegaram as alianças eleitorais, a persuasão dirigida aos setores médios e, last but not least, o elo com setores da imprensa. Assustar o grande empresário, a multinacional, além do pequeno e médio proprietário do campo e da cidade, perceberam os petistas, era receita de fracasso. Surgia o esboço do "Lulinha paz e amor" e da Carta ao Povo Brasileiro. Líderes como Antônio Palocci ensaiaram privatizações "neoliberais" em seus domínios. O aço totalitário se cobria com o chantilly propagandístico. Era superada a era das pizzarias e padarias para o PT. Começava o tempo dos bons restaurantes, das garrafas de Romanée Conti. Oligarcas passaram a ser convidados de honra no convescote: Antonio Carlos Magalhães, José Sarney e outros receberam novos títulos, pois garantiam a governabilidade...

A encenação convenceu. Grandes empresas, multinacionais, pequenos e médios proprietários, boa parte da imprensa, todos azeitados pelos dividendos de uma política econômica antes execrada no petismo, aplaudiram o "novo PT". Com as loas ao suposto bom senso, carisma e quejandos de Luiz Inácio da Silva, entoadas no Congresso pela oposição, veio o apoio às iniciativas governamentais na economia e adjacências. Quanto maior o sucesso entre os antigos inimigos, maior o cinismo dos petistas em relação a si mesmos. Discutir a divida externa, romper com o Fundo Monetário Internacional (FMI), controlar o capital estrangeiro? Bravatas. Política radical e socialista? "Nunca fui de esquerda", asseverou o líder, aplaudido em delírio.

Passaram os dias e, arrogantes, seguros de manter o mando, os petistas começaram a soltar os demônios reprimidos. Já no episódio do "mensalão" sobraram raios e trovões contra a "imprensa burguesa", os empresários, os promotores públicos. Mas o presidente foi à TV e pediu desculpas, dizendo não saber a causa de suas escusas. Agora confessa: sabia. Chegaram os aloprados, os projetos de mordaça na mídia, a defesa de Sarney a todo custo (inclusive ao preço da censura, como no caso deste jornal) e as unhas ideológicas apareceram, somadas aos caninos. Lenta e inexorável, ressurge a busca de uma hegemonia ditatorial mantida pelos escravos voluntários, os militantes. Estes tudo fazem para garantir o poder aos donos do partido. Quanto mais seguros de que ficarão no Planalto por mil anos, maior a grosseria dos ataques contra quem não dobra espinha e ouvido às ordens palacianas.

Os cosméticos tombam da face governamental. A lógica de Luiz Inácio da Silva é a mesma, desde 1986. Naquela época importava defender os direitos humanos (nunca incluídos os presos de Cuba) para manter a coesão interna do PT, no qual ombreavam stalinistas e católicos, trotskistas e adeptos da ecologia. Os religiosos defenderam os direitos humanos contra a ditadura, foram adversários das violações em todos os países e sob qualquer ideologia. Quem defende direitos não escolhe ideologia a ser protegida. Mas, com a chegada do PT ao poder, os católicos desembarcam do navio. Ficam os adeptos da razão cabocla de Estado.

A fala do presidente contra os presos cubanos, assimilando-os a bandidos, tem uma gênese mais ampla do que o PT. Ela se enraíza nas purgas nauseantes, como nos Processos de Moscou, em 1936. Ali não existiam dissidentes, mas terroristas. Só possui direito quem se abriga à sombra do partido. O resto é inimigo e... bandido.

Obrigado, Lula, por desvelar o que sempre esteve em seu íntimo. E por nos advertir sobre o que virá nos próximos dias.

Filósofo, professor de ética e filosofia na UNICAMP, é autor, entre outros livros, de "o caldeirão de medeia" (perspectiva)

Heitor Villa-Lobos Bachiana Brasileira n. 5

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Juros do dilema:: Miriam Leitão

DEU EM O GLOBO

A Selic não subiu, mas os juros bancários já subiram, e economistas de bancos e consultorias apostam que a alta da taxa oficial não passa de abril. Será mesmo que tem que subir? O Brasil está há oito meses com a menor taxa de juros da história recente, mas mesmo assim ela é altíssima se comparada com o resto do mundo, que continua na era dos juros negativos.

O dilema do Brasil é este.

Quase 16 anos depois do plano de estabilização, após 10 anos de metas de inflação, o país continua com uma taxa de juros alta demais, e em qualquer descuido a inflação sobe.Dos Brics, é o que possui a maior taxa de juros real: 4%. A China tem juros reais de 2,5%; e a Rússia, de 1,4%. O Brasil não quer correr o risco que a Índia está correndo. Lá, a inflação está em 16%, e claramente se acelerando nos últimos anos. Com isso, os juros reais estão negativos em 11%. Comparando as taxas de 40 países, a consultoria econômica Up Trend concluiu que os juros da Índia são os mais fortemente negativos, porque a inflação é mais alta.

O risco é que a inflação se acelere ainda mais. Os juros reais baixos da Rússia,de 1,4%, também são causados pela inflação alta, que está em torno de7%.

Esse certamente não é um risco que o Brasil queira correr,dado o nosso passado inflacionário e o compromisso do país com a inflação sob controle. É tão grande esse compromisso que inflação subindo traz mais risco eleitoral para o governo do que juros subindo.

Portanto, o BC se não elevar os juros por ter afinal cedido às pressões internas do governo estará errando duplamente.

Há uma divergência genuína sobre a natureza da inflação deste começo de ano. Ela subiu fortemente agora. O IGP-10 acumulou em três meses 2,4%.Isso é assustador para quem tem uma meta de 4,5%. Mas os IGPs têm movimentos mais nervosos, que não são necessariamente confirmados pela inflação ao consumidor.

Antigamente se dizia que os índices que têm uma parte de preços do atacado seriam uma espécie de aviso prévio da inflação ao consumidor. O avanço da estabilização acabou com esse automatismo.

A pressão do boom das commodities internacionais levou os preços das matérias-primas a subir no Brasil no começo de2008. Em julho, o IGP-M acumulado em 12 meses chegou a 15%, e o IPCA,também em 12 meses, estava em 6,3%. Daí para diante, o IGP-M caiu e terminou o ano em 7,8%, enquanto o IPCA terminou o ano em 5,9%. Não houve o tal repasse. Em seguida, foi a vez de os IGPs despencarem e terminarem o ano passado em deflação, já o IPCA caiu e ficou em 4,3%.

Conclusão: os IGPs são mais voláteis e não são uma prévia dos índices ao consumidor.

O mistério que continua no Brasil é porque o país precisa de taxa de juros tão alta para atingir o objetivo de evitar a inflação acima da meta, que é o mandato do Banco Central.

Houve um tempo em que o mercado dizia que o BC tinha que pagar o preço da reputação, porque ninguém confiava que ele pudesse ter independência para decidir. Tantas batalhas vencidas pelo Banco depois, poucos continuam a duvidar da decisão independente.

O ex-presidente do Banco Central Gustavo Franco, que entrevistei esta semana na Globonews, explica que a decisão do Copom foi estritamente técnica. Houve divergências no diagnóstico, eo placar apertado da decisão seria uma indicação de que os juros podem subir em abril. Quando perguntei se ele estava então convencido da autonomia do BC no atual governo, ele disse que sim, e que as reclamações públicas sobre a taxa de juros de outros setores do governo são normais, e exatamente por serem públicas não são pressões, seriam uma espécie de desculpas para o seu público. Luiz Chrysostomo, sócio da Neo Investimentos, também acha que o Banco Central decide autonomamente.

Portanto,se o BC tem reputação de independente, se a estabilização ocorreu há tantos anos, se o mundo inteiro está com juros baixos, por que o Brasil não pode ter juros mais parecidos com o resto do mundo? A nossa taxa básica hoje está em 8,75%, mesmo sendo a mais baixa da nossa história recente, continua sendo muito alta na comparação com outros países.

Será que está mesmo escrito que os juros terão que subir em abril? Gustavo Franco acha que pode acontecer uma novidade boa em termos de inflação que permita ao Banco Central adiar mais uma vez.

Chrysostomo acha que há uma pressão de demanda das famílias que pode manter a inflação subindo, mas admite que os incentivos de IPI estão sendo removidos, e que os compulsórios voltaram a subir, retirando nos próximos dias cerca de R$ 70 bilhões da economia.

Além disso, a demanda externa continuará fraca já que a crise internacional ainda não foi resolvida.

Gustavo Franco acha que, apesar de tanto tempo depois do início da nova moeda,ainda existem uma bactéria presente na economia brasileira,desequilíbrios fiscais crônicos, o peso de uma história muito longa de convivência com inflação alta que fazem com que o Brasil permaneça sendo o campeão mundial dos juros altos. Pode ser que seja ainda herança desse passado, mas o fato é que já era tempo de o mercado de juros brasileiros ser mais normal. Mais escandalosamente anormais são as taxas de juros cobradas pelos bancos, no crédito ao consumidor e às empresas. Neste ponto mesmo é que o Brasil parece um E.T., tal a discrepância entre as taxas dos outros e as nossas.

Pré-sal: após Serra, Dilma reconhece direitos do Rio

DEU EM O GLOBO

Para ministra, royalties são compensação para os produtores de petróleo

Dois dias depois de o governador de São Paulo, José Serra, defender Rio e Espírito Santo na distribuição dos royalties do petróleo, ontem foi a vez de a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, afirmar que o recebimento dessas compensações é direito constitucional do Rio e de demais estados produtores, como São Paulo e Rio Grande do Norte. Ao ser perguntada se o presidente Lula vetaria a emenda Ibsen - que retira R$ 7 bi em royalties do Rio -, Dilma disse que o governo não trabalha com essa hipótese no momento porque seria "um desrespeito ao Senado e aos senadores", que ainda vão examinar o projeto.


Dilma defende direito do Rio

Ministra destaca respeito a contratos e compensação a produtores de petróleo prevista na Constituição

Mônica Tavares

BRASÍLIA – A ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, defendeu ontem que é um direito constitucional do Rio e dos demais estados produtores receber compensação diferenciada pela exploração do petróleo. Para ela,ao contrário do que propõe a emenda Ibsen, deve ser observado o respeito aos contratos que estão em vigor caso das participações governamentais sobre a extração nos campos já em atividade,majoritariamente destinadas ao Estado do Rio e aos municípios fluminenses, que respondem por 80% da produção nacional de petróleo.Dois dias antes, o governador de São Paulo, José Serra, também defendera os estados do Rio e do Espírito Santo.

Segundo Dilma,é preciso um acordo: Esperamos que no Congresso, no Senado, isso (a emenda Ibsen) seja revertido e se busque um consenso, que é muito melhor que uma disputa fratricida entre estados.

Dilma lembrou que a Constituição prevê que os estados produtores de petróleo ou que tenham instalações para exploração sejam contemplados diferenciadamente.

É o caso dos estados que produzem: Rio, Espírito Santo, São Paulo e Rio Grande do Norte. Isso é da Constituição.

O senador tem essa função de respeitar o cerne da Constituição.

Minc:emenda é corsária, mas Lula não deixará Rio injustiçado A ministra destacou que em direito adquirido não se mexe, e por isso o governo jamais pensou em aplicar uma nova regra de divisão dos royalties deforma retroativa, como foi feito na emenda Ibsen. Esta redivide a renda do petróleo, inclusive a da produção atual, entre as 27 unidades da Federação, o que resulta em perda de R$ 7 bilhões anuais para a economia fluminense.

Isso nós nunca cogitamos. Não é possível ser feito. Mantivemos o que estava concedido, dentro do princípio de respeito a contratos intactos afirmou Dilma, em referência ao projeto apresentado pelo líder do PMDB, deputado Henrique Eduardo Alves (RN),que cria nova regra de divisão apenas para os campos a serem licitados,sob o regime de partilha.

Dilma disse que essa proposta foi discutida com estados além dos produtores representados pelos governadores Eduardo Campos (PE) e Cid Gomes (CE) e foi consensual.

Ao ser perguntada se o presidente Lula vetaria a emenda, caso ela passe no Congresso, a ministra recorreu à estratégia do governo de não se comprometer publicamente com o veto, para forçar a negociação no Senado.

Não trabalhamos com essa hipótese, e seria um desrespeito ao Senado eaos senadores, e ao Congresso, discutir uma questão dessas a essa altura disse, um dia após o presidente ter afirmado que a questão era um problema para o Congresso.

O ministro do Meio Ambiente,Carlos Minc, disse ontem estar otimista quanto à derrubada da emenda por Lula: Uma coisa seria eu ou Sérgio Cabral falar. Outra coisa é ele(Lula) chegar e dizer o seguinte: não interessa o que vocês vão fazer,se fizer a, b ou c, eu pego e caneto. Aí, seria, digamos assim,um desrespeito do presidente com o Poder Legislativo.

Agora, que ele disse que não vai deixar o Rio injustiçado, isso ele disse.

Minc lembrou que o projeto enviado pelo presidente não previa tamanha perda de recursos para o Rio: O projeto que o Lula mandou não tinha essa tunga para o Rio, isso foi criado pelo Ibsen. A emenda é corsária.

Na calada da noite, cada um vinha com sua adaga tirar um butim. O risco ambiental ficava no Rio, mas o butim, o tesouro dos corsários, ia se espalhar para quem levantasse a mão.

Colaborou Rubem Berta