sexta-feira, 27 de novembro de 2015

Opinião do dia: José Serra*

De fato, minha sensação, ou conclusão, é de que dias melhores não virão. A menos que haja uma mudança política de grande profundidade. Ou seja, a economia dependerá mais do que nunca da política. O atual governo, inepto, inseguro, sem rumo nem sustentação congressual, é um elo decisivo do círculo vicioso que empurra o Brasil para trás e para baixo.

Lembro, a esse respeito, a opinião externada em discurso na semana passada por um senador do PSB, Fernando Coelho. Ele propôs que a presidente Dilma Rousseff incite a Câmara de Deputados a apreciar ao menos um dos pedidos de impeachment que se acumulam na Casa. Se vencesse, retomaria alguma condição de governar. Se perdesse, abriria a chance de o Brasil se voltar para o futuro. Do jeito que vai, só lhe restará contemplar o barco que não dirige continuar à deriva no mar bravio.

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*José Serra é senador (PSDB-SP), ‘E la nave và... alla deriva’, O Estado de S. Paulo, 26 de novembro de 2015.

‘Foi questão humanitária’, diz Delcídio sobre oferta a Cerveró

• À PF, ex-líder do governo diz reconhecer sua voz em áudio,mas nega tentativa de suborno a ex-diretor da Petrobrás

O senador Delcídio Amaral (PT-MS) disse ontem que pretendia “ajudar” o ex-diretor da Petrobrás Nestor Cerveró a sair da prisão “por questão humanitária”. Em depoimento à Polícia Federal em Brasília, onde está preso desde anteontem, o ex-líder do governo afirmou que na conversa gravada por Bernardo Cerveró, filho de Nestor, seu intuito foi dar “palavra de esperança e conforto ao familiar de um réu preso”. Ele reconheceu sua fala no áudio,usado como base para a prisão, mas negou ter oferecido mesada a Cerveró ou falado com ministros do STF sobre habeas corpus. O tratamento da direção do PT ao senador, ameaçado de expulsão, gerou crise no partido.

• Em seu primeiro depoimento após ter sido preso, senador petista nega ter atuado para evitar que o ex-diretor da Petrobrás fechasse acordo de delação com autoridades; bancadas do partido entram em conflito com a direção do PT sobre processo de expulsão

Delcídio diz à PF que ajudar Cerveró a sair da prisão era ‘questão humanitária’

Andreza Matais, Julia Affonso, Fausto Macedo – O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O senador Delcídio Amaral (PT-MS) afirmou ontem à Polícia Federal, em Brasília, que pretendia “ajudar” o ex-diretor da Petrobrás Nestor Cerveró a sair da prisão por “uma questão humanitária”. Delcídio prestou depoimento na Superintendência da PF, onde está preso preventivamente desde anteontem. Ele negou que buscasse impedir Cerveró de fazer acordo de delação premiada.

Segundo o senador, ele disse a Bernardo Cerveró, filho de Nestor Cerveró, que iria ajudar o ex-diretor “apenas por uma questão humanitária”,como intuito de confortar Bernardo. No entender da Procuradoria Geral da República, no entanto, Delcídio buscava obstruir o avanço das investigações e evitar que Nestor Cerveró firmasse acordo de delação premiada.

Em uma conversa que Bernardo gravou com seu telefone celular no dia 4 de novembro,o senador disse que intercederia no Supremo Tribunal Federal para ajudar Cerveró a conseguir um habeas corpus. Questionado ontem pela PF sobre expressões utilizadas no diálogo, Delcídio afirmou: “Foram com intuito de dar uma palavra de esperança e de conforto para o familiar de um réu que está preso, mas jamais falei com qualquer ministro do STF sobre o assunto.”De acordo com o petista, ele foi procurado pelo filho do ex-diretor da Petrobrás por meio do advogado.

“Apenas dei essa palavra de conforto vendo o desespero do filho de um dos presos. Ele (Bernardo) se apresentou a mim pedindo ajuda. Eu disse que ia ajudar e tentar interceder, mas isso foi apenas uma questão humanitária, para confortar o familiar do réu preso da Lava Jato”, afirmou o senador à PF.

No diálogo gravado por Bernardo, Delcídio, um assessor de seu gabinete e o advogado Edson Ribeiro chegam a planejar um roteiro de fuga para Cerveró deixar o Brasil após conseguir a liberação pelo Supremo. A intenção, conforme os relatos, era levar o ex-diretor da Petrobrás para a Espanha.

‘Relação próxima’. A PF quis saber de Delcídio sobre a participação do advogado, ex-defensor de Cerveró e até ontem procurado pela Interpol também por envolvimento no episódio. O senador disse que o advogado entrou em contato com ele e pediu uma reunião. “Levou junto (na reunião) o Bernardo. Eu o recebi. Eu tinha uma relação próxima com Nestor Cerveró e com a família do Nestor Cerveró. Por esse motivo, eu os recebi. Na conversa, Edson Ribeiro começou a relatar que tinha entrado com habeas corpus (para Cerveró), relatou o drama pessoal, o sofrimento pessoal que Nestor Cerveró está passando. Eu disse que ia tentar ajudar, mas foi uma palavra de conforto ao filho (Bernardo)”, reiterou.

Delcídio deverá ser ouvido novamente pela PF.Existem outras questões que os investigadores querem submeter ao senador,como sua ligação com o banqueiro André Esteves, presidente do BTG Pactual, que, conforme as tratativas gravadas por Bernardo, ficaria responsável por uma mesada de R$ 50mil para a família de Cerveró em troca do silêncio do ex-diretor da Petrobrás.

Delcídio foi confrontado com o áudio da conversa com o filho de Cerveró e reconheceu sua voz na gravação.” “O senador deu as explicações de maneira contundente”, afirmou o advogado.Maurício Silva Leite. Ele disse que o petista aguarda “sereno o desenrolar das investigações, mas muito chateado”. Segundo Leite, o senador não tentou subornar Cerveró nem obstruir a Lava Jato. “Isso não ocorreu.” / Colaborou Dida Sampaio

Planalto teme que Delcídio faça delação premiada para prejudicar Dilma

• Preocupação de auxiliares da presidente é que, se sentir que foi abandonado tanto pelo governo quanto pelo PT, o senador lance mão de acusações contra o Planalto

Isadora Peron - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Após o Senado decidir nessa quarta-feira, 25, manter a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de prender o senador Delcídio do Amaral (PT-MS), o Palácio do Planalto teme que o petista decida fazer uma delação premiada com o objetivo de comprometer o governo.

A preocupação de auxiliares da presidente Dilma Rousseff é que, se sentir que foi abandonado tanto pelo governo quanto pelo PT, Delcídio lance mão de acusações contra o Planalto.

Os acordos de delação premiada têm sido a base da Operação Lava Jato. Para conseguir reduzir a pena, porém, o investigado tem de apresentar provas dos fatos relatados.

A prisão de Delcídio deixou o governo em alerta porque ressuscita o escândalo da refinaria da compra da refinaria de Pasadena, em 2006, quando Dilma era ministra-chefe da Casa Civil. A presidente foi a responsável por dar o aval para o negócio, que foi fechado com um preço superfaturado.

Quando o escândalo veio à tona, Dilma disse que havia autorizado a transação com base em um relatório produzido por Nestor Cerveró, então diretor da área internacional da Petrobrás.

Líder do governo, Delcídio foi preso na quarta-feira após o STF entender que ele tentou obstruir as investigações da Operação Lava Jato. Em uma gravação, o senador aparece oferecendo uma mesada de R$ 50 mil para que Cerveró não fizesse um acordo de delação premiada ou não citasse o seu nome caso resolvesse fazer.

Na quarta, a avaliação do Planalto era que a atitude de Delcídio foi “indefensável” e que o senador havia agido por conta própria, não em nome do governo.

Planalto vê sua base aliada combalida

• Governo avalia que terá de recomeçar do zero recomposição da bancada de apoio após prisão do líder no Senado, Delcídio Amaral (PT-MS)

Tânia Monteiro, Isadora Peron e Vera Rosa - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O Palácio do Planalto avalia que terá de começar do zero a recomposição da sua base aliada após a prisão do líder do governo, senador Delcídio Amaral (PT-MS). A impressão ali é que a articulação política do governo, após o forte revés, está “combalida” e será necessário agir muito rápido porque em pouco mais de 20 dias o Congresso vai entrar em recesso.

Até lá, o Planalto precisa aprovar a nova meta fiscal de 2015, para que a presidente Dilma Rousseff não corra o risco de descumprir a Lei de Responsabilidade Fiscal, realimentando as discussões sobre o impeachment.

Depois de um bom tempo sem se falar direito, o episódio fez com que Dilma e o vice-presidente Michel Temer acabassem conversando anteontem sobre os problemas que vão enfrentar daqui para a frente. A avaliação era de que Delcídio, neste momento, havia se tornado uma peça fundamental em toda a articulação para aprovação de medidas consideradas fundamentais para o ajuste fiscal. Dilma embarca na noite desta sexta-feira, 27, para uma viagem de uma semana fora do País. Temer estará à frente da Presidência e terá ajudar na composição na semana que vem. Os dois precisam estar alinhados.

Novo líder. A presidente busca um novo líder do governo e quer a ajuda do PMDB para a tarefa. Os petistas gostariam que a liderança continuasse com o PT, mas já foram avisados de que terão de ceder a vaga.

O senador Wellington Fagundes (PR-MT) chegou a ter o nome cogitado para substituir Delcídio, mas a presidente preferiu adiar a decisão, enquanto aguarda as tradicionais checagens da vida pessoal do parlamentar. Houve quem sugerisse a possibilidade de o senador, que está fora do País, ser convidado para acompanhá-la em um dos trechos da viagem da semana que vem, para que eles pudessem conversar melhor, mas a proposta não vingou. O governo já avalia outros nomes.

O ministro-chefe da Secretaria de Governo, Ricardo Berzoini, passou o dia em reunião com parlamentares da base aliada, trabalhando para reconstruir o que tinha sido colocado de pé e que foi destruído com o escândalo envolvendo Delcídio. Após conseguir obter um “respiro” no Congresso, com a rejeição de medidas da chamada pauta bomba, o governo está novamente em apuros.

O Planalto avalia que Delcídio cometeu erros inadmissíveis. “Uma lambança”, na definição de um dos interlocutores da presidente. Apesar de saber do risco de o senador fazer acordo de delação premiada, o governo não se moverá para defendê-lo, mesmo porque isso poderia ser interpretado como uma interferência na Operação Lava Jato.

A estratégia é evitar, ao máximo, que a nova crise política prejudique ainda mais a já abalada imagem de Dilma. Interlocutores da presidente observam, ainda, que a prisão de Delcídio não trouxe apenas problemas políticos e econômicos para o governo. O episódio, na opinião de ministros, também fechou as portas do Judiciário para o Planalto. Motivo: ao dizer que tinha influência sobre o Supremo, Delcídio deixou os ministros da Côrte em situação delicada.

Cinco impactos da prisão de Delcídio para o governo

- O Estado de S. Paulo

A prisão, nessa quarta-feira, 25, do líder do governo no Senado, Delcídio Amaral (PT-MS), pela Polícia Federal, acusado de tentar atrapalhar investigações da Lava Jato contra ele, criou dificuldades para o governo Dilma Rousseff. A primeira foi o adiamento da votação de medidas ajuste fiscal no Congresso. Saiba cinco impactos da prisão do petista para o Palácio do Planalto:

1. Atraso nas votações de projetos do ajuste fiscal
O governo não conseguiu com que fosse votado, nessa quarta, o projeto que altera a meta fiscal de 2015 para prever déficit primário de até R$ 119,9 bilhões nas contas públicas. A sessão do Congresso que votaria a proposta foi transferida para 3 de dezembro. O adiamento traz riscos legais para o governo. A presidente Dilma Rousseff tem até o dia 30 para editar o próximo decreto de programação orçamentária, o que ocorrerá sem a nova meta fiscal aprovada. Dilma terá de escolher entre fazer um duro corte de despesas federais, que pode paralisar a administração, ou repetir manobra que já foi considerada ilegal pelos ministros do Tribunal de Contas da União (TCU), baseando o decreto na premissa da nova meta fiscal de 2015, ainda não votada pelo Congresso. Além disso, pode haver atraso na votação, pelo Senado, do projeto que permite a repatriação de recursos de brasileiros no exterior. Delcídio Amaral seria designado relator nas três comissões temáticas da Casa. Agora outro nome terá de ser escolhido.

2. Desarticulação na base aliada
Delcídio era considerado articulador político habilidoso. Ele ajudou o governo a recuperar alguma tranquilidade na relação com a base aliada no Congresso, rebelada diante da crise política e das ameaças de impeachment de Dilma. O Palácio do Planalto deve ter dificuldades para encontrar nome de mesmo porte político que o substitua, pois já houve embaraços na definição do cargo no início do mandato, quando a liderança do governo no Senado ficou cinco meses sem ocupante.

3. Risco de divulgação de informações estratégicas
Governistas se preocupam com o risco de Delcídio, em seus depoimentos à Polícia Federal ou eventualmente em uma delação premiada, caso feche acordo com a força-tarefa da Lava Jato, divulgar informações que comprometam nomes ligados ao Palácio do Planalto. Como líder do governo e ex-diretor da Petrobrás, ele teve acesso a informações estratégicas para o governo.

4. Forma de lidar com o caso pode rachar ainda mais o PT
A maneira do Palácio do Planalto e da direção do PT lidarem com o caso envolvendo Delcídio pode rachar ainda mais o partido da presidente Dilma Rousseff. A direção do PT e a bancada no Senado já tiveram comportamentos distintos após a prisão do petista. O presidente do partido, Rui Falcão, divulgou nota na qual afirmou que o “PT não se julga obrigado a qualquer gesto de solidariedade com o senador”, mas nove dos 13 senadores petistas votaram pela liberação de Delcídio da cadeia.

5. Governo volta ao centro do noticiário sobre Operação Lava Jato
A prisão de seu líder no Senado leva o governo de volta ao centro do noticiário envolvendo a Operação Lava Jato em momento no qual o Palácio do Planalto comemorava o arrefecimento de notícias negativas envolvendo governistas. Ex-tucano, Delcídio Amaral aproximou-se do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e da presidente Dilma Rousseff desde que era filiado ao PSDB e diretor de Gás e Energia da Petrobrás. As notícias envolvendo corrupção no governo podem vir a afetar a já combalida popularidade de Dilma.

Prisão de Delcídio pode paralisar o governo

• Com votação de meta fiscal adiada, máquina corre o risco de parar Na segunda-feira, vence prazo para o Executivo apresentar o último decreto de receitas e despesas do ano. Para não sofrer sanções do TCU, opção é fazer corte de R$ 107 bi e suspender gastos

O agravamento da crise política, com a prisão do senador Delcídio Amaral (PT), líder do governo no Senado, pode levar à paralisação da máquina pública. Após a prisão de Delcídio, anteontem, a votação da nova meta fiscal de 2015 foi adiada. O governo, porém, só tem até segunda-feira para editar decreto sobre suas receitas e despesas neste ano. Se optar por meta ainda não aprovada pelo Congresso, o governo ficará sujeito a sanções do TCU. Mas, se adotar a meta antiga, terá de cortar R$ 107 bilhões, suspendendo todos os gastos não obrigatórios. Ao depor ontem na PF, onde está preso, Delcídio negou ter tentado obstruir investigações da Lava-Jato.

Crise após prisão de Delcídio pode parar máquina pública

• Votação de meta fiscal é adiada e, para não sofrer sanção do TCU, governo teria que cortar R$ 107 bi

Martha Beck, Júnia Gama, Isabel Braga e Cristiane Jungblut - O Globo

-BRASÍLIA- O agravamento da crise política, com a prisão, na quarta-feira, do líder do governo no Senado, senador Delcídio Amaral (PT-MS), acusado de obstruir as investigações da Operação Lava-Jato, gerou um impasse que pode ter como desfecho a paralisação da máquina pública. E, para complicar ainda mais a situação, a equipe econômica está dividida em relação ao caminho a seguir. Com a prisão de Delcídio e a forte repercussão do fato no Senado, o presidente da Casa, Renan Calheiros, adiou para a próxima terça-feira a votação, no Congresso, da revisão da meta fiscal de 2015, que foi ajustada para acomodar um déficit de até R$ 120 bilhões.

Só que o governo tem prazo até segunda-feira, dia 30, para editar o último decreto de programação financeira do ano e decidir se adota uma meta que ainda não foi aprovada pelo Congresso, ficando sujeito a sanções do Tribunal de Contas da União (TCU), ou se ajusta o decreto à meta atual, já aprovada pelo Congresso, que é de superávit de R$ 55,3 bilhões, o que exigiria um corte no Orçamento de R$ 107 bilhões. Isso, na prática, não é factível, mesmo com a suspensão de todos os gastos não obrigatórios do governo, o que paralisaria a máquina pública.

Sem consenso na equipe econômica
Na equipe econômica, não há consenso sobre a forma de fazer o decreto. De um lado, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, defende que se cumpra a recomendação do TCU. Ao analisar as contas do governo de 2014, os ministros da Corte condenaram o fato de o governo ter administrado o Orçamento do ano passado com base num esforço fiscal que ainda não havia recebido o aval dos parlamentares. Por isso, a posição da Fazenda é evitar correr esse risco novamente.

De outro lado, o Ministério do Planejamento quer que a programação financeira se baseie na meta ajustada, que permite um déficit primário de R$ 51,8 bilhões, exatamente para evitar a paralisação da máquina federal. Para seguir a recomendação do TCU, seria preciso fazer o que alguns técnicos chamam de shut down, ou seja, simplesmente suspender todos os gastos discricionários até o fim do ano. Significaria deixar de fazer, por exemplo, o pagamento de todos os serviços de água, luz, telefone, bolsas do Brasil e no exterior, fiscalização ambiental, do trabalho, da Receita e da Polícia Federal.

O presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), alertou ontem para o problema:
— É uma decisão que terão que tomar no Executivo: ou eles continuarão executando o Orçamento normalmente, ou vão paralisar até aprovar. Paralisar significa paralisar tudo, porque o tamanho da diferença é tão grande que, se executar qualquer coisa, de qualquer maneira estarão descumprindo (a Lei Orçamentária). É uma decisão difícil que o governo terá que tomar.

Cunha disse que há disposição para facilitar a realização da sessão do Congresso em que será analisado o projeto de mudança, mas ponderou que o governo deveria ter articulado a aprovação com maior antecedência:

— Esse projeto da mudança de meta já deveria ter sido votado — disse.

Fazenda defende contingenciar por alguns dias
Os técnicos esperavam que a mudança na meta fiscal fosse votada esta semana e, assim, o decreto — que precisa ser publicado no dia 30 de novembro — já pudesse acompanhar os novos parâmetros fiscais. No entanto, a prisão do líder do governo tumultuou os trabalhos do Senado, e a votação foi adiada.

Com receitas em queda livre e despesas engessadas, o governo federal já acumula um déficit primário de R$ 33 bilhões até outubro. Esse valor, no entanto, poderia chegar a R$ 117,9 bilhões, caso o governo tenha algumas receitas frustradas e pague o saldo de todas as “pedaladas” fiscais (atrasos nos repasses de recursos do Tesouro Nacional para bancos públicos), que é de R$ 57 bilhões. Isso no caso de a nova meta fiscal ser aprovada pelo Congresso.

No último relatório bimestral de receitas e despesas, o governo alertou para o fato de que seria preciso fazer um contingenciamento adicional de gastos de R$ 107,1 bilhões para garantir a meta oficial. No entanto, neste momento, o valor que pode efetivamente ser contingenciado é de apenas R$ 10,7 bilhões.

“Cabe ressaltar que o contingenciamento dessas despesas levaria a graves consequências para a sociedade, com a interrupção da prestação de importantes serviços públicos e da execução de investimentos necessários à manutenção da infraestrutura do País e à retomada do crescimento econômico”, afirma o documento. Há ainda uma preocupação com o risco de um novo corte obrigar o governo a deixar de cumprir contratos, o que também teria repercussão negativa.

Ontem, ao comentar o resultado das contas públicas, o secretário do Tesouro, Marcelo Saintive, admitiu que o governo tem dois caminhos na hora de editar o decreto e reconheceu que seguir a recomendação do TCU prejudicará a prestação de serviços:

— Seguindo a determinação do TCU, a gente deve publicar o decreto na segunda. Já fizemos o maior contingenciamento dos últimos 13 anos. Mas já explicamos no relatório bimestral que um novo contingenciamento prejudica a prestação de serviços do Estado.

Interlocutores da Fazenda argumentam que seria mais seguro fazer esse contingenciamento, pois, embora ele penalize a população, só duraria alguns dias, até a aprovação da nova meta pelo Congresso. Logo em seguida, poderia ser editado um decreto liberando os gastos.

O procurador do Ministério Público junto ao TCU, Júlio Marcelo de Oliveira, afirmou ao GLOBO que o governo não deveria trabalhar com uma meta que não foi aprovada pelo Congresso:

— O governo não pode jogar para o TCU uma irresponsabilidade dele. Se a meta que ele fixou é irrealista, ele tem que arcar com as consequências. Não dá para trabalhar confiando numa meta que não foi aprovada pelo Congresso. Ele não pode fingir que está cumprindo a lei.

Renan Calheiros não demonstra ter pressa
Ontem, Joaquim Levy se reuniu com o presidente do Congresso, Renan Calheiros, e pediu que a meta fiscal de 2015 seja votada o mais rapidamente possível, reforçando que essa é a maior preocupação do governo neste momento. Renan quer convocar sessão do Congresso para a próxima terça-feira à noite. O líder do PMDB no Senado, Eunício Oliveira (CE), disse que será às 19h de terça-feira.

Apesar da pressão do TCU, Renan não tem demonstrado preocupação com o prazo, segundo interlocutores, lembrando que no ano passado a meta foi votada em dezembro. Além disso, congressistas lembram que o TCU é órgão auxiliar do Congresso e que suas decisões precisam ser referendadas pelo Legislativo.

Renan deverá repetir na próxima semana a fórmula de fazer sessões na terça e na quarta. A sessão começa com a votação de três vetos presidenciais que trancam a pauta. E, depois, será colocada em votação da meta fiscal de 2015. Em seguida, a LDO de 2016, com a meta fiscal de 0,7% do PIB .

Pesos e medidas do PT

• Condenação do partido a Delcídio Amaral contrasta com defesa a Dirceu e Vaccari
Após defender e aplaudir o ex-tesoureiro Vaccari e o ex-ministro José Dirceu, presos, o PT fala em expulsar Delcídio.

Sérgio Roxo, Chico Gois, Simone Iglesias Catarina Alencastro – O Globo

-SÃO PAULO e BRASÍLIA- O PT adota com o líder do governo do Senado, Delcídio Amaral, preso na quarta-feira por determinação do Supremo Tribunal Federal (STF), um tratamento muito mais duro que o dispensado a outros nomes da legenda envolvidos na Operação Lava-Jato, como o ex-ministro José Dirceu e o ex-tesoureiro João Vaccari Neto.

Com o argumento de que Delcídio não estava em atividade partidária quando foi flagrado tentando obstruir as investigações, o comando da legenda decidirá, já na próxima semana, uma possível expulsão do senador.

Em evento promovido ontem pelo Instituto Lula, em parceria com a Central Única dos Trabalhadores (CUT), o presidente do PT, Rui Falcão, admitiu que o líder do governo recebe tratamento diferente ao destinado a Vaccari.

— Tem uma diferença clara entre a atividade partidária e a atividade não partidária — disse Falcão.

Em nota divulgada após a prisão de Delcídio, o presidente do PT disse que o partido “não se julga obrigado a qualquer gesto de solidariedade” com o senador, porque nenhuma das tratativas atribuídas a ele tem relação com sua atividade partidária. Em setembro, quando Vaccari foi condenado a 15 anos por corrupção, lavagem de dinheiro e associação criminosa, o partido criticou a decisão do juiz Sérgio Moro. Na época da prisão de Dirceu, em agosto, o PT decidiu não assumir a defesa de seu ex-presidente, mas, em entrevistas, Falcão tem afirmado que é preciso aguardar a defesa do ex-ministro sobre as acusações de que teria recebido benefícios pessoais, como o pagamento da reforma de uma casa e de voos em jatos particulares, custeados por dinheiro desviado da Petrobras.

Ambos os casos se tratam de questões pessoais, mas tiveram tratamento diferente de Falcão. Enquanto o presidente do PT defende a reação dura contra Delcídio por essa razão (a questão pessoal), com Dirceu o mesmo argumento é usado para dar-lhe o direito de defesa

— Houve um entendimento partidário de que todas as ações do Vaccari para recolher contribuições seguiram a legislação. A acusação de que havia uma relação (do dinheiro arrecadado) com propina não foi provada, e ele tem direito de recorrer. O entendimento do PT é que ele foi acusado pela função que exerceu como tesoureiro. Não há nenhuma acusação de caráter pessoal, de enriquecimento, de atitude autoritária, de burlar a lei — afirmou Carlos Árabe, secretário de Formação Política do PT, que apoiou a nota de Falcão contra Delcídio.

Defesa de expulsão do partido
Na comparação com o caso de Dirceu, os petistas citam que as provas contra o exministro não são tão evidentes quanto a gravação em que Delcídio oferece R$ 50 mil para o ex-diretor Nestor Cerveró não citá-lo em delação premiada.

O fato de o líder do governo ser um ex-tucano, sem ligações históricas com o PT, também ajudou a dar força à postura da cúpula partidária de lavar as mãos no seu caso. O episódio é visto como uma chance de a legenda tentar passar para a opinião pública a imagem de que também combate a corrupção.

Alguns dirigentes petistas já assumem a defesa da expulsão do senador.

— Pessoalmente, sou favorável à expulsão — disse ontem o presidente do PT de São Paulo, Emídio de Souza, ao participar do mesmo evento que Falcão.

O diretório do Rio Grande do Sul também divulgou ontem uma nota defendendo o afastamento imediato do líder do governo no Senado. Mas a posição contra Delcídio está longe de ser um consenso no PT. As bancadas do Senado e da Câmara consideraram a nota de Falcão precipitada.

A bancada do PT no Senado se sentiu traída pelo presidente do partido e pelo Palácio do Planalto, e deverá procurar a presidente Dilma Rousseff, o ex-presidente Lula e a direção petista para conversar sobre os desdobramentos da prisão de Delcídio. Depois da sessão que manteve o petista na cadeia, na noite de quarta-feira, os senadores se reuniram para analisar a situação. Consideraram que governo e PT tiraram o corpo fora e deixaram o problema no colo da bancada. Somado a isso, consideraram que houve total falta de articulação, a ponto de a nota em que Falcão rifa Delcídio ter sido conhecida pela bancada por meio do senador oposicionista Ronaldo Caiado (DEM-GO).

— É preciso um freio de arrumação para unificar o discurso. Temos que conversar. Não houve uma articulação entre PT, governo e Senado. A bancada ficou destruída — disse um petista.

Os senadores se mostraram irritados por não terem sido avisados por Falcão do teor da nota e porque seu conteúdo, praticamente antecipando a expulsão de Delcídio do PT, interferiu na posição dos outros partidos, que recuaram e passaram a defender a votação aberta. Em nenhum momento, relataram senadores do partido, Falcão discutiu o conteúdo da nota. O líder do PT no Senado, Humberto Costa (PE), tomou um susto ao ver Caiado lendo o texto em plenário. Tentou falar com Falcão por telefone, mas não conseguiu.

— Se Rui tivesse falado com a gente, poderíamos talvez até ter tomado outra decisão, defender o voto aberto. De qualquer forma, acho que não se faz isso com um companheiro, é covardia — afirmou um senador petista ao GLOBO.

Nas palavras de outro petista, o dia foi um desastre:

— O governo e o PT jogaram Delcídio aos leões na primeira hora do dia. O governo, logo de pronto, deixou claro que já procurava um líder.

Antes de se reunir com a cúpula partidária, o PT no Senado tem uma preocupação mais imediata. Delcídio era o presidente da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), a segunda mais importante do Senado. A discussão é se o partido deve indicar já outro nome, atropelando o líder que está preso.

Falcão minimizou a reação da bancada no Senado e uma divisão no partido sobre o futuro de Delcídio:

— Ele (Humberto Costa) falou pela bancada de senadores. É a opinião dele. Não há divisão, porque eu expressei uma opinião, e essa opinião vai ser debatida pela Executiva com maior profundidade, inclusive com consequência práticas. -BRASÍLIA- O agravamento da crise política, com a prisão, na quarta-feira, do líder do governo no Senado, senador Delcídio Amaral (PT-MS), acusado de obstruir as investigações da Operação Lava-Jato, gerou um impasse que pode ter como desfecho a paralisação da máquina pública. E, para complicar ainda mais a situação, a equipe econômica está dividida em relação ao caminho a seguir. Com a prisão de Delcídio e a forte repercussão do fato no Senado, o presidente da Casa, Renan Calheiros, adiou para a próxima terça-feira a votação, no Congresso, da revisão da meta fiscal de 2015, que foi ajustada para acomodar um déficit de até R$ 120 bilhões.

Só que o governo tem prazo até segunda-feira, dia 30, para editar o último decreto de programação financeira do ano e decidir se adota uma meta que ainda não foi aprovada pelo Congresso, ficando sujeito a sanções do Tribunal de Contas da União (TCU), ou se ajusta o decreto à meta atual, já aprovada pelo Congresso, que é de superávit de R$ 55,3 bilhões, o que exigiria um corte no Orçamento de R$ 107 bilhões. Isso, na prática, não é factível, mesmo com a suspensão de todos os gastos não obrigatórios do governo, o que paralisaria a máquina pública.

Sem Congresso, governo pode parar

Por Raphael Di Cunto, Leandra Peres, e Murillo Camarotto e Ribamar Oliveira - Valor Econômico

BRASÍLIA - A prisão do senador Delcídio do Amaral (PT-SP) e do banqueiro André Esteves cancelou a pauta de votações do Congresso e os parlamentares não aprovaram o projeto que reduz a meta de superávit primário do governo de R$ 55,3 bilhões para um déficit de R$ 51,8 bilhões. Com isso, a presidente Dilma Rousseff está em xeque: ou descumpre orientação do Tribunal de Contas da União, já que a meta fiscal em vigor não será atingida, ou baixa decreto com cortes que praticamente paralisariam o governo. O prazo final para a decisão é segunda-feira.

O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, pressiona o governo a editar o decreto com novos cortes no Orçamento, que levariam à paralisação de todas as obras e demais despesas não obrigatórias.

No Planalto, a área política entende que um novo corte poderia "dar um susto" no Congresso e apressar as votações do ajuste. O Planejamento é, por enquanto, uma voz isolada e considera que a suspensão dos pagamentos do governo pode ter consequências desastrosas.

Levy quer decreto com novos cortes no Orçamento
O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, pressiona o governo a editar um decreto com novos cortes no Orçamento, que levariam à paralisação de todas as obras e demais despesas não obrigatórias. Fontes ouvidas pelo Valor disseram que ainda não há decisão da presidente Dilma Rousseff sobre um novo decreto de contingenciamento das dotações orçamentárias. "Ainda há conversas internas", disse uma fonte oficial. A mesma autoridade acredita, no entanto, que o argumento de Levy pode ser fortalecido porque o governo "não quer dar sinais ruins [ao mercado] em um momento já difícil".

Levy defende o contingenciamento como forma de cumprir a orientação do Tribunal de Contas da União (TCU), que determinou ao governo reduzir as despesas quando houver risco de descumprimento das metas de resultado fiscal. A assessoria de imprensa da Fazenda informou que o ministério pretende "fazer o que o TCU recomenda".

A prisão do senador Delcídio do Amaral (PT-SP) e do banqueiro André Esteves cancelou a pauta de votações do Congresso Nacional e os parlamentares não aprovaram o projeto que reduz a meta de superávit primário do governo de R$ 55,3 bilhões para um déficit de R$ 51,8 bilhões. Com isso, a presidente Dilma Rousseff ficou numa sinuca de bico: ou descumpre orientação do TCU, já que a meta fiscal em vigor não será atingida, ou baixa decreto paralisando o governo. O prazo final para decisão é segunda-feira.

No Planalto, a área política entende que um novo corte pode "dar um susto" no Congresso e apressar as votações do ajuste fiscal. O Ministério do Planejamento é, por enquanto uma voz isolada, pois considera que uma suspensão nos pagamentos do governo pode ter consequências desastrosas, inclusive políticas se os parlamentares não reagirem como espera o governo. Deputados e senadores só voltarão a se reunir para votar a proposta de mudança da meta fiscal dia 1º de dezembro.

A orientação do TCU sobre as contas do governo de 2014, que foram reprovadas pelo órgão, determina que o governo congele parte do Orçamento até 30 de novembro se verificou no fim de outubro que a meta em vigor não será atingida, mesmo que tramite projeto no Congresso Nacional para alterar o objetivo fiscal daquele ano. O argumento é de que a proposta poderia ser rejeitada pelos parlamentares ou não votada a tempo, o que comprometeria as contas públicas.

O líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), e lideranças de partidos aliados passaram toda a quarta-feira em tratativas com os presidentes da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), para tentar manter a sessão do Congresso naquele dia ou na quinta-feira, mas a reunião foi adiada para que os senadores não postergassem a decisão em plenário sobre se Delcídio seria solto ou mantido preso.

O acordo para adiar a votação foi apoiado pelo Planejamento, mas ontem, segundo aliados do governo, a equipe econômica reavaliava o cenário. A presidente Dilma viaja hoje de manhã para participar da CoP-21 em Paris e precisa decidir antes.

Há diferentes entendimentos sobre o impacto de não cortar as despesas. No governo, a avaliação corrente é que a lei não é clara e, por isso, não há obrigação expressa. Mas há o risco de não fazer os cortes e o TCU dizer que Dilma cometeu crime no atual mandato, o que poderia levar até a novo pedido de impeachment pela oposição.

Fonte do TCU diretamente envolvida com a análise das contas do governo aponta que a Lei de Responsabilidade Fiscal prevê que se faça o contingenciamento até 30 dias após o fim de cada bimestre, caso o governo constate que a previsão da receita não garanta o cumprimento da meta fiscal. Se o governo não o fizer, haveria, em tese, uma "infração administrativa", tipificada pela Lei de Crimes Fiscais. Não seria, porém, um crime de irresponsabilidade fiscal.

Segundo o deputado Danilo Forte (PSB-CE), que conversou com dois ministros do TCU sobre o caso, o não contingenciamento levaria ao descumprimento da orientação, mas, como tribunal é um órgão de assessoramento e o Congresso ainda não ratificou o parecer das contas de 2014, não haveria punição. "Como o Congresso não estipulou nenhuma punição, o que vai caber é uma reavaliação pelo tribunal nas contas futuras", disse.

Para o deputado Ricardo Barros (PP-PR), o governo poderia editar o decreto no dia 30, aprovar a meta no dia 1º e revogar os cortes logo em seguida. O problema, disse o relator do Orçamento de 2016, é que o Planalto precisa aprovar ainda este ano projetos de lei para abertura de créditos com o objetivo de pagar as pedaladas, que só podem ser encaminhados após a nova meta. "Falta votar o Orçamento, o PPA [Plano Plurianual], a Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2016 e os créditos. Tudo isso em apenas três semanas", afirmou.

Como o governo prevê agora um déficit primário de R$ 51,8 bilhões nas suas contas neste ano, para cumprir a meta de superávit de R$ 55,3 bilhões que consta da LDO, seria necessário fazer um contingenciamento de R$ 107,1 bilhões. Mas já não há esse dinheiro, pois do total que podia ser contingenciado (R$ 113,8 bilhões), R$ 99,3 bilhões já tinha sido gasto até 10 de novembro. Sobra apenas R$ 10,7 bilhões para fazer novo corte, excluindo-se os recursos destinados à saúde e às emendas impositivas dos parlamentares.

A nota de boxe ao relatório do Tesouro Nacional, divulgado ontem, diz que o contingenciamento das despesas "levaria a graves consequências para a sociedade com a interrupção de prestação de serviços públicos". Fontes do governo avaliam que um novo corte de gastos poderá levar a algo parecido ao "shutdown" feito pelo governo dos Estados Unidos em 2013, que significou a redução das atividades governamentais ao essencial.

PR pode assumir liderança do governo, apesar de resistência do PT

Por Andrea Jubé – Valor Econômico

BRASÍLIA - A três semanas do recesso parlamentar, o governo tenta reverter em tempo hábil a perda de um de seus principais articuladores no Congresso Nacional, o líder no Senado, Delcídio Amaral (PT-MS), preso na quarta-feira. Hoje o mais cotado no Palácio do Planalto para sucedê-lo é o senador Wellington Fagundes (MT), líder do PR, embora o PT atue para garantir a manutenção do cargo com a bancada.

Fagundes é um dos quatro vice-líderes do governo no Senado, que respondem pelo cargo, interinamente, conforme nota oficial do Planalto divulgada na quarta-feira. Há urgência na busca de um substituto, diante das votações prementes de interesse do governo, como o projeto de repatriação de recursos, a revisão da meta fiscal de 2015 e a Lei Orçamentária de 2016.

Uma fonte do Planalto descreveu Fagundes como um parlamentar metódico e engajado. Tem experiência parlamentar - está na primeira legislatura de senador, mas acumula seis mandatos de deputado federal - e, assim como Delcídio, transita com desenvoltura na oposição. Foi filiado ao PSDB (1999-2001) e vice-líder do bloco governista no governo de Fernando Henrique Cardoso.

Fagundes só não se reuniu com os ministros da Casa Civil, Jaques Wagner, e da Secretaria de Governo, Ricardo Berzoini, nos últimos dias porque está em viagem para os Estados Unidos. Ele divulgou nota informando que na próxima semana, reúne-se com os demais vice-líderes e com os senadores do PR, que o elegeram líder há oito dias.

Mas o PT fez chegar ao Planalto que não pretende renunciar à liderança, que até o primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff, esteve com o PMDB. Os petistas têm dois nomes: Paulo Rocha (PA), que também é vice-líder, e José Pimentel (CE), que é líder do governo no Congresso, responsável pela votação de matérias orçamentárias e vetos. Um auxiliar de Dilma ressalva que Rocha foi envolvido no escândalo do mensalão. O Supremo Tribunal Federal o absolveu em 2012 de todas as acusações, mas após o trauma da prisão de Delcídio na Operação Lava-Jato, o governo quer distância de problemas. Quanto a Pimentel, o governo prefere mantê-lo onde está.

No Planalto, o ex-líder governista Romero Jucá (PMDB-RR) é apontado como alguém que desataria, habilmente, metade dos nós do governo hoje no Congresso. Ele mantém interlocução com os principais ministros - Wagner, Berzoini, Joaquim Levy (Fazenda) e Nelson Barbosa (Planejamento) - e ajuda o governo. Mas se fosse convidado para retornar ao cargo, recusaria.

Até a próxima semana, Wagner e Berzoini podem cogitar outros nomes, mas as opções são escassas. Poucos se habilitam a liderar um governo frágil e impopular. Era assim no começo do ano: a função de líder no Senado ficou vaga nos primeiros cinco meses, até Delcídio assumir o cargo no dia 28 de abril, sob pressão. Ele preferia ficar, exclusivamente, com a presidência da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), que conquistou após embate interno na bancada com Gleisi Hoffmann (PT-PR).

Prisão opõe bancadas à direção do partido

• Parte da legenda diz que Rui Falcão precipitou-se ao emitir nota contra senador, enquanto outra alega que prisão foi ilegal

Ricardo Galhardo e Ana Fernandes - O Estado de S. Paulo

São Paulo - O tratamento duro dado pela direção do PT ao senador Delcídio do Amaral (PT-MS), ameaçado de ser expulso do partido, desencadeou uma queda de braço entre a cúpula petista e as bancadas da legenda no Senado e na Câmara.

Na quarta, o presidente do PT, Rui Falcão, divulgou uma nota na qual diz que o partido não deve solidariedade ao senador e que a executiva petista vai apreciar o caso, indício de que parte da cúpula petista deseja expulsar Delcídio. O objetivo de Falcão foi minimizar o estrago da prisão do senador à já combalida imagem do partido e tentar manter alguma base para um discurso de defesa da ética.

Horas depois, o líder do PT no Senado, Humberto Costa (PT-PE), reagiu dizendo que a nota foi feita à revelia da bancada. Ontem, a insatisfação se alastrou para a bancada do PT na Câmara. Em conversas reservadas, deputados disseram que o texto foi divulgado de forma precipitada e intempestiva, condenando previamente o senador sem ouvir o partido.

Parte dos deputados petistas considera que a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de prender Delcídio no exercício do mandato é ilegal, abre um precedente perigoso para o futuro e deveria ser objeto de apreciação do partido.

“A nota não ataca a questão principal, que é o fato de o STF ter rasgado a Constituição ao prender um senador no exercício do mandato sem que houvesse flagrante. Houve um rompimento do estado de direito”, disse o deputado Carlos Zaratini (PT-SP).

Apoio. A nota de Falcão ganhou, porém, forte apoio de outras instâncias dirigentes do PT. “Apoio integralmente a nota do presidente Rui Falcão”, disse o presidente do diretório estadual do PT de São Paulo, o maior do partido, Emídio de Souza. “Pessoalmente sou favorável à expulsão (de Delcídio). Não podemos ter tolerância com esse tipo de coisa”, completou.

A direção do PT do Rio Grande do Sul também emitiu um comunicado no qual pede o afastamento imediato do senador dos quadros partidários com base no artigo 246 do estatuto petista que determina a suspensão cautelar de filiados “em casos de percepção de vantagens indevidas, favorecimentos, conluio, corrupção, desvio de verbas”. Além disso, o PT-RS pede abertura de processo disciplinar com vistas à expulsão do senador.

Nesta quinta, Falcão negou que haja divisão em relação às bancadas mas admitiu que a executiva do PT deve tomar alguma decisão prática.

Executiva do PSDB critica silêncio de Dilma sobre Delcídio

• Dirigentes tucanos alertam para ‘manobras políticas’ do PT e do governo

Por Maria Lima – O Globo

BRASÍLIA - O silêncio da presidente Dilma Rousseff em relação à prisão do seu líder de governo no Senado, Delcídio Amaral (PT-MS), pela Operação Lava-jato, foi criticado nesta quinta-feira pelo presidente nacional do PSDB, senador Aécio Neves (MG). Após reunião da Executiva nacional hoje para discutir o agravamento da crise após os acontecimentos dos últimos dias, ele disse que os brasileiros esperam que Dilma, “ao invés de fingir que não tem nada a ver com ela”, venha a público para se explicar, como faria qualquer chefe de Estado em um País “sério”.

Em nota, a Executiva Nacional diz que o Brasil vive hoje uma situação limite e é preciso “alertar a opinião pública para as manobras políticas e conveniências de posições que vêm assumindo o PT e o governo federal, de covarde tentativa de distanciamento dos fatos”.

Os líderes tucanos vão esperar que a Mesa do Senado encaminhe o mesmo ofício enviado ao Supremo Tribunal Federal sobre a decisão do plenário ontem mantendo a prisão de Delcídio, para o Conselho de Ética para abertura de processo por quebra de decoro. Se isso não for feito pelo presidente Renan Calheiros, o PSDB pode discutir o encaminhamento de uma representação ao Conselho, junto com outros partidos de oposição.

— É extremamente grave e incompreensível que o líder do governo esteja preso por acusações gravíssimas, e a presidente Dilma não se manifesta. É incrível que ela continue agindo como se não tivesse nada com isso, como se os delatores presos não tivessem sido nomeados por ela. Esse silêncio é um acinte. A presidente tem que olhar nos olhos dos brasileiros, como gostava muito de fazer em cadeias de rádio e TV durante a campanha, e se explicar sobre os equívocos e sua responsabilidade em tudo que está acontecendo — cobrou Aécio, dizendo que o povo nem presta mais atenção no comportamento de Dilma, “que é hoje quase uma figura folclórica” a frente do governo.

Ele também criticou a nota assinada pelo presidente do PT, Rui Falcão, anunciando que o partido não se solidarizaria com Delcídio.

— É um dos documentos mais sórdidos que já vi. Mostra a falta de coragem do presidente do PT, Rui Falcão. Ao invés de assumir a responsabilidade, foi o primeiro a virar as costas para o seu líder. É uma nota inoportuna e covarde e passa para a História como um dos deprimentes episódios da política brasileira — criticou Aécio.

Questionado se o PSDB ia ficar de braços cruzados durante o agravamento da crise, Aécio disse que a oposição está fazendo o seu papel, no momento, de blindar e fortalecer as instituições, e que a responsabilidade de aprovar ações e aprová-las no Congresso é de quem está no governo e venceu as eleições. Ele disse ainda que o governo, nesse momento, só se empenha em mudar a meta fiscal para não cometer o crime já que cometeu e em distribuir espaços de poder.

Para Aécio, a prisão de Delcídio vai piorar ainda mais a já frágil agenda de votações do ajuste no Congresso.

— A agenda do governo é tão medíocre que sequer sua base acredita que ela seja capaz de tirar o País da crise. A oposição vai continuar fazendo seu papel de blindar e fortalecer as instituições, como fizemos ontem na votação da prisão do Delcídio — disse Aécio.

Ele disse que no próximo dia 08 de dezembro irá fazer um pronunciamento mostrando o diagnóstico objetivo das consequências da crise na vida real dos brasileiros, com foco nas políticas sociais do governo e na volta de milhões para a miséria.

— Vamos divulgar nossa agenda social — disse Aécio.

Ao final da reunião, a Executiva nacional do PSDB divulgou uma nota dizendo que os novos desdobramentos da Operação Lava-Jato reforçam nos brasileiros o sentimento de indignação em relação à forma como o país vem sendo governado.

“Mais uma vez, depois do mensalão e, agora, no petrolão, reforça-se a convicção de que uma organização criminosa, tentacular, apoderou-se de estruturas do Estado, com o objetivo de manter-se no poder mediante desvio de dinheiro público. O PT e seus aliados foram os executores dessa construção nefasta, que começa a desmoronar sob o impacto das investigações do Ministério Público, da Justiça e do Congresso Nacional, com entusiástico apoio do povo brasileiro “, diz a nota.

Os dirigentes tucanos dizem ainda ser “crucial” não perder de vista a necessidade de aprofundamento das investigações, o esclarecimento rigoroso e a responsabilização de todos os que participaram do esquema criminoso que vem sendo desnudado no país - agora, com especial atenção à operação de compra da refinaria de Pasadena, cuja apuração permanece ainda hoje inconclusa.

“É preciso perseverar nas investigações, aprofundar as apurações e radicalizar as punições para que os principais responsáveis por esta cadeia de delitos - que ocuparam e ocupam alguns dos principais cargos da República - também sejam alcançados. É hora, ainda, de alertar a opinião pública para as manobras políticas e conveniências de posições que vêm assumindo o PT e o governo federal, de covarde tentativa de distanciamento dos fatos. De nada adianta tentar tapar o sol com a peneira: são sempre as mesmas pessoas, ligadas por laços de cumplicidade e compadrio, presentes em todos os episódios criminosos que se revelam a cada dia, parte da corrupção institucionalizada a serviço de seu projeto de poder”, diz a nota.

Freire: Saída para deter o processo de degradação da República é o impeachment da Dilma

Por: Luis Zanini

Ao comentar a prisão do senador Delcídio Amaral (PT-MS), acusado de obstruir as investigações da Operação Lava Jato, o presidente do PPS, deputado Roberto Freire (SP) disse, em entrevista à TV-PPS (veja abaixo), que “mais grave é a situação de degradação que se encontra a República”.

“O PPS, e eu em especial, lutamos para deter esse processo, e uma forma concreta é o impeachment [da presidente Dilma Rousseff], até porque a partir daí nós teremos um novo rumo, um novo governo”, defendeu.

Para ele, o Congresso Nacional, o Executivo, especialmente à Presidência da República, “estão no mesmo processo de degradação gravíssima que atinge a própria República”.

Freire disse que a prisão de um senador é o mais “emblemático” de todo o processo pelo fato de Delcídio tentar obstruir a Justiça que, na sua visão, “segura a perspectiva de mantermos a ordem democrática no Brasil”.

O presidente do PPS salientou ainda que o então líder do PT no Senado “não estava falando apenas em seu nome” no áudio em que planejava a fuga do ex-diretor da Petrobras, Nestor Cerveró, alvo de investigação da Lava Jato.

“Ele era uma figura menor no processo de delação [de Cerveró]. É um momento de muita reflexão para todos os democratas deste País, porque a situação é grave”, advertiu o presidente do PPS, ao citar ainda o impasse na Câmara dos Deputados com Eduardo Cunha (PMDB-RJ).

“Era fundamental que ele já estivesse afastado da presidência da Casa”, afirmou.

Veja a entrevista de Freire:



Sob Teori, STF deve ser mais rigoroso na Lava-Jato

Por Juliano Basile e Maíra Magro - Valor Econômico

BRASÍLIA - Zavascki: magistrado levou menos de dois dias para determinar a prisão em flagrante do senador Delcídio Amaral Empossado no meio do julgamento do mensalão, quando criminalistas criticavam as condenações e petistas apostavam em recursos para reduzir as punições, Teori Zavascki tornou-se, nessa semana, o primeiro ministro do Supremo Tribunal Federal a prender um senador na história da República. A tendência é a de que, sob a sua condução, as decisões da Corte sobre a Operação Lava-Jato sejam ainda mais rigorosas e exemplares do que as sentenças no mensalão, quando 24 pessoas foram condenadas entre as 38 que foram levadas a julgamento.

A Lava-Jato já tem 65 pessoas investigadas no Supremo, das quais 37 têm foro privilegiado, e não será surpreendente se o número de condenados for bem superior ao mensalão, quando for julgada a última ação sobre a operação na Corte - o que pode demorar quase dez anos para ocorrer.

Zavascki levou menos de dois dias para determinar a prisão em flagrante do senador Delcídio Amaral (PT-MS), que sequer figurava como investigado nos autos da operação. Recebeu os autos no domingo; tirou dúvidas com o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, na segunda; decidiu na terça. A decisão surpreendeu criminalistas que até algumas semanas atrás ainda acreditavam que o ministro poderia dar um novo rumo à operação, mais favorável aos acusados de participação nos desvios da Petrobras.

Quando assumiu no STF, em novembro de 2012, os primeiros sinais eram de que o ministro seria um garantista. Na época, o STF estava em evidência na imprensa e a avaliação do Palácio do Planalto foi a de que era necessário indicar um juiz alheio aos holofotes. Zavascki é contrário à superexposição de juízes, o que foi fundamental para a sua nomeação.

Em 2013, ele acolheu os primeiros embargos do mensalão. Em 2014, ele reduziu as penas de alguns dos condenados, como o ex-ministro-chefe da Casa Civil José Dirceu, alegando que houve "exacerbação de pena". Em maio passado, o ministro mandou soltar personagens-chave da Lava-Jato, como o doleiro Alberto Youssef, o ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa e mais dez suspeitos. A partir daquela decisão, criminalistas apostaram em Zavascki na tentativa de obter habeas corpus e para impor uma nova ordem às decisões do juiz Sérgio Moro, o juiz titular da operação na 1ª instância, em Curitiba. A prisão de Delcídio, na quarta-feira, mostrou que essa expectativa deu em água e chamou a atenção para uma nova guinada do tribunal frente aos autos da Lava-Jato.

Os integrantes do STF, nas palavras da ministra Cármen Lúcia, estão verificando que parte dos acusados está querendo fazer "escárnio com a Justiça". Foi o caso de Delcídio dizendo que poderia interferir junto aos ministros para soltar Nestor Cerveró, o ex-diretor da área internacional da Petrobras, de modo a evitar que ele assinasse um acordo de delação. Mas o escárnio, na percepção de integrantes do STF vai além do senador, já que, enquanto eles julgavam o mensalão, há três anos, o esquema de desvio de dinheiro da Petrobras funcionava a todo o vapor.

Em julho, Zavascki imprimiu o seu estilo discreto ao Ministério Público Federal, quando ordenou que nenhum documento enviado ao seu gabinete deveria ser vazado antes para a imprensa. Janot passou a lacrar as informações sobre a Lava-Jato em seu gabinete e deu uma ordem geral aos seus auxiliares de não comentarem nada sobre a operação com ninguém de fora da força-tarefa criada na instituição. A discrição também ganhou o respeito dos colegas no STF. Teori, como é chamado, conversa reservadamente com cada um deles antes de levar decisões importantes a serem tomadas à 2ª Turma, como a que resultou na prisão de Delcídio.

Aos 67 anos, ele atua como juiz desde 1989 e fez boa parte da carreira no Rio Grande do Sul, apesar de ter nascido em Faxinal dos Guedes (SC). Pessoalmente, a perda da esposa, a também magistrada Maria Helena, por um câncer, em agosto de 2013, foi um baque. Colegas da Corte procuraram Zavascki para tentar incluir mais eventos fora de casa em sua rotina, mas a quantidade de trabalho e a preocupação da família com a segurança acabam restringindo as suas saídas. Recluso, ele trabalha nos fins de semana e já tomou decisões sobre a Lava-Jato em alguns domingos. O agito da rotina do ministro está nos processos e o mais importante deles continua mexendo com a República.

Desigualdade de renda aumenta este ano

• Com alta no desemprego, disparidade nos ganhos do trabalho se acentuou nos últimos dois trimestres

Cássia Almeida- O Globo

Após 15 anos seguidos de queda, a desigualdade de renda no mercado de trabalho voltou a subir este ano, segundo cálculos do economista Sergei Soares, do Ipea. A recessão e o aumento do desemprego explicam a piora na distribuição de renda entre os trabalhadores, informa CÁSSIA ALMEIDA. O mercado de trabalho brasileiro está mais desigual. Levantamento inédito do economista Sergei Soares, pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e pesquisador visitante do Centro Global de Desenvolvimento, em Washington, revela que o Índice de Gini, indicador mais usado para medir o nível de distribuição de renda, aumentou nos dois últimos trimestres no mercado de trabalho.

Com dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, do IBGE, que traz informações sobre todo o país, Soares viu que o índice — que varia de zero a um e quanto mais perto de zero, mais igual é a sociedade — subiu de 0,5084 no primeiro trimestre deste ano para 0,5178 de julho a agosto. A conta foi feita com base no rendimento efetivo dos trabalhadores, no qual entram além dos salários, rendas eventuais ou benefícios como décimo terceiro e férias.

— A desigualdade certamente não está caindo mais, depois de 15 anos de queda quase ininterrupta, possivelmente está voltando a aumentar. Espero que temporariamente — afirmou Soares.

Segundo o economista, fatores mais estruturais, como a melhoria na escolaridade dos trabalhadores, vão ao encontro de maior igualdade no mercado a longo prazo. A recessão, por sua vez, pode ser a explicação para essa mudança de tendência.

— Nem sempre a desigualdade aumenta quando há crise econômica. Os ricos podem perder mais que os pobres e a distribuição de renda melhorar. A recessão explica em parte essa piora na distribuição.

Especialista em mercado de trabalho, o professor do Instituto de Economia da UFRJ, João Saboia vê motivos claros para o aumento da desigualdade. A qualidade do emprego, medida pela carteira de trabalho assinada e pela renda, vem caindo, lembra Saboia. No ano passado, a desigualdade, mesmo com baixo crescimento, ainda cedia.

— O ano de 2015 está muito ruim para o mercado de trabalho. Há muita demissão, com redução da carteira assinada, crescimento do número de trabalhadores por conta própria e dos empregados sem carteira assinada, piorando a situação desse povo — diz o professor.

A taxa de desemprego vem subindo sistematicamente desde o início do ano. No último trimestre de 2014, de acordo com a Pnad Contínua, a parcela da força de trabalho sem emprego era de 6,5%. No terceiro trimestre deste ano, já era de 8,9%. Historicamente, as taxas de desemprego começam a cair no segundo semestre. Mas a recessão mudou o padrão sazonal do mercado, que costuma contratar para atender a demanda de fim de ano. Nas metrópoles, observa-se o mesmo movimento. A taxa subiu de 5,3% em janeiro para 7,9% em outubro.

Demografia alivia impacto da recessão
Saboia diz que as categorias mais organizadas e com salários melhores, como metalúrgicos, petroleiros e bancários, conseguiram algum aumento real nos últimos meses, mas na base da distribuição, esse movimento não aconteceu.

—Na base é o salário mínimo. Com a inflação aumentando e sem crescimento, há perda de renda na base — afirma.

Até julho deste ano, o salário mínimo já perdeu 5,3% do seu poder de compra. Segundo Soares, a dinâmica demográfica não deixa a situação do mercado piorar ainda mais. Ele observa que, apesar de a recessão ser a pior desde a queda de 4,3% no governo Fernando Collor, em 1990, não há uma subida forte do desemprego nem queda intensa da renda:

—Na década de 1980, a economia ficou estagnada e a situação ficou muito pior (a população crescia 2,8% ao ano, atualmente esse avanço está perto de 1%). Com menos expansão da mão de obra, com mercado de trabalho mais apertado, a piora não será tão grande.

Orçamento de 2016 ainda tem rombo de R$ 30 bi

Por Thiago Resende e Raphael Di Cunto - Valor Econômico

BRASÍLIA - Mesmo com receitas extras para compensar a exclusão da CPMF, ainda há um rombo de aproximadamente R$ 30 bilhões no Orçamento do próximo ano. O cálculo de consultores do Congresso indica que nem se aliados do Palácio do Planalto conseguirem reincluir a CPMF - estimada em R$ 24 bilhões - na programação orçamentária será suficiente para o governo alcançar a meta fiscal de 2016, estabelecida em R$ 34,4 bilhões.

Esse rombo já considera recursos da regularização de dinheiro não declarado no exterior, dos leilões de hidrelétricas e da venda de ações da Caixa Seguridade e IRB, acrescentados pelo relator da receita, senador Acir Gurgacz (PDT-RO). Também foram descontadas despesas que a equipe econômica da presidente Dilma Rousseff pretende cortar.

Para resolver o problema, o governo federal, segundo uma fonte, espera usar a arrecadação com a legalização de jogos de azar, elevar a estimativa relacionada à repatriação de dinheiro não declarado em R$ 9 bilhões e insistir na CPMF, mas para que comece a ser cobrada no segundo semestre.

"Não importa muito o mês em que [o imposto] entrará em vigor. Interessa é a CPMF em si, porque será uma sinalização boa para o mercado já que a arrecadação será mantida em 2017 e 2018", informou um parlamentar com trânsito no governo. O aumento da Cide sobre combustíveis será "desengatilhado" apenas em último caso.

O deputado João Arruda (PMDB-PR), relator do Orçamento setorial de saúde, disse que o governo cortou a verba para procedimentos de alta complexidade. Com isso, o PMDB, que controla o Ministério da Saúde, quer que a alta de R$ 9 bilhões da repatriação seja para compensar o corte.

Ontem, Gurgacz apresentou o parecer mais recente com arrecadações que "substituem a CPMF". No entanto, "não é suficiente para cobrir o superávit que a LDO indica, mas nós não podemos aumentar uma receita sem ter a fonte". "Temos que fazer um relatório de receita justo", afirmou o senador.

O pedetista e parlamentares da Comissão Mista de Orçamento continuam rejeitando a nova CPMF, que o governo tentará reincluir em votação no plenário da comissão. A presidente enviou mensagem ao Congresso na semana passada para incluir a estimativa de arrecadação de R$ 24 bilhões, contando que a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que recria o tributo seria promulgada em dezembro para começar a ser cobrado em abril.

A mesma fonte confirmou que esse não é mais o horizonte, pois a ideia é usar a CPMF "como um ativo" para o futuro e mostrar ao mercado que terá uma receita extra completa em 2017 e 2018. Para 2016, o cenário ideal para o governo era aprovar o imposto em março e, após a "noventena", valer em julho. Cenário muito difícil.

A reunião da Comissão de Orçamento terminou ontem sem que o relatório de Gurgacz fosse votado e, assim, destravasse a tramitação do projeto de Lei Orçamentária Anual de 2016. O Valor apurou que governistas preferiram adiar a decisão diante de impasse entre os ministros Joaquim Levy (Fazenda), que ligava para parlamentares para pedir a aprovação do parecer ontem, e Nelson Barbosa (Planejamento), que preferia o adiamento.

Presidente da comissão, a senadora Rose de Freitas (PMDB-ES), reclamou: "Vamos votar o Orçamento [neste ano] ainda que eu tenha que bater na porta de um por um e explicar que esse país precisa desse Orçamento". Sem citar claramente a prisão do senador Delcídio Amaral (PT-MS), que atuava como líder do governo no Senado, Rose disse que "pelo menos temos que oferecer a esse país desnorteado essa peça orçamentária".

Merval Pereira: STF contra o crime

- O Globo

Última palavra só cabe ao Supremo. A discussão sobre a legalidade da prisão do senador Delcídio Amaral peca pela base, pois cabe ao Supremo Tribunal Federal definir a constitucionalidade dos atos jurídicos e, portanto, como gosta de lembrar o decano Celso de Mello, é do STF a última palavra, o direito de errar por último.

Éclaro que, se o STF começar a dar interpretações politizadas sobre a constitucionalidade de certas leis, com o intuito de proteger os poderosos do momento, teríamos então uma séria ameaça à democracia. Neste caso, ao contrário, trata-se de evitar que o crime vença a Justiça, como salientou a ministra Cármen Lúcia.

A proteção constitucional a parlamentares no exercício do mandato visa resguardá-los, mas não pode servir para acobertar crimes, evidentes no caso de Delcídio pela gravação feita pelo filho de Nestor Cerveró.

A Segunda Turma do Supremo Tribunal acolheu, por unanimidade, o voto do relator, ministro Teori Zavascki, na linha do requerimento do procurador-geral da República decretando a prisão, pois o senador estaria em situação de flagrância pela prática de crime de obstrução da Justiça, crime permanente e inafiançável, que só cessa quando o autor é impedido de continuar sua ação.

Todos os requisitos, portanto, foram obedecidos para a prisão de um parlamentar no exercício do mandato, inclusive a permissão do Senado, que se dobrou à vontade da sociedade que representa. O delito de organização criminosa também foi aventado e é crime permanente, permitindo a prisão em flagrante. Mas não é inafiançável, e portanto não pode ser a base da prisão de Delcídio, embora possa vir a ser um dos crimes de que ele será acusado.

A questão controvertida que será suscitada pela defesa, ressalta o criminalista Cosmo Ferreira, é se realmente se trata de organização criminosa, que exige, para se caracterizar, estabilidade e permanência — ou, se a hipótese é de concurso de pessoas, prevista no artigo 29, caput, do Código Penal, de natureza efêmera, o que afastaria a figura do crime permanente e, em consequência, o estado de flagrância.

O que é necessário definir agora é o que se deve fazer com o senador preso em flagrante. Como esse tipo de prisão não pode ter duração indefinida, será preciso, para mantê-lo preso, decretar sua prisão preventiva, o que torna inafiançável o crime de que é acusado. Mas aí entram seus defensores alegando que um parlamentar não pode ter sua prisão preventiva decretada.

O constitucionalista Gustavo Binenbojm acha que o Supremo Tribunal Federal terá que inovar em sua decisão para impedir que o senador seja posto em liberdade 24 horas depois de preso, o que daria à opinião pública a sensação de que a Justiça é impotente para punir figurões políticos.

Para Binenbojm, cumpridas as exigências constitucionais para a prisão do senador, ele deveria ser tratado como qualquer outro cidadão preso em flagrante. Havendo motivos para a decretação da prisão preventiva, não pode ser solto. Gustavo Binenbojm ressalta que o artigo da Constituição que protege os parlamentares no exercício do cargo é uma norma excepcional e deve ser interpretada de maneira restritiva, de modo a não inviabilizar a persecução penal. De outro modo, a prerrogativa parlamentar se converteria em privilégio odioso de impunidade.

Eliane Cantanhêde: Filme de terror

- O Estado de S. Paulo

Quando o impeachment parecia esfriar a caminho da geladeira, eis que a semana esquenta e acaba com a presidente Dilma Rousseff na linha de fogo. Mais uma vez, o problema não é a oposição, mas sim os próprios aliados que põem os pés pelas mãos, sabem das coisas e podem decidir falar poucas e boas. Aí, vira um salve-se quem puder.

Estamos falando, obviamente, dos novos personagens da semana, que vêm se somar a Dirceu, Genoino, Delúbio, Vaccari, João Paulo Cunha e André Vargas: o ex-líder do governo Dilma no Senado, Delcídio do Amaral, o banqueiro André Esteves e o ex-diretor da Petrobrás Nestor Cerveró, além do pecuarista José Carlos Bumlai, o amigão do Lula que andou levando vantagem do nosso BNDES.

Todos eles estão presos. Todos eles sabem coisas do arco da velha. Todos eles têm um enorme potencial de atingir não mais só o PT e o governo Lula, mas também Dilma Rousseff. Principalmente se reavivarem a história levantada com exclusividade pelo Estado no ano passado sobre a compra inacreditavelmente irresponsável da refinaria de Pasadena, nos EUA. Essa história vaga como alma penada na Procuradoria, na Polícia Federal e no TCU.

Nesse enredo que deixou de ser econômico, passou a ser policial e está virando filme de terror, Cerveró diz na delação premiada (que vazou para os principais interessados) que Dilma não apenas “sabia de tudo” como acompanhou diligentemente a negociação de Pasadena.

Afora o fato, em si já muito grave, de que alguém deve ter ganho fortunas para repassar a delação a Delcídio e ao banqueiro Esteves, acendem-se todos os sinais amarelos no Planalto e no PT. Se Cerveró já andou dizendo isso, o que mais poderá dizer sobre a participação de Dilma, que era chefe da Casa Civil de Lula e presidente do Conselho de Administração da Petrobrás? E Esteves, o que tem a dizer? E Delcídio, vai cair sozinho?

É por essas e outras que o Planalto tenta fazer “hedge” alardeando que teme “as mentiras” de Delcídio. Já o PT se precipitou perigosamente ao jogá-lo aos leões depois de pôr Vaccari e outros no colo. Em nota classificada de “covarde” pelo presidente do Senado, Renan Calheiros, o PT diz que “nenhuma das tratativas atribuídas ao senador (Delcídio) tem qualquer relação com sua atividade partidária”. E arremata: “O PT não se julga obrigado a qualquer gesto de solidariedade”. Com Delcídio preso, depondo e sem muito mais a perder, essa nota tem explosivo potencial bumerangue.

Muitíssimo mais esperto, como sempre, foi Lula. Lê-se que, em evento na CUT ontem, ele reduziu a prisão e as agruras de Delcídio a um erro tático: deixar-se gravar pelo filho de Cerveró, fazendo as propostas mais obscenas ao ex-diretor. Segundo Lula, foi “uma grande burrada”, uma coisa “imbecil” e “idiota”. Leia-se: que Delcídio desviasse, roubasse, cometesse qualquer crime, tudo bem. Só não podia cair na esparrela de falar demais diante de um microfone escondido.

Tem-se, assim, que o grande escândalo não foi a prisão inédita de um senador no exercício do mandato, nem a prisão do líder do governo no Senado, nem a prisão de um dos homens mais ricos do país, que navega com igual desenvoltura nas águas do PT e do PSDB. Isso foi apenas mais uma etapa da Lava Jato. O maior escândalo, aparentemente, ainda está por vir. É por isso que os nervos andam à flor da pele no Planalto e arredores.

Força feminina. Foram duas médicas de Pernambuco que suspeitaram do súbito aumento de microcefalia. Foi uma médica da Paraíba que tomou a iniciativa de pedir análise para o Rio. Foi a equipe de uma médica da Fiocruz que identificou o Zika vírus. E foi uma jornalista, Ligia Formenti, do Estado, quem divulgou primeiro tanto o surto de microcefalia quanto as suspeitas sobre o Zika vírus. Parabéns, mulheres!

Bernardo Mello Franco: Instinto de sobrevivência

- Folha de S. Paulo

O Senado evitou um suicídio institucional ao acatar a prisão de Delcídio do Amaral. Se mandasse soltar o petista, a Casa incitaria a revolta na sociedade e compraria uma briga inglória com o Supremo Tribunal Federal.

As provas contra Delcídio são incontestáveis. Ele tramou a fuga de um preso e prometeu usar sua influência para anular delações da Lava Jato. Além disso, ofereceu suborno para calar uma testemunha que deve incriminá-lo no petrolão.

A tentativa de obstruir o processo foi tão clara que o ministro Teori Zavascki não hesitou em decretar sua prisão. A decisão foi referendada pela segunda turma do Supremo, que percebeu a grave ameaça à imagem e à autoridade do Judiciário.

Apesar da solidez das provas, o Senado ensaiou uma operação para livrar Delcídio da cadeia. A tentativa de resgate foi liderada pelo presidente Renan Calheiros, um dos principais investigados da Lava Jato.

O peemedebista traçou um plano simples: os senadores decidiriam o futuro do petista em votação secreta, sem prestar contas aos eleitores. Com isso, Delcídio teria chances razoáveis de ser libertado.

Num apelo ao corporativismo, Renan insinuou que o Supremo usurpou poderes do Legislativo e chegou a dizer que a prisão do petista, decidida à luz do dia e com base na lei, não teria sido "democrática".

O discurso foi endossado pelo incorrigível Jader Barbalho, que evocou o nome de Deus e declarou que os senadores não precisam ser fiscalizados pela opinião pública. Ele acrescentou que já passou por "lutas" e "dificuldades". É verdade: em 2002, foi preso e algemado pela PF.

"O que está em jogo neste momento é a vida da instituição, é a vida do Senado Federal", alertou Jader, na tentativa de convencer os colegas a proteger Delcídio. Por instinto de sobrevivência, a maioria dos senadores entendeu o aviso de outra forma. A prisão foi confirmada em votação aberta e por ampla margem: 59 a 13.

César Felício: A dominância política

• Se Dilma e Lula ficam sob ameaça, Cunha perde

- Valor Econômico

Por um momento, o transe político em Brasília pareceu perder o fôlego diante da recessão econômica, o que paradoxalmente estava garantindo que a presidente Dilma Rousseff ganhasse margem para concluir o seu mandato sangrando, mas viva, até 2018.

Por este roteiro, o tempo conspirava a favor da presidente, uma vez que o mundo político entraria em compasso de espera, travado pelo labirinto que se ergueu em volta de Eduardo Cunha. Os que tramam o impeachment precisariam esperar a maturação da crise econômica no desespero popular.

A batalha decisiva seria travada em algum momento entre março e abril. O outono, pelas projeções econômicas, seria o instante em que o crescimento do desemprego e da inflação poderia emparedar Dilma e alimentar sua derrocada.

Caso Dilma vencesse o outono com a guerra do impeachment sob controle, seria beneficiada por dois fenômenos potencialmente paralisantes sobre conspirações: os Jogos Olímpicos do Rio e, praticamente em sequência, as eleições municipais que tendem a esvaziar Brasília.

Com a sucessão de acontecimentos vertiginosos decorrentes da Operação Lava-Jato que marcaram esta semana, o cronograma da crise de 2016 foi afetado e já não se divisa mais a fase da dominância econômica sobre o cenário político. Delcídio e Bumlai na cadeia impedem que as expectativas econômicas se formem sem levar em consideração o noticiário policial.

As primeiras consequências de se ter um líder do governo preso já puderam ser vistas nesta quarta-feira, em que o Congresso Nacional teve que adiar o início da votação sobre a revisão da meta do resultado primário. Sem esta votação até o fim do ano, Dilma pode ser incursa em um eventual crime de responsabilidade que embase outro pedido de impeachment.

O epicentro da crise que fez com que o futuro político de Cunha se estreitasse pode se espalhar para o coração do Senado. É difícil medir o alcance que a delação premiada de Nestor Cerveró, a ser homologada, terá sobre a situação do presidente da Casa, Renan Calheiros. Embora seja certo que Dilma não pode ser incriminada por atos cometidos anteriormente ao início de seu mandato, as acusações do ex-diretor procurando comprometê-la com a compra de Pasadena tendem a aprofundar o seu desgaste. No mínimo, deixaria a presidente com dificuldade de repetir uma de suas frases-mestras em entrevistas: "Eu não fiz nada".

Mais explosiva ainda parecem ser as consequências que as recentes prisões poderão ter sobre as pretensões de Luiz Inácio Lula da Silva. No caso de Bumlai, trata-se de um amigo particular do ex-presidente. Em relação a Delcídio, alguém que foi nada menos que o presidente da CPI do Mensalão de 2005, e nesta posição, eventualmente pode ter tido conhecimento de fatos que ainda não vieram à tona.

Uma pequena amostra pôde ser vista há apenas seis meses. Em maio, a revista "Veja" publicou uma matéria em que Delcídio confirma que recebeu Marcos Valério para uma reunião, em que o operador do esquema apurado pela CPI se queixou de passar por problemas financeiros.

O extermínio político de Delcídio deixa um cenário de desolação extrema para o governo no Senado. Na bolsa de apostas de seus possíveis sucessores na liderança do governo estão parlamentares que sequer se aproximam do trânsito que Delcídio, um ex-tucano e ex-pemedebista, tinha junto a todo o universo político e ao empresariado. Toda pauta do governo na Casa que é o anteparo dos desmandos da tropa de Cunha na Câmara fica ameaçada de cair por terra. Se já tinha o desafio de reconstituir sua base entre os deputados, agora Dilma terá que remontar sua estrutura entre os senadores.

Não é por outro motivo que o senador do DEM e presidenciável em 2018 Ronaldo Caiado procurou relançar ainda na noite de quarta a tese de novas eleições.

É uma proposta que ainda está muito longe de qualquer vestígio de concretude, mas sua simples menção sinaliza que a ampulheta virou novamente.

O ambiente político de agora é semelhante ao do fim do primeiro trimestre, quando fracassou a articulação dilmista para montar um eixo envolvendo o PT não lulista e um centro político comandado por Gilberto Kassab e a família Ferreira Gomes. Pela terceira vez no ano, Dilma estará convidada a se reinventar.

Neste contexto, a ação da equipe econômica volta a estar condicionada de modo violento às limitações políticas. Não será uma troca de ministro da Fazenda que irá mudar o espírito do Congresso.

A governabilidade deixou de existir, pelo menos no sentido amplo da palavra, que é o de pautar o debate nacional, e é duvidoso que seja restaurada em caso de ascensão de Michel Temer. Na hipótese de chegar ao poder em um processo de impeachment, o vice terá uma legitimidade política a ser construída, já que sobre si pesam ameaças que por enquanto estão circunscritas à Justiça Eleitoral.

Há quem sonhe com um governo Temer estruturado em uma base governista semelhante a que sustentou Fernando Henrique nos anos 90, em que o vetor decisivo seria o PMDB, e não o PSDB, como foi no passado. O ativo que Temer teria seria sua disposição em não se apresentar como candidato em 2018.

Parece muito pouco, como indica a declaração de Caiado feita minutos depois do Senado confirmar a decisão do STF de encarcerar o líder do governo na Casa. Um processo de impeachment sumário no Brasil não seria uma turbulência que se encerra em si mesma. A primeira tarefa de Temer como presidente seria lutar para não cair.

Se no caso de Dilma e Lula as prisões decorrentes da Lava-Jato são preocupantes, para Eduardo Cunha podem ser o dado definitivo para selar sua sorte. De longe, o presidente da Câmara é a parte mais vulnerável da equação. Toda a crise política atual indica que o futuro presidente da Câmara, a ser eleito cinco dias depois de um afastamento de Cunha, teria imenso poder para arbitrar o conflito político, dada as limitações que existem em relação a Temer e Renan.

Cunha está cambaleando desde a sua desastrosa intervenção no Conselho de Ética, na última semana. Antes um condutor de um processo de impeachment, Cunha poderá no máximo vetar a ascensão de um desafeto em seu lugar. Não tem mais como ungir um eleito.