IPCA acima de 6% às vésperas das eleições preocupa
A trajetória da inflação neste ano é perversa. As expectativas tanto do mercado quanto do governo são de uma variação do IPCA em doze meses muito próxima do teto da meta (6,5%) no terceiro trimestre, período que coincide com o auge da campanha presidencial. Só no fim do ano é que o índice pode cair abaixo de 6%.
Há uma janela favorável para o controle da inflação até abril. Entre janeiro e abril do ano passado, as taxas estavam bastante pressionadas, o que levou o Comitê de Política Monetária (Copom) a iniciar um ciclo de aperto monetário que elevou a taxa Selic, desde então, em 3,25 ponto percentual, de 7,25% ao ano para 10,5% ao ano. Como o IPCA tende a ser mais moderado neste ano até abril, a inflação de doze meses deve cair. Daí por diante os ganhos vão ficar muito difíceis e, entre julho e setembro, a inflação volta para a casa dos 6% ao ano, podendo novamente superar o teto da meta, como os 6,7% de junho do ano passado.
São muitas, ainda, as incertezas que permeiam os dados de inflação para este ano e dificultam as projeções do Banco Central. Não está claro, por exemplo, qual será a política de reajuste dos derivados de petróleo, se haverá aumento da gasolina e se este será antes ou depois das eleições. Não se sabe qual será a conta de energia. O orçamento de 2014 prevê gastos de R$ 9 bilhões com o setor, cifra que se subestimada pressionará os reajustes das tarifas das distribuidoras. A performance dos preços dependerá, também, de qual será a atitude dos prefeitos das capitais em relação às tarifas de ônibus, congeladas desde 2012.
O mais decisivo, contudo, será o comportamento da taxa de câmbio. Em situação normal, não se contaria com uma desvalorização cambial importante após a depreciação acentuada dos últimos dois anos (de 16% em 2012 e de 11% no ano passado).
Os operadores do mercado financeiro, porém, já consideram favas contadas um rebaixamento do grau de investimento do país e da Petrobras pela agência de rating Standard & Poor's neste ano. O que fará diferença no preço atual do câmbio será o que a S&P vai colocar como perspectiva para o país. Se for "estável", menos mal, já está implícito na cotação da moeda. Mas se a agência de rating considerar a perspectiva "negativa", os efeitos podem ser muito ruins, com a saída dos investidores institucionais e um déficit de cerca de US$ 80 bilhões em conta corrente para financiar.
Nem tudo é negativo para a inflação deste ano. Há fatores que vão colaborar, mas é prematuro considerar factível uma ligeira queda em relação ao inesperado IPCA de 5,91% de 2013.
O principal deles é a expectativa de que, finalmente, os alimentos tenham um melhor comportamento depois de vários choques de preços nos últimos anos. A projeção do governo é de que a variação do índice de preços desse setor fique na casa dos 6%, em comparação com os 8,48% de inflação de alimentos e bebidas no ano passado. Uma queda para esse patamar poderia reduzir a inflação anual em 50 pontos base, neutralizando parte do impacto da eventual descompressão dos preços administrados.
Embora o Banco Central trabalhe com um aumento de 4,5% nos administrados, vários economistas de bancos consideram que a variação será menor, de 3,5%, depois da inflação de administrados e monitorados em 2013 ter sido de somente 1,5%.
Outro fator que vai ajudar o Banco Central na tarefa de controlar a inflação é o reajuste do salário mínimo em vigor este mês, de 6,78%, o menor desde que o ex-presidente Lula começou a política de recuperação do valor do salário mínimo, em meados do primeiro mandato.
Há, no governo, quem ainda alimente alguma esperança na contribuição da política fiscal para a contenção dos preços. O Ministério da Fazenda prepara o decreto de contingenciamento do orçamento da União, que deve ser divulgado em fevereiro. Economistas do setor financeiro, no momento, não esperam qualquer auxílio vindo de uma suposta austeridade do gasto público.
É a política de aperto monetário que pode definir o futuro da inflação. O aumento da taxa Selic para 10,5% na quarta-feira mostrou um BC disposto a agir, mas também indicou que o próximo passo do Copom pode ser menor, de 0,25 ponto percentual, com os juros parando em 10,75% ao ano - exatamente a taxa de juros que Dilma Rousseff recebeu de Lula.
Para levar o IPCA a níveis mais próximos da meta de 4,5% - algo na casa dos 5,5% -, a Selic de 10,5% ao ano ainda estaria aquém do necessário, avaliam economistas do mercado financeiro.
Muitas iniciativas oficiais alimentaram a resistência inflacionária: a abertura dos cofres públicos, a expansão do crédito dos bancos federais, a super indexação do salário mínimo, a depreciação do real e os juros insustentavelmente baixos, de 7,25% ao ano, entre outubro de 2012 e março de 2013. Não deu frutos o empenho da presidente Dilma Roussef em concluir o primeiro mandato com taxa de juros reais de 2% ao ano. A taxa real, que chegou ao pouco mais de 1% ao ano, já voltou para a casa dos 4%. Ontem o swap de 360 dias estava pagando 4,67% ao ano.
C; erca de 84% dos investimentos das 18 concessões realizadas pelo governo em 2013 vão ser feitos nos primeiros cinco anos. Segundo cálculos da Secretaria de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda (Seae), os aportes totais, estimados em R$ 80,3 bilhões, devem corresponder a uma média de R$ 13,5 bilhões por ano, nos primeiros cinco anos. A parcela restante, equivalente a R$ 12,8 bilhões, deverá ocorrer no curso das concessões cujos prazos variam de 25 anos a 30 anos, conforme as obrigações contratuais.
Esses investimentos, algo como 0,28% do PIB ao ano, devem ter impulso mesmo só a partir de 2015, pois os contratos ainda estão sendo assinados e os primeiros meses após a assinatura são inevitavelmente dedicados à montagem das empresas e à obtenção de licenças para as obras.
Fonte: Valor Econômico