sábado, 21 de janeiro de 2023

Fernando Luiz Abrucio* - A hora da despolitização das Forças Armadas

O Estado de S. Paulo.

As Forças Armadas vivem hoje a maior crise de sua história. É uma crise de legitimidade perante o sistema político, a sociedade e a ordem internacional. Houve outros momentos difíceis para a instituição, como no conturbado mandato de Floriano

Peixoto ou no final da ditadura militar, mas em nenhum deles se teve tanto consenso sobre a imprescindível despolitização das Forças Armadas.

O cume dessa crise foi a intentona do dia 8 de janeiro, quando se constatou que a ação dos militares tinha sido, no mínimo, conivente com golpistas que praticaram um ato terrorista sem paralelo na história democrática brasileira. Mas o processo não se iniciou naquele trágico evento. As origens estão na adesão de boa parte dos integrantes das três Forças ao bolsonarismo, deixando-se politizar em episódios como o desastroso combate à covid-19 e em eventos públicos de apoio ao presidente Bolsonaro, que prometeu benesses materiais e, sobretudo, um projeto de poder a integrantes ou à própria instituição militar.

Cristina Serra - O general Etchegoyen e a covardia

Folha de S. Paulo

Militar da reserva emergiu das sombras para afrontar Lula

Setores das Forças Armadas, certamente frustrados com o fracasso do atentado no domingo infame, encontraram um porta-voz para mandar recados em tom de ameaça ao presidente LulaTrata-se do general da reserva Sérgio Etchegoyen, ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) do golpista Michel Temer.

Etchegoyen emergiu das sombras, onde atua com desenvoltura, e reapareceu num programa de entrevistas para afrontar Lula. Disse que o presidente praticou "ato de profunda covardia" ao manifestar a desconfiança de que militares tenham sido coniventes com a invasão e depredação do Palácio do Planalto.

Pablo Ortellado - Acusação de terrorismo

O Globo

A experiência nos últimos anos evidenciou a fragilidade de nosso arcabouço penal para conter e punir com rigor a atividade golpista

As ações de bolsonaristas radicais contra a ordem democrática têm sido chamadas pela imprensa e por juízes de “terrorismo”. O enquadramento como terrorismo não encontra amparo claro na legislação e sinaliza um esforço de endurecimento penal que talvez seja necessário. Enquanto o enquadramento mais claro no crime de abolição violenta do Estado Democrático de Direito (Lei 14.197/2021) acarreta pena de reclusão de 4 a 8 anos, o enquadramento como terrorismo (Lei 13.260/2016) levaria a penas de reclusão duríssimas, de até 30 anos.

Nossa lei antiterrorismo é deliberadamente inócua. Quando a instituímos, para atender à pressão internacional, havia temor da esquerda de que ela pudesse ser utilizada para criminalizar a conduta de movimentos sociais que estivessem reivindicando direitos — que pudesse ser usada para acusar de terrorismo um bloqueio de rodovia para reivindicar moradia pelo Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) ou uma ocupação do Incra para reivindicar reforma agrária pelo Movimento Sem Terra (MST).

Eduardo Affonso - Todes juntes, vamos!

O Globo

Ao contrário de seus auxiliares, o presidente Lula parece refratário ao progressismo linguístico

A linguagem inclusiva tem tudo para vir a ser exclusividade de um grupo restrito. É preciso muita determinação para incorporar ao idioma o gênero neutro — que existia no latim, com outra finalidade, e de que o português guarda resquícios — e levá-lo às últimas consequências.

Não basta — como fizeram em seus discursos de posse os ministros Alexandre Padilha, Cida Gonçalves, Fernando Haddad, Márcio Macêdo, Margareth Menezes e Silvio Almeida — se dirigir a “todos, todas e todes”.

No nosso ainda inculto e já não tão belo idioma, artigos, pronomes, substantivos, adjetivos e verbos no particípio sofrem flexão de gênero. O neutro implicará concordância em efeito cascata.

Ricardo Henriques - Desperdícios de recursos via isenções fiscais

O Globo

Renúncias fiscais na educação também devem ser observadas com lupa para melhorar a eficiência do gasto público

A conjunção de um cenário econômico e fiscal desafiador com a urgente necessidade de recompor o orçamento público em áreas fundamentais vai exigir dos gestores públicos um esforço ainda maior para melhoria da eficiência e qualidade do investimento estatal. Além de olhar para os gastos diretos do governo, é fundamental também investigar com lupa os efeitos das renúncias fiscais. Na educação, por exemplo, há muito a fazer.

Carlos Alberto Sardenberg - O verdadeiro Lula

O Globo

Presidente praticou políticas responsáveis, ortodoxas, no primeiro mandato por medo da reação dos meios econômicos

O presidente Lula considera uma bobagem esse negócio de Banco Central independente. Diz que o sistema não está funcionando porque a meta de inflação é muito baixa, a inflação real está elevada e os juros muito altos. Arremata dizendo que, no tempo do seu primeiro governo, o BC não era independente e conseguiu derrubar inflação e juros.

Confusão danada.

Começando pelo fim: o Banco Central nos dois primeiros mandatos de Lula, de fato, não tinha autonomia ou independência formal. Mas Henrique Meirelles, então um deputado tucano e ex-presidente mundial do Bank of Boston, só aceitou o convite de Lula para assumir o BC porque teve plena independência. Lula prometeu e cumpriu.

Hélio Schwartsman - Um sigilo a preservar

Folha de S. Paulo

Até Bolsonaro deve ter direito a seu sigilo médico

Hoje eu vou defender Jair Bolsonaro. Não acho que o sigilo sobre seu prontuário médico e cartão de vacinação deva ser retirado. É verdade que essa é uma defesa bem indireta. Não tenho nenhuma intenção de agradar ao ex-presidente nem coloco seu bem-estar entre as minhas prioridades. Penso, porém, que o sigilo médico é uma instituição que precisa ser respeitada, inclusive no caso de Bolsonaro.

São duas as razões que me levam a advogar por uma confidencialidade forte para informações médicas. A primeira é a proteção da intimidade. Uma boa anamnese pode incluir o que há de mais íntimo sobre uma pessoa, de suas preferências sexuais a hábitos alimentares, passando por eventuais vícios e histórico de doenças, do próprio indivíduo e de sua família. Não é por outro motivo que o prontuário é considerado um documento de propriedade do paciente, ainda que fique sob a guarda de profissionais ou instituições de saúde.

João Gabriel de Lima* - A mentira que destrói palácios

O Estado de S. Paulo.

Como evitar que cidadãos, movidos por uma mentira, destruam símbolos da democracia?

As imagens de destruição em Brasília ainda nos envergonham nos telejornais mundo afora. Elas são reprisadas a cada nova notícia sobre a crise militar no governo Lula. Por aqui o 8 de janeiro começa a sumir do noticiário, em nossa rotina de eventos impactantes quase todos os dias – no Brasil não se morre de tédio. No exterior, o vandalismo contra os palácios dos três Poderes, evento chocante e talvez inédito em democracias consolidadas, segue repercutindo.

A pergunta recorrente que os jornalistas estrangeiros fazem aos comentaristas brasileiros – eu mesmo tive de respondê-la algumas vezes ao longo da semana – é: como uma multidão foi capaz de tamanha violência? E, ainda por cima, motivada por uma mentira?

Marcus `Pestana - Perplexidades e angústias no Brasil de 2023

Ainda ecoam na imprensa, nas instituições e no imaginário coletivo os efeitos dos graves acontecimentos do início do ano em Brasília. Para um país que chegou a discutir a ideia do brasileiro como “homem cordial” proposta por Sérgio Buarque de Holanda, fruto do universo rural e colonial em nossa formação, produzindo um povo generoso, hospitaleiro, informal e afetivo, diferente de outros decorrentes de processos de colonização onde a violência foi elemento central, o grave atentado golpista assustou. Certamente, Sérgio Buarque subestimou o grau de violência e coerção presente no escravismo colonial, na dizimação dos povos indígenas, no combate às diversas revoltas populares e políticas como Inconfidência Mineira, Cabanagem, Revolução Farroupilha, Sabinada, Balaiada, Canudos, Contestado e Revolta da Chibata, entre outras, e nos traços permanentes de racismo, misoginia e homofobia.

Gabriel Guimarães* - Centro-direita é a alternativa à barbárie

O Globo

O fortalecimento da democracia no país passa por um projeto crítico ao PT que permita a recuperação do eleitor que um dia foi do PSDB

Desde a eleição presidencial de 2018, os partidos de centro-direita no Brasil estão em crise. A vitória de Bolsonaro com uma plataforma de extrema direita — associada a um discurso de pseudoliberalismo econômico na figura de Paulo Guedes — capturou um eleitorado, antipetista, que estava familiarizado com o projeto da centro-direita encabeçado pelo PSDB, mas que passou a enxergar Bolsonaro como único capaz de derrotar o PT.

Com os atos terroristas promovidos por bolsonaristas no dia 8 de janeiro, esse eleitorado da centro-direita pode ter caído na real. Pesquisa realizada pelo Datafolha mostra que 93% dos brasileiros repudiam os atos extremistas, e 55% acreditam que Bolsonaro teve alguma responsabilidade pelas cenas de depredação e vandalismo na capital federal. Há, então, uma provável fatia — que votou em Bolsonaro em 2018 e em 2022 — descontente com as consequências da postura do ex-presidente de atentar contra a democracia.

José Luis Oreiro: Medidas de Haddad “buscam dar uma satisfação ao mercado”

Economista da Universidade de Brasília diz que “a gestão de caixa do governo tem que mudar”

Por Diego Viana — Para o Valor, de São Paulo

O economista José Luis Oreiro, da Universidade de Brasília, ressalta o custo financeiro maior com que o governo tem arcado por causa da indexação:

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Arminio Fraga: ‘Vejo as medidas de Haddad com bons olhos. É o início de um trabalho difícil’

Luiz Fernando de Paula: ‘Um ajuste fiscal mais forte poderia repetir 2015’

Manoel Pires: “Vamos ter que ter paciência. As balas de prata que geram economia já foram usadas”

Valor: Como lhe parecem as primeiras medidas anunciadas pelo ministro Haddad?

José Luis Oreiro: Elas buscam dar uma espécie de satisfação ao mercado, ou seja, expressar que o governo não é irresponsável, está preocupado com o equilíbrio fiscal, quer reduzir o déficit primário. Acho que muitas não vão gerar o impacto previsto. O déficit deve ficar em 1%. No fundo, a intenção é ganhar tempo, até ter uma estratégia fiscal mais consistente, que terá que passar pelo aumento de impostos ou pela redução do gasto tributário. Ou as duas coisas, que seria o ideal.

Valor: Do lado do gasto, há uma ênfase em revisões de contrato. É factível?

Arminio Fraga: ‘Vejo as medidas de Haddad com bons olhos. É o início de um trabalho difícil’

Para o ex-presidente do Banco Central, em prazo mais longo é preciso um ajuste maior do que o anunciado

Por Diego Viana — Para o Valor, de São Paulo

O ex-presidente do Banco Central Arminio Fraga vê com bons olhos “o início de um trabalho difícil” do ministro Fernando Haddad, da Fazenda:

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Valor: Que impressão lhe causou o anúncio das primeiras medidas fiscais do ministro da Fazenda?

Arminio Fraga: Eu diria que foi um bom primeiro passo. Achei correto o ministro reconhecer que nessas medidas tem muita incerteza e muitas receitas que não são recorrentes. Em prazo mais longo, é preciso um ajuste até maior do que o anunciado, que vá além do controle da dinâmica de crescimento da dívida pública. Se o país quer atingir seu potencial, trabalhando nos grandes temas da desigualdade e da falta de oportunidade, e de temas macroeconômicos como a produtividade, precisamos repensar o direcionamento geral do gasto público. É um trabalho que vai levar tempo.

Valor: Há algo a destacar nessas primeiras medidas?

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

Punir golpistas impõe desafio ímpar à Justiça

O Globo

Profusão de envolvidos, prazos de prescrição e lentidão do Judiciário dificultam condenação dos criminosos

Não existem investigações nem processos mais prioritários hoje no Brasil do que os ligados aos eventos do 8 de janeiro. A democracia foi alvo de uma tentativa de golpe felizmente fracassada. Agora, policiais, procuradores, juízes e ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) devem lembrar diuturnamente a relevância da obtenção criteriosa de provas, da elaboração de denúncias robustas contra os acusados e, quando chegar o momento, de decisões judiciais exemplares. “Foi uma ignomínia, um violentíssimo ataque à honra e à imagem do nosso país, que deve ser punido com o rigor da nossa Constituição e demais leis. Até para que não se repita jamais”, afirma o ex-ministro do STF Carlos Ayres Britto.

Todos os recursos financeiros e humanos precisam estar à disposição para que sejam punidos os responsáveis pela violência inaceitável. O desafio é gigantesco. Os detidos sob suspeita de participação nos ataques do 8 de janeiro somaram 1.406. Desse total, a Justiça manteve 942 em prisão preventiva. Ainda há perto de 200 câmeras de segurança cujas imagens precisam ser examinadas em detalhes pela polícia.

Poesia | Carlos Drummond de Andrade - Mãos dadas

 

Música | Alceu Valença e Orquestra Ouro Preto - Na Primeira Manhã