Correio Braziliense
Há duas fomes no Brasil de hoje: a fome de
comida, que maltrata e mata, e a fome da moral, dos que assistem à tragédia sem
indignação com o sofrimento dos outros, nem inteligência para perceber o custo
social e econômico para todo o país.
Assistimos constrangidos aos 33,1 milhões
de brasileiros dormindo, acordando e sobrevivendo sem se ter o que comer, ao
mesmo tempo que sabemos que essa fome não decorre da escassez de alimentos no
país. Nosso território não é desértico, não estamos vivendo uma guerra, não
fomos invadidos. É vergonhoso que a fome ocorra num país que está entre os
maiores exportadores do mundo, onde o agronegócio produz safras recordes
sucessivas, em que os supermercados estão sempre abastecidos, e a televisão
divulga dezenas de publicidades para vender comida e apresenta horas por dia de
programas realities com concursos, lições e turismo de gastronomia.
Alguns países, mais populosos, também têm contingentes de famintos, mas nenhum deles tem tanta comida disponível, tanta propaganda de alimento, nem tanta apologia à gastronomia ao lado dos noticiários da fome na televisão. A fome de alguns não vem, também, da disputa pela comida que é suficiente para alimentar muitos brasis; a falta de educação também não decorre da necessidade de negar a educação a alguns para oferecer a outros. Ambas as fomes, de comida e de educação, são resultado da maldade, da insensibilidade e da estupidez.