domingo, 10 de julho de 2016

Opinião do dia – Dora Kramer

Diante da evidência de que não há solução ideal, o Planalto prefere guardar prudente distância de qualquer solução que venha a decorrer a disputa em plenário. Quanto à ideia de que o renunciado Cunha venha a influir na escolha do novo presidente, a resposta é a seguinte: não conseguiu preservar o próprio mandato, muito menos poderá assegurar o do próximo.

Sete chaves. Aprovado o impeachment de Dilma Rousseff, sobre o qual os atuais governistas não têm a menor dúvida, Planalto e adjacências sofrerão mudança radical. Transformação esta já desenhada, mas mantida sob o mais absoluto sigilo.”

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Dora Kramer é jornalista. ‘Amargo regresso’, O Estado de S. Paulo, 10/07/2016

Perícia do TSE evidencia que a campanha de Dilma lavou dinheiro do Petrolão

• Durante auditoria realizada pelo Tribunal Eleitoral, as gráficas VTPB, Focal e Red Seg, que receberam R$ 52 milhões da campanha da presidente afastada, em 2014, não comprovam que prestaram os serviços declarados

Débora Bergamasco - IstoÉ

No dia 20 de abril, a ministra Maria Thereza de Assis Moura, corregedora-geral da Justiça Eleitoral, autorizou a apuração das suspeitas de que a campanha à reeleição da presidente Dilma Rousseff, em 2014, havia utilizado gráficas para lavar dinheiro do Petrolão. Na última semana, o relatório entrou em fase final de redação e uma perícia deverá ser oficialmente divulgada no próximo mês. ISTOÉ apurou que as evidências de lavagem de recursos desviados da Petrobras se confirmaram. As empresas VTPB, Focal e Red Seg não conseguiram comprovar que prestaram os serviços declarados durante as últimas eleições, o que reforçam os indícios de que eram mesmo de fachada e serviram de ponte para o pagamento de propinas do Petrolão. Juntas, elas receberam uma fábula da campanha de Dilma em 2014: R$ 52 milhões.

Cunha sai do jogo. E agora?

• Eduardo Cunha renuncia à presidência da Câmara para salvar seu mandato – e o governo Temer se livra de um aliado incômodo

Alana Rizzo, Ana Clara Costa e Talita Fernandes - Época

Trecho da reportagem de capa de ÉPOCA desta semana

A renúncia de Eduardo Cunha à presidência da Câmara era questão de tempo. No domingo, 3 de julho, Cunha finalmente concebeu que seu tempo se esgotara. Afastado do cargo há dois meses por decisão do Supremo Tribunal Federal, e perto de ser cassado por quebra de decoro parlamentar, ele não só não tinha mais saída, como o arranjo de um interino em seu posto começava a incomodar o Palácio do Planalto. A pressão da família, em especial da esposa, Cláudia Cruz, ré na Lava Jato, de seus advogados e de aliados políticos o fez dar um passo definitivo.

O olhar obtuso da professora Chaui

• Além dos prejuízos ao Brasil e aos brasileiros, a corrupção petista parece produzir uma perigosa cegueira em alguns conceituados acadêmicos

Mário Simas Filho - IstoÉ

Não é preciso frequentar as salas da filosofia da USP para saber que o PT de hoje nada tem a ver com o partido que a professora Marilena Chaui e muitos brasileiros do bem ajudaram a fundar em 1980. Depois de tantas operações promovidas pela Lava Jato não há cidadão que discorde: a legenda que nasceu idealista se transformou em sinônimo de corrupção e institucionalizou a roubalheira para se manter no poder e melhorar a vida de seus líderes. Mas, além dos enormes prejuízos ao Brasil e aos brasileiros, a gatunagem petista parece produzir uma perigosa cegueira em alguns conceituados acadêmicos. É o caso da professora Chaui.

Força-tarefa vê suspeita de caixa 2 em empresa de segundo maior fornecedor de Dilma em 2014

• Polícia Federal e Procuradoria apontam que Carlos Cortegoso, dono da Focal e da CRLS, contratadas pelo PT para fornecer palanques e materiais de campanha, registrou movimentação de quase R$ 50 milhões, de créditos e débitos, entre 2010 e 2014, mas receita bruta de R$ 9 milhões; transações 'atípicas' são alvos da Custo Brasil, que apura se propinas foram ocultas nos negócios

Ricardo Brandt, Fausto Macedo, Julia Affonso, Mateus Coutinho e Fábio Serapião – O Estado de S. Paulo

/BRASÍLIAA Operação Custo Brasil, desdobramento da Lava Jato, investiga lavagem de dinheiro e sonegação fiscal em negócios do segundo maior fornecedor da campanha da presidente afastada Dilma Rousseff, reeleita há quase dois anos. Relatório da Receita Federal repassado à Polícia Federal e ao Ministério Público Federal revela que, entre 2010 e 2014, uma das empresas de Carlos Roberto Cortegoso, a CRLS Consultoria e Eventos, movimentou quase R$ 50 milhões, de créditos e débitos, um quinto do valor declarado de receita bruta no período.

Os investigadores suspeitam de contabilidade “atípica” e caixa 2 com recursos provenientes do PT e de esquemas de propinas na Petrobrás e no Ministério do Planejamento. “A CRLS, segundo a Receita Federal, movimentou em suas contas cerca de R$ 25 milhões de entrada (crédito) e R$ 24 milhões de saída, mas declarou receita bruta de menos de R$ 10 milhões”, afirmam procuradores da República da Custo Brasil.

Contra tese de Temer, PMDB lança candidatos

• Sigla tem 5 nomes para disputa na Câmara, mas presidente quer 1 só que unifique base

Caio Junqueira - O Estado de S.Paulo

BRASÍLIA - A bancada do PMDB na Câmara acabou por se tornar um problema para o presidente em exercício Michel Temer na sucessão do deputado afastado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que renunciou à presidência da Casa na quinta-feira. Cinco deputados da legenda já apresentaram suas candidaturas ao partido a despeito de o Planalto trabalhar por um nome de consenso entre o Centrão (bloco que inclui 13 partidos) e a antiga oposição (PSDB, DEM, PSDB e PSB).

O governo espera que o candidato, provavelmente Heráclito Fortes (PSB-PI) ou Rogério Rosso (PSD-DF), unifique a base. Mas o PMDB, no entanto, está indo na contramão dessa estratégia. Dos cinco, dois já protocolaram suas candidaturas, caso de Marcelo Castro (PI) e Fabio Ramalho (MG). Outros três comunicaram que vão disputar: Carlos Marun (MS), Sergio Souza (PR) e Osmar Serraglio (PR). A orientação é de que eles viabilizem seus nomes com as outras forças políticas da Casa. A expectativa é de que seja fechada questão em torno do nome em reunião por ora agendada para a manhã de terça-feira. “A decisão que a maioria tomar será a que eu defenderei”, disse ao Estado o líder da bancada, Baleia Rossi (SP).

Planalto atua para conter racha na base

• Governo pede a líderes aliados que tentem reduzir o número de candidatos

Temer, porém, se manterá publicamente neutro na disputa. Interino quer evitar erro de Dilma, que, ao apoiar adversário de Cunha, perdeu respaldo político

O presidente interino, Michel Temer, decidiu agir para evitar a implosão de sua base no Congresso, e para isso determinou que seus principais interlocutores pedissem aos líderes dos partidos aliados que demovam pré-candidatos à presidência da Câmara da disputa, que já tem pelo menos 15 interessados, seis deles registrados. Só no PMDB, são quatro concorrentes. Publicamente, porém, o governo mantém o discurso de que não vai interferir no pleito. Temer quer evitar o erro da presidente afastada, Dilma Rousseff, que articulou abertamente uma candidatura contra o ex-presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e acabou inviabilizando-se politicamente.

Contenção de danos

• Temendo implosão da base na Câmara, governo pede a aliados redução de candidatos

Eduardo Bresciani e Júnia Gama - O Globo

BRASÍLIA - Sob risco de implosão da base aliada por conta da disputa pela presidência da Câmara, que já tem 15 candidatos, o governo está procurando os líderes aliados e pedindo que eles negociem para reduzir ao máximo o número de concorrentes. O Planalto passou a operar nos bastidores numa tentativa de pelo menos amenizar as sequelas na sua base parlamentar. Publicamente, o discurso governista ainda é o de que não se envolverá na eleição, mas o risco de conflagração dos aliados alarma os articuladores do presidente interino, Michel Temer, que tem dito aos candidatos que o procuram que não terá um favorito.

Dois líderes de partidos aliados confirmaram a nova postura do governo ao GLOBO e disseram que a preocupação do Planalto é com o conflito que a corrida eleitoral pode gerar na base aliada.

Onda de dificuldades para Temer no Congresso

• Projetos prioritários esbarram em indefinição na Câmara e em pauta escolhida por Renan no Senado

Cristiane Jungblut e Isabel Braga - O Globo

BRASÍLIA Na última semana de trabalho do Congresso antes do recesso de julho, as votações de projetos cruciais para o governo interino de Michel Temer serão contaminadas pelo impasse que marca a disputa acirrada para eleição do sucessor do expresidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ). O esforço concentrado no Senado também será dominado por uma pauta de interesse do presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL), deixando de lado propostas prioritárias para o governo. Caso esses projetos não sejam votados até a interrupção dos trabalhos, as chances de aprovação diminuem, porque em agosto está prevista a votação do impeachment da presidente afastada, Dilma Rousseff. Em seguida, começará a campanha para a eleição municipal.

Por que tão tarde? - Fernando Gabeira

- O Globo

Cunha renunciou. Ainda estou devendo a mim mesmo uma explicação de como foi possível a trajetória e a resiliência de Cunha na democracia brasileira. É um pouco cedo para isso. Cunha oferece um anel para não perder os dedos. Todos sabem em Brasília que ele renunciou à presidência na esperança de manter o mandato e escapar de Curitiba.

O momento em que suas lágrimas me pareceram mais convincentes foi quando mencionou mulher e filha. Também foram envolvidas e, certamente, muito criticadas na imprensa e nas redes sociais. As lágrimas são enigmáticas. Seu último esforço é, precisamente, escapar do destino delas: ser julgado em Curitiba.

Estouro da boiada - Eliane Cantanhêde

- O Estado de S. Paulo

A Câmara dos Deputados chegou à redemocratização com o inatacável Ulysses Guimarães na presidência, mas acendeu o sinal amarelo com a eleição do indescritível Severino Cavalcanti e o sinal vermelho com o duplamente réu Eduardo Cunha e, agora, não apenas convive com o inacreditável Waldir Maranhão como está entre duas opções: ou um estouro da boiada e mais um presidente problema, ou uma união das forças políticas em torno de um nome palatável pela opinião pública.

Os maiores partidos, PMDB, PSDB e PT, simplesmente não apresentaram candidatos, para não piorar a implosão da Câmara e para esperar 2017. Mas, além deles, nenhum outro partido fechou firmemente em torno de um nome que preencha requisitos básicos, como o respeito da grande maioria e uma ficha razoavelmente limpa. Está difícil!

O preço da sacralização do judiciário - Elio Gaspari

- O Globo

Aconteceram três episódios que prenunciam encrencas que serão testes para o Judiciário nacional. Em fevereiro, contra o voto de Celso de Mello e de três outros ministros, o Supremo Tribunal Federal decidiu que uma pessoa condenada na segunda instância deverá esperar o julgamento de um novo recurso na cadeia. Mello chamou a decisão de “inversão totalitária”. Na semana passada, numa inversão minoritária, o ministro mandou soltar um empresário que em 2009 matara o sócio. 

Condenado a 16 anos na primeira instância, ficou com 14 anos na segunda e foi preso. Mello soltou-o. Ele não julgou o caso, mas o direito de um assassino esperar em liberdade o julgamento de seu último recurso. O Supremo deverá decidir se a decisão de fevereiro foi constitucional. Todos os grandes clientes e escritórios de advocacia que defendem a turma da Lava-Jato torcem para que ocorra uma inversão plutocrática. Como 7x4 pode virar uma outra coisa, não se sabe, mas pode-se sonhar com uma reversão do doloroso 7x1 do Mineirão.

Corrida ao pote – Bernardo Mello Franco

- Folha de S. Paulo

O próximo presidente da Câmara exercerá um mandato-tampão de apenas seis meses. Neste curto período, comandará uma Casa desmoralizada e esvaziada pelas eleições municipais. Será pressionado a proteger colegas em apuros e terá a vida devassada pela imprensa e pelos órgãos de investigação.

Não parece o melhor emprego do mundo, mas ao menos 15 deputados já secandidataram a ocupá-lo. A lista pode crescer nos próximos dias, embora ainda não se saiba ao certo nem a data da eleição.

Amargo regresso - Dora Kramer

- O Estado de S. Paulo

A perspectiva de uma campanha eleitoral sem doações de empresas a serem registradas na contabilidade oficial instalou o pânico nos partidos. Ao contrário do que seria natural, não produziu neles solução alternativa.

O veto ao financiamento de pessoas jurídicas está em vigor há mais de um ano, por decisão do Supremo Tribunal Federal, corroborada por votação do Congresso. Votação esta pautada pelo constrangimento de ir contra a decisão do STF. Tempo suficiente para que suas excelências estivessem ao menos discutindo o que fazer: mobilizar eleitores, preparar campanhas de arrecadação, mostrarem-se dignos de financiamento espontâneo.

Golpe só na fantasia - Sérgio Besserman Vianna

• Presidente tem de ser um líder e fazer política com maestria

- O Globo

Um presidente não é impedido porque cometeu estelionato eleitoral. Isso é das regras do jogo, é legal e legítimo. “Hate the game, not the players”, dizem os americanos.

Um presidente não é impedido porque, em decorrência do item 1 acima, sua popularidade vai para a lona, e o eleitorado se sente traído. É do jogo, basta manter sustentação parlamentar.

Um presidente não é impedido porque, além dos itens 1 e 2 acima, todo o sistema de representação política está em crise, no Brasil e no mundo. Está no jogo, basta ter casca grossa.

O desajuste político das contas públicas - Rolf Kuntz

- O Estado de S. Paulo

Pode-se medir o sucesso de várias formas, algumas espantosas, principalmente quando se trata de políticas públicas no Brasil. O governo poderá fazer uma festa se fechar 2016 com um déficit primário de R$ 170,5 bilhões. Poderá abrir champanhe se reduzir o buraco no próximo ano para R$ 139 bilhões, valor correspondente, segundo a estimativa oficial, a 2,05% do produto interno bruto (PIB). Somando os juros, porém, a conta mostrará um rombo total muito maior. Esse resultado, conhecido como déficit nominal, tem estado na vizinhança de 10% do PIB, uma monstruosidade, pelos padrões internacionais. O déficit nominal americano ficou em 3,7% no ano passado e deve oscilar por um bom tempo nas vizinhanças desse número. A média geral dos países da eurozona tem estado na faixa de 2% a 3%. A média latino-americana bateu em 7,3% no ano passado – com a maior parte dos países muito abaixo disso – e tende a cair.

Um novo jeito - Míriam Leitão

- O Globo

O ministro Henrique Meirelles deixou claro nas suas conversas dentro do governo sobre a meta fiscal que este ano a atual equipe pegou o bonde andando, mas em 2017 será considerado responsável pelo que acontecer. Por isso, “sob nenhuma hipótese” a meta fiscal poderia ser um déficit maior que o de 2016. Desta forma ele rechaçou as propostas mais expansionistas. Mesmo assim, R$ 139 bilhões é um déficit enorme.

É muito difícil fazer uma reversão de um resultado tão negativo sem aumento de carga tributária. Mas não foi incluído aumento de imposto. A hipótese de elevação da Cide, apesar de ser considerada um “imposto verde”, também foi deixada de lado pelo impacto inflacionário que poderia representar.

Renegociação com os Estados – Samuel Pessòa

- Folha de S. Paulo

A área econômica do governo acaba de enviar ao Congresso Nacional o texto do projeto de lei complementar (PLC) que estabelece os termos nos quais se dará a renegociação das dívidas dos governos estaduais com a União.

Desde a renegociação no governo Fernando Henrique Cardoso, os Estados comprometem parte de sua receita corrente líquida, até o limite de 13%, com pagamentos do serviço e da amortização da dívida com o Tesouro Nacional.

A penúria dos Tesouros estaduais em razão da crise econômica, associada à verdadeira farra fiscal que ocorreu no setor público brasileiro no primeiro mandato de Dilma, criou situações-limite em que os Estados não conseguem pagar a folha salarial.

Vinte e cinco anos e muito por fazer - José Serra

- O Globo

O Mercosul faz 25 anos, em meio a bons resultados agregados, ao lado de algum ceticismos em relação ao período recente e ao futuro próximo. Tem pela frente o grande desafio da renovação e da adaptação a um cenário internacional cada vez mais competitivo e instável.

A crise que atingiu a região nos últimos anos não diminui a importância do projeto de integração. Ao contrário, torna urgente recuperar o dinamismo perdido, com vistas ao nosso desenvolvimento e projeção externa.

É no contexto desses desafios que abordamos a questão da transmissão da presidência pro tempore do Mercosul para a Venezuela. A presidência do bloco, atualmente a cargo do Uruguai, é exercida semestralmente, em sequência alfabética.

O entulho começa a ser removido – Editorial / O Estado de S. Paulo

Mergulhado numa paralisante crise política, econômica, social e moral, cuja persistência pode significar um enorme retrocesso no trabalho de construção de uma sociedade livre, próspera e justa, o Brasil se prepara para remover o entulho do passado recente que tem obstruído o processo político e prejudicado a retomada do crescimento econômico em benefício da justiça social. Esse entulho tem nome duplo: Dilma Rousseff e Eduardo Cunha. O definitivo afastamento de ambos da vida pública, mediante a cassação de seus mandatos, terá ainda o efeito simbólico de uma vitória dos brasileiros sobre a corrupção disseminada por ambos, cada uma a seu modo: Dilma na condição de chefe de um governo comprometido com o objetivo duplo de beneficiar com o desvio de recursos públicos um projeto partidário de poder e também enriquecer seus principais líderes e aliados; Eduardo Cunha, no comando da Câmara dos Deputados, responsável pela cooptação de companheiros de mandato para acumular poder e, assim, beneficiar-se de recursos públicos. Uma e outro, inimigos figadais, ironicamente se unirão em breve no mesmo destino: o exílio político. Já é um avanço e tanto.

Riscos do gradualismo – Editorial / Folha de S. Paulo

O governo Michel Temer (PMDB) afinal delineou um programa econômico que alcança o ano de 2019, quando terá início o mandato de um novo presidente eleito.

Trata-se de uma estratégia gradualista de reequilíbrio das finanças públicas, que por ora adia a tomada de decisões mais duras —o presidente interino previu medidas impopulares "a partir de certo momento" e depende de reformas constitucionais ambiciosas.

A diretriz central do plano é a tolerância com deficits elevados nas contas do governos ao longo do mandato atual, o que manterá sua dívida em escalada até, no mínimo, o final da década.

Em compensação, será imposto um congelamento inédito dos gastos federais em termos reais —dito de outra maneira, os desembolsos, salvo poucas exceções, não poderão crescer acima da inflação.

Resistência dos governadores pode levar estados à falência – Editorial / O Globo

Previsto para ser votado no Congresso na última quarta-feira, o projeto de lei que formaliza a renegociação das dívidas dos estados com a União foi adiado para esta semana. Segundo o relator do projeto, o deputado Esperidião Amin (PP-SC), as contrapartidas exigidas pelo governo federal enfrentam resistências dos governadores e suas bancadas na Câmara.

O principal ponto de atrito é a inclusão dos estados na Proposta de Emenda à Constituição, que limita o aumento de gastos públicos à inflação do ano anterior.

Os representantes dos estados argumentam que a medida significa uma ingerência indevida, ferindo a autonomia dos gestores estaduais. Para o governo federal, porém, sem que se estabeleça um limite de gastos, o problema se repetirá, obrigando uma nova negociação no futuro, num ciclo vicioso, cujo preço final é pago pela população. Esta preocupação procede.

O banal maravilhoso – Ferreira Gullar

- Folha de S. Paulo

Não me lembro se já falei aqui para vocês da menininha que vi no elevador do edifício onde moro. Ela devia ter alguns meses de nascida mas, quando voltei a vê-la, no mesmo elevador, uns dois anos depois, já de pé ao lado da mãe, levei um susto: batia o pezinho no chão e gritava: "Não quero ir lá! Não quero!".

Mal acreditei que se tratava daquela mesma menininha que ainda nem abrira os olhos direito, com chupeta na boca. Agora, não só falava como tinha opinião —e opinião contrária à de sua mãe.

Saí dali perplexo. Então, aquele bichinho que, dois anos atrás, no colo da mãe, nada sabia da vida, agora gritava, batia o pé e opinava!? A verdade é que a garota de agora já estava naquela, que, ao que tudo indicava, não sabia nada de nada, nem sequer pensava ainda. E sabe-se lá o que mais de gente estava ali, naquela pirralha, e só saberemos mais tarde, quando ela se tornar uma adolescente e, depois, uma mulher.

Poema Sujo - Ferreira Gullar

turvo turvo
a turva
mão do sopro
contra o muro
escuro
menos menos

menos que escuro
menos que mole e duro
menos que fosso e muro: menos que furo
escuro
mais que escuro:
claro
como água? como pluma?
claro mais que claro claro: coisa alguma
e tudo
(ou quase)
um bicho que o universo fabrica
e vem sonhando desde as entranhas
azul
era o gato
azul
era o galo
azul
o cavalo
azul
teu cu
tua gengiva igual a tua bocetinha
que parecia sorrir entre as folhas de
banana entre os cheiros de flor
e bosta de porco aberta como
uma boca do corpo
(não como a tua boca de palavras) como uma
entrada para
eu não sabia tu
não sabias
fazer girar a vida
com seu montão de estrelas e oceano
entrando-nos em ti
bela bela
mais que bela
mas como era o nome dela?
Não era Helena nem Vera
nem Nara nem Gabriela
nem Tereza nem Maria
Seu nome seu nome era…
Perdeu-se na carne fria
perdeu na confusão de tanta noite e tanto dia
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Trecho de Poema Sujo, de Ferreira Gullar

Toquinho & Baden Powell - ODEON