quinta-feira, 3 de setembro de 2009

Urgência descabida

Merval Pereira
DEU EM O GLOBO


A questão da “urgência urgentíssima” para a análise, pelo Congresso, dos projetos sobre a exploração do petróleo na camada pré-sal poderia ter sido resolvida na noite mesmo de domingo, naquela reunião no Palácio da Alvorada em que o presidente Lula aceitou manter a divisão atual dos royalties para os estados produtores. O presidente aceitou também a sugestão do governador de São Paulo, José Serra, para que não limitasse no tempo a discussão dos parlamentares, contra a vontade do ministro da Comunicação Social, Franklin Martins, que se mostrou contrariado com a decisão. “Não vão aprovar nunca”, comentou alto, ao ouvir Lula abrindo mão do expediente

Atribui-se a Franklin Martins a retomada do tema no dia seguinte, desta vez com o apoio enfático do senador Renan Calheiros, do PMDB, que comandou a reivindicação de que o presidente voltasse atrás do que combinara com os governadores e enviasse os projetos com a chancela de “urgência urgentíssima”.

Vê-se agora que nem mesmo a maioria da base do governo está convencida de que essa é a melhor solução, e o presidente Lula encontra-se diante de uma inédita rebelião de seus próprios aliados, que estão considerando um descaso com o Congresso dar tão curto espaço de tempo (90 dias) para a análise de tema tão complexo, que custou ao governo mais de um ano de debates internos para chegar a uma proposta.

O comentário do líder petista Henrique Fontana, de que quanto mais rapidamente o Congresso decidir, mais rapidamente o país usufruirá dos benefícios do petróleo do pré-sal, revela ignorância do assunto e mistificação, pois é de conhecimento de todos que os resultados da exploração na camada pré-sal só serão reais dentro de dez a 15 anos. O que o PT quer é um tema para a campanha eleitoral de Dilma Rousseff à Presidência da República.

O ministro da Comunicação Social, aliás, teve papel preponderante na reunião do Palácio da Alvorada, chegando a ser ríspido com o governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, em pelo menos duas oportunidades.

Logo no início da reunião, reclamou em termos duros do governador por este ter dito que o governo estava fazendo “bravata nacionalista” com o tema do pré-sal.

Depois, quando tentava defender a mudança do marco regulatório de concessão para o sistema de partilha, o ministro arrancou um sorriso do governador Sérgio Cabral quando citou a Líbia como exemplo. “Está rindo de quê?”, perguntou Franklin Martins, irritado.

Ora, há estudos suficientes para demonstrar que os países que adotam esse tipo de partilha são, em sua grande maioria, ditaduras como a Líbia, onde o nível de corrupção é bastante elevado.

O governador Sérgio Cabral, aliás, teve que ser acalmado em diversas ocasiões, inclusive pelo próprio presidente Lula, que lhe enviou bilhetinhos recomendando tranquilidade.

Houve um momento em que ele discutiu de dedo em riste com o ministro das Minas e Energia, Edison Lobão, que afirmara que havia conversado com ele sobre a questão dos royalties do pré-sal.

“Não é verdade”, reagiu Cabral, sendo contestado por Lobão, que lhe disse: “Isso não é maneira de um governador se dirigir a um ministro de Estado. Nós conversamos sobre o assunto em uma reunião da Petrobras no Rio”. Cabral retrucou: “E eu lhe disse que não aceitava a mudança da repartição dos royalties dos estados produtores”.

Os três governadores tinham como objetivo central garantir que a divisão dos royalties se mantivesse inalterada, o que conseguiram, pelo menos inicialmente.

Na verdade, o que prevaleceu na reunião foram os argumentos apresentados pelo secretário de Desenvolvimento Econômico do Rio, Julio Bueno, que já exercera papel idêntico no governo de Paulo Hartung (ES). Ele demostrou que o Rio de Janeiro produz 85% do petróleo brasileiro e fica com 45% do total das participações governamentais, que envolvem os royalties e as participações especiais.

Pelos dados oficiais da Agência Nacional do Petróleo (ANP), essa participação do Rio é de 80%, mas trata-se de um truque contábil. A participação do governo federal de 39% fica de fora nessa conta.

Se o sistema de divisão fosse alterado, os estados produtores teriam um grave prejuízo. O Rio de Janeiro perderia R$ 16,5 bilhões por ano; São Paulo, R$ 12,4 bilhões; e o Espírito Santo, R$ 4,1 bilhões.

O secretário Julio Bueno levou também um estudo que demonstra que o Rio de Janeiro perde anualmente R$ 8,6 bilhões porque o Imposto de Circulação de Mercadorias (ICMS) é cobrado no local de consumo, prejudicando os estados produtores de petróleo.

O governador José Serra carrega a fama de ser o mentor da lei, na Constituinte de 1988. Mas a verdade é que não foi possível cobrar o ICMS na origem, como era a proposta da comissão presidida por ele e da qual fazia parte o hoje senador pelo Rio Francisco Dornelles, porque a maioria dos estados, importadores de petróleo e derivados e de energia elétrica, perderia, por ter de pagar o ICMS que não pagava antes.

Já há setores do governo espalhando que o presidente Lula se incomodou com a reação de Sérgio Cabral, outros dizendo que o apoio do ministro da Defesa, Nelson Jobim, à reivindicação dos estados produtores seria uma indicação de sua proximidade com o governador José Serra, esquecendo-se de que Jobim é do PMDB, partido dos governadores do Rio e do Espírito Santo.

O artigo 49, redigido por Jobim com a assessoria do secretário da Fazenda do Rio, Joaquim Levy, garante essa divisão inalterada, mas nada impede que no Congresso esse artigo seja retirado do projeto, ação que já está sendo estimulada por setores do governo.

Os governadores do Rio, de São Paulo e do Espírito Santo irritaram áreas do governo com sua reação, e já há várias retaliações em marcha, que eles terão que superar com acordos políticos

Esse crime chamado justiça

Demétrio Magnoli
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

A jornalista Helena Chagas, diretora de O Globo em Brasília (hoje na TV Brasil), soube por seu jardineiro de um depósito de vulto na conta do caseiro Francenildo Costa e passou a informação ao senador Tião Viana (PT-AC), que a transmitiu ao ministro da Fazenda, Antônio Palocci. Então, Palocci convocou ao Planalto Jorge Mattoso, presidente da Caixa Econômica Federal (CEF). Naquele dia, Mattoso tirou um extrato da conta de Francenildo. À noite, 23 horas, reuniu-se com Palocci na casa do ministro, num encontro a três, no qual estava Marcelo Netto, assessor de imprensa do Ministério. No dia seguinte, o mesmo extrato que circulou na reunião foi publicado no site da revista Época.

O enredo acima não é uma tese, mas uma narrativa factual, comprovada materialmente pelas investigações da Polícia Federal, que está nos autos da denúncia apresentada ao STF.

A defesa alegou não existirem indícios robustos sobre a autoria da transmissão do extrato à revista e argumentou que o crime de quebra de sigilo bancário só ficou caracterizado no momento da publicação do extrato. O STF derrubou o argumento central da defesa, identificando indício de crime na transferência do extrato de Mattoso para Palocci. Mas só admitiu a denúncia contra Mattoso, que responderá a processo em instância inferior. Uma frágil maioria, de cinco contra quatro juízes, alinhou o Judiciário com o paradigma do Executivo, expresso por Lula: no Brasil, o Estado distingue os "homens incomuns" dos "homens comuns".

A maioria que livrou de processo o "homem incomum" se orientou pelo relatório de Gilmar Mendes, o presidente do STF. Mendes é um defensor incansável de que a Justiça não se pode submeter ao "clamor das ruas" e do princípio do Estado de Direito de que ninguém deve ser punido sem a existência de provas capazes de arrostar a presunção de inocência. Não há nos autos prova acima de dúvida razoável de que Palocci tenha ordenado a quebra de sigilo. O STF, contudo, não julgava a culpa ou inocência do ministro. Julgava apenas o acolhimento da denúncia, ou seja, a deflagração de um processo. Para isso bastam indícios convincentes de participação em ato criminoso. Os cinco juízes que negaram tal estatuto ao relato comprovado nos autos condenam a Nação a conviver com a impunidade legal dos poderosos. Eles cometem um crime contra a justiça.

Nunca, desde o encerramento da ditadura militar, o Estado brasileiro violou tão profundamente a ordem democrática quanto na hora em que Mattoso selecionou, entre os milhões de correntistas da CEF, o nome de Francenildo, uma testemunha da CPI que investigava o poderoso ministro. No mesmo dia em que o presidente da CEF acessava o extrato "suspeito", mas não o transmitia ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), guardando-o para Palocci, Tião Viana prometia aos jornalistas "uma grande surpresa". O poder que faz isso não conhece limites. Seu horizonte utópico é o Estado policial: a administração pública convertida em aparelho de intimidação permanente dos cidadãos, por meio da invasão da privacidade e da chantagem pessoal.

"A corda acabou estourando do lado mais fraco, como sempre", diagnosticou o juiz Marco Aurélio Mello, referindo-se ao voto da maioria de seus colegas. Os cinco juízes decidiram que o crime inominável só pode ser reconhecido com a condição de que a responsabilidade por ele recaia apenas no agente direto da operação ilegal. O paralelo é inevitável: esses juízes abririam processo contra um rato dos porões da tortura, mas absolveriam de antemão os altos oficiais que comandavam a máquina de interrogar e torturar da ditadura militar.

O relatório de Gilmar Mendes pendeu sobre o abismo por algum tempo, até ser resgatado da derrota por um inacreditável Cezar Peluso. O juiz destroçou a tese da defesa, mas, antes da conclusão lógica, imaginou a hipótese de que Mattoso não seguia uma instrução do ministro ao quebrar o sigilo de Francenildo. A sua hipótese altamente improvável talvez pudesse sustentar uma absolvição de Palocci ao final de um processo. Mas bastou-lhe para rejeitar a abertura do próprio processo que a escrutinaria. Peluso sucederá a Mendes à frente do STF, no ano que vem. A minha hipótese é de que ele decidiu contra seus próprios argumentos, sacrificando a justiça para estabelecer uma jurisprudência informal de submissão dos juízes ao voto do presidente do tribunal nos casos de valor político estratégico. A ordem tradicional que organiza o mundo não pode ser violada - eis a mensagem inscrita no voto de Peluso.

A maioria configurada na defesa dessa ordem tradicional relegou Francenildo ao papel de espectador silencioso da solenidade de consagração de uma impunidade tão absoluta que impede a própria instauração de processo. Essa maioria assistiu, talvez levemente constrangida, ao espetáculo ignóbil proporcionado pelo advogado de Palocci, José Roberto Batochio, que assomou à varanda de sua Casa-Grande ideológica para apontar o caseiro como um "singelo quase indigente". Quando proferiram seus votos, os cinco juízes enxergaram um semelhante não em Francenildo, mas em Palocci. Eles votaram na sua casta, deixando as impressões digitais do persistente patrimonialismo brasileiro nos registros da Corte constitucional.

Francenildo sou eu, somos nós todos, potenciais testemunhas de desvios de conduta das altas autoridades políticas. A decisão proferida por um STF diminuído equivale a uma mensagem destinada aos cidadãos comuns. Eles estão dizendo que o silêncio vale ouro: o privilégio a uma privacidade que não figura como um direito forte aos olhos da Corte devotada a interpretar a Lei das Leis. Estão condenando a Nação a calar quando se trata dos homens de poder. Como nem todos calarão por todo o tempo, estão condenando o País a ter novos Francenildos. É o preço que cobram pela absolvição do cidadão mais que comum.

Demétrio Magnoli é sociólogo e doutor em Geografia Humana pela USP.

Congresso é o palanque entre eleições

Maria Inês Nassif
DEU NO VALOR ECONÔMICO


O alto componente emocional que se agrega à política em momentos de grande radicalização de partidária turva julgamentos, em especial quando eles se referem a instituições. Dos partidos políticos se originam os ataques de alta capacidade ofensiva, mas ironicamente é mesmo aos partidos que eles se destinam. Quando se fala em desgaste das instituições, em especial do Legislativo, é aos partidos que isso se refere. E quando se fala em baixa qualidade das instituições, em especial do Legislativo, essa avaliação bate direto nos partidos políticos.

O chamado desgaste do Legislativo remete a alguns fatos. Um deles é uma baixa qualidade que não é da representação política como um todo, atente-se a isso, mas é da elite parlamentar que ascende a funções de liderança via partidos políticos - dessa realidade, hoje, não são poupados nem partidos do governo, nem da oposição; nem pequenos, nem grandes partidos. O segundo fato é a midiatização do Legislativo. A massificação do acesso à informação, em especial pela imagem, levou para dentro da residência do eleitor o espaço por excelência das disputas partidárias, o Congresso. O Parlamento tornou-se, assim, quase que uma extensão do horário eleitoral gratuito. Não existe desmonte de palanque entre uma eleição e outra.

Trazer o espaço de lutas políticas para o eleitor é um pressuposto altamente democrático. Todavia, isso ocorre num momento de radicaliação ideológica e dentro de um modelo de militância partidária que é emprestado da mídia de espetáculo. A ofensiva política é espetacular; o ator político fala para os microfones e encena para as câmeras; o enredo é dramático e não raro ficcional.

Assim como a mídia, os partidos políticos dedicam-se a firmar conteúdos à base de fortes emoções. Isso não desideologiza o espaço público no qual se movem os partidos - aliás, nem seria desejável um Legislativo que não seja o de embates entre ideologias, não é esse o problema. A emocionalização e a teatralização da política, isso sim, desqualificam o debate. Embora as razões ideológicas para a ofensiva midiática dos partidos políticos sejam claras, o tipo de discurso está voltado para vencer o eleitor pelas emoções, sem que a racionalidade esteja presente ao debate. Isso não qualifica o cidadão-eleitor e muito menos os partidos políticos envolvidos nesse tipo de política rasa. Aliás, pode ter um efeito contrário a isso e bastante perverso. Como são partidos que estão em choque constante no Legislativo, eles também estão sujeitos aos intensos processos de desgaste a que submetem a instituição como um todo.

A política partidária-midiática pode ganhar mais relevância se encontra correspondência na sociedade civil, em especial em setores com algum grau de relevância na formulação de opiniões públicas, inclusive a própria mídia. A contraindicação, nesse caso, é que a sobrevivência à base de criação de grandes comoções em algum momento dá vida própria aos processos de criação de escândalos. A racionalidade é a principal vítima disso; os partidos políticos, mais uma vez, são a segunda maior vítima dos escândalos que se autoalimentam.

O outro problema de políticas mantidas nesse ambiente é que elas, num primeiro momento, envolvem grandes parcelas de eleitorado pela emoção, mas no momento seguinte têm um potencial muito maior de criar ceticismos. Quando a comoção se alia a grandes polarizações ideológicas, os partidos aos poucos vão perdendo a capacidade de ampliar seus eleitores à base da midiatização. O que ocorre, via de regra, é que o discurso político-emocional tende a radicalizar posições que já estão consolidadas. Até do ponto de vista eleitoral o midiatismo é pouco recomendável aos partidos políticos.

Trazendo mais ainda a análise para o quadro partidário brasileiro, a outra característica da política emocional é a de se apoiar em julgamentos sempre morais, e sempre muito frágeis. O julgamento ético é mais neutro, ele se aplica democraticamente aos cidadãos, qualquer que seja a filiação partidária. Um julgamento moralista imprime moralidades diferentes a casos diferentes; e obrigações de moralidade diferentes a pessoas que são iguais, pelo menos do ponto de vista constitucional. A moralidade de ocasião não se sustenta como debate político, mas ajuda a radicalizar as partes que já fizeram a sua opção ideológica. É apenas um alimento de uma radicalização que não dá votos, que não melhora a qualidade dos partidos e não ajuda a qualificar a representação política.

Maria Inês Nassif é editora de Opinião. Escreve às quintas-feiras

Empilhando

Eliane Cantanhêde
DEU NA FOLHA DE S. PAULO


Com o pré-sal, o governo Lula continua empilhando e abandonando, uma a uma, suas principais bandeiras políticas. Agora, só vai se falar no pré-sal, no seu fundo social, na sua importância geopolítica para o Brasil e na sua imensa potencialidade para os palanques da ministra Dilma. Combinando com o "Minha Casa, Minha Vida", para equilibrar o abstrato e o concreto.

Antes do pré-sal, a grande bandeira era o PAC, que reúne bilhões de reais para obras por todo o canto e serve de pretexto para Lula carregar seus 80% de popularidade e sua candidata debaixo do braço para inaugurar pedra fundamental, depois a primeira pedra, depois o primeiro tijolo. Só que, segundo os entendidos em marketing, o tal PAC não tem muita graça e, para os entendidos em obras, está cheio de buracos e de atrasos.

Antes do pré-sal e do PAC, o governo bem tentou o biocombustível, que é simpático, moderno e bem aceito no país e no mundo. Foi até o centro da conversa de Lula com George W. Bush em São Paulo, mas submergiu enquanto o pré-sal emergia das profundezas do mar.

Antes do pré-sal, do PAC e do biocombustível, tentou-se muito embalar o Primeiro Emprego, mas ele, coitado, nunca vingou. A ideia parecia até bonita, mas entre ser bonita e factível vai uma diferença enorme.

E antes do pré-sal, do PAC, do biocombustível e do Primeiro Emprego, houve o Fome Zero.

Aliás, você aí lembra do Fome Zero, lançado, na primeira entrevista de Lula depois da vitória, como o grande projeto do seu mandato? Sumiu.

Do outro lado, chega a ser patética a tentativa de reação de Serra, dizendo-se "amigo dos pobres" ao anunciar uma redução de juros "de mãe para filho". Pobres de nós.

E ainda falta mais de um ano para a eleição...

PS - Jobim responde: "Isso de que eu vou sair [da Defesa] é intriga, pura fofoca". A conferir.

Pré-sal. Mudança da agenda do Congresso e tentativa de retomada da polarização na disputa de 2010

Jarbas de Holanda
Jornalista

Teve muita semelhança a avaliação econômica feita ontem pelos grandes veículos da imprensa sobre o anúncio do marco regulatório e das demais propostas do governo para a exploração das reservas de petróleo e gás da camada pré-sal. Avaliação evidenciada nos títulos e principais matérias a respeito do tema: do Valor – Pré-Sal reforça viés estatizante”, e “Petro-sal terá poder para vetar consórcios privados”, do Estadão – “Regras do pré-sal ampliam poder do Estado na exploração do petróleo”, do Globo – “Regras estatizantes para pré-sal assustam mercado. Ações da Petrobras caem 4,4%. Empresários podem contar investimentos” e “De volta ao passado. Reservas do pré-sal serão controladas pela União, como na época do monopólio da Petrobras”. Da Folha – “Lula lança pré-sal com ataque a tucanos. Tom político, nacionalista e estatizante, marca anúncio de propostas que irão ao congresso” e “Lula inaugura a desprivatização”.

Quanto aos objetivos propriamente políticos da iniciativa, com a tramitação dos projetos do pré-sal, sobretudo em regime de urgência, o Palácio do Planalto e o seu aliado básico, o PMDB, esperam - com boa chance de conseguirem – deixar para trás a crise do Senado, bem como esvaziar a CPI da Petrobras, trocando-as (de setembro em diante) pelo debate e pelas manchetes correspondentes a respeito do pré-sal. E o regime de urgência reforçará a predominância desse debate, o que explica porque o presidente Lula, que o havia dispensado, atendendo a pedido do governador José Serra, decidiu afinal utilizá-lo no encaminhamento dos projetos, acolhendo recomendação tática do senador Renan Calheiros.

Outro propósito importante buscado com a mudança da pauta das duas casas do Congresso é a alavancagem da candidatura de Dilma Rousseff, por meio de sua promoção como principal estrela do pré-sal. Alavancagem tornada indispensável com as avarias sofridas nos últimos meses pela imagem da ministra e candidata em decorrência de problemas gerenciais (como o precário andamento das obras do PAC) e de natureza política – o desgaste na polêmica com a ex-secretária da Receita Federal, Lina Vieira, e a quebra da perspectiva da polarização Lula-PSDB na disputa presidencial, em face da emergência do cenário das candidaturas de Marina Silva e Ciro Gomes.

Foi justamente o desígnio de retomada dessa polarização que levou o presidente Lula a aproveitar o anúncio das propostas sobre o pré-sal para fazer fortes ataques ao governo do antecessor FHC. Postura assim tratada na reportagem de capa da Folha: “Numa continuação da retórica usada contra tucanos no segundo turno de 2006 e numa indicação de rumo para a campanha governista de 2010, Lula busca colocar seu governo como o oposto da gestão tucana no cada vez mais importante setor do petróleo”.

“Lição esquecida”

(Trechos de artigo de Rubens Ricupero,
na Folha de domingo último)

“Como reagiríamos se o coronel Chávez tivesse visitado o nosso presidente na campanha de 2006 para anunciar-lhe centenas de milhões de dólares e favorecimento nas importações a fim de ajudá-los na reeleição? Esse ato explícito de intervenção praticado (há pouco) pelo presidente Lula na política interna boliviana soma-se a outros de seus auxiliares em violação do princípio básico de diplomacia: a não ingerência”.

Sobre o recente encontro da Unasul: “A reunião do órgão em Bariloche se concentrou no acordo militar Colômbia-EUA, mas esse tema é inseparável de dois outros: a guerrilha e o narcotráfico, cada vez mais entrelaçados. Será razoável ver os colombianos condenados a bater às portas de Washington quando os vizinhos não escondem a simpatia ideológica pela guerrilha? E não conseguem (talvez nem tentem) evitar que seus territórios sejam usados pelos insurretos como santuário ou para obter armas?”. “Cem anos atrás, o barão do Rio Branco propunha à Argentina e ao Chile o pacto do ABC. Cada pais se comprometeria a impedir a organização em seu território de expedições armadas de exilados para promover guerra civil nos dois outros países. Em caso de insurreição, proibia-se qualquer comércio com insurgentes, que seriam desarmados ao passarem a fronteira”.

“Por que exigir garantia apenas da Colômbia (sobre o acordo com os EUA), sem cobrança análoga da Venezuela em relação às ameaças multiplicadas por Caracas e ao desvio para a guerrilha de armas pesadas importadas da Suécia? Nem do Equador no que se refere ao uso do seu território por líderes das Farc como os mortos em incursão colombiana?”

Combate à exclusão racional

Fábio de Castro
Agência FAPESP

Pensar criticamente – isto é, ser capaz de reconhecer e formular bons argumentos – é uma prática fundamental para o exercício pleno da cidadania e da democracia. Mas, apesar de ser uma necessidade tão universal, a intimidade com a boa argumentação não é uma realidade para grande parte da população, que, por conta disso, fica exposta a todo tipo de falácias e argumentações enganosas.

Com a finalidade de combater essa “exclusão racional”, acaba de ser lançado o livro Pensamento crítico – O poder da lógica e da argumentação, de Walter Carnielli e Richard Epstein. Segundo os autores, a obra tem como objetivo servir de guia para a boa argumentação e, ao mesmo tempo, de instrumento de “autodefesa intelectual contra as falácias do mundo contemporâneo”.

Carnielli, professor do Departamento de Filosofia do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), e Epstein, diretor do Advanced Reasoning Fórum no Novo México, Estados Unidos, também escreveram em conjunto a obra Computabilidade, funções computáveis, lógica e os fundamentos da matemática, que em 2007 foi um dos ganhadores do Prêmio Jabuti, na categoria Ciência Exatas, Tecnologia e Informática.

Os dois livros são produtos do Projeto Temático “Consequência lógica e combinação de lógicas – Fundamentos e aplicações eficientes”, apoiado pela FAPESP e coordenado por Carnielli. De acordo com o professor, Pensamento crítico se baseou na obra Critical thinking (2001), escrita por Epstein com sua colaboração, que se tornou um best-seller nos Estados Unidos. A colaboração entre os dois autores é intensa há mais de 25 anos.

Segundo Carnielli, um dos diferenciais da obra é abordar o pensamento crítico de maneira fundamentada, diferentemente de outras obras que tratam o tema, em geral, como retórica e técnica de argumentação, sem base sólida na lógica.

“Nosso livro é um guia da arte de pensar criticamente a partir de bases lógicas. Ele preenche uma lacuna, uma vez que em línguas latinas não há praticamente nada sobre o assunto e, mesmo nos Estados Unidos, não há um livro que trate do pensamento crítico de maneira fundamentada, sistemática e ao mesmo tempo voltada para o grande público”, disse Carnielli à Agência FAPESP.

Segundo ele, o livro é dirigido a um público amplo com o objetivo de contribuir com o acesso à cidadania. “Da mesma forma que falamos em exclusão digital, podemos falar hoje em exclusão racional, ou exclusão argumentativa. Se a pessoa não tem acesso às bases da boa argumentação, será facilmente enganada”, disse.

Carnielli indica como um dos destaques da obra o fato de sua análise não se limitar a argumentos válidos ou inválidos, mas se estender também às definições de argumentos fortes e fracos.

“Apresentamos, de forma sistematizada, uma teoria da argumentação com bases sólidas na lógica contemporânea, passando também pela teoria clássica da argumentação, partindo de Aristóteles, com bases claras e simples”, explicou.

Ao aproximar argumentação e lógica, a obra adquire uma grande amplitude de aplicações práticas, úteis para vestibulares, concursos públicos, exames de todo tipo e práticas profissionais de jornalistas, professores, advogados, juízes, políticos, médicos e cientistas, por exemplo. “O livro pode ser utilizado por um público que vai de estudantes de colégios a parlamentares”, disse.

Jiu-jitsu da argumentação

O uso de exemplos cotidianos e de ilustrações bem-humoradas (incluindo diversas tiras) são destaques da obra que contribuem para aumentar a proximidade do pensamento crítico com a realidade dos leitores. “Embora tenhamos mantido a estrutura da edição norte-americana, a versão brasileira foi completamente refeita, com o uso de exemplos do cenário público nacional, incluindo política, televisão, jornalismo e cartoons”, disse Carnielli.

O livro é dividido em quatro partes principais: “As bases fundamentais”, “A estrutura dos argumentos”, “Como evitar os maus argumentos” e “Argumentos com base na experiência”.

A primeira parte trata de definir o que é o pensamento crítico, o que são frases vagas e ambíguas, o que são bons argumentos, quais os princípios da discussão racional, os critérios básicos para rejeitar ou aceitar afirmações e a diferença entre plausibilidade e verdade.

A segunda parte explica o que são as afirmações compostas, os argumentos complexos e as generalidades. Já a terceira parte ensina a detectar maus argumentos: afirmações ocultas, apelos emocionais e falácias estruturais ou falácias de conteúdo.

A quarta parte, além de fazer um inventário de falácias, devidamente classificadas, ensina a boa utilização de analogias e generalizações, entre outras. Um dos capítulos finais é reservado aos elementos da lógica propriamente dita.

“Podemos dizer que se trata aqui de um ‘jiu-jitsu da argumentação’. A ideia é instrumentalizar o leitor para se defender das falácias. Nas duas últimas partes tratamos de mostrar, por exemplo, como enganar com números e estatísticas, como usar a falsa precisão e falsos positivos e como deturpar gráficos e médias. Fazemos também uma relação das falácias famosas – incluindo a lista negra das falácias mais perigosas”, explicou o professor da Unicamp.

O livro levou cerca de sete anos para ser feito. “Escrever em linguagem simples é mais difícil e demorado do que se expressar por fórmulas matemáticas. Mas isso era necessário para que o livro fosse acessível e cumprisse sua missão”, disse.

Segundo Carnielli, o pensamento crítico traz grandes vantagens competitivas no mundo contemporâneo, no qual todos são submetidos a pressões de argumentos falaciosos que inundam a internet, a publicidade e o jornalismo, por exemplo. Além disso, ele garante uma orientação racional para que se possa tomar posição sobre os debates sociais polêmicos, que passam por temas como aborto, criacionismo ou direitos humanos.

“Todos esses temas estão presentes no livro. O conhecimento da boa argumentação permite que tomemos decisões melhores e que possamos lutar por nossos direitos em todos os campos. Podemos usar o pensamento crítico para avaliar e-mails maliciosos, boatos e notícias falsas, ou para desmascarar, sob um discurso aparentemente coerente, a superstição e o obscurantismo”, destacou.

Pensamento crítico – O poder da lógica e da argumentação
Autores: Walter Carnielli e Richard Epstein
Lançamento: 2009
Preço: R$ 34
Mais informações: www.livrariacultura.com.br

O QUE PENSA A MÍDIA

Editoriais dos principais jornais do Brasil
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Reforma restringe internet na campanha

Adriana Vasconcelos BRASÍLIA
DEU EM O GLOBO

O projeto de reforma eleitoral aprovado em duas comissões no Senado restringe a cobertura jornalística de campanhas na internet. Sites teriam de seguir as regras das emissoras de rádio e TV, mas alguns senadores protestaram. Acórdão do Supremo sobre o fim da lei de imprensa publicado ontem deixa claro o caráter livre da internet. Com a polêmica, a votação final foi adiada.

Senado admite ter votado censura

Comissões restringem cobertura de eleições na internet, e senadores já aceitam voltar atrás

Em sessão conjunta, as comissões de Constituição e Justiça e de Ciência e Tecnologia do Senado decidiram manter ontem no texto da reforma eleitoral as restrições impostas pela Câmara à cobertura jornalística de campanhas eleitorais na internet. A tentativa de impor a sites jornalísticos, blogs, radiosweb e webTVs as mesmas regras previstas pela legislação eleitoral para emissoras de rádio e TV brasileiras contraria decisão recente do Supremo Tribunal Federal.

O ministro Carlos Ayres Britto, que também preside o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), encaminhou ontem para publicação o acórdão da decisão do STF que considerou, em abril passado, inconstitucional a lei de imprensa.

No texto, o tribunal deixa claro o caráter livre da internet: “...Silenciando a Constituição quanto ao regime jurídico da internet, não há como se lhe recusar a qualificação de território virtual livremente veiculador de ideias, debate, notícia e tudo o mais que se contenha no conceito essencial da plenitude de informação jornalística no nosso país.” Pouco depois da aprovação da reforma eleitoral nas comissões do Senado, as medidas restritivas à cobertura jornalística das campanhas pela internet já suscitavam polêmica entre os próprios senadores que participaram da votação. Com isso, a votação final do texto, em plenário, foi adiada para terça-feira. Até lá, os líderes partidários tentarão encontrar uma fórmula para acabar com o que alguns senadores já classificam de censura.

O líder do PT, Aloizio Mercadante (SP), sugeriu que o artigo que impõe tais restrições seja retirado integralmente do texto da reforma. O petista propôs que seja aprovado artigo no texto garantindo o direito de resposta aos candidatos que se considerarem prejudicados ou ofendidos. Sua proposta é que essa resposta seja publicada no prazo máximo de 48 horas e que fique no ar por tempo duas vezes maior do que tiveram reportagens ou artigos considerados ofensivos.

— Há espaço para buscarmos uma solução que preserve a liberdade de expressão e o direito de opinião. Até porque a essência da internet é a liberdade de expressão — disse

Doações ocultas continuam

O líder do PSDB, Arthur Virgílio (AM), foi um dos primeiros a manifestar preocupação com as restrições impostas à cobertura na rede: — A internet nasceu para ser livre, e foi isso o que permitiu que o presidente Barack Obama derrotasse a Hillary Clinton.

O presidente da CCJ, Demóstenes Torres (DEM-GO), que comandou a votação da reforma eleitoral, foi outro que admitiu a necessidade de mudança do texto: — Do jeito que ficou, o texto é restritivo, sim. Mas vamos mudá-lo.

Já Eduardo Azeredo (PSDB-MG), um dos relatores da reforma eleitoral, resistia às mudanças, mas cedeu. Ao longo do dia, ele se mostrou confuso sobre o alcance das medidas restritivas.

Sua intenção era aplicar aos sites jornalísticos as regras impostas atualmente aos jornais, impedindo inclusive os blogs de emitirem opiniões sobre os candidatos. Já rádios e TVs mantidas na internet teriam de seguir os mesmos critérios aplicados às emissoras de rádio e televisão convencionais, que determinam que seja dado espaço igual em sua programação a todos os candidatos.

A novidade introduzida pelo Senado ontem foi a emenda de Eduardo Suplicy (PT-SP) que autoriza os partidos políticos a realizarem prévias para a escolha de candidatos majoritários.

A proposta prevê que os partidos possam organizar debates entre seus pré-candidatos, permitindo, inclusive, que sejam transmitidos pelos meios de comunicação. O texto é omisso em relação à possibilidade de esses candidatos fazerem propaganda.

De acordo com a proposta aprovada ontem, fica proibida a participação de qualquer candidato em inaugurações de obras públicas ou no lançamento de pedras fundamentais nos seis meses que antecedem as eleições. Também foi vedada a publicidade institucional ou eleitoral dessas obras públicas no mesmo período.

Já os programas sociais, como o Bolsa Família, não poderão ser expandidos durante o ano eleitoral.

Mas seus benefícios poderão ser reajustados.

Fica proibida ainda a criação de novos programas desse tipo.

Apesar do esforço de Suplicy para garantir maior transparência às doações de campanha, foi mantido o texto da Câmara, que permite aos partidos receber doações em nome de candidatos, o que caracteriza as chamadas doações ocultas. Foi rejeitada proposta do petista que obrigava a publicação dos nomes dos doadores no dia 30 de setembro, véspera da eleição.

O ministro Ayres Britto vai se manifestar hoje sobre o texto aprovado.

Mas adiantou que as mudanças podem comprometer a transparência do processo eleitoral.

— A doação oculta é o mais preocupante — afirmou.

O adiamento da votação final para a terça-feira, após o feriado de 7 de setembro, poderá inviabilizar a aplicação da lei nas eleições de 2010. Isso porque o texto terá de voltar para a Câmara, onde passará por nova votação, e ser sancionado até 2 de outubro, um ano antes da eleição

PMDB vira e agora condena urgência

Cristiane Jungblut e Gerson Camarotti, Brasília
DEU EM O GLOBO

O PMDB se uniu à oposição e impôs a primeira derrota ao governo no pré-sal. Após obstruções no Congresso, Lula convocou líderes políticos e deve retirar o regime de urgência.

Sem urgência no pré-sal

PMDB se junta à oposição na questão do prazo de votação no Congresso e impõe a Lula 1ª derrota

Dois dias depois do lançamento das propostas relativas à exploração na camada do pré-sal, o governo teve ontem sua primeira derrota política. Pressionado pelo PMDB e outros partidos da base aliada — à exceção do PT —, pelos governadores dos estados produtores (Rio, São Paulo e Espírito Santo) e pela oposição, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva decidiu convocar para hoje de manhã mais uma reunião do Conselho Político. Lula vai avaliar a possibilidade de retirar o regime de urgência constitucional fixado para os quatro projetos de lei encaminhados ao Congresso. A expectativa é que Lula volte atrás.

Sob regime de urgência, os projetos devem ser votados em até 90 dias, sendo 45 na Câmara e 45 no Senado. Transcorrido esse prazo, a pauta fica travada. Avisado pelo presidente da Câmara, o peemedebista Michel Temer (SP), de que a base mudara de posição sobre a urgência, Lula deverá criar um artifício político que lhe permita recuar. O problema é que há resistência da ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff.

Ela, segundo aliados, teme que, sem a urgência, na tramitação normal, vários projetos possam ser anexados aos quatro já enviados.

Lula quer aprovação até fim do mandato

No Palácio do Planalto, a pressão do PMDB para retirar a urgência foi vista como a primeira derrota do governo em relação ao projeto do novo marco regulatório do pré-sal.

De forma reservada, o próprio presidente Lula chegou a demonstrar contrariedade com a mudança de comportamento do PMDB. O governo teme que, com a retirada da urgência, o marco regulatório não seja aprovado até o fim do mandato do presidente Lula. Caso isso aconteça, o discurso já está pronto: Lula colocará a culpa na oposição.

A questão da urgência constitucional acabou virando um cavalo de batalha na base, dividindo inclusive os partidos na Câmara e no Senado. Na reunião de segunda-feira passada com os líderes aliados, Lula foi convencido pelo PMDB do Senado a adotar a urgência como estratégia. Na ocasião, apenas o líder do PT, Cândido Vaccarezza (SP), ficou contra a medida.

Agora, é o PT que não quer o recuo.

O movimento pela retirada da urgência começou ontem pela manhã.

Depois de uma reunião de líderes partidários na Câmara, o líder do PMDB, Henrique Eduardo Alves (RN), disse que o ideal seria retirá-la para melhorar o clima na Casa, já que a oposição entrou em obstrução: — Faço um mea culpa e acredito que foi um equívoco os líderes terem convencido o presidente Lula a adotar a urgência. Mas vou acatar o que for decidido pelo presidente.

A preocupação do Planalto é evitar que a retirada da urgência seja interpretada como um novo recuo do presidente Lula. Por isso, a estratégia é esperar pelo pedido coletivo da base aliada.

— Fiz um relato completo ao presidente.

Disse a ele (Lula) que talvez fosse útil retirar a urgência, mas caberá ao presidente da República manter ou não a urgência constitucional, porque essa é uma prerrogativa dele — disse Temer.

Irmão de Agaciel poderá ser relator

Além da pressão dos governadores, inclusive de São Paulo, PMDB, PTB, PP e PR avaliaram que os projetos do pré-sal foram “arremessados” ao Congresso, sem maior discussão prévia. Os quatro projetos só chegaram ao Legislativo oficialmente na noite de terça-feira, o que irritou ainda mais os aliados.

Quanto à oposição, a obstrução tem apenas efeito político e de arrastar as sessões. Isso porque, em tese, os oposicionistas não têm votos suficientes, e a base, querendo, pode votar qualquer proposta sem dificuldade. Nas previsões mais otimistas do governo, mesmo com urgência, as propostas só seriam aprovadas em 2010.

O incômodo não foi só no Palácio do Planalto. No PT, houve forte reação à postura do PMDB de criar constrangimentos ao presidente Lula para retirar a urgência.

— Eu queria, sim, que o PT ficasse com o projeto da partilha. Mas o mais importante é preservar o texto do governo. E o PMDB tem que assumir esse compromisso — advertiu Vaccarezza, para, em seguida, criticar a mudança dos peemedebistas.

Até agora, a intenção é que o deputado Henrique Alves fique com a relatoria do projeto de partilha. No caso do PT, a ideia é que Arlindo Chinaglia (SP) seja relator do projeto do Fundo Social e que Antonio Palocci (SP) fique com a criação da Petro-Sal.

Mas ele pode ficar com a relatoria da capitalização da Petrobras, e o PR ficar com a Petro-Sal. O líder do PR, Sandro Mabel, indicará para relator João Maia (PR-RN), irmão de Agaciel Maia.

Serra diz que é "amigo dos pobres" e faz críticas a Lula

Catia Seabra
DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Governador anuncia redução de juros e afirma que medida é "de mãe para filho" Fala vem no mesmo dia em que governo Lula mantém inalterada a taxa Selic; tucano afirma que não joga "bilhete premiado no vaso"

Potencial candidato à Presidência, o governador de São Paulo, José Serra (PSDB), declarou-se ontem "amigo dos pobres" ao anunciar medida que classificou como de "mãe para filho": a redução de 1% para 0,7% da taxa mensal de juro aplicada em empréstimo para a população de baixa renda.

Em evento em tom de campanha, Serra anunciou a redução da taxa praticada pelo Banco do Povo Paulista para 7,68% anuais e reiterou suas críticas ao governo Lula."Num país civilizado, que tem uma política econômica sensata, esse é até um juro alto. Mas, no Brasil, é um juro de mãe para filho", afirmou.

A medida foi anunciada no mesmo dia em que, interrompendo trajetória de queda, o Banco Central manteve em 8,75% a taxa Selic.

Atribuindo ao ex-ministro da Saúde Adib Jatene a constatação "perfeita" de que "o problema de pobre não é ser pobre, mas só ter amigos pobres", Serra afirmou que aquele era um gesto de amizade. "Não vou dizer que o governo do Estado é rico, porque não há dinheiro sobrando, mas somos amigos dos pobres. Esse crédito do povo é uma forma de amizade".

Ao discursar, o secretário de Fazenda, Mauro Ricardo Costa, disse que a redução fora decidida na segunda-feira. Segundo ele, o governo prova que é possível reduzir juros no país. A baixa incidência de inadimplência, de 1,29%, justificaria a flexibilização do crédito, que incluiu dispensa de avalista no segundo empréstimo.

O Banco do Povo beneficia o eleitorado de baixa renda, oferecendo empréstimos que variam de R$ 200 a R$ 7.500.

No discurso, Serra disse que, contrariando um costume nacional, seu governo não desperdiça oportunidades: "Tanto quanto sorte, é importante a capacidade para aproveitar oportunidades, coisa que não é comum no nosso país. A gente tem, inclusive, um complexo de muitas vezes ganhar bilhete da loteria, jogar no vaso sanitário e puxar a descarga, em matéria de perda de oportunidade".

Embora tenha participado da cerimônia em que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva chamou a descoberta do pré-sal de bilhete premiado, Serra negou que se referisse às reservas recém-descobertas no país.

Com Marina no PV, Dilma adota discurso ambiental

Leonencio Nossa e Tânia Monteiro
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO


Criticada pelos ambientalistas, a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, trocou ontem a leitura de números em arquivo de PowerPoint pela defesa exaltada dos rios e das baías. Três dias depois da filiação ao PV da ex-ministra do Meio Ambiente e senadora Marina Silva, possível concorrente nas eleições presidenciais, Dilma anunciou obras de saneamento em sete Estados, no valor total de R$ 4,5 bilhões, e demonstrou preocupação com recursos hídricos.

"É impossível termos vida se não tivermos o respeito à água", disse ela, em discurso no Itamaraty. "Respeitar a água é respeitar os mananciais, respeitar os mananciais é respeitar o meio ambiente, então, esse programa de saneamento é em primeiro lugar o respeito às águas deste país."

Dilma, que entrou em divergências com a ex-ministra do Meio Ambiente por causa de licenças ambientais na Amazônia, deu pouca ênfase ontem a detalhes de orçamento e execução das obras de saneamento. Chegou a discorrer sobre a forma de ocupação humana ao longo dos rios. "No centro da vida nas cidades, nos Estados e no Brasil estão nossos rios. Respeitar esses rios e essas bacias é algo fundamental", frisou.

A ministra destacou que o governo está fazendo obras para melhorar as águas da Baía de Guanabara, do Pantanal e da Baía de Todos os Santos. "Nosso país tinha um nível de tratamento da questão da água e do esgoto primitivo, do século 19", afirmou. "Temos não só nas regiões mais pobres, mas também nas mais ricas, uma carência de esgoto tratado."

Maria Souto e João Gabriel

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