As consequências vêm depois
– Opinião | O Estado de S. Paulo
Países
europeus cobram 'ações reais imediatas' contra o desmatamento, sob pena de ver
dificultada a entrada de produtos brasileiros
A França reafirmou na sexta-feira passada que
rejeitará, em seu formato atual, o acordo de livre comércio entre a União
Europeia e o Mercosul, aprovado no ano passado, após 20 anos de negociações,
mas ainda pendente de ratificação pelos Parlamentos dos países envolvidos.
O governo francês se manifestou depois de receber
relatório de um grupo de especialistas sobre os riscos à biodiversidade
supostamente acarretados pelo acordo. Segundo o estudo, o desmatamento nos
países do Mercosul vai crescer a uma taxa de 5% ao ano nos seis anos seguintes
à implantação do acordo. Os especialistas concluem que o custo ambiental supera
os benefícios econômicos.
O governo brasileiro reagiu. Nota conjunta dos
Ministérios das Relações Exteriores e da Agricultura negou que o acordo
represente “qualquer ameaça ao meio ambiente”. Ao contrário, diz o texto:
“Reforça compromissos multilaterais e agrega as melhores práticas na matéria”.
Para o governo, o estudo francês carece de critérios técnicos e ignora que a
pecuária brasileira ampliou sua produtividade sem aumentar a área de pastagens.
Por fim, reitera o bom histórico brasileiro em políticas de conservação,
destaca a modernidade do nosso Código Florestal e reafirma garantias de
sustentabilidade ambiental.
Fortemente contaminada por um lado pela histeria
ideológica bolsonarista, que vê conspiração em todo canto, e por outro pelo
lobby de produtores concorrentes do agronegócio brasileiro, que aproveitam o
discurso irresponsável do presidente Jair Bolsonaro para reivindicar mais
protecionismo, a contenda tende ao infinito, neste caso, com grandes prejuízos
para o Brasil.
Por ora, o único fato incontestável, como diria o
Conselheiro Acácio, é que as consequências continuam a vir depois: se tem toda
a razão ao manifestar “estranheza” com um relatório que põe em dúvida os
evidentes progressos de boa parte do agronegócio do País no que diz respeito à
proteção dos biomas, o governo brasileiro, no entanto, está colhendo o que
plantou desde que o presidente Bolsonaro assumiu com um discurso de franco menosprezo
pelas questões ambientais.
Hoje, a pressão contra o Brasil não se limita a
produtores franceses interessados em enfraquecer o agronegócio brasileiro.
Multiplicaram-se nos últimos meses iniciativas com vista a constranger o
governo Bolsonaro a agir com mais firmeza contra o desmatamento e as queimadas.
Em junho, o Parlamento holandês aprovou moção contra a
ratificação do acordo da União Europeia com o Mercosul, sob a alegação de que
havia risco de aumento do desmatamento da Amazônia. Na semana passada, foi a
vez do Parlamento da Áustria vetar o acordo, pela mesma razão. E há alguns dias
a chanceler da Alemanha, Angela Merkel, disse ter “sérias dúvidas” sobre o
acordo comercial, como consequência da situação na Amazônia e no Pantanal.
Além disso, um grupo de investidores internacionais
expressou em carta aberta preocupação com o “desmantelamento de políticas
ambientais e de direitos humanos” no Brasil. Na mesma linha, 230 organizações
do agronegócio e do setor financeiro, além de ONGs ambientalistas, enviaram uma
carta ao governo destacando que reduzir o desmatamento é de “fundamental
importância para o País”.
Na semana passada, um grupo de oito países europeus
liderados pela Alemanha também enviou carta ao governo brasileiro para cobrar
“ações reais imediatas” contra o desmatamento, sob pena de ver dificultada a
entrada de produtos brasileiros na Europa.
Diante disso, o governo Bolsonaro pode escolher: ou
aceita que a questão ambiental há muito deixou de ser apenas pretexto para
produtores europeus prejudicarem o agronegócio brasileiro, e afinal toma
providências sérias para combater o desmatamento, ou continua a tratar as
críticas como parte de um complô internacional contra o Brasil. A julgar pelo
discurso de Bolsonaro na ONU, repleto de fantasias sobre o sucesso de seu
governo na área ambiental e de denúncias paranoicas a respeito de “interesses
escusos” de organizações “aproveitadoras e impatriotas”, o governo já fez sua
escolha: a errada
Não é só
recurso que falta ao programa Renda Brasil – Opinião | Valor Econômico
O
programa Renda Brasil pareceu um remendo feito às pressas e mal feito, que se
coaduna com seu caráter eleitoreiro