segunda-feira, 2 de setembro de 2019

Opinião do dia: Fernando Henrique Cardoso*

Com tanto horror perante os céus, como disse um poeta, devemos aguentar firmes (imprensa, Congresso, Judiciários, líderes empresariais e da sociedade civil) para não deixar que arroubos personalistas e interesses familiares comprometam o futuro do País.

Creio que foi Otávio Mangabeira quem disse: a democracia é como uma plantinha tenra, precisa ser regada todos os dias para crescer. Trata-se agora de preservá-la. Como mostram muitos livros recentes sobre a crise da democracia, a forma moderna de corrompê-la não passa por golpes militares, mas por atos governamentais que, quando não encontram reação à altura, pouco a pouco lhe vão arrancando as fibras.

O preço da liberdade é a eterna vigilância. É preciso nos mantermos atentos e fortes para que as instituições do Estado continuem a cumprir, com independência, as obrigações impostas pela Constituição.

* Sociólogo, foi presidente da República. ’Basta de gols contra’, O Estado de S. Paulo | O Globo, 1/9/2019.

Fernando Gabeira - Cabeça fria, apesar das chamas

- O Globo

O caminho é mostrar a importância da floresta em pé, pelos serviços ambientais e pela riqueza da biodiversidade

Estou na Amazônia para mais uma viagem de aprendizado na região. Ela é vastíssima, e minha capacidade de aprender é lenta e sinuosa. A floresta tem cem mil espécies animais, 43 mil vegetais. As queimadas devem arder até outubro, a julgar pela experiência dos últimos anos.

Os ânimos parecem ter se acalmado. Angela Merkel deu o tom no G7 ao afirmar que é preciso fazer alguma coisa, sem dar a impressão de ser contra Bolsonaro.

Não se trata de um exercício de psicologia individual. Merkel é uma estadista, tem objetivos maiores, lida com pessoas complicadas como Trump. Percebeu talvez que Trump e Bolsonaro são frutos de uma época e que não podem ser tratados com os mesmos critérios do passado.

Bolsonaro anunciou que apresentaria uma política para a Amazônia. Mas, até o momento, afirmou apenas, em reunião com governadores, que era preciso explorar as terras indígenas.

Essa história de Bolsonaro com os índios brasileiros esbarra na Constituição. Para avançar sobre a superfície, precisa de emenda constitucional, e para avançar no subsolo indígena é necessária uma lei complementar, que Romero Jucá não conseguiu aprovar ao longo desses anos.

Algumas repercussões negativas ainda estão no horizonte: fundos suecos planejam deixar de investir no Brasil, compradores de couro, como a Timberland, querem se fechar para a nossa produção.

Importante lembrar que boicotes e sanções contra governos —pelo menos é a impressão que tenho ao longo dos anos que acompanhei — atingem as pessoas comuns e acabam fortalecendo os próprios governos visados.

Ana Maria Machado - Curto-circuito

- O Globo

Não parece complicado. Coaf era para controlar atividades financeiras. Identificar operações atípicas e dar alarme. A Receita confere e cruza informações. Cada vez que um de nós se equivoca ou confunde dados na declaração de renda, recebe uma notificação e tem de provar com documentos o que informou. Nada de mais.

É bom que funcione assim, e todos os contribuintes sejam tratados de igual maneira. São mecanismos de controle. De compartilhamento de informações, inclusive com autoridades estrangeiras. Não de investigação. Quem investiga são outros canais. Mas estes, por vezes, só sabem que devem investigar ao receber sinais de alerta. Sem saber que há razões para isso, não pedem licença antes. Não adivinham.

Quando o STF obriga a sustar esse processo, ou políticos se alarmam porque houve sinais de alerta e as investigações começaram sem pedir licença, há uma mistura de canais. Um curto-circuito. É da mais elementar lógica: um órgão que existe para controlar tem de dar o alarme se algo parece estranho. E órgãos que existem para investigar então passam a investigar.

Cacá Diegues - Seu garçom, faça o favor

- O Globo

No botequim, o valor de quem fala alto será sempre superior ao de quem é capaz de raciocinar sem muito escândalo

Mesmo que o amemos com paixão, o Brasil é um país pouco fácil de se elogiar. Os tolos sempre acreditaram no marketing que nos vende como um paraíso tropical, onde tudo é belo e prazeroso, onde não há conflitos a encarar. Já os mais espertos perceberam a falácia do país da cordialidade e do risonho rosto ao sol, e protestam contra nossas dificuldades, das mais fundamentais às mais prosaicas, para o exercício do amor. O mestre Antônio Vieira, por exemplo, reclamava de nossos mosquitos que não paravam de picá-lo; assim como dom João VI ordenou a mudança para o Rio de Janeiro, porque não aguentava mais o mau cheiro nas ruas da Bahia.

Hoje, parte de nós, ao comentar o que somos, exerce uma lógica peculiar e muito original do que podemos chamar de “cultura de botequim”, que hoje domina a cultura brasileira em geral, depois de longo silêncio cuidadoso de desvalorização e de vergonha do que podíamos ser. Ou vir a ser.

A cultura de botequim se manifesta através de outra especialidade nacional, a “conversa de botequim”, à qual se dedicaram, com diferentes posturas e valores, poetas, romancistas e pensadores sobretudo cariocas. Entre eles, Noel Rosa pode ser considerado o pai da expressão. Grandes artistas como João do Rio, Marques Rebelo ou Nelson Rodrigues, entre tantos outros, nos fizeram conhecer bem esse mundo, em outros momentos do país. Pois, como toda criação dessa natureza, a cultura de botequim se transforma no tempo, conforme o que acontece e a influencia do lado de fora do botequim.

A conversa de botequim se caracteriza pela irresponsabilidade tóxica de seus praticantes, pela impertinência com que tratam assuntos pertinentes. No botequim, não se pensa duas vezes ao preferir a piada à verdade sem graça. Ninguém vacila em inventar um argumento falso para justificar o que pretende afirmar. Não se dá crédito ao que não serve para impor uma razão pouco razoável. Ganhara discussão é a prioridade, mesmo que não se saiba o que está certo ou errado, que não se dê muita importância à vitória. Mesmo que estejamos a espremer uma barata na sola do sapato, faremos isso porque é assim que se faz no mundo real dos heróis. Com um sorriso nos lábios, ainda que disfarçadamente triste.

Marcus André Melo* - A tragédia incomum: piorar para melhorar

- Folha de S. Paulo

Em muitas áreas, a grande tragédia é que não há tragédia

Há um ponto comum na agenda pública brasileira, em vários domínios: as coisas tiveram que piorar muito para começarem a melhorar. Têm sido necessárias crises para deflagrar respostas a problemas coletivos.

O caso mais evidente é a Previdência Social: o diagnóstico e as soluções são conhecidos e a agenda de reformas é a mesma desde a década de 1990. Mas foi necessária uma conflagração no nível subnacional —com suspensão e/ou atrasos do pagamento de pensões e benefícios— para que as ameaças de colapso do sistema se tornassem críveis.

Na área tributária, as distorções do sistema são conhecidas há duas décadas. As propostas mudam marginalmente. Foi necessário se chegar a uma situação de caos criada pela proliferação de regimes tributários especiais para que se deflagrasse processo de reforma, cuja sina ainda é incerta.

Na área ambiental, foi só após as crises ciclópicas de Mariana e Brumadinho e a devastação na Amazônia que a opinião pública foi exposta “bestializada” à enormidade da crise, e parece que a questão adquiriu senso de urgência. Neste último caso há uma diferença importante: a emergência foi ativamente produzida pelo governo, que converteu crise crônica em calamidade.

Celso Rocha de Barros* - O PSB sai na frente

- Folha de S. Paulo

Torço para que esse movimento seja o início de uma frente ampla de esquerda

Uma boa notícia: o Partido Socialista Brasileiro (PSB) aprovou, na última sexta-feira (30), uma resolução repudiando as violações de direitos humanos perpetradas pelo governo de Nicolás Maduro na Venezuela.

Na resolução, os socialistas manifestam "seu repúdio às violações de direitos humanos praticadas pelo governo venezuelano, descritas no relatório da Alta Comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Michelle Bachelet, típicas de regimes autoritários, como bem observado pelo ex-presidente do Uruguai, José Mujica". Pedem que o regime venezuelano "acate, o quanto antes, as recomendações que constam do relatório da ACNUDH", como, por exemplo, que se "ponha em liberdade todas as pessoas privadas arbitrariamente de sua liberdade".

Ao mesmo tempo, os socialistas repudiaram qualquer tentativa de resolver a crise venezuelana por intervenção externa, e manifestaram seu apoio às tentativas do governo da Noruega de obter uma solução negociada.

A citação ao Frente Amplío uruguaio e aos socialistas chilenos na resolução do PSB não é gratuita. É nítido o esforço de se associar a exemplos bem-sucedidos da esquerda democrática sul-americana.

Nessa linha, o PSB propõe o reforço da CSL (Coordenação Socialista Latino-americana) como espaço de reunião dos partidos de esquerda "comprometidos com a redução das desigualdades, com o desenvolvimento econômico e social soberano dos países de nosso continente, com a democracia, com as liberdades e com os direitos humanos", e anuncia seu desligamento do Foro de São Paulo.

Vinicius Mota - A depuração do bolsonarismo

- Folha de S. Paulo

Tamanho e características da base popular da direita brasileira ficam mais nítidos conforme o presidente se desgasta

Deve ser particularmente dolorido para a esquerda, cuja autoimagem sempre foi a de única representante legítima das massas trabalhadoras, o fato de ter florescido uma direita popular no Brasil.

Não me refiro às maiorias que sustentaram as duas eleições de Fernando Henrique Cardoso, que apenas na propaganda de seus rivais do PT pode ser tachado de direitista. Ou alguém imagina FHC a elogiar torturadores, a aliar-se carnalmente aos Estados Unidos ou a incentivar trogloditas destruidores de florestas?

Direita é o que temos agora. E ela só chegou ao poder porque, a despeito de galvanizar o sentimento anti-establishment, atraiu simpatias na sociedade numa escala inédita em mais de três décadas de democracia.

O tamanho e as características dessa base popular da direita brasileira ficam mais nítidos conforme o presidente se desgasta. O vasto contingente de batalhadores cuja família ganha de R$ 2 mil a R$ 5 mil por mês desponta como o mais importante bastião da resistência bolsonarista.

Leandro Colon - Os recados da pesquisa ao governo Bolsonaro

- Folha de S. Paulo

Datafolha indica que a escalada retórica do presidente tem afugentado boa parte dos que votaram nele

A nova pesquisa do Datafolha mostra que não tem agradado aos brasileiros a estratégia de governar de Bolsonaro ou a falta dela —se é que inexiste, como já declarou o presidente ("sou assim mesmo").

Foram oito meses até hoje, 16% do mandato. Tempo de sobra tem Bolsonaro para reverter a opinião dos eleitores, embora não haja pista de que ele esteja preocupado com isso.

A pesquisa indica que a escalada retórica do presidente tem afugentado boa parte dos que apertaram o botão para varrer o PT em 2018.

O Nordeste deu sinal de que reprovou o episódio dos "paraíbas", em que Bolsonaro foi flagrado em vídeo criticando governadores da região.

De acordo com a pesquisa, subiu de 41% para 52% o índice de avaliação ruim e péssima feita pelos nordestinos sobre o governo atual.

Denis Lerrer Rosenfield* - Amazônia ‘internacional’

- O Estado de S.Paulo

O presidente Macron, ao responder ao presidente brasileiro, criou um problema geopolítico de dimensão inusitada

Muitas impropriedades foram cometidas a propósito dos debates sobre a questão da Floresta Amazônica, uma celeuma que se tornou um problema geopolítico, diplomático, comercial e militar. Uma questão de comunicação, de pouca eficácia do lado brasileiro ganhou dimensão propriamente amazônica. Note-se que o mundo da política, e também o do comércio exterior e da diplomacia, é o das percepções, muitas vezes os fatos e a verdade ficam a reboque.

Tanto uma percepção falsa quanto uma verdadeira orientam a ação, que se fará numa ou noutra direção. Eis por que o trabalho de comunicação e esclarecimento dos fatos é da máxima importância, pois de sua falta seguirá um tipo ou outro de ação. Ou seja, a comunicação social, tanto a tradicional quanto a digital, faz parte da ação humana e, portanto, dos governos, empresas e entidades de classe. Dela dependerá a orientação do comportamento e da ação humana.

Nesse jogo de percepções e de apostas arriscadas, no que tange às impropriedades o presidente francês ganhou o campeonato, embora o brasileiro se tenha referido à primeira-dama da França de forma inadequada e desrespeitosa. Isto é, o presidente Macron, ao responder ao presidente brasileiro, criou um problema geopolítico de dimensão inusitada. Picado pela boutade imprópria de Bolsonaro, declarou que a Amazônia teria status internacional, não devendo, portanto, estar submetida à soberania brasileira.

O caminho é deveras longo da primeira-dama à ameaça de velada intervenção externa, certamente “comandada” e “inspirada” pela França. É bem verdade que o presidente Macron procura agradar aos agricultores franceses, refratários à competição internacional, vivendo de subsídios e temendo fortemente a concorrência da agropecuária brasileira. Sua intenção é evidente: torpedear o recém-assinado acordo Mercosul-União Europeia. Está à procura de votos e tenta para isso criar uma crise internacional.

Mauro Paulino* / Alessandro Janoni* - Com tom belicoso, Bolsonaro arrisca pregar apenas para convertidos

- Folha de S. Paulo

Ao se radicalizar, presidente comprometeu capital eleitoral segundo o Datafolha

Não é de hoje que o Datafolha alerta para a necessidade de Jair Bolsonaro (PSL) adequar-se ao cargo de presidente da República, caso queira melhorar sua imagem junto aos brasileiros.

Desde a primeira pesquisa de avaliação, realizada em abril deste ano, o comportamento do ex-deputado à frente da Presidência tem figurado nas análises estatísticas como variável determinante no posicionamento da opinião pública sobre seu governo.

Os resultados divulgados agora pela Folha mostram que, ao intensificar essa característica nos últimos meses, Bolsonaro comprometeu parcela simbólica de seu capital eleitoral.

Mesmo com o peso quantitativo de sua crescente impopularidade entre mulheres, entre os que têm menor renda e baixa escolaridade, moradores do Nordeste, talvez incomode mais o pesselista ver sua reprovação subir também entre homens, moradores do Sul e entre os que têm altas renda e escolaridade —perfis que o elegeram com expressivas taxas de apoio.

A prova do diagnóstico está no contingente de arrependidos —um em cada quatro dos que votaram no capitão reformado não repetiria a opção caso o pleito fosse hoje, garantindo a Fernando Haddad (PT) uma liderança apertada, mas fora dos limites da margem de erro.

Os mais arrependidos são os que têm entre 45 a 59 anos, faixa especialmente atingida pela reforma da Previdência.

A verborragia presidencial é abominada pela grande maioria da população e alcança quase 90% de reprovação quando se vale, por exemplo, de conteúdo escatológico.

Cida Damasco – Circuito da crise

- O Estado de S.Paulo

Desemprego persistente e Orçamento anêmico ainda ameaçam evolução do PIB

Quem dormiu na quinta-feira aliviado com a notícia de que o Brasil escapou da "recessão técnica" acordou na sexta-feira com a informação de que o País ainda tem uma legião de 12,6 milhões de desempregados, mais do que a população da cidade de São Paulo.

Desemprego real mesmo e não "técnico". E ainda terminou o dia com a confirmação de que, se depender do governo, não haverá nenhuma tração para o crescimento no ano que vem. Só para dar uma ideia do arrocho, o projeto encaminhado ao Congresso quase na prorrogação do segundo tempo prevê que os gastos obrigatórios consumirão 94% do Orçamento federal e os investimentos terão uma queda de 15%, limitando-se a R$ 19 bilhões, o menor nível em 10 anos.

São vários ângulos da mesma crise, que se reflete na extrema lentidão com que a economia se move há tempos. Com crescimento minúsculo, as empresas não só deixam de ampliar os quadros como partem para demissões e achatam os custos da mão-de-obra recorrendo à "informalidade". Com desemprego renitente, associado ao endividamento, consumidores restringem as compras ao mínimo necessário, o que, no fim da linha, resulta em menos crescimento. E, no sufoco, o governo mal consegue cumprir suas obrigações básicas, que dirá investir ou mesmo induzir o setor privado a tomar seu lugar.

Bruno Carazza* - Eminência pálida

- Valor Econômico

Enfraquecimento de Onyx revela novo rumos do governo

O cardeal Armand Jean du Plessis, o duque de Richelieu, era o todo-poderoso "primeiro-ministro" do rei Luís XIII da França. Combinando sua ascendência na Igreja Católica e no palácio real, Richelieu conduziu o país na sangrenta guerra dos Trinta Anos, redefinindo o mapa religioso e político na Europa Central e, assim, consolidou o absolutismo francês de 1624 até a sua morte, em 1642.

François Leclerc du Tremblay, um frade capuchinho devotado a manter a França católica em plena onda protestante, se tornou confidente e braço-direito de Richelieu. Muito habilidoso politicamente, Leclerc exerceu forte influência sobre as decisões tomadas pelo cardeal, a ponto de receber dele o apelido de "eminência parda" - em referência tanto à sua importância quanto à cor de suas vestes religiosas.

A partir de então, a expressão passou a ser utilizada para designar assessores ou conselheiros de governantes que, atuando nos bastidores, ditam os rumos de suas escolhas. Ao longo da história, várias personalidades foram apontadas como "eminências pardas", do místico Rasputin na corte do czar Nicolau II ao vice-presidente Dick Cheney nos Estados Unidos da era de Bush filho (vale assistir ao filme "Vice", de Adam McKay).

Jair Bolsonaro chegou ao Planalto acompanhado de seus três mosqueteiros. Sérgio Moro comandaria a guerra contra a corrupção e a criminalidade, Paulo Guedes daria um choque liberal para tirar a economia do buraco e Onyx Lorenzoni comandaria a articulação política para aprovar as reformas.

Onyx foi um dos primeiros políticos a enxergar o potencial de ascensão do ex-capitão. Enfrentou seu partido, o DEM, que na eleição de 2018 apoiou Geraldo Alckmin, e colheu os lucros de uma aposta certa, sendo nomeado o coordenador da equipe de transição entre a eleição e a posse.

Sergio Lamucci - O investimento na nova era de incerteza

- Valor Econômico

Governo brasileiro continua a ser fonte de indefinição

A incerteza elevada prejudica as perspectivas para o crescimento global, num cenário marcado por crescentes tensões comerciais entre EUA e China, a iminente saída do Reino Unido da União Europeia (o Brexit), a crise da Argentina e os protestos dos ativistas em Hong Kong. A economia mundial vai crescer menos neste ano porque o quadro internacional está mais incerto, o que atinge em especial o investimento.

É um problema que obviamente respinga no Brasil, afetando em alguma medida o crescimento por aqui. Nesse ambiente, é fundamental que o governo atue para diminuir as incertezas internas - a iminente aprovação da reforma da Previdência vai nessa direção, ao reduzir as dúvidas quanto à sustentabilidade das contas públicas. No entanto, há iniciativas que continuam a produzir ruído e a aumentar a incerteza, caso evidente da política ambiental do presidente Jair Bolsonaro. No campo tributário, ideias como a recriação de uma contribuição sobre movimentação financeira também podem causar insegurança entre as empresas.

Em relatório, o chefe de pesquisa econômica do Barclays, Christian Keller, destaca que a maior incerteza esteve por trás das revisões para baixo do crescimento global nos trimestres recentes. "A discussão do FMI no seu Panorama Econômico Mundial de abril foi dominada pela palavra 'incerto' e suas variantes, assim como o depoimento do presidente do Fed, Jerome Powell, no Congresso em julho", diz Keller.

Entre os fatores que diminuem a previsibilidade, ele cita as negociações sobre o Brexit no Reino Unido, as eleições na Argentina e conflitos geopolíticos, como a disputa entre Índia e Paquistão e os protestos em Hong Kong, além do problema de maior impacto - as tensões entre EUA e China e outros parceiros comerciais.

"A pesquisa [econômica] mostra que esses aumentos da incerteza antecipam declínios de produção. Tarifas comerciais mais altas e preocupações sobre uma escalada e sobre retaliações afetaram o volume de comércio global diretamente, mas as consequências econômicas negativas são mais amplas, atingindo cadeias de suprimentos, o investimento empresarial e a produtividade", observa Keller.

Gustavo Loyola* - Ataque aos Bancos Centrais

- Valor Econômico

Até em países tidos como institucionalmente desenvolvidos, como os EUA, a autonomia do BC é colocada em xeque

Em recente artigo, Bill Dudley, que foi vice-chairman do Fed de Nova York, opinou que qualquer estímulo adicional do Fed encorajaria Trump a ser mais agressivo em sua política comercial e traria prejuízos maiores à economia dos EUA no longo prazo. Essa opinião mereceu uma imediata resposta oficial do Fed no sentido de que considerações políticas não têm qualquer espaço em suas decisões de política monetária. Por si só, o fato de o Fed ter se preocupado em reagir de forma não usual a uma manifestação de um seu ex-dirigente indica o elevado grau de pressão a que a instituição está submetida nesses tempos "trumpianos".

Bancos centrais na mira de políticos eleitos não é novidade. Muito ao contrário. O inusitado do momento atual é que tal prática tem proliferado até em países tidos como institucionalmente mais desenvolvidos e coincide com o surgimento de políticos populistas como Donald Trump, Matteo Salvini e outros. O presidente americano tem sido pródigo em ataques ao Fed, que acusa de manter as taxas de juros excessivamente elevadas. Chegou até a ameaçar de demissão o chairman do Fed, Jerome Powell. No continente americano, até recentemente ataques e ameaças do gênero aos bancos centrais ocorriam apenas ao sul do Rio Grande.

Vale recordar que a ideia de que os bancos centrais necessitam de autonomia está de há muito consagrada na literatura econômica, embora muito frequentemente se alerte para o risco de um déficit democrático caso a autoridade monetária não tenha a necessária "accountability" perante os governantes eleitos e o parlamento, legítimos detentores do mandato popular. Por autonomia do banco central, entende-se principalmente sua capacidade de operar a política monetária longe das interferências políticas. Com isso, são evitadas decisões que satisfazem interesses eleitorais no curto prazo à custa de maiores custos no longo prazo.

Robert J. Shiller* - O discurso de Trump e a recessão

- Valor Econômico

Trump certamente tentará se aferrar a sua oratória, que funcionou tão bem por tanto tempo. Mas uma grave recessão pode ser sua ruína. E, mesmo antes de a catástrofe econômica sobrevir, a opinião pública pode começar a prestar mais atenção às aberrações dele

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, concluiu sua intervenção na recente cúpula do G-7 convidando os dirigentes ali reunidos a realizar o encontro do ano que vem em seu clube de campo de Doral, perto de Miami. Sua descrição do entorno lembra um mundo fantástico, de "edificações magníficas", cujos "salões de baile estão entre os maiores e melhores da Flórida". Foi mais um exemplo do discurso público de Trump, que trilha um caminho de crescimento ascendente há quase meio século.

Pode-se observar isso fazendo-se uma busca do nome de Trump em fontes noticiosas digitais, como o Google Ngrams. Seu discurso foi lento em crescer por contágio, mas já cresce há muito tempo, de tal forma que seu domínio do discurso público nos EUA parece quase inconcebível.

Parte do gênio de Trump foi procurar seguir, por toda a vida, os recursos que sustentam o contágio do discurso: ostentar encanto, cercar-se de lindas mulheres que aparentemente o adoram e simular exercer grande influência.

Trump abraçou firmemente essa estratégia de carreira em 1983, quando um artigo do jornal "The New York Times" intitulado "The Empire and Ego of Donald Trump" informou que ele já era, naquele ano, "um símbolo internacionalmente reconhecido da cidade de Nova York como a Meca dos super-ricos do mundo".

Examinemos seu interesse por luta livre profissional - uma forma de entretenimento que atrai multidões que, por obra de alguma estranha peculiaridade humana, querem acreditar na autenticidade do que é evidentemente encenado. Ele dominou o estilo de interpretação do setor e o usa, com eficiência, em todo lugar para aumentar seu contágio, tendo chegado até mesmo a participar de uma luta falsa em 2007.

Trump teve a sorte de ser convidado para ser o apresentador de um novo "reality show" de TV em 2004 chamado "The Apprentice" [no Brasil,"O Aprendiz", de mesmo formato], que apresentava competição empresarial na vida real. Vislumbrou imediatamente a oportunidade de uma vida inteira de aprimorar sua imagem pública, ficando famoso por um discurso rude, mas aparentemente voltado para o bem. "Você está demitido!", urrava ele, de modo grosseiro, para os perdedores de seu programa, ao mesmo tempo em que demonstrava algum calor humano tanto pelos ganhadores quanto pelos perdedores.

Agora que Trump consolidou uma retórica contagiosa, ele continua a viver fantasiosamente segundo a imagem de seu programa de TV. Na convenção do Partido Republicano de 2016, após retratar os EUA como uma potência em decadência, ele declarou "só eu conseguirei consertar o país". Correspondentemente, demitiu seus funcionários de alto escalão a um ritmo sem precedentes, até garantir que ninguém de porte independente continuasse a fazer parte de seu governo. Isso criou uma nova forma de absolutismo no governo dos EUA, as excentricidades de Trump, que, em vista da integração entre os EUA e as economias mundiais, tem capacidade para afetar o mundo inteiro.

Nada disso é original. Trump segue uma variante de um discurso recorrente que remonta a milhares de anos atrás. O satirista da antiguidade Luciano de Samósata, em um ensaio sobre oratória do século II, "Um Professor de Oratória", descreve para os potenciais líderes como é possível explorar ao máximo um discurso de poder por meio da prática de sua representação na própria vida:

Ricardo Noblat - Bolsonaro desce a ladeira

- Blog do Noblat | Veja

Se não mudar, adeus reeleição
Compreensível que muita gente considere que sempre há uma jogada maquiavélica por trás de cada ação aparentemente estapafúrdia do presidente Jair Bolsonaro.

Uma inteligência superior que escapa ao nosso entendimento, mas que um dia se revelará de forma surpreendente, empurrando o capitão para os píncaros da glória.

O contrário seria reconhecer que Bolsonaro é um desastrado e o maior adversário do seu governo até aqui. Pois é o que ele de fato é. A pesquisa Datafolha, divulgada hoje, só reforça essa certeza.

A desaprovação a Bolsonaro cresce a galope. Ele é o presidente pior avaliado em oito meses de governo desde Fernando Henrique Cardoso em 1995.

Sua rejeição aumenta entre os que estão no topo da pirâmide social e entre os que estão na base. É maior no Nordeste, mas o Sul e o Sudeste começam a enxergá-lo com maus olhos.

Um terço dos brasileiros acham que a conduta de Bolsonaro não condiz com a de um presidente. Quase 45% dizem nunca confiar no que o ele diz. 62% creem que ele fez menos do que o esperado.

Dizem seus partidários que Bolsonaro só precisa manter o apoio de 30% dos brasileiros que lhe deram seu voto no ano passado para ter vaga assegurada no segundo turno da eleição de 2022.

Podem estar certos. Mas por que abrir mão do contingente que votou nele? Por que continuar perdendo votos? Por que acreditar que no futuro automaticamente os recuperará?

De tão fora dos padrões que foi a eleição passada, é difícil que ela se repita. O líder das pesquisas de intenção de voto até agosto último está preso. E se for mandado para casa não será candidato a nada.

A recuperação da economia é lenta, assim como a queda do número de desempregados. A reforma da Previdência foi aprovada, mas os sinais da volta dos investimentos ainda são pálidos.

O governo mal terá dinheiro para pagar suas obrigações no próximo ano. Para investir, quase nada. Por falta de base parlamentar, Bolsonaro seguirá perdendo a queda de braço com o Congresso.

Ele tem muito tempo à sua frente para recuperar-se. Mas também muito tempo para enterrar-se de vez. Para recupera-se teria que mudar radicalmente seu comportamento. Quem acredita nisso?

Não se descarte a existência de um eventual acordo secreto para que ele governe por dois anos e ceda o lugar ao vice-presidente Hamilton Mourão Filho, que se revela mais sensato e mais bem preparado.

Afinal, nunca esteve no plano original de Bolsonaro se eleger presidente. Foi candidato para ajudar a reeleger os filhos e assegurar o futuro da família. Deu errado – e é o país quem paga a conta.

Quem com BIC fere com BIC será ferido

Entrevista / FHC - O Brasil está em xeque?

Entrevista - Fernando Henrique Cardoso, ex-presidente da República

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso se mostra apreensivo com o futuro do País. Sobretudo pelo que chama de autoritarismo de Bolsonaro, que, no seu entender, ao manter o acirramento ideológico, ameaça a recuperação da economia: “O presidente não está tendo postura de estadista”.

Germano Oliveira | Revista IstoÉ

Fernando Henrique Cardoso estava no último final de semana em Buenos Aires, Argentina, para uma série de palestras, quando dirigiu-se ao quarto do hotel e ligou a televisão. “Só falavam da Amazônia ardendo. Os jornais do mundo inteiro também só falavam nisso”, disse o ex-presidente. A apreensão lhe consumiu. Mais ainda quando viu as reações de Jair Bolsonaro à crise ambiental sem precedentes: o presidente procurava negar a gravidade da situação, afirmando que o desmatamento era menor do que realmente é e que os incêndios florestais não seriam significativos. “Quando o presidente dá a sensação de que vale tudo, o pessoal toca fogo mesmo”, lamentou FHC. Para quem já enfrentou a questão ambiental na Amazônia com mais rigor quando foi presidente, Fernando Henrique disse, em entrevista exclusiva à ISTOÉ, que Bolsonaro é conivente, pelo menos verbalmente, com a tragédia que está queimando as florestas no Norte do país. “Bolsonaro não está tendo uma postura de presidente, de estadista”, afirmou o tucano.

Aos 88 anos, o ex-presidente teme que a crise ambiental possa levar os países desenvolvidos, sobretudo os europeus, a impor retaliações comerciais aos produtos agrícolas brasileiros. Mas essa não é a única preocupação. Fernando Henrique está angustiado com os discursos polêmicos de Bolsonaro. “Essas disputas ideológicas são arcaicas”, diz FHC, para quem as controvérsias desarticulam também a base no Congresso, que acaba de dar uma grande vitória ao governo, com a aprovação da Reforma da Previdência na Câmara. “Tudo muito graças ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia”, reconheceu. Para ele, ao manter a polarização política, Bolsonaro atrapalha as reformas, a recuperação da economia e a própria democracia. Segundo o ex-presidente, Bolsonaro adota posturas autoritárias. Em breve, o País pode ficar em xeque novamente. “Estamos vendo a volta de um tipo de monarquia”, disse ele enquanto manuseava peças de xadrez.

Como presidente de honra do PSDB, FHC não participa mais da vida orgânica do partido, mas mostra-se atento à necessidade de refundação da sigla. Dessa forma, o ex-presidente já vislumbra a sucessão presidencial em 2022: acha que o governador de São Paulo, João Doria, é o único nome do partido para a disputa e que o apresentador Luciano Huck tem chances de vencer desde que simbolize algo para o País. “Se simbolizar, ele leva”, vaticina.

• Como o senhor está vendo a crise provocada pelo desmatamento e queimadas na Amazônia?

Em parte, as queimadas são cíclicas e naturais. E, em parte, acontecem por causa do desmatamento, mas aí é crime. O governo emitiu sinais verbais de despreocupação. O mundo ficou assustado. Há interesses comerciais ao mesmo tempo. Junta tudo isso e deu essa confusão. Eu estava em Buenos Aires e liguei a televisão. Só falavam da Amazônia ardendo. Os jornais do mundo inteiro só falam nisso também. Claro que há um pouco de exagero, mas, por outro lado, a retórica do governo ajudou os interesses contrários à agricultura brasileira. A agricultura moderna sabe que tem que haver preservação do meio ambiente. Não há incompatibilidade, mas acho que o governo errou ao abrir brechas para que acontecesse o que está acontecendo. O governo demorou muito a reagir. Primeiro, demitiu o diretor do Inpe, negou o desmatamento, não disse a verdade. E criou esse clima. E tem outro risco: é como que a soberania implicasse em queimar. Não. A soberania implica em preservar e usar o que for possível.

• O presidente da França, Emmanuel Macron, disse que o problema se transformou em uma crise mundial.

Macron exagerou. Os franceses são os mais resistentes a um acordo com o Mercosul. Já era no meu tempo. Porque a França também é produtora agrícola, embora o Brasil seja mais competitivo. Há interesses no meio disso. Bolsonaro também extrapolou, fez piadinhas com a mulher dele. Quem é presidente tem que se comportar como tal. Precisa ter em conta que a palavra dele pesa muito e foi descuidado.

• O senhor acha que os países desenvolvidos podem promover retaliações comerciais ao Brasil por descuidarmos da Amazônia?

Eu vi declarações do ex-ministro Blairo Maggi, recentemente, dizendo que os europeus podem usar o desmatamento como pretexto para dificultar as exportações brasileiras. O Brasil é uma potência ambiental. De repente, Bolsonaro deu a impressão para o mundo de que o governo lavou as mãos. Não pode.

• O governo está sendo conivente com a tragédia?

Verbalmente sim. Não sei qual é a extensão real do desmatamento atual. Agora, a responsabilidade do governo é não entender as relações do Brasil com mundo. Quando o presidente dá a sensação de que vale tudo, o pessoal toca fogo mesmo. Os fazendeiros avançam nas terras que não podem. É crime. A defesa de nossa soberania implica em mostrar nossa preocupação. Bolsonaro não está tendo postura de presidente, de estadista.

• O senhor acha que o presidente atrapalha com suas falas polêmicas?

Não tenha dúvida. Ele está tropeçando nele mesmo. Essas disputas ideológicas são arcaicas. Ele está lutando contra uma esquerda que não existe mais tal como ela era. Quem é o sustentáculo dessa esquerda que eles supõem que tomou conta do Brasil? Ninguém. O principal deles está na cadeia. Está aniquilada.

• Quando Bolsonaro acusa os parlamentares de desejarem o toma lá dá cá, o presidente promove um clima hostil e atrapalha as reformas?

Ele foi deputado muitos anos. Eu nunca o vi na vida. Quando era deputado, era corporativista. Fazia agitação a favor de aumento de salário dos militares. Deveria conhecer o Congresso. Os presidentes que não percebem que o Congresso existe e tem força, se arriscam muito. Seja por incapacidade de dialogar, seja por prepotência, os dois casos não dão bons resultados. Agora, até ministros ele está fritando.

• O senhor falou em fritura de ministros e temos visto que o presidente está deixando Sergio Moro em uma posição desconfortável.

Moro está ficando numa situação penosa. É o ministro com maior popularidade. O presidente teve uma crise de ego: eu mando, eu faço. Claro que o presidente manda, mas não precisa falar. Quem manda não fala, exerce o poder.

O que pensa a mídia – Editoriais

Mais reprovado: Editorial | Folha de S. Paulo

Parcela dos que consideram Jair Bolsonaro péssimo ou ruim sobe de 33% para 38%

Na primeira pesquisa Datafolha para avaliar seu desempenho, o presidente Jair Bolsonaro (PSL) colheu números relativamente modestos. No início de abril, 30% dos brasileiros consideravam o governo ruim ou péssimo, fatia semelhante à daqueles que o estimavam como regular e como ótimo ou bom.

Tratava-se, para o período, da pior avaliação de um presidente eleito em início de mandato desde a redemocratização do país.

A seguir, após o sexto mês, o instituto captou uma ligeira piora dos números da popularidade de Bolsonaro. Os que consideravam o governo ruim ou péssimo passaram a 33%, e os que o viam como regular caíram de 33% para 31%.

O que poderia ter sido uma oscilação ocasional na margem de erro revelou-se, no mais recente levantamento do instituto, como um ponto numa curva de deterioração.

A taxa de reprovação subiu ao final de agosto para 38%, num avanço significativo. A parcela mais inclinada a apoiar o presidente, não desprezível, está em 29%, ante 33% apurados no início de julho.

Morre o ex-comunista que governou São Paulo

Líder tucano estava internado desde o dia 19 de agosto, quando teve uma hemorragia cerebral e precisou passar por cirurgia

Marcelo Godoy e Pedro Venceslau | O Estado de S.Paulo

Morreu neste domingo, 1.º, o ex-governador de São Paulo e deputado federal Alberto Goldman (PSDB). Ele estava internado desde o dia 19 no hospital Sírio-Libanês, em São Paulo. O líder tucano teve uma hemorragia no cérebro detectada por exames e foi operado em seguida, mas não resistiu. Ex-comunista, Goldman aderiu à social-democracia e se tornou um de seus maiores nomes no País.

Desafeto de Goldman desde que este se opôs à sua candidatura a prefeito de São Paulo em 2012, o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), decretou três dias de luto oficial. Doria, que tentara sua expulsão do partido em 2018 - a Executiva tucana barrou a medida -, ofereceu o Palácio dos Bandeirantes para o velório do colega de partido. O velório, no entanto, será na Assembleia Legislativa e o enterro, no cemitério israelita do Butantã, às 15 horas da segunda-feira, dia 2.

Nascido em 12 de outubro de 1937, em São Paulo, Goldman era filho de Dora, uma dona de casa, e de um alfaiate polonês, Wolf Goldman. Seu avô paterno tinha uma pequena loja de tecidos em uma cidade da região de Lublin, no interior da Polônia – recentemente, ele viajara ao país e tentara encontrar os antigos jazigos da famílias, mas o cemitério havia sido destruído e nada sobrara da memória dos Goldman no lugar. Nem uma lápide. “Impressionante. Os nazistas levaram os vivos e os mortos também.”

No Brasil, seu pai começou a trabalhar como alfaiate e, depois, com o irmão montou uma confecção de roupas masculinas. Moravam no Bom Retiro, no centro de São Paulo, bairro que então concentrava a população judaica de São Paulo. Alberto Goldman cursou a Escola Politécnica (Poli) da Universidade de São Paulo, onde se formou engenheiro civil. Ali começou a militância política. “No primeiro ano da Poli me filiei ao partido. A base era grande.” Era 1955.

O partido era o Partido Comunista Brasileiro, o PCB. “Minha mãe havia sido militante do partido comunista na Polônia. E meu pai não era propriamente militante, mas era próximo.” O menino conviveu com discussões em casa, durante a guerra, sobre os acontecimentos no mundo. “Fui me aproximando dessa posição.”

Participou do movimento estudantil. Quando deixou a faculdade não se vinculou a nenhuma outra base do partido, mas permaneceu ligado ao grupo da comunidade judaica do Bom Retiro ao lado de militantes como Max Altman e Jacob Wolfenson. “Era um pessoal muito bem formado.” Trabalhava então em uma empresa de engenharia que ele abriu depois de sair da faculdade.

Ligou-se aos Comitês Municipal e estadual do partido, uma militância clandestina. “Participava das reuniões e discussões.” Tinha já três filhos quando, em 1969, após o Ato Institucional-5 (AI-5) , foi procurado em seu escritório de engenharia pelos dirigentes do partido Moacir Longo e Hércules Correa dos Reis, ambos cassados pelo regime.

“Em nome do comitê estadual, eles me comunicaram que o partido queria que eu fosse candidato a deputado estadual.” Os militares haviam acabado de cassar em 1968 o deputado estadual Fernando Perrone (MDB), que era o homem do partido na Assembleia Legislativa.

“Resisti durante meses. Não queria entrar nisso. Era um loucura, pois era a pior época para isso (entrar na política).” Quando decidiu ser candidato, teve de enfrentar a oposição do pai. “Meu pai fazia campanha contra mim, achando que eu havia enlouquecido. E acho que ele tinha razão”, lembrava décadas depois. Era o começo de uma carreira que não teria mais fim. “Tento, tento e não consigo deixar a política”, dizia o ex-governador.

Morre o ex-governador de São Paulo e ex-presidente do PSDB

- O Globo

O ex-governador de São Paulo Alberto Goldman morreu no início da tarde de ontem, na capital paulista. Ele estava internado desde o dia 19 de agosto no Hospital SírioLibanês, quando passou mal e foi submetido a uma cirurgia no cérebro. O político tratava de um câncer neuroendócrino na região cervical.

Nascido em 12 de outubro de 1937, Goldman era engenheiro formado pela Escola Politécnica da USP. Tinha 19 anos quando se filiou ao Partido Comunista Brasileiro (PCB). Foi diretor do Centro Acadêmico da Poli e diretor da União Estadual dos Estudantes.

Foi deputado estadual por dois mandatos (1971-1978) e presidiu a CPI sobre a invasão da PUC pela polícia em 1979. No mesmo ano, foi para o PMDB (hoje MDB) e, mais tarde, para o PSDB. Por seis vezes foi eleito deputado federal (1979-1986 e 1991-2006).

Também esteve à frente do Ministério dos Transportes, no governo de Itamar Franco, além de secretário de Estado e vice-governador. Quando o então governador paulista José Serra, em 2010, deixou o cargo para disputar as eleições presidenciais, Goldman ocupou a cadeira no Palácio dos Bandeirantes até janeiro de 2011.

Sem cargos eletivos desde então, ele se dedicou à vida partidária no PSDB e chegou a ocupar interinamente a função de presidente da sigla em 2017.

EMBATE COM DORIA
Como desafeto público do atual governador João Doria, Goldman criou atrito com o partido nas eleições de 2018 e foi expulso por não apoiar a candidatura de Doria para o governo estadual. Pouco antes do segundo turno, ele acusou Doria de fazer campanha escondido para o então candidato Jair Bolsonaro contra Geraldo Alckmin .

— Sua postura ideológica, seu tipo de pensamento, o tipo de mensagem, é a mesma do Bolsonaro, não me surpreende — disse ao GLOBO na ocasião.

Goldman apoiou o candidato Paulo Skaf (MDB) ao governo do estado, durante as eleições do ano passado, vencidas por Doria.

Em nota, o presidente do PSDB, Bruno Araujo, lamentou o falecimento do ex-governador. “Sua atividade política atravessa sete décadas da nossa história”, escreveu no Twitter. “Uma trajetória que impõe respeito e admiração. Meus sentimentos à família”, completou na rede social.

Cidadania lamenta morte de Alberto Goldman

Em nota (veja abaixo), o presidente do Cidadania, Roberto Freire, lamentou a morte do ex-vice governador de São Paulo, Alberto Goldman, aos 81 anos, neste domingo (1/9), na capital paulista.

Ele estava internado no hospital Sírio Libanês desde o dia 19 de agosto, quando passou mal durante um procedimento para tratamento de um câncer.

O ex-governador iniciou sua carreira na política na década de 1950, quando foi um dos líderes do movimento estudantil do PCB (Partido Comunista Brasileiro) que lutou contra a ditadura militar.

“Mais uma grande perda para o Brasil

Faleceu hoje, aos 81 anos, no Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo, o engenheiro e exemplar personalidade política Alberto Goldman.

Sua rica militância política começou, aos 18 anos, quando passou a atuar nas fileiras do Partido Comunista Brasileiro e no movimento estudantil, ao iniciar seu Curso de Engenharia, na Escola Politécnica (Poli) da Universidade de São Paulo, em 1955. Ao concluir seu curso, além de permanecer ligado ao grupo comunista da comunidade judaica do bairro do Bom Retiro, vinculava-se aos Comitês Municipal e Estadual do partido, participando de reuniões e discussões, em uma militância clandestina. Em 1969, após o Ato Institucional nº 5 (AI-5), implantado pela Ditadura Militar, foi procurado em seu escritório por dirigentes comunistas que lhe foram propor candidatar-se a deputado estadual. Elegeu-se em 1970, pelo MDB, sendo o oitavo mais votado em sua legenda, começando ali uma carreira que não teria mais fim.

Em 1974, reelegeu-se deputado estadual, tornando-se líder da bancada do MDB, que tinha então dois terços da Assembleia Legislativa paulista. E, em 1978, elegeu-se deputado federal, sendo reeleito, em 1982, pelo MDB. Em 1986, após a legalização do PCB no ano anterior, tornou-se líder do partido na Câmara dos Deputados e integrante do Comitê Central do partido.

Tornou-se secretário de coordenação de programas do governo de Orestes Quércia (PMDB), em 1987, e, em seguida, deixou o PCB e retornou ao PMDB. Em 1990, voltou a se candidatar e a ser eleito deputado federal. No governo Itamar Franco (1992-1995), tornou-se ministro dos Transportes. Como tucano, elegeu-se deputado ainda em 1998 e 2002. Em 2006, elegeu-se vice-governador na chapa de José Serra (PSDB), assumindo o governo paulista, em 2010, após a renúncia do colega, que se candidatou à presidência da República.

Tendo deixado uma rica trajetória política e administrativa, Goldman constitui-se também uma exemplar e fraterna pessoa, sempre solidário e colaborador com qualquer um que lhe procurasse. À sua companheira Deuzeni, aos seus cinco filhos e quatro netos, nossos votos de muita paz, para que possam enfrentar sua singular ausência.

Brasília, 1º de setembro de 2019

Roberto Freire
Presidente nacional do Cidadania“

Poesia | Vinicius de Moraes - Poema dos olhos da amada

Ó minha amada
Que olhos os teus

São cais noturnos
Cheios de adeus
São docas mansas
Trilhando luzes
Que brilham longe
Longe nos breus…
Ó minha amada
Que olhos os teus

Quanto mistério
Nos olhos teus
Quantos saveiros
Quantos navios
Quantos naufrágios
Nos olhos teus…

Ó minha amada
Que olhos os teus

Se Deus houvera
Fizera-os Deus
Pois não os fizera
Quem não soubera
Que há muitas eras
Nos olhos teus.

Ah, minha amada
De olhos ateus

Cria a esperança
Nos olhos meus
De verem um dia
O olhar mendigo
Da poesia
Nos olhos teus.

Música | Alaíde Costa - Quando o samba acabou (Noel Rosa)