Para cientista político, lançar candidatura de Aécio Neves para 2014 é
estratégia do PSDB para "magnetizar" a legenda
Roldão Arruda
O futuro eleitoral do PSDB esteve em jogo na semana passada, em duas
frentes. De um lado com a disputa interna em torno da definição do nome do
candidato à Presidência da República em 2014. A iniciativa do ex-presidente
Fernando Henrique Cardoso de lançar o nome de Aécio Neves encontrou
resistências em setores ligados a José Serra e Geraldo Alckmin. Por outro lado,
o próprio indicado manifestou reticências.
No plano mais geral, a presidente Dilma Rousseff pôs o PSDB na berlinda, no
debate sobre a redução do preço da energia elétrica, ao acusar o partido de
defender os interesses de empresas em São Paulo, Minas e Paraná, Estados
governados por tucanos.
Na entrevista abaixo, o cientista político Bolívar Lamounier, que é filiado
ao PSDB e próximo ao ex-presidente Fernando Henrique, analisa esses episódios.
Na avaliação dele, sintetizam os impasses que o partido vive desde a ascensão
do PT ao poder, há dez anos.
Como qualifica as reticências de Aécio Neves diante da iniciativa do
ex-presidente Fernando Henrique de lançá-lo candidato?
Foi uma reação normal dentro da política eleitoral. Ninguém, dois anos antes
da eleição, vai abrir o peito e dizer: "Sim, eu sou candidato". Está
implícito que aceita tacitamente a indicação, ao mesmo tempo que reconhece que
ainda precisa realizar costuras, acomodar camadas geológicas e não se expor
prematuramente ao sereno. A iniciativa de Fernando Henrique e a reação de Aécio
são faces da mesma moeda.
Políticos ligados a José Serra e Geraldo Alckmin também não se
entusiasmaram.
O fato de líderes do partido, que, eventualmente, pensam em outras candidaturas,
defenderem a abertura do leque nomes, também é normal.
O ex-presidente não teria se precipitado?
Não conversei com ele, mas acho que sua principal preocupação é o partido. O
PSDB, desde o primeiro governo Lula, foi virando vidraça, em vez de virar
estilingue. A todo momento se ouve falar em falta de coesão, em muito cacique
para pouco índio, na piora da imagem do partido e no seu enfraquecimento. Nesse
contexto, houve uma derrota eleitoral muito ruim em 2006, especialmente na
medida em que Alckmin vacilou na defesa do programa privatizações do governo
FHC. Em 2010, o José Serra perdeu para a Dilma com uma campanha também
considerada ruim. Ela era uma candidata pesada, sem discurso, e mesmo assim ele
não conseguiu se destacar suficientemente. O desgaste progrediu e culminou com
a eleição do Fernando Haddad.
Um dos temas do rescaldo dessa eleição foi a necessidade de renovação dos
quadros do PSDB.
O Lula, sempre muito hábil nisso, conseguiu plantar na opinião pública a
ideia de que o PT estaria se renovando com o Haddad e o PSDB se repetindo com o
Serra. Mas isso foi, digamos, uma pedra a mais numa série de desgastes. É nesse
contexto que analiso a iniciativa de Fernando Henrique.
E qual é sua conclusão?
Penso que ele procura dizer o seguinte: estamos diante de um círculo
vicioso. Para se renovar, o partido tem que ter eletricidade e vigor e se
apresentar na luta pelo poder. Como se faz isso? Tendo um candidato. Um partido
sem candidato e perspectiva de poder vai se estiolar e morrer de inanição. Na
política, você está subindo ou descendo. E o PSDB vem descendo.
A iniciativa de Fernando Henrique seria sobretudo estratégica?
Exatamente. O magnetismo de um partido começa com uma candidatura, reunindo
forças, montando agenda, programa.
Aécio é o melhor nome?
Considerando que Alckmin foi candidato em 2006, que Serra disputou em 2002 e
2010, é natural reconhecer que a bola da vez é o Aécio. Está fora de dúvida.
Ele foi bem-sucedido no governo de um Estado importante, é senador, tem
popularidade e condições de unificar o PSDB.
Não acha que, do ponto de vista eleitoral, Aécio errou ao assumir a defesa
da Cemig, na queda de braço entre as empresas e o governo sobre tarifa de
energia?
Não. Foi a Dilma que politizou um assunto que não pertence à área eleitoral.
Os governos de Minas, Paraná e São Paulo tinham e têm o dever de preservar o
valor das suas empresas e o sistema de energia elétrica. Ela é que tomou
medidas atrabiliárias, para forçar na marra o barateamento de energia.
Não acha que ela irá capitalizar isso na eleição?
Já está tentando. Quer transformar o prejuízo em lucro.
Isso pode levar à perda de votos do PSDB.
É sempre o problema do partido que tenta agir com seriedade, com equilíbrio
fiscal: fica exposto à crítica deletéria, ao uso eleitoral destas situações por
parte do partido populista.
Como explicar isso ao eleitor?
Qualquer manual de economia diz que você barateia um bem oferecendo mais
dele, aumentando a oferta. A Dilma quer resolver a questão do preço da energia
tomando na marra os ativos dos Estados.
O PSDB vai conseguir explicar isso na eleição?
Isso ilustra bem o impasse do partido. Ele tem que passar a se apresentar de
maneira mais ativa, enfrentar a luta ideológica, denunciar o populismo e
apresentar uma agenda de modernidade, para não ficar exposto a uma chantagem
eleitoral desse tipo. Enquanto não faz isso, fica apenas reagindo aos petardos
disparados por Lula e Dilma.
Fonte: O Estado de S. Paulo