• IPCA fecha 2015 em 10,67%, maior taxa em 13 anos. BC sinaliza novo ciclo de alta de juros
Pressionada pelo aumento da conta de luz, dos combustíveis e dos alimentos, a inflação medida pelo IPCA teve alta de 10,67% em 2015, o maior patamar em 13 anos, segundo o IBGE. Para os mais pobres, o custo de vida subiu ainda mais: 11,28% pelo INPC. Foi o sexto ano seguido de descumprimento da meta de inflação. Para evitar nova escalada dos preços em 2016, o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, sinalizou que a instituição voltará a subir os juros. Analistas acreditam que, ainda assim, a taxa deverá superar o teto fixado, ficando acima de 7%. Em carta à Fazenda para explicar o estouro da meta, Tombini culpou a condução da política fiscal.
Daiane Costa, Gabriela Valente - O Globo
Os aumentos nos preços de alimentos, energia elétrica e combustíveis fizeram a inflação oficial do país fechar 2015 em 10,67%, a maior taxa dos últimos 13 anos. Esse resultado fez o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) do IBGE estourar o teto da meta fixada pelo governo — que é de 4,5%, com margem para chegar até 6,5% — e deve forçar o Banco Central (BC) a voltar a subir juros para conter os preços, conforme sinalizou ontem à noite, o próprio presidente do BC, Alexandre Tombini:
— O Banco Central tem a taxa de juros básica da economia e este é um instrumento que vem utilizando e utilizará, quando necessário, para trazer a inflação para meta em 2017 e para fazêla passar por debaixo de 6,5% neste ano — disse Tombini em entrevista ao Jornal Nacional, da TV Globo.
A presidente Dilma Rousseff não conseguiu cumprir a meta em nenhum ano de seu governo e pode estar indo para o segundo seguido em que a inflação vai estourar o teto. A maioria dos analistas prevê inflação na casa dos 7% este ano. Desde que o regime de metas de inflação foi adotado, em 1999, o teto da meta foi ultrapassado outras três vezes: em 2001, 2002 e 2003.
Tombini culpa desequilíbrio fiscal
Tombini também divulgou a carta que enviou ao ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, para justificar o descumprimento da meta de inflação. Em 13 páginas, ele fala abertamente, pela primeira vez, como decisões da equipe econômica provocaram alta de preços. Ele ataca, principalmente, o fato de o governo ter enviado ao Congresso Nacional um Orçamento prevendo déficit para este ano e admite que isso fez o dólar (um dos principais vilões da inflação do ano passado) subir rapidamente.
“Em julho, o anúncio de alterações nas trajetórias para as variáveis fiscais afetou as expectativas de inflação e os preços de ativos e contribuiu para criar uma percepção menos positiva sobre o ambiente macroeconômico no médio e no longo prazo. No final de agosto, a perspectiva de nova mudança de trajetória para as variáveis fiscais, implícita na proposta orçamentária para 2016, novamente afetou as expectativas e, de forma significativa, os preços de ativos”, frisou Tombini, que disse que o processo foi agravado pelo rebaixamento da nota de crédito soberano por duas das mais importantes agências de classificação de risco.
O presidente do Banco Central ainda culpa o aumento de tarifas públicas pelo descumprimento da meta. Diz que os sucessivos aumentos que elevaram a taxa básica de juros para 14,25% seriam suficientes para a convergência da inflação para a meta, mas que esse plano foi frustrado pelo impacto das incertezas fiscais e uma alta ainda maior das tarifas. E indica que os juros devem voltar a subir.
“Nesse contexto, é importante ressaltar que, independentemente do contorno das demais políticas, o Banco Central adotará as medidas necessárias de forma a assegurar o cumprimento dos objetivos do regime de metas, ou seja, circunscrever a inflação aos limites estabelecidos pelo CMN, em 2016, e fazer convergir a inflação para a meta de 4,5%, em 2017”.
O ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, divulgou nota para reafirmar o compromisso do governo com a estabilidade dos preços. “O controle da inflação é uma prioridade do governo, e o Banco Central do Brasil está empenhado em adotar as medidas necessárias para alcançar o centro da meta estabelecida pelo Conselho Monetário Nacional até o final de 2017. Nesse processo, o Ministério da Fazenda contribuirá no combate à inflação mediante a adoção de ações para o reequilíbrio fiscal e para o aumento da produtividade da economia”, escreveu.
No mês de dezembro, a inflação ficou em 0,96%, a maior para o mês também desde 2002. Segundo Eulina Nunes dos Santos, coordenadora de Índices de Preços do IBGE, os aumentos de energia elétrica, que subiu 51% no ano passado, gás de cozinha (22,5%), gasolina (20%) e demais combustíveis foram contaminando os custos dos outros produtos e elevando os preços no geral.
Altas de mais de 10% se espalham
Dos 373 itens pesquisados pelo IBGE para compor o IPCA, em dezembro, 160 subiram mais de 10% no ano passado. Esse número foi crescendo gradualmente ao longo do ano. Em janeiro, apenas 91 tinham alta de mais de 10% em 12 meses.
— Os três grupos de maior peso no IPCA (alimentação, transportes e habitação, nessa ordem) foram os que tiveram maior inflação em 2015, por isso a inflação média geral chegou a dois dígitos em 2015 — explicou Eulina.
Para o analista de inflação da Tendências Consultoria Integrada, Marcio Milan, estes três grupos continuarão pressionando o IPCA neste ano, mas em patamares menos elevados:
— Os movimentos serão parecidos em 2016, mas menos elevados, fazendo menos pressão. A energia, por exemplo, deve ter a variação em torno de 12%, quase um quinto do registrado em 2015.
A gasolina também deve continuar pressionando a inflação este ano. Para Adriano Pires Rodrigues, do Centro Brasileiro de Infra-Estrutura (CBIE), nem a forte queda dos preços internacionais do petróleo pode levar a Petrobras a reduzir os preços do combustível no mercado doméstico, porque a empresa precisa reforçar seu caixa:
— A gasolina vai continuar pressionando a inflação em igual patamar ou até mais do que em 2015.
Octavio de Barros, diretor de Pesquisas e Estudos Econômicos do Bradesco, explica os fatores que afetaram o preço dos alimentos:
— No começo do ano, foram as pressões por conta da crise hídrica e da depreciação cambial, enquanto no segundo semestre, os efeitos do El Niño, da nova rodada de depreciação cambial e das safras menores de alguns produtos voltaram a elevar os preços de alimentação.
O economista também acredita que o realinhamento dos preços das tarifas já aconteceu ano passado, quando os administrados como um todo ficaram 18,08% mais caros, e não espera uma alta do dólar na mesma magnitude da observada em 2015. Mas diz que riscos ainda existem, sobretudo de aumentos de preços baseados na inflação passada:
— Alguns riscos estão presentes, como o de alimentação mais elevada por conta de eventos climáticos adversos, elevação de tarifas e contribuições regionais, e, mais importante, o risco do elevado nível de inflação registrado em 2015 afetar de maneira mais importante do que a desaceleração da economia as decisões dos formadores de preços.