- Nas entrelinhas / Correio Braziliense
“Embora o presidente Jair Bolsonaro tenha minimizado a tentativa de roubo de mensagens dos seus celulares, esvaziando a tese da ‘ação subversiva’, subiu o tom contra o jornalista Glenn Greenwald”
Ainda bem, a Polícia Federal investiga uma “organização criminosa que praticava crimes cibernéticos” e não uma conspiração para desestabilizar o governo Bolsonaro, como chegou a ser cogitado por alguns setores de governo, em razão da disputa política que se estabeleceu em torno do vazamento da troca de mensagens entre o então juiz federal Sérgio Moro, atual ministro da Justiça, e integrantes da força-tarefa da Operação Lava-Jato, entre os quais o procurador federal Deltan Dallagnol.
Na quinta-feira, a líder do governo no Congresso, deputada Joice Hasselman (PSL-SP), chegou a anunciar que o Palácio do Planalto estudava aplicar a Lei de Segurança Nacional (LSN) para punir os responsáveis pela invasão de celulares de várias autoridades dos Três Poderes, entre as quais o presidente Jair Bolsonaro; os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP); e a procuradora-geral da República, Raquel Dodge. Em caso de aplicação da Lei 7.170/1983, os quatro presos seriam enquadrados como “terroristas”.
A LSN foi promulgada durante a ditadura militar, pelo presidente João Figueiredo, e continua em vigor; porém, somente pode ser aplicada no caso de crimes que “lesam ou expõem a perigo de lesão: a integridade territorial e a soberania nacional, o regime representativo e democrático, a Federação e o Estado de Direito, a pessoa dos chefes dos Poderes da União”. É aí que mora o perigo, embora o presidente Jair Bolsonaro tenha minimizado a tentativa de roubo de mensagens dos seus celulares, esvaziando a tese da “ação subversiva”, subiu o tom contra o jornalista Glenn Greenwald, que revelou a troca de mensagens no site The Intercept Brasil, ao afirmar que o americano pode pegar uma “cana” no Brasil.
O hacker Walter Delgatti teve a prisão temporária prolongada por mais cinco dias, pelo juiz federal Vallisney de Oliveira, que determinou a ampliação das investigações, principalmente sobre a origem do dinheiro movimentado pelos quatro envolvidos no caso. A tese conspiratória decorreu do envolvimento da ex-deputada Manuela D’Ávila (PCdoB-RS), que foi intermediária entre o hacker e o jornalista americano radicado no Brasil Glenn Greenwald, do site The Intercept Brasil, que divulgou as mensagens em parceria com o jornal Folha de S. Paulo e a revista Veja.
O hacker teve acesso ao código enviado pelos servidores do Telegram ao celular das vítimas para abrir a versão do aplicativo no navegador, assumiu que entrou nas contas de procuradores da Lava-Jato e confirmou que repassou mensagens ao site The Intercept Brasil; ele disse não ter alterado o conteúdo e não ter recebido dinheiro por isso. Manuela foi a intermediária entre ele e o jornalista. A ex-deputada confirmou que repassou ao hacker o contato de Glenn, conforme troca de mensagens cujas cópias entregou à Polícia Federal.
Segundo o juiz federal Vallisney de Oliveira, são investigados os crimes de organização criminosa (pena de 3 a 8 anos); invasão de dispositivo eletrônico (pena de 3 meses a 1 ano); e interceptação telefônica sem autorização judicial (pena de 2 a 4 anos). Entretanto, a PF ainda verifica o completo cenário e a profundidade das invasões praticadas; busca a origem da quantia de R$ 99 mil em espécie apreendidos com Gustavo Henrique Elias Santos e sua mulher, Suelen Priscilla de Oliveira; e investiga os 60 chips lacrados para telefone celular pré-pago da TIM em poder de Danilo Cristiano Marques, “laranja” de Walter, além de toda movimentação financeira dos envolvidos em bitcoin e outros criptomoedas.