quarta-feira, 17 de fevereiro de 2021

O que a mídia pensa: Opiniões / Editoriais

Ilegal, inoportuno e muito perigoso – Opinião | O Estado de S. Paulo

Decretos que ampliam o acesso e afrouxam o controle sobre armas de fogo desrespeitam o Estatuto do Desarmamento

No dia 12 de fevereiro à noite, uma sexta-feira, véspera do feriado de carnaval, o governo federal divulgou quatro decretos alterando outros quatro atos do próprio governo, editados em 2019, com o propósito de ampliar ainda mais o acesso a armas de fogo e afrouxar o seu controle pelo poder público. Os novos decretos vão muito além de mera regulamentação da legislação aprovada pelo Congresso. Eles desrespeitam o objetivo e as disposições do Estatuto do Desarmamento (Lei 10.826/2003). São, portanto, ilegais, merecendo pronta revogação.

O governo de Jair Bolsonaro não apenas desrespeitou os limites do poder de regulamentação do Executivo. Os novos atos do governo federal em relação às armas são extremamente perigosos, facilitando a vida das milícias e de quem deseja utilizar as armas de fogo para além das coordenadas legais. Por exemplo, as novas medidas tornam mais precário o rastreamento de munições, o que, entre outros danos, pode dificultar a elucidação dos crimes.

Os quatro decretos dão a exata dimensão das prioridades do governo de Jair Bolsonaro. No meio de uma gravíssima crise de saúde pública, com mais de 240 mil mortos pela covid-19, com consequências devastadoras sobre a situação social e econômica do País, o presidente Bolsonaro atua não para prover vacina para a população, mas para desregulamentar o acesso e o uso de armas de fogo.

Para agravar o quadro, Jair Bolsonaro tem sugerido que a ampliação do porte e uso de armas de fogo não tem relação apenas com a defesa pessoal. Ele já deu a entender que defende o uso desse armamento contra inimigos políticos. Em reunião ministerial de abril de 2020, Jair Bolsonaro foi explícito, ao exigir, em meio a muitos palavrões, “que o povo se arme”, pois isso seria a “garantia” de que ninguém ousará “impor uma ditadura aqui” – referindo-se explicitamente a prefeitos e governadores que haviam imposto medidas restritivas de movimento para enfrentar a pandemia. “Se estivesse armado, (o povo) ia para a rua” e, assim, desobedeceria à ordem desses governantes, disse o presidente. 

Rosângela Bittar - O tempo Huck

- O Estado de S. Paulo

Empresário tem a candidatura mais consistente fora da política e tem de tomar uma decisão

Entre a máxima de que há vida pensante fora do fisiologismo do Centrão e a constatação de que setenta por cento dos brasileiros não querem mais quatro anos do extremista Jair Bolsonaro, o tempo de tolerância concedido a Luciano Huck está se esgotando. Ele tem a mais consistente das candidaturas fora dos eixos da política partidária e está sendo forçado a se decidir, o que fará em meados do ano.

Não se trata de prazo da lei eleitoral, nem de atender às conveniências pessoais e profissionais do empresário. Mas de uma exigência imposta pelo cenário dinâmico. Huck, que parecia atravessar olimpicamente as preliminares de resistência, inclusive aos preconceitos, está diante da hora da verdade. Avança, em silêncio. Os movimentos políticos de fevereiro não levaram o potencial candidato a mudar sua estratégia. Nem mesmo o revés da submissão do DEM, partido com quem vinha se alinhando, a Bolsonaro.

Ele tem exposto aos colaboradores sua teoria dos três tempos. Há o tempo dos políticos, e os movimentos de hoje nele se encaixam. Há o tempo do jornalismo político, que precisa de definições para trabalhar suas análises. E há o tempo das ruas. Huck acredita estar no tempo certo.

Vera Magalhães - Entubados, mas armados

- O Globo

Se depender de Jair Bolsonaro, o número de mortes pela Covid-19 passará em breve dos 300 mil brasileiros, sem que haja uma palavra de compaixão, reconhecimento da tragédia ou das múltiplas ações e omissões propositais que nos levaram a isso. O presidente não está nem aí, já se cansou de dizer.

Para este homem, este presidente incidental e lamentável, pouco importa que as UTIs colapsem com gente entubada em uma, duas, três ondas sucessivas e contínuas da pandemia, desde que ele passe com sua boiada de desmonte das políticas civilizatórias. Para isso, quanto menos gente estiver olhando, melhor.

Se for na calada da noite de um não carnaval ermo, sombrio, melancólico, em que as pessoas lamentam a alegria suprimida com as vidas das pessoas amadas, perfeito.

Para o presidente da República do Brasil, o “povo tá vibrando”. Bolsonaro conhece tanto de povo quanto de cloroquina: absolutamente nada. Sua noção de povo se limita a olhar gráficos de popularidade em pesquisas e, quando eles caem, se preocupar com o próprio pescoço.

Zeina Latif - É o que temos para hoje

- O Globo

"Não convém tomar a aprovação da autonomia do BC como um sinal de que medidas importantes virão na sequência"

O comportamento do dólar tem incomodado o mercado financeiro, por estar muito descolado das moedas de países parecidos. A taxa de câmbio oscila ao redor de R$/US$ 5,40, enquanto modelos de projeção do câmbio apontam para aproximadamente 4,20 atualmente. Esse hiato não será eliminado tão cedo.

É verdade que os modelos de projeção têm grandes limitações, pois a taxa de câmbio não é um preço qualquer da economia, mas também de um ativo financeiro, sensível a expectativas e percepção de risco de investidores, que não são diretamente mensuráveis.

Mesmo assim, a expressiva distância entre as cotações atuais e o projetado, poucas vezes vista, sinaliza um novo fator de risco doméstico não captado pelos modelos.

Algo similar ocorreu no início do governo Temer, mas no sentido contrário: cotações muito abaixo do projetado, em função da expectativa de reforma da Previdência, um tabu na época. O escândalo político esvaiu o descolamento.

Via de regra, fatores externos associados ao ciclo mundial (dólar contra uma cesta ampla de moedas, preços de commodities, apetite global para risco) têm maior importância para explicar o comportamento do dólar, e deveriam estar puxando a cotação para baixo, assim como o fazem em outras economias emergentes.

Porém, fatores domésticos associados ao risco de ter recursos no Brasil estão pesando mais.

Bernardo Mello Franco - Baile de máscaras

- O Globo

O carnaval foi cancelado, mas o Supremo manteve viva a tradição do baile de máscaras. Na terça-feira gorda, o ministro Gilmar Mendes voltou a se exibir em nova fantasia. Ex-integrante do Bloco da Lava-Jato, ele agora desfila na ala dos críticos da operação.

Em entrevista à BBC News Brasil, Gilmar disse que a força-tarefa de Curitiba virou “movimento político” e “tinha candidato” na última eleição presidencial. Faz sentido, mas parece que ele demorou a notar.

Por muito tempo, o ministro elogiou os métodos de Moro, Dallagnol & cia. Em setembro de 2015, ele disse que a operação salvou o Brasil de virar uma “cleptocracia”. “A Lava-Jato estragou tudo”, comemorou.

Seis meses depois, Gilmar barrou a nomeação de Lula para a Casa Civil com base num grampo divulgado ilegalmente por Moro. A liminar invadiu atribuição do Executivo e deu o empurrão final para o impeachment.

Hélio Schwartsman - O golpe dos militares

- Folha de S. Paulo

Esforço para convencer de que a ditadura era coisa do passado não passou de propaganda enganosa

Por algum tempo eu acreditei que as Forças Armadas brasileiras haviam se profissionalizado, abandonando de vez a ingerência política e buscando o aprimoramento técnico. Eu estava errado.

Especialmente nos anos 1990 e na primeira década deste século, os militares brasileiros empreenderam um grande esforço de relações públicas para nos convencer de que a ditadura era coisa do passado e que as Forças Armadas estavam comprometidas com a democracia e preocupadas com a eficiência.

É claro que os militares ainda torciam o nariz para iniciativas como a Comissão da Verdade e, de vez em quando, algum deles, em geral um general de pijama, vinha com um discurso com ares de recaída autoritária. Nada que preocupasse muito. Bastaram, porém, alguns anos com a perspectiva de exercer mais poder, para constatarmos que tudo não passava de propaganda enganosa.

Vinicius Sassine - Os comandantes e o bolsonarismo

- Folha de S. Paulo

Próximos anos podem servir para novas reações à relação entre um comandante e o ex-capitão

No comando do Exército, o general Eduardo Villas Bôas agiu para pressionar o STF e para favorecer seu candidato à Presidência: Jair Bolsonaro. Um tuíte com verniz conspiratório, agora dissecado pelo próprio Villas Bôas, foi feito para interferir no julgamento de um habeas corpus do ex-presidente Lula, em 2018. A prisão do petista mudou a eleição.

As reações ao que ocorreu naquele momento-chave chegam com um atraso já habitual na democracia brasileira. Além de tardias, não passam de ruídos. E o mesmo deve ocorrer em relação à postura de um outro comandante, sucessor de Villas Bôas e atual líder do Exército brasileiro: o general Edson Leal Pujol.

Pujol não é Villas Bôas. Seu estilo é quase o oposto. Não há verborragia, redes sociais, pontes sólidas no mundo político ou ausência de sutilezas. Mas o comandante serve ao ideário bolsonarista, e sua conduta (ou a ausência dela) ajuda a compor as ofensivas mais danosas de Bolsonaro nesta primeira metade de mandato.

A permanência do general Eduardo Pazuello no cargo de ministro da Saúde e na ativa do Exército contou com aval de Pujol. Pazuello, hoje, é investigado por crimes e improbidade, suspeito de omissão diante de iminentes mortes por asfixia.

Ruy Castro - O Brasil nas ruas

- Folha de S. Paulo

Não fosse pela pandemia, já haveria comícios gigantes contra a putrefação de Bolsonaro

No fundo de uma gaveta surge de repente um objeto cheio de história: um button verde-amarelo de um comício da campanha pelas Diretas Já, em 1984. Era o comício da Candelária, aqui no Rio, no dia 10 de abril. Não me lembrava desse button e vejo agora que ele viajou comigo por apartamentos, casas e cidades nesses inacreditáveis 36 anos —em breve, 37.

Pouco antes, em janeiro daquele ano, acontecera o primeiro comício pelas Diretas, o da praça da Sé, em São Paulo, que reunira 300 mil pessoas. Mas o do Rio teria 1 milhão, com a multidão entupindo a avenida Presidente Vargas, do palanque na Candelária à praça da República, e atapetando a Rio Branco, da praça Mauá à Cinelândia —uma massa humana em forma de cruz, mostrando de vez que o país estava farto dos militares.

No palanque, os artistas, os famosos e os líderes Ulysses Guimarães, Tancredo Neves, Franco Montoro, Fernando Henrique, Miguel Arraes, Leonel Brizola, Lula. Nem todos ali se davam: Montoro não gostava de Brizola, Brizola não gostava de Lula e Lula não gostava de ninguém. Mas todos tinham um inimigo comum: o regime, que já caia de podre e respirava por aparelhos, que eram as eleições indiretas para presidente votadas por um Congresso viciado. Daí os comícios, para pressionar os políticos a aprovar uma emenda que propunha restabelecer as diretas. Duas semanas depois, em 25 de abril, o Congresso traiu como sempre a nação, derrotando a emenda.

Elio Gaspari - Bolsonaro desafiou o ‘mercado’

- O Globo / Folha de S. Paulo

Ele e o vice ensaiam um novo número

Ganha uma fritada de morcego quem souber o que é o “mercado”. Bolsonaro corre atrás do novo auxílio emergencial que ampara sua popularidade, e pipocam ansiedades desse ectoplasma. Outro dia ele ironizou: “Qualquer negocinho, qualquer boato na imprensa, tá aí esse mercado nosso, irritadinho, né?”.

“Pessoal, vocês sabem o que é passar fome?” No dia seguinte foi a vez do vice-presidente Hamilton Mourão: “Minha gente, a gente não pode ser escravo do mercado. Nós temos aí uns 40 milhões de brasileiros que estão numa situação difícil”.

Toda vez que o capitão usa diminutivos (“gripezinha” no “finzinho”), algo de ruim pode acontecer e, ao mencionar a neurastenia do ectoplasma, ele pode estar indicando uma nova forma de demagogia. Para quem tem um pé no irracionalismo da cloroquina e na eleição americana fraudada, é um prato cheio a ideia de um descontrole fiscal em nome dos problemas sociais.

Lula cavalgou racionalmente sua plataforma social e teve em Bolsonaro um crítico. Isso para não falar no general Mourão, reclamando da existência do 13º salário. Opondo-se ao nervosismo da turma do papelório, Bolsonaro escolhe um adversário fácil para fazer não se sabe o quê.

Vinicius Torres Freire – General Pesadello, pela hora da morte

- Folha de S. Paulo

Prefeitos pedem a cabeça de Pazuello, governadores cobram vacinas e UTIs

A Confederação Nacional dos Municípios pediu a cabeça de Eduardo Pazuello, ainda aboletado no Ministério da Saúde. A Frente Nacional de Prefeitos diz que o governo de Jair Bolsonaro é culpado pela falta de vacinas e ainda se perde com coisas como decretos de armas e "pauta de costumes".

Nesta quarta-feira (17), governadores têm reunião com o general Pesadello (João Doria não vai). Vão cobrar o cronograma de entrega de vacinas até abril, dinheiro para pagamento de leitos de UTIs e fazer pressão para que se aprove a fabricação da vacina russa no Brasil. Pesadello está pela hora da morte, que sempre foi o seu tempo.

A vacinação vai parando, por falta de doses. Vai andando o inquérito do Supremo sobre Pesadello. Vidas, a economia e o prestígio de Jair Bolsonaro vão depender da política e de alguma esperteza do governo nas próximas semanas.

Governadores são bem mais próximos de senadores do que os deputados. Vários estão como medo do que vai acontecer com sua fama caso a vacinação seja interrompida, como deve ser, nos próximos dias.

Fernando Exman - A vacina foi a ilusão do Carnaval de 2021

- Valor Econômico

Governo deveria viabilizar produção local do imunizante

Quarta-feira de Cinzas, dia em que as ilusões de Carnaval se tornam menos turvas, a realidade se impõe, nada mais serve de desculpa para adiar novamente a execução do que foi planejado ou ignorado. Ilusões de Carnaval em tempos de pandemia têm lá suas particularidades.

Em Brasília, o devaneio foi do governo local. Acreditou que conseguiria inventar por meio de decreto uma nova modalidade de folia, o Carnaval sentado. Bares e restaurantes foram autorizados a funcionar, desde que não houvesse passistas nos salões ou nas ruas. Impossível controlar. Os próximos balanços do Ministério da Saúde dirão se a estratégia funcionou ou foi apenas para autoridade sanitária ver.

O governo Bolsonaro também vai criando suas histórias de Carnaval. No primeiro ano, a data ficou marcada pelas publicações escatológicas do presidente. Este deve passar a ser conhecido por aquele em que apenas o Centrão e os armamentistas tiveram motivos para jogar confete.

Depois de muito resistir e criticar quem o fez, Bolsonaro acabou cedendo o Ministério da Cidadania a partidos aliados. Outras mudanças no primeiro escalão devem ocorrer durante a Quaresma - para quem crê na Bíblia, um período de penitência e reorientação.

Bolsonaro descumpriu o compromisso feito durante a campanha de manter-se afastado das práticas tradicionais da política, mas, em contrapartida, na sexta-feira editou uma nova leva de decretos para flexibilizar o acesso a armas e munições. Era uma promessa antiga, adiada há tempos. Já havia, inclusive, virado motivo de deboche entre seus apoiadores em razão da demora e de sucessivos adiamentos.

Armando Castelar Pinheiro* - Crise e populismo

- Valor Econômico

É difícil imaginar que veremos candidatos com plataformas puramente tecnocráticas em 2022

Professor da USP, fundador do PT, Paul Singer foi um exemplo do intelectual ideologicamente engajado que tanto marcou o século XX. Conheci Singer em 1996, quando participamos de um projeto comparando as experiências de África do Sul e Brasil. Lembro dele como uma pessoa correta, boa praça e focada em promover o bem comum.

Mas Singer me veio à lembrança por outra razão. Assisti-o quando participou, em 1982, de um debate pré-eleitoral, em meio à crise da dívida externa. Crise era então uma coisa nova, depois de quatro décadas sem nunca o PIB cair. Ele contou ter ido à periferia paulistana saber o que as pessoas pensavam sobre a crise, ao que uma senhora respondeu: “Crise, que crise, doutor? Eu já nasci em crise”.

Desde então, o Brasil parece essa senhora: vive em crise quase permanente. E crise, argumenta Benjamim Moffitt, em “The Global Rise of Populism”, é o trampolim do qual se projetam os populistas. O livro dialoga com a literatura de ciência política sobre o que é populismo, propondo que este seja visto como um estilo performático de fazer política. Um estilo que se tornou mais competitivo com o menor alinhamento ideológico do eleitor e as transformações tecnológicas e culturais recentes, como a criação das mídias sociais e o culto às celebridades.

Quatro pontos da análise de Moffitt me chamaram mais a atenção.

Moraes, do STF, manda prender deputado Daniel Silveira após ataques a ministros da corte

Decisão será submetida à Câmara, que poderá manter ou derrubar ordem; Fux deve levar caso nesta quarta a plenário

Marcelo Rocha, Renato Machado, Ricardo Della Coletta / Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - O ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), mandou prender em flagrante, na noite desta terça-feira (16), o deputado Daniel Silveira (PSL-RJ).

Silveira é alvo de dois inquéritos na corte —um apura atos antidemocráticos e o outro, fake news. Moraes é relator de ambos os casos, e a ordem de prisão contra o deputado bolsonarista foi expedida na investigação sobre notícias falsas.

Nesta terça, Silveira publicou na internet um vídeo com ataques a ministros do Supremo. Ao ser preso, voltou às redes sociais: "Polícia Federal na minha casa neste exato momento com ordem de prisão expedida pelo ministro Alexandre de Moraes".

Pouco depois, o parlamentar postou um vídeo: "Neste momento, 23 horas e 19 minutos, Polícia Federal aqui na minha casa, estão ali na minha sala".

"Ministro [Alexandre de Moraes], eu quero que você saiba que você está entrando numa queda de braço que você não pode vencer. Não adianta você tentar me calar", afirmou.

Silveira foi preso em Petrópolis (RJ) e seria encaminhado à Superintendência da PF no Rio de Janeiro, no centro da capital fluminense.

A ordem de Moraes é uma decisão liminar (provisória). Por isso, será submetida aos demais ministros da corte. O presidente do STF, ministro Luiz Fux, pretende levar o caso ao plenário nesta quarta-feira (17).

Ricardo Noblat - Supremo vai confirmar decisão de prender deputado bolsonarista

- Blog do Noblat / Veja

Daniel Silveira atentou contra o Estado de Direito

Se o presidente da República pode impunemente ameaçar encher de porrada a boca de jornalista, participar de manifestações hostis à democracia e pregar que o povo deve se armar, o deputado federal Daniel Silveira (PSL-RJ), bolsonarista de raiz, achou que poderia ir além, acreditando-se imune para dizer o que quisesse.

Deu-se mal ao escolher seu alvo. Foi preso por crime inafiançável. O que ele disse em vídeo “atingiu a honorabilidade” e constituiu “ameaça à segurança dos ministros do Supremo Tribunal Federal”, revestindo-se de “claro intuito de impedir a independência do Judiciário e a manutenção do Estado Democrático de Direito”.

Assim entendeu o ministro Alexandre de Moraes, autor da ordem de prisão executada ontem à noite. A decisão de Moraes deverá ser ratificada, hoje, unanimemente, por seus pares. Será o primeiro item da sessão convocada pelo ministro Luiz Fux, presidente do Supremo. Espera-se para ver como a Câmara reagirá.

Seguem alguns trechos da fala de 19 minutos de Silveira dirigida ao ministro Edson Fachin, que criticou o general Eduardo Villas Bôas, ex-comandante do Exército, por ter pressionado o Supremo em abril de 2018 a negar habeas-corpus ao ex-presidente Lula:

Com aval de Lira, deputados querem limitar atuação de oposicionistas na Câmara

Parlamentares governistas tentam alterar o regimento interno para reduzir as formas que hoje existem para atrasar ou até barrar votações de projetos

Camila Turtelli / O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA – Na esteira da vitória do Palácio do Planalto na eleição da Câmara, deputados aliados do presidente Jair Bolsonaro pretendem dificultar a atuação de oposicionistas na Casa. A intenção é alterar o regimento interno para reduzir as formas que hoje existem para atrasar ou até barrar votações de projetos. A medida conta com o aval de Arthur Lira (Progressistas-AL), que em sua campanha prometeu levar as mudanças adiante em troca do apoio para comandar a casa legislativa.

A ideia não é nova. Propostas semelhantes chegaram a ser discutidas na gestão de Rodrigo Maia (DEM-RJ), mas não andaram. Cotada para assumir a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), a deputada Bia Kicis (PSL-DF) disse que colocará as medidas em votação caso assuma o colegiado. “A esquerda sempre fez obstrução. Aliás, isso é uma coisa que a gente quer mexer no regimento, para que a Casa seja realmente governada pela maioria, dando espaço para minoria. Mas em uma democracia, é a maioria que vence. Hoje, nosso regimento permite que a minoria acabe sempre vencedora. Isso acaba sendo muito ruim para o País”, disse Kicis ao Estadão/Broadcast

Atualmente, a oposição conta com um arsenal usado para barrar votações. São, ao todo, 17 dispositivos regimentais que podem ser apresentados pelos deputados nas votações de projetos em plenário ou em comissões. Vão desde pedidos para adiar a discussão, para inverter a pauta até a verificação da quantidade de parlamentares presentes na sessão. É o chamado “kit obstrução”.

A consequência disso é que muitas vezes as votações se arrastam a ponto de avançar pela madrugada ou até serem adiadas. Foi o que aconteceu com a discussão sobre o projeto que trata da proibição do aborto no País em qualquer situação – hoje só é permitido em caso de estupro, de risco à vida da gestante ou em caso de feto anencéfalo. A comissão criada para discutir o tema em 2017 se reuniu 18 vezes, mas a oposição, contrária à proposta, conseguiu evitar que um texto final fosse aprovado, impedindo que a discussão avançasse. Foram mais de 20 requerimentos de obstrução, além de inúmeras questões de ordem que arrastaram os debates. 

Carlos Melo* - Antes tarde que mais tarde

- O Estado de S. Paulo

Edson Fachin reagiu com justificada indignação: na democracia, a Constituição é soberana e as instituições a ela se submetem. O livro do ex-comandante do Exército Eduardo Villas Bôas traz, assim, uma aberração: generais não dizem a juízes ou a ministros do Supremo o que fazer; nem o que admitem ou não. Fachin está certo. Mas, com três anos de atraso, cabe perguntar: o relator da Lava Jato se indignou com a revelação de um Segredo de Polichinelo ou com seu conteúdo?

A história é conhecida e as memórias do general não trazem novidade: no Brasil, o temor da sombra militar, infelizmente, nunca se dissipou; continua influenciando, se não submetendo, a política e as instituições. Ingenuidade, talvez, tenha sido crer que o País havia superado seu fantasma. A surpresa não mora no tuíte do general, nem na consulta que fez a seus pares. Mas na reação retardada de agentes institucionais que somente agora se manifestam. Não se sabe se o silêncio de então se deveu à distração, à conivência ou à omissão. Fachin não foi o único.

Após ironia de Villas Bôas a Fachin, Gilmar Mendes rebate: ‘Ditadura nunca mais!’

Ministro usou as redes sociais para criticar declaração do ex-comandante do Exército, que ironizou a resposta do ministro Edson Fachin às declarações feitas em 2018 sobre julgamento de Lula

 Redação / O Estado de S. Paulo

O ministro Gilmar Mendes usou as redes sociais nesta terça, 16, para rebater o ex-comandante do Exército Eduardo Villas Bôas. Mais cedo, o militar ironizou a reação do ministro Edson Fachin, que subiu o tom nesta segunda contra uma declaração dita por ele há

“A harmonia institucional e o respeito à separação dos poderes são valores fundamentais da nossa república. Ao deboche daqueles que deveriam dar o exemplo responda-se com firmeza e senso histórico: Ditadura nunca mais!”, escreveu Gilmar.

A polêmica tive início após o livro General Villas Bôas: Conversa com o Comandante, lançado pela Editora FGV a partir de uma longa entrevista dada ao pesquisador Celso Castro, revelar que o ex-comandante do Exército teria planejado com o Alto Comando da Força o tuíte que foi interpretado como pressão para que o Supremo Tribunal Federal (STF) não favorecesse o ex-presidente Lula.

“Nessa situação que vive o Brasil, resta perguntar às instituições e ao povo quem realmente está pensando no bem do País e das gerações futuras e quem está preocupado apenas com interesses pessoais?”, escreveu Villas Bôas na ocasião.

O texto chegou a ser interpretado como ameaça de golpe, caso Lula fosse libertado. O ex-presidente cumpria pena estabelecida pelo juiz Sérgio Moro, no processo do triplex do Guarujá. Sua libertação poderia ter influência na campanha eleitoral. A disputa foi vencida, no segundo turno, por Jair Bolsonaro, derrotando o petista Fernando Haddad.

Confederação Nacional de Municípios pede demissão de ministro Pazuello

Em nota, entidade cita suspensão da vacinação em cidades brasileiras e diz que o Ministério da Saúde tem 'ignorado os prefeitos' do país

- O Globo

BRASÍLIA — A Confederação Nacional dos Municípios (CNM) disse, em nota divulgada nesta terça-feira, ser "necessária, urgente e inevitável" a troca do ministro da Saúde, Eduardo Pazuello. Segundo o texto, Pazuello não tem condições de conduzir a superação da pandemia e deve ser substituído "para o bem dos brasileiros".

No documento a entidade diz que tem recebido relatos de prefeitos indicando a suspensão da vacinação contra a Covid-19 para grupos prioritários, motivada pela falta de doses e de previsão de reabastecimento dos estoques. A nota está assinada pelo presidente da CNM, Glademir Aroldi.

Questionado pelo G1, o Ministério da Saúde disse que não comentaria o tema porque a carta "não lhe foi endereçada". "O Ministério da Saúde e todos os seus dirigentes e corpo técnico estão trabalhando diuturnamente para dar a melhor resposta à sociedade", diz a pasta.

No texto, a CNM também afirma que tem tentado dialogar com a atual gestão do Ministério da Saúde — entre pedidos de agendas e de informação. A pasta tem “reiteradamente” ignorado os prefeitos do Brasil, afirma a entidade.

 “Por considerar que a vacinação é o único caminho para superar a crise sanitária e possibilitar a retomada do desenvolvimento econômico e social e por não acreditar que a atual gestão reúna as condições para conduzir este processo, o movimento municipalista entende necessária, urgente e inevitável a troca de comando da pasta para o bem dos brasileiros”, diz o documento divulgado.

O carnaval de Bolsonaro em SC, aglomerado e sem máscaras

Enquanto vacinas escasseiam, presidente ignorou protocolos e receitou ‘spray’ ainda em testes durante feriado no litoral do estado

Carolina Macário, Especial para O GLOBO

SÃO FRANCISCO DO SUL (SC) — Enquanto uma das principais cidades de Santa Catarina, Chapecó, enfrenta o colapso no sistema de saúde em razão da pandemia do novo coronavírus, o presidente Jair Bolsonaro causou aglomerações durante todos os dias de folga pelo litoral do Estado. O feriadão de carnaval — cancelado em todas as capitais do país para evitar a propagação do vírus — teve passeios de moto aquática, pesca num cenário paradisíaco e desrespeito à Lei 14.019, que desde julho de 2020 tornou obrigatório o uso de máscaras em espaços públicos.

Desde sábado, o chefe do Executivo está hospedado no Forte Marechal Luz, uma colônia de férias para militares no município de São Francisco do Sul, no litoral norte. Ele chegou acompanhado de um séquito de políticos e amigos, entre eles o deputado federal Helio Lopes (PSL-RJ) e o secretário Nacional de Aquicultura e a Pesca, Jorge Seif. Veio também parte da família: a filha caçula, Laura, e o filho 03, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), além da mulher e filha de Eduardo. Eles retornam hoje a Brasília.

Tanto o presidente quanto os amigos e políticos que o acompanharam não usaram máscaras de proteção. Nem mesmo a equipe responsável pela segurança. Na segunda-feira, quando passeou de moto aquática por diferentes enseadas de São Francisco do Sul, tirou fotos e distribuiu cumprimentos, pegou crianças no colo e conversou com idosos aglomerados a cada parada na beira da praia. O roteiro pela região foi amplamente documentado por Eduardo Bolsonaro em suas redes sociais.

O momento, no entanto, é de gravidade no estado. Santa Catarina tem atualmente 12 regiões em risco gravíssimo da Covid-19, segundo a Secretaria de Saúde do Estado. Questionado se tinha conhecimento da situação, o mandatário disse ter falado por telefone com o prefeito de Chapecó, João Rodrigues (PSD), e também que pediu ao Ministério da Saúde para dar atenção à cidade. Na sequência, voltou a defender o tratamento precoce:

— O ideal é não haver entubamento (sic). Agora os médicos devem ter o direito, sem pressão, de exercer a sua liberdade de receitar algo, para uma doença, no caso, off-label, sem estar prescrito em bula. Porque é uma doença que ainda não tem remédio definido.

Roberto DaMatta - Cinzas sem carnaval

- O Globo

É possível ter cinzas sem ter feito fogo? Como penitenciar-se, se não houve pecado porque a carne não foi levada (carne-vale)? Não temos cinzas numa Quarta-feira de Cinzas...

Mas como podíamos nos esbaldar num tempo de pandemia — um tempo em que a morte não era fantasia, mas realidade?

A pandemia tem sido um carnaval de lágrimas e mortes, e a vacinação, que seria sua Quaresma, foi mal planejada e sabotada. As cinzas desta singular Quarta-Feira de Cinzas repetem sombras, e não a sensualidade luminosa e perdoável da folia carnavalesca.

Estes dias cinzentos levam a outros tempos igualmente ansiosos. É impossível não sussurrar, com Carlinhos Lyra e Vinícius de Morais, a “Marcha da Quarta-feira de Cinzas: “Acabou o nosso carnaval/ Ninguém ouve cantar canções/ Ninguém passa mais brincando feliz/ E nos corações/ Saudades e cinzas foi o que restou.../ Pelas ruas, o que se vê/ É uma gente que nem se vê/ Que nem se sorri, se beija e se abraça/ E sai caminhando/Dançando e cantando cantigas de amor...”

Seria possível tornar o carnaval, cuja origem e legitimidade é religiosa e cujo desenho remete a oposições cósmicas, um feriado normal, objetivamente histórico ou cívico, em que se comemora algo concreto?

Tenho dúvidas, porque jamais pensei em testemunhar um adiamento do carnaval, inesperadamente misturado a uma pestilência. Se é impossível transferir o 7 de setembro, o 15 de novembro, o fim do ano — ou o aniversário de casamento que você sempre esquece —, como fazer o mesmo com uma festa cósmica. Uma festa que, no credo católico, inventa o próprio tempo, pois demarca o nascimento, o sacrifício e a ressurreição de Deus na sua figura humana.

Tudo pode ser mudado, doutor, ouço um leitor. Sem dúvida, mas dá trabalho...

Um Brasil sem carnaval seria tão impensável quanto um purgatório sem almas. Ou um mundo pós-moderno sem turismo e sem as tais “aglomerações” (sem o “movimento”) que nos tornam humanos da espécie cosmopolita. Sapiens turísticos em constante movimento. Seres insaciáveis e alertas para a última novidade. Consumistas radicais que sabem do seu lugar de fala bem como dos seus desejos, mas não compreendem bem seus limites — essas disciplinas das quaresmas que também fazem parte da vida.

Música | Vinicius de Moraes / Toquinho - Marcha da quarta feira de cinzas

 

Poesia | Manuel Bandeira - Poema de uma quarta-feira de cinzas

Entre a turba grosseira e fútil
Um Pierrot doloroso passa.
Veste-o uma túnica inconsútil
Feita de sonho e desgraça...

O seu delírio manso agrupa
Atrás dele os maus e os basbaques.
Este o indigita, este outro o apupa...
Indiferente a tais ataques,

Nublada a vista em pranto inútil,
Dolorosamente ele passa.
Veste-o uma túnica inconsútil,
Feita de sonho e desgraça...