terça-feira, 31 de agosto de 2010

O Regresso :: Luiz Werneck Vianna

DEU NO VALOR ECONÔMICO

Com suas ruas emudecidas, a sociedade prepara-se para revisitar o nosso abominável mundo velho

Não está fácil compreender o que anda se passando. Se em 2002, após a vitória eleitoral de Lula, houve quem a recebesse como uma queda da Bastilha, o que era um exagero, perdoável em jovens militantes intelectuais do PT, se vier mais uma vitória agora em 2010, qualquer tentativa de interpretá-la em chave grandiloquente é puro disparate. Nada vai cair, ao contrário, tudo que aí está vai se consolidar e mesmo se aprofundar. Não há paixões soltas nas ruas e nem debates acalorados entre os principais candidatos à sucessão presidencial que desfilam, em tom monocórdico, na TV e nas emissoras radiofônicas seus pontos programáticos em matérias de educação, saúde e segurança, obedientes à pauta que lhes empurram os seus especialistas em marketing eleitoral. Os dois principais candidatos oposicionistas sequer sugerem uma ameaça efetiva às linhas principais do governo e têm declarado em alto e bom som que serão, no fundamental, contínuos a elas.

Tudo isso, mais o fato de tanto Serra como Dilma serem personagens avessos a histrionismos carismáticos, com perfis políticos forjados em temas técnicos da economia e da administração pública, seriam indicações de que há algo de impostado nas manifestações exaltadas das hostes situacionistas, especialmente do presidente de honra do PT e da República, como se esta sucessão importasse um confronto dramático entre duas concepções do mundo. E a partir de considerações desse tipo, a análise chega ao território das coisas indemonstráveis, porque não se pode deixar de cogitar que é Lula, e não Dilma, o candidato às próximas sucessões, agora em 2010, por interposta pessoa, e nas vindouras em carne e osso. E se assim for, o cenário real em que se deve travar a disputa eleitoral não pode ser o do trinômio saúde, educação e segurança, nem o da questão social em geral. Sob esse véu das promessas compadecidas, o que rolaria, de verdade, seria um projeto de poder e de acumulação de mais poder.

A hipótese, vista ao lado de uma série de outros indicadores, não é para ser negligenciada, especialmente quando se considera, no caso de vitória de Dilma, a possibilidade de uma convocação de uma assembleia constituinte, mesmo que de poderes limitados para fins de reformas pontuais, como a tributária e a política. Não se põe de volta ao tubo a pasta de dentes que se extraiu dele. Na eventualidade, toda a obra da Carta de 1988 estará sob risco, em particular o regime de freios e contrapesos que ela criou para impedir a tirania de maiorias eventuais, e sabe-se lá qual modelo de democracia participativa vingaria com a vida associativa, inclusive os sindicatos, vinculada como está às agências estatais.

A ficar com as imagens da Revolução Francesa, são as do 18 Brumário de que estamos mais próximos, quando a nação francesa ao invés de seguir em frente com sua experiência republicana, temerosa dos setores populares, fez a opção de se voltar para o seu passado, retomando, em uma sociedade já prosaicamente burguesa, o mito napoleônico. Aqui, ao que parece, teríamos também um encontro marcado com o nosso passado, com a ressurgência do mito de Vargas, embora, é claro, estejamos em uma cena já esvaziada da carga dramática das lutas anti-imperialistas dos anos 1950 e diligentemente empenhados no aprofundamento da experiência capitalista brasileira sem os obstáculos, externos e internos, que Vargas conheceu e que levaram ao desfecho trágico do seu governo. Melancolicamente, esse "revival" do varguismo não se esquece de recordar o papel de pai dos pobres que lhe colou em sua campanha presidencial largamente vitoriosa; Vargas que, em suas últimas palavras, conclamava a mobilização popular em defesa do seu legado.

Mas por que essa viagem de volta na história, se há e havia um caminho promissor rumo ao futuro, na esteira do movimento de emergência popular, que, com inícios na resistência ao regime autoritário, se espraiou nas décadas seguintes com a conquista da Constituinte, no impeachment de Collor, e na vitória do PT na sucessão de 2002? Por que se retornou ao anacrônico dilema, opondo a democracia formal à substantiva, que grassa em surdina em certos círculos do poder? As respostas podem ser muitas, mas qualquer delas será falsa se não admitir que o princípio em vigência é o de acumular poder pelo poder. E para quem está à testa do Estado, em especial com as tradições de estadofilia que nos caracterizam, por que não fazer dele o centro estratégico da sua política?

Retorna-se, então, e agora com um mito vivo, ao modelo da modernização, aos seus ícones intelectuais e ao tema do nacional-desenvolvimentismo. Como no Império, findo o tempo em que a sociedade, no período regencial, ganhou alguma autonomia diante do seu aparato burocrático, podemos constatar que o Regresso, assim em maiúsculas, como se dizia em meados do século XIX, abre caminho, restaurando a majestade do Estado. A sociedade regride ao aceitar passivamente a verticalização a que estão sujeitas as questões que lhe dizem respeito, abdica do moderno, da autonomia de suas organizações, e até parece indiferente ao fato de as oligarquias tradicionais mais recessivas e cúpidas estarem instaladas nos postos de mando. Pachorrentamente, docemente resignada, com suas ruas emudecidas, a sociedade se prepara para revisitar o nosso abominável mundo velho.



Luiz Werneck Vianna é professor-pesquisador do Iesp-Uerj. Ex-presidente da Anpocs, integra seu conselho institucional. Escreve às segundas-feiras

(A pedidos, o artigo é reproduzido, novamente, hoje)

Disputa por espaço:: Merval Pereira

DEU EM O GLOBO

O presidente Lula está utilizando sua força eleitoral para transferir aos estados a mesma expectativa de poder que conseguiu no plano nacional, no qual, antes mesmo de sua candidata oficial aparecer na frente das pesquisas, já havia uma percepção generalizada entre os eleitores de que ela acabaria sendo a vencedora.

A estratégia eleitoral do presidente Lula, que vem sendo vitoriosa em relação à campanha presidencial com sua candidata se colocando com folga à frente do candidato oposicionista , se desdobra agora na fase regional, onde o objetivo não é fazer a maioria dos governadores, mas, sim, garantir uma maioria sólida no Senado.

Um senador vale por três governadores, avisava bem antes da reta final da eleição o próprio Lula, justificando ter aberto mão de disputar muitos governos estaduais em favor de aliados em melhores condições.

Até o momento, no entanto, as pesquisas indicam que, além de mais governadores, a oposição e os independentes dos partidos aliados estão conseguindo manter um equilíbrio de forças dentro do Senado.

O PSDB hoje aparece com possibilidade de eleger nada menos que dez governadores, sendo que está na liderança das pesquisas do Ibope nos dois maiores colégios eleitorais, São Paulo, com Geraldo Alckmin, e Minas Gerais, com Antonio Anastasia.

Pode vencer ainda em Goiás, com Marconi Perillo; no Paraná, com Beto Richa; no Piauí, com Sílvio Mendes; em Rondônia, com Expedito Júnior.

Além disso, tem boas chances no Amapá, com Jorge Amanajás; no Mato Grosso, com Wilson Santos; em Roraima, com José Anchieta Júnior; e em Tocantins, com Siqueira Campos.

O DEM lidera no Rio Grande do Norte, com Rosalba Ciarlini, e tem chance de vencer em Santa Catarina, com Raimundo Colombo, e em Sergipe, com João Alves. No Distrito Federal, por enquanto, a liderança está com Joaquim Roriz, do PSC.

No Senado, das 27 cadeiras que estão fora da disputa, por seus detentores terem mais quatro anos de mandato, nada menos que 14 são de oposicionistas ou de independentes: Marconi Perillo (Goiás) que pode se eleger governador e colocará seu suplente Ciro Miranda Junior, também do PSDB ; Elizeu Rezende (DEM); Marisa Serrano (PSDB); Jaime Campos (DEM); Mario Couto (PSDB); Cícero Lucena (PSDB); Jarbas Vasconcellos (PMDB); Álvaro Dias (PSDB); Francisco Dornelles (PP) que terá seu caráter independente reforçado pela chegada ao Senado de Aécio Neves; Rosalba Ciarlini, do DEM que deve ser eleita governadora do Rio Grande do Norte e colocará em seu lugar o pai do senador Garibaldi Alves ou Ivonete Alves da Silva; Mozarildo Cavalcanti (PTB); Pedro Simon (PMDB); Raimundo Colombo (DEM) que pode ser eleito governador de Santa Catarina e colocará em seu lugar o suplente Casildo Maldaner, do PMDB independente; Maria do Carmo Alves (PSDB); Katia Abreu (DEM).

Na nova safra de senadores a serem eleitos este ano, são os seguintes os senadores da oposição ou independentes que podem se eleger: Heloisa Helena (PSOL); Arthur Virgílio (PSDB) que disputa a segunda vaga com Vanessa Grazziotin, do PCdoB ; Cesar Borges (PR); Tasso Jereissati (PSDB); Cristovam Buarque (PDT); Maria Abadia (PSDB) que disputa a segunda vaga do Distrito Federal com Rodrigo Rollemberg, do PSB ; Demóstenes Torres (DEM); Lucia Vanbia (PSDB); Aécio Neves (PSDB); Itamar Franco (PPS); Valéria Pires (DEM); Antero Paes e Barros (PSDB).

Outros prováveis futuros senadores são Cassio Cunha Lima (PSDB da Paraíba; é o favorito, mas luta no Supremo para não ser considerado ficha suja), Efraim de Moraes (DEM) que disputa uma vaga com Vital do Rego Filho, do PMDB;Marco Maciel (DEM) que disputa a vaga com Armando Monteiro Filho, do PTB ; Mão Santa (PSC); Cesar Maia (DEM); José Agripino Maia (DEM); Ivo Cassol (PP); Ana Amélia Lemos (PP); Germano Rigotto (PMDB); Luiz Henrique (PMDB); Albano Franco (PSDB); e Orestes Quércia (PMDB) que disputa uma vaga com Netinho, do PCdoB.

Como se vê, o equilíbrio real de forças no Senado continuará sendo grande, com uma pequena vantagem governista, que não garante a aprovação de questões polêmicas, e, muito menos, mudanças constitucionais que exigem quórum de 3/5 dos senadores.

Ao mesmo tempo, a presumível força eleitoral com que o PMDB sairá das urnas deve eleger a maior bancada da Câmara e do Senado e grande número de governadores está fazendo com que tanto governo quanto oposição comecem a negociar alianças para neutralizá-lo.

O PMDB pode eleger até nove governadores, sendo que dois deles André Pucinelli, do Mato Grosso do Sul, e José Fogaça, do Rio Grande do Sul são independentes e não estão envolvidos na campanha de Dilma Rousseff.

O partido deve eleger ainda Roseana Sarney no Maranhão, Sinval Barbosa no Mato Grosso, José Maranhão na Paraíba, Sérgio Cabral no Rio de Janeiro e Carlos Gaguim em Tocantins.

E tem chances também em Minas Gerais, com Hélio Costa, e em Rondônia, com Confúcio Moura.

Esse poder todo está movimentando não apenas a base petista, que sabe que vai ter que dividir realmente o poder, inclusive a distribuição de cargos, com o PMDB, mas também a base governista mais ampla, que teme que não sobrará espaço para mais ninguém com a disputa entre PT e PMDB.

O PSB, que deve eleger pelo menos três governadores Cid Gomes no Ceará, Eduardo Campos em Pernambuco e Renato Casagrande no Espírito Santo , é o mais preocupado em ganhar espaço para negociar e já propõe uma união entre PT, PSDB e PSB para se contrapor ao PMDB.

O ex-governador Aécio Neves que terá sua liderança reforçada se conseguir eleger seu candidato Antonio Anastasia prevê que a polarização com o PT continuará, e pretende fazer uma aliança do PSDB com PDT, PSB, PPS, DEM e mais PP, PTB e parte do PMDB, para disputar com o PMDB oficial e o PT o comando do Senado.

Pode ser que uma onda governista altere esse quadro, mas até o momento isso não aconteceu.

Inépcia ou dolo:: Dora Kramer

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

A Polícia Federal não divulga o nome e mantém sob sigilo a profissão, mas localizou em São Paulo um suspeito de comandar esquema que se utiliza de informações da Receita Federal obtidas a partir da delegacia de Mauá, para extorquir dinheiro de gente que tenha algum tipo de problema com o Imposto de Renda.

A pessoa em questão está sendo vigiada e, com autorização da Justiça, tem suas conversas telefônicas gravadas pela PF. De posse dos dados, o homem procuraria os contribuintes que tiveram sigilo violado identificando-se como funcionário da Receita e se ofereceria para "resolver o problema" mediante uma quantia a combinar.

Essa é uma das linhas de investigação do caso descoberto quando informações fiscais do vice-presidente do PSDB, Eduardo Jorge Caldas, foram parar numa papelada que faria parte de um dossiê elaborado por petistas para tentar atingir a campanha presidencial dos tucanos.

O problema dessa versão - que em alguma medida até explicaria o silêncio das pessoas (não políticos) que tiveram seus sigilos violados na delegacia da Receita em Mauá - é que acaba parecendo conveniente demais para o PT, pois tiraria conotação político-eleitoral do episódio e o colocaria exclusivamente no campo criminal.

Tudo certo, caso a Receita tivesse alguma vez nos últimos dois meses aludido à hipótese de as acusações que assombravam o comitê de campanha de Dilma Rousseff nada terem que ver com a disputa eleitoral, pois as investigações da PF apontavam para crime comum.

O PT e a candidata falaram primeiro em inexistência de quebra de sigilo e depois em "factoide" da oposição.

Mas nestes mais de 60 dias de inquérito aberto, só agora, depois de conhecida a violação de mais três pessoas ligadas a José Serra, aparecem versões sobre extorsão. Como quem tem uma boa ideia depois de ver reportagens sobre a venda de informações sigilosas em CDs no centro de São Paulo.

Não é impossível que a PF tenha realmente um suspeito em vista, mas está parecendo que foram misturados alhos com bugalhos por conveniência.

Com base no histórico de casos anteriores, se for isso mesmo logo aparecerá o nome de um culpado para ser punido e encerrado o assunto.

Mas desta vez é mais complicado, pois quando um santo é vestido, livrando a campanha da suspeita de espionagem, outro é posto nu ao deixar patente que o Estado ou é inepto ou criminoso: não assegura a privacidade do cidadão e ainda esconde da sociedade os fatos.

Olhar estrangeiro. Enquanto a academia brasileira de um modo geral se abstém de analisar o quadro, de fora de quando em vez aparecem diagnósticos proveitosos.

Em entrevista ao jornal Folha S. Paulo, o diretor do Centro para o Desenvolvimento Internacional da Universidade de Harvard, Ricardo Hausmann, diz que o Brasil tem ótimo potencial de crescimento, um setor privado muito forte, mas que o governo, apesar de ter administrado bem a crise econômica mundial de 2008, comete equívocos fatais com base em sucessos pontuais interpretados como sinal de êxito total.

Segundo ele, o Brasil é dos países que ficam arrogantes quando as coisas começam a parecer bem encaminhadas. "Parecem acreditar num mundo de fantasia."

Por exemplo: "Só porque o País teve por um trimestre uma taxa de crescimento de 7%, o Brasil é agora a nova China, Lula é o gênio das finanças e nenhum dos problemas anteriores existe mais."

O economista elogia o cuidado de Lula em 2002 de ter transmitido confiança ao setor privado, mas critica a atitude atual, menos cuidadosa e "mais ideológica". Para ele, a administração "macro" é insustentável por um defeito comum ao que conduz também a linha da política externa.

"Agora que o País é grande pode ir para a cama com Ahmadinejad ou hospedar Manuel Zelaya na embaixada em Honduras. É uma atitude de que o Brasil agora é diferente e, portanto, pode confrontar o senso comum. Esse tipo de arrogância tem sido desastrosa na política externa e pode ser desastrosa para a administração macroeconômica."

Festa na véspera:: Miriam Leitão

DEU EM O GLOBO

Então é isso? Uma eleição cuja campanha começou antes da hora acabou antes que os votos sejam depositados na urna? A vencedora de véspera já estendeu a mão, magnânima, à oposição; seus dois maiores caciques começaram uma briga intestina; cargos são distribuídos entre os partidos da base e os assessores já preparam os planos e projetos. Fala-se do futuro como inexorável.

O quadro está amplamente favorável a Dilma Rousseff, mas é preciso ter respeito pelo processo eleitoral.

Se pesquisa fosse voto, era bem mais simples e barato escolher o governante.

Imagina o tempo e o dinheiro poupado se pesquisas, 30 dias antes do pleito, fossem suficientes para o processo de escolha? A estrutura da Justiça Eleitoral, as urnas distribuídas num país continental, mesários trabalhando o dia inteiro, computadores contando votos; nada disso seria necessário.

Mas como eleição é a democracia num momento supremo, respeitá-la é essencial.

Os que estão em vantagem, e os que estão em desvantagem, não podem considerar o processo terminado porque isso amputa a melhor parte da democracia, encerra prematuramente o precioso tempo do debate e das escolhas.

Dilma já sabe até o que fará depois de ser eleita, como disse na sexta-feira: A gente desarma o palanque e estende a mão para quem for pessoa de boa vontade e quiser partilhar desse processo de transformação do Brasil. Os jornalistas insistiram, ela ficou no mesmo tom: Estendo a mão para quem quiser partilhar. Eu não sei se ele (Serra) quer.

Você pergunta para ele, se ele quiser, perfeitamente. Avisou que se alguém recusasse, não haveria problema: Pode ficar sem estender a mão, como oposição numa boa que vai ter dinheiro. Já está até distribuindo o dinheiro público.

Feio, muito feio. Por mais animador que seja para Dilma os resultados da pesquisa e deve ser difícil segurar a ansiedade ela deveria pensar em algumas coisas antes. Primeiro, que falta o principal para ela ganhar: o voto na urna. Segundo, que o eleitor muda de ideia na hora que quer, porque para isso é livre.

Terceiro, que, novata em eleição, deve seu sucesso a fatores externos a ela: o presidente Lula, o momento econômico e a eficiência dos seus marqueteiros.

Aliás, o marketing de Dilma tem sido tão eficiente em aparar todas as arestas de sua personalidade que criou uma pessoa que nem ela deve conhecer.

O salto alto não é só dela, a bem da verdade. A síndrome das favas contadas se espalha por todo o seu entorno, cada vez mais desenvolto.

Por isso já começaram a brigar os generais de cada uma das bandas: Antonio Palocci e José Dirceu. Da última vez que brigaram, os dois caíram.

A disputa dos partidos da base de apoio pelos cargos públicos, como se fossem os despojos da guerra já vencida, é um espetáculo que informa muito sobre valores, critérios e métodos do grupo.

A desenvoltura do já ganhou é tanta que até o presidente Lula, dono da escolha autocrática de Dilma, parece meio enciumado e reclamou que já falam dele no passado. E avisou: Ainda tenho caneta para fazer muita miséria. A declaração inteira é reveladora: Tem gente que fica falando aqui como se eu já tivesse ido embora, mas ainda tenho quatro meses e alguns dias de governo. Alguns falam como se eu já tivesse ido. Tem gente que se mata para ser presidente por um dia e ainda tenho quatro meses e alguns dias. Ainda tenho a caneta para fazer muita miséria nesse país. O sentimento é um perigo.

O presidente Lula já está fazendo miséria. Atropelou o calendário eleitoral, zombou das multas na Justiça, pôs o governo que dirige para trabalhar pela sua candidata como se a máquina pública fosse um partido político.

Há uma lista enorme de misérias econômicas que o governo Lula tem feito nesse final dos tempos. Os gastos foram inchados, aumentos salariais ao funcionalismo já foram concedidos no próximo orçamento, restos a pagar se aproximam dos R$ 100 bilhões, projetos são precipitados sem análise de risco, o Tesouro vai emitir uma montanha de dívida para capitalizar a principal estatal. Enfim, o governo no finalzinho não lembra em nada o comedido início.

Aliás, a razão da briga entre os generais José Dirceu e Palocci é exatamente esse ponto: se é melhor ter uma cara de austeridade, ou continuar fazendo miséria.

O curioso da insegurança que bateu no presidente Lula é que foi ele mesmo que explicitou o clima de fui na campanha de Dilma Rousseff com aquele filmete do: entrego em suas mãos. Na sexta, Dilma disse mais: Meu projeto político é ficar quatro anos. Na próxima eleição, digo o resto do projeto. Então ela já começou a pensar na eleição de 2014? Mas pelos cálculos petistas, a história brasileira está decidida até 2022. É Dilma, agora. Depois, Lula em dois mandatos. Está tudo decidido para os próximos doze anos. O país teria assim um período de 20 anos de governo petista.

Quando Dilma brigou com Palocci em 2005 e disse que o projeto de zerar o déficit público era rudimentar, ela usou a conhecida expressão de Garrincha: Falta combinar com os russos.

Agora, falta combinar com os brasileiros.

Frente e verso :: Eliane Cantanhêde

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

BRASÍLIA - O PMDB considera "sem pé nem cabeça" a notícia de que Lula articula pessoalmente uma "frente de esquerda" com PT, PSB, PDT, PCdoB e PRB para se contrapor à força e à avidez peemedebista no eventual governo Dilma.

Mas, como o seguro morreu de velho, especialmente em política, a cúpula do partido não vai abrir a guarda. Pretende manter o discurso de que são todos dilmistas desde criancinha, mas assuntando até onde vai a tal frente e se preparando para, se e quando for o caso, mostrar que não é de brincadeira.

"A aliança era episódica, só para a eleição? Nós não somos parceiros? Não vamos juntos para a vitória?", questionou ontem Henrique Eduardo Alves, que é hoje o mais antigo deputado, com dez mandatos consecutivos, e candidato peemedebista a presidente da Câmara. O PT promete fazer barulho. Mas o PMDB tem lá suas vuvuzelas.

"Uma coisa é um governo com Lula, outra é um governo com Dilma", diz Alves, como quem não quer nada, lembrando o quanto Dilma, se for mesmo presidenta, pode vir a precisar um bocado do partido -no Congresso e fora dele.

Alves diz não acreditar na tal frente de esquerda, mas adverte por precaução: "Uma frente contra nós vai ser um tiro no pé, porque é claro que vai provocar uma reação do PMDB".

Quem avisa amigo é.

Lula, aliás, não está sozinho ao focar o PSB e o PDT, já que Aécio Neves nem esperou as urnas e deu entrevista ao jornal "Valor Econômico" sobre uma linha de ação para 2011 "que independa do resultado da eleição presidencial". Qual seja? A aproximação do PSDB (ou da parte que sobrar de pé) com o PDT e o PSB de Ciro e Cid Gomes.

Lula quer os dois partidos contra o PMDB. Aécio, contra o PSDB serrista e paulista. Pode estar aí a base do novo partido a ser erguido sob os escombros da oposição.

PS - O que faz o PRB da Igreja Universal no meio da "frente de esquerda" de Lula? E eu que sei?!

Casuarina - A Roda Morreu

Marco oculto sob a passagem de nível:: Wilson Figueiredo

DEU NO JORNAL DO BRASIL

Está no Caldas Aulete que oposição é a ação de opor ou opor-se e, como não poderia deixar de ser, o verbete vai direto ao ponto com a variante segundo a qual também vale para esforços que se opõem a um governo para o estorvar nos seus atos, para a paralisação na sua ação ou para expulsá-lo do poder. A última hipótese teve seu tempo no Brasil, mas a moda passou. E deixou sequelas. Pode ter sido por mais de uma razão, mas o fato histórico foi que o PSDB teve ao seu alcance, num determinado momento do mensalão, o primeiro mandato de Lula, em situação de tirar o fôlego. O episódio foi discreto, e o pessoal da social-democracia parou à beira do precipício. E perdeu a oportunidade de optar pela solução negociada, no melhor sentido, e garantir à democracia saldo qualificado no quinto mandato presidencial depois dos governo militares.

O episódio circulou em âmbito restrito, em forma de versões pessoais, como se fosse degradante ou envolvesse conivência para desativar o escândalo. É fato, ainda não processado de público, que o comando social-democrata resolveu esperar que a situação se resolvesse por si mesma. Não se resolveu, e o governo apenas chegou a examinar a renúncia ou a alternativa de apelar para os grotões ideológicos. A oposição tomou consciência de que a democracia confirma ter vindo para ficar.

Pode ter sido também o temor do opróbrio histórico que levou o PSDB à reflexão. O tempo trará à tona a verdade sobre o único perigo de retrocesso vivido desde a última eleição indireta, que foi também o primeiro passo rumo a uma democracia estável. Naquele momento tenso, o acordo poderia poupar a História, para sempre, da farsa de repetir-se em círculos de autoritarismo estéril e recomeçar em vão.

Ao deter-se diante do desfecho do que se entende (em regime parlamentar de governo) por ultima ratio do direito de fazer oposição, o PSDB não pleiteou solução de algibeira. No confronto de conceitos socialistas de governo democrático e resíduos de natureza revolucionária, falta aos dois lados da questão derrubar o muro de prevenções fomentadas por baixo nível ideológico. A desconfiança recíproca ficou mais nítida na campanha eleitoral perante a qual se nivelam igualmente pela intolerância. A atual oportunidade não será a última, mas o tempo desperdiçado na disputa de votos abre espaço para a reflexão isenta, objetiva, ponderada, sem pressa em relação ao futuro que está atrasado mas recomeça todos os dias. O único símbolo de progresso, a despeito das aparências e sombras (se é que não apenas esconde o que não pode ser mostrado), é a apresentação de quatro candidatos com matizes variados de esquerda, pelo que se subentende como centro, sujeito a suspeitas mas sem a tentação de voltar atrás à procura do que passou.

Passou e não tem volta.

Lula em transe :: Fernando de Barros e Silva

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

SÃO PAULO - A um mês da eleição, o petismo está em festa, mas não há ninguém mais animado do que o próprio Lula. Ele não age como quem quer apenas derrotar José Serra.

Age como quem quer massacrar a oposição. Massacrar politicamente, bem entendido, embora o que ele diga às vezes faça eco, com sinais invertidos, à fala truculenta de Jorge Bornhausen em 2005 -"vamos acabar com aquela raça".

É evidente, de maneira até muito mais acentuada do que ocorreu em 2006, o clima de desforra que o presidente imprime à campanha atual.

Lula transformou o processo eleitoral num "road show". Escreve o roteiro, dirige e protagoniza o espetáculo itinerante da sua aclamação. Vai pulando de cidade em cidade, empenhado em dizimar os remanescentes "do lado de lá".

E, como a disputa ficou fácil para a sua candidata, cada palco visitado pelo astro mambembe oferece uma nova ocasião para sua despedida interminável e novelesca do poder. Lula, mais do que a plateia, parece necessitar dessa catarse.

Não sendo candidato, em cima do palanque ele com frequência agride o código de conduta burguês. Sua performance fere suscetibilidades tucanas e não deixa de recordar, pelo que mobiliza, algo do teatro collorido no seu auge.

Pelos exemplos dos últimos comícios, no seu personagem parecem se misturar, quando caminha e esbraveja pelo palco, o líder sindical, o pai populista e o pregador religioso. Mas seu transe tem método.

A mensagem que o atravessa é invariavelmente a mesma: a luta política se trava entre "nós" (o povo, encarnado na sua figura) contra "eles" (a elite inimiga do povo).

Pouco importa que, na vida real, parte significativa das elites e das oligarquias esteja junto com Dilma. A equação eleitoral que Lula montou se mostrou, afinal, muito eficaz.

Não seria assim, obviamente, se o conto de fadas da ascensão social que o próprio Lula representa não tivesse de alguma maneira se traduzido em realidade para muitos.

A volta do bode preto da velha esquerda:: Arnaldo Jabor

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Com tucanos em extinção, surge um país sem oposição

Meu primeiro grande amor começou num aparelho do Partido Comunista Brasileiro em 1963, meses antes do golpe militar. Era um pequeno apartamento conjugado na Rua Djalma Ulrich em Copacabana, em cima de uma loja de discos.

No apartamento, havia um sofá-cama com a paina aparecendo por um buraco da mola, entre manchas indistintas marcas de amor ou de revolução? Na parede, um cartaz dos girassóis de Van Gogh e, numa tábua sobre tijolos, livros da Academia de Ciências da URSS. Um companheiro me emprestara a chave com olhar preocupado, sabendo que era para o amor e não para a política. Cuidado, hein, se o dirigente da base souber.... disse-me, vendo a gratidão em meus olhos.

Eu era virgem de sexo com namoradas, pois pouquíssimas moças davam, nessa época anterior à pílula; transar para elas era ainda um ato de coragem política. As moças iam para a cama pálidas de medo, para romper com a vida burguesa, correndo o risco da gravidez supremo pavor. Famintos de amor, usávamos até Marx para convencer as meninas.

Não. Aí eu não entro!, gemiam, empacadas na porta do apartamento. Nós usávamos argumentos que iam de Sartre e Simone até a revolução: Mas, meu bem... deixa de ser alienada...

A sexualidade é um ato de liberdade contra a direita... Tudo era ideológico em Ipanema até a praia tinha um gosto de transgressão política.

Éramos assim nos anos 60.

A Guerra Fria, Cuba, China, tudo dava a sensação de que a revolução estava próxima.

Revolução era uma varinha de condão, uma mudança radical em tudo, desde nossos pintinhos até a reorganização das relações de produção.

Não fazíamos diferença entre desejo e possibilidade. Eu era do Grupo Vertigem, como colegas radicais nos apelidaram. Nossa revolução era poética, Rimbaud com Guevara; era uma esperança de um tempo futuro em que a feia confusão da vida se harmonizaria numa perfeição política e estética. Para os mais obsessivos era uma tarefa a cumprir, uma disciplina infernal, um calvário de sacrifícios para atingir não sabíamos bem o quê. Tínhamos os fins, mas não tínhamos os meios.

E, como todos, tínhamos horror ao demônio do capital e da administração da realidade para a luta (coisa chata, sem utopia...). Por isso, a incompetência era arrepiante. Ninguém sabia administrar nada, mas essa mediocridade era compensada por bandeiras e frases bombásticas sobre justiça social, etc.... Nunca vi gente tão incompetente quanto a velha esquerda que agora quer voltar ao poder como em 63, de novo com a ajuda de um presidente. Assim como foi com Jango, agora precisam do Lula. São as mesmas besteiras de pessoas que ainda pensam como nos anos 60 e, pior, anos 40.

Revolução era uma mão na roda para justificar sua ignorância, pois essa ala da esquerda burra (a inteligente cresceu e mudou...) não precisava estudar nada profundamente, por serem a favor do bem e da justiça a boa consciência, último refúgio dos boçais. Era generosidade e era egoísmo. A desgraça dos pobres nos doía como um problema existencial nosso, embora a miséria fosse deles. Em nossa fome pela justiça, nem pensávamos nas dificuldades de qualquer revolução, as tais condições objetivas; não sabíamos nada, mas o desejo bastava. Como hoje, os idiotas continuam com as mesmas palavras, se bem que aprenderam a roubar e mentir como burgueses.

A democracia lhes repugnava, com suas fragilidades, sua lentidão. Era difícil fazer uma revolução? Deixávamos esses detalhes mixurucas para os militantes tarefeiros, que considerávamos inferiores, peões de Lenin ou (mais absurdo ainda) delegávamos o dever da revolução ao presidente da República, na melhor tradição de dependência ao Estado, como hoje.

Deu nos 20 anos de bode preto da ditadura.

Por que escrevo essas coisas antigas, estimado leitor? Porque muita gente que está ai, gritando slogans, não quer entender que a via mais revolucionária para o Brasil de hoje é justamente o que chamávamos de democracia burguesa, com boquinha de nojo. Muita gente sem idade e sem memória não sabe que o caminho para o crescimento e a justiça social é o progressivo aperfeiçoamento da democracia, minando aos poucos, com reformas, a tradição escrota de oligarquias patrimonialistas. Escrevo isso porque acho que a luta de hoje é entre a verdadeira esquerda que amadureceu e uma esquerda que quer continuar a bobagem, não por romantismo, mas porque o Lula abriu-lhes as portas para a lucrativa pelegagem. Vejo, assustado, que querem substituir o patrimonialismo burguês pelo sindicalista, claro que numa aliança de metas e métodos com o que há de pior na política deste pais. Vão partir para um controle soviético e gramsciano vulgar do Estado para ter salvo-condutos para suas roubalheiras num país sem oposição, entregue a inimigos da liberdade de opinião.

Escrevo isso enojado pela mentira vencendo com 80% de Ibope, apagando como da história brasileira o melhor governo que já tivemos de 94 a 2002, com o Plano Real, com a Lei de Responsabilidade Fiscal, com a telefonia moderna de hoje, com o Proer que limpou os bancos e impediu a crise nos atingir, com privatizações essenciais que mentem ao povo que venderam nossos bens..., com a diminuição da pobreza em 35% e que abriu caminho para o progresso econômico de hoje que foi apropriado na mão grande por Lula e seus bolchevistas. Ladroeira pura, que o povo, anestesiado pelo Bolsa Família e pelas rebolations do Lula na TV, não entendem.

Também estou enojado com os vergonhosos tucanos apanhando na cara por oito anos sem reagir.

O governo Lula roubou FHC e o mais sério período do país, e seus amigos nunca o defenderam nem reagiram. São pássaros ridículos em extinção.

Tenho orgulho de que, há 40 anos, no apartamento conjugado do Partidão com minha namorada, eu gostava mais dos girassóis de Van Gogh do que dos livros de Plenkanov.

Por isso, para levar meu primeiro amor ao apartamento, usei uma cantada de esquerda:

Nosso amor também é uma forma de luta contra o imperialismo norte-americano. E ela foi.

Aécio cobra mais ousadia na campanha presidencial

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Para tucano, Serra deve apontar diferenças mais claras em relação a propostas [br]do atual governo

O ex-governador de Minas e candidato ao Senado, Aécio Neves (PSDB), cobrou ontem mais ousadia na campanha do candidato tucano à Presidência, José Serra. Em Varginha, no sul do Estado, onde participou de evento de campanha ao lado de Serra e do governador Antonio Anastasia (PSDB), candidato à reeleição, Aécio defendeu que o presidenciável de seu partido "venha sempre que possível a Minas".

"Acho que o próprio crescimento do governador Anastasia de alguma forma possa ajudar que ele avance um pouco mais em Minas Gerais", observou. "Mas eu acho que o mais importante é que a sua comunicação para o País inteiro talvez seja um pouco mais ousada, apontando diferenças mais claras em relação a propostas do atual governo. Essa nunca foi uma eleição fácil para nós, mas está longe de ser uma eleição perdida."

Questionado sobre o crescimento da presidenciável petista, Dilma Rousseff, nas pesquisas, Aécio disse que se trata de "uma conjunção de fatores". "É uma conjunção de fatores. Falar agora, fazer críticas agora não contribui. Temos que trabalhar muito. Repito, a eleição ainda não está ganha, ainda acredito na possibilidade de não estar perdida no nosso caso nacional", assinalou. O candidato tucano ao Senado observou ainda que a transferência de votos do presidente Lula na corrida presidencial não se repete nos Estados.

"O que estamos assistindo é que realmente a presença do presidente Lula em nível nacional, no que diz respeito à candidatura majoritária federal, influenciou muito, não vejo um outro diagnóstico", disse. "Ele acaba tendo uma capacidade maior de transferência dos votos na questão nacional."

Serra muda slogan e fala em 'hora da virada'

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Depois de articular ofensiva para fazer frente aos resultados das pesquisas, a nova estratégia de comunicação de José Serra (PSDB) tem "tribuna popular" na internet e um slogan que traduz o momento da campanha tucana: É a hora da virada.

Serra muda estratégia de comunicação e adota como slogan "é hora da virada"

Objetivo da campanha é conseguir se comunicar mais diretamente e de forma mais eficaz com os interessados na candidatura tucana

Julia Duailibi, Marcelo de Moraes

Depois de articular uma ofensiva política para fazer frente aos resultados das pesquisas de intenção de voto, a coordenação de campanha do presidenciável do PSDB, José Serra, traçou agora nova estratégia de comunicação. A investida conta com uma "tribuna popular" na internet e novo slogan, que traduz o momento por qual passa a campanha tucana: "É a hora da virada."

Agora a campanha passará a falar diretamente com o eleitor por meio de e-mail. Desde domingo, o site de Serra passou a ter nova cara. Foi criado um cadastro dos eleitores para mapear detalhadamente o perfil do internauta e saber qual seu assunto de interesse. Assim, a campanha acredita que conseguirá se comunicar mais diretamente, e de forma mais eficaz, com os interessados na candidatura tucana.

A iniciativa já é reflexo da contratação do consultor americano Ravi Singh, da Election Mall Tecnologies, que atuou na campanha de Juan Manuel Santos à Presidência da Colômbia.

O candidato a vice de Serra, Índio da Costa (DEM), foi o primeiro a estrear a investida por e-mail. Com o título Vamos virar esse jogo, iniciou ontem tentativa de mobilizar eleitor. A mensagem de Índio dizia: "Serra precisa do seu apoio agora."

"Somos nós quem decidimos o que queremos. Acredite no seu voto! Acredite em você! Todas as campanhas vitoriosas têm momentos difíceis. Somos 72 milhões de brasileiros conectados, uma das maiores comunidades do mundo na internet e é a hora da virada. Serra precisa do seu apoio agora", dizia a mensagem.

Na página da rede, saiu o conteúdo diário, com fotos, reportagens sobre o dia do candidato e informações sobre a posição dele a respeito de determinados temas. Por enquanto, o conteúdo será enviado para os eleitores apenas por e-mail e pós-cadastro.

Foi enviado para os internautas um "presente" da campanha: um pôster de Serra, que lembra o cartaz do presidente Barack Obama feito pelo ilustrador e ex-skatista Shepard Fairey na campanha americana de 2008.

"Sempre digo que é impossível fazer comparações com a campanha do Obama. Mas é impossível não se deixar influenciar por essa referência", disse a coordenadora da campanha na internet Soninha Francine. A candidata do PV, Marina Silva, também criou cartazes inspirados na obra de Fairey.

"Em vez de ficarmos dizendo que Serra tem experiência, vamos deixar que as pessoas digam. Virou uma tribunal virtual popular", disse Soninha, sobre a decisão de não colocar, por enquanto, conteúdo no site, mas registrar mensagens dos eleitores.

Questionada se o fato de a página de Serra ter ficado fora do ar no final de semana fazia parte da "estratégia" para criar expectativa com o novo projeto, conforme relataram integrantes da campanha ao Estado, Soninha disse: "Não é positivo termos tido problemas. É agonizante. Mas é verdade que tivemos mais tempo para refazer o site."

"Diariamente lhe enviaremos atividades para você realizar e nos ajudar a vencer. Vamos juntos! Vamos com Serra", afirma a mensagem do Time Serra 45, enviada por e-mail. Um dos casos que inspiraram a mudança foi uma viagem de Serra ao Rio Grande do Sul. Lá um eleitor perguntou a posição dele sobre agricultura. A resposta já estava na internet e a campanha passou a achar inútil o conteúdo do site.

Serra 45: Virada na eleição com Anastasia: pule você também para o lado de cá!

Serra promete criar 20 milhões de empregos até 2020

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Tatiana Fávaro

O candidato do PSDB à Presidência da República, José Serra, disse hoje em Varginha, no sul de Minas Gerais, que é "importante que a economia brasileira continue bem". O tucano afirmou que vai criar, caso seja eleito, 20 milhões de empregos até 2020 e reconheceu que para isso as pessoas "precisam continuar consumindo".

Serra não quis comentar o avanço da candidata Dilma Rousseff (PT) nas pesquisas de intenção de voto e disse que só falaria sobre "coisas que interessam às pessoas". Apesar disso, reconheceu que está "numa batalha nacional dura e difícil".

O tucano chegou à cidade por volta das 14 horas e seguiu do aeroporto em carreata até o centro de Varginha, acompanhado pelo candidato ao Senado Aécio Neves e o candidato ao governo de Minas, Antonio Anastasia.

Aécio afirmou que tem pedido a Serra sua presença frequente em Minas. O tucano disse acreditar que a força das candidaturas regionais (a dele e de Anastasia) possam ajudar a alavancar a candidatura presidencial. "Espero que esse avanço do governador Anastasia possa de alguma forma também ajudar o governador José Serra e (ele) possa crescer", afirmou Neves.

O candidato ao Senado atribui a perda de espaço de Serra para Dilma à presença do presidente Lula ao lado da candidata durante a campanha. "O que estamos assistindo é que a presença do presidente Lula em nível nacional na candidatura majoritária federal influenciou muito", disse Aécio. "Não vejo outro diagnóstico ou explicação plausível, além da força de transferência de voto do presidente Lula", acrescentou o ex-governador de Minas.

Previdência: Planalto teme prejuízo eleitoral com debate

DEU EM O GLOBO

PT e campanha de Dilma, porém, reconhecem urgência da reforma

Para evitar prejuízos eleitorais, o Planalto tenta esvaziar o debate sobre a provável reforma da Previdência no eventual governo da petista Dilma Rousseff. Assessores do governo e parlamentares do PT reconhecem que a reforma da Previdência é urgente e terá que ser encarada pelo futuro presidente. Oficialmente, porém, o governo e a campanha petista negaram qualquer discussão interna sobre o assunto.

"Essa proposta existe há muito tempo e continua em estudo, mas não faz parte do programa de governo da Dilma. Só vamos discutir isso depois da manifestação das urnas", disse o presidente do PT, José Eduardo Dutra. A reforma prevê mudanças nas regras de aposentadoria.


Lula agora prioriza eleição de bancada forte no Congresso

Preocupação maior é com o Senado, onde maioria do governo é frágil

Maria Lima

BRASÍLIA. Confiante que a candidata petista, Dilma Rousseff, vencerá no primeiro turno, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva está centrando fogo para ampliar ao máximo a base governista no Congresso, principalmente no Senado. Nos últimos comícios ao lado de Dilma no Nordeste, Lula fez discursos emocionados, pedindo aos eleitores e políticos locais que elejam candidatos a deputado e a senador da base aliada.

Lula disse que não deseja que Dilma sinta na pele o que ele sofreu no Senado. Em 2005, disse, a oposição tentou derrubá-lo, no auge da crise do mensalão. Também lembrou o fim da CPMF, que rendia aos cofres públicos cerca de R$ 40 bilhões por ano.

Na última sexta-feira, em Recife, ele afirmou que o eleitor tem o compromisso de reeleger o governador Eduardo Campos (PSB) e deputados aliados para que não venha nenhum picareta lhe criar dificuldade.

É importante votar nos deputados federais para ajudar a companheira Dilma, porque não tem nada pior que você precisar de voto e algumas pessoas ficarem te chantageando. Portanto, é importante votar nos companheiros dos partidos que estão apoiando Dilma pediu Lula.

Ao falar das dificuldades que teve, diante da sua frágil maioria no Senado, Lula disse que, após sair da a Presidência, andará pelo país para avaliar a construção de uma organização política: Uma organização política em que a gente junte todos os partidos aliados e crie uma coisa muito forte, para nunca mais permitir que um presidente sofra o que sofri em 2005, com um Senado que quase tenta derrubar o presidente da República.

Partidos pequenos e médios querem ampliar bloquinho Segundo o presidente do PT, José Eduardo Dutra, o partido pode eleger cerca de cem deputados, talvez superando a bancada do PMDB. No Senado, a previsão é que o PT faça dez senadores e o PMDB, cerca de 20.

Para se contrapor à força dessas duas maiores bancadas, os partidos pequenos e médios da base podem se juntar e transformar e aumentar o atual bloquinho (PSB-PDT-PCdoB).

O PT já espera por isso.

Independente da minha vontade, acho que partidos como o PSB/PDT/PCdoB/PRB e outros vão ampliar o bloquinho. A tendência é se aglutinarem, para não ficar com uma perna a menos diante do fortalecimento das bancadas do PT e PMDB.

Acho que o PT pode sair mais forte das urnas do que o PMDB.

A diferença pode ser de cinco a seis deputados para um lado ou outro disse Dutra.

O líder do PTB no Senado, Gim Argelo (DF), diz que a ampliação do bloquinho será discutida após a eleição.

Vamos discutir esse negócio de formação de blocos na hora certa. Daqui a 30 dias vamos saber a força que cada um vai sair das urnas. O PTB no Senado deverá continuar como o fiel da balança.

Do outro lado, o candidato ao Senado e ex-governador Aécio Neves (PSDB-MG) tem pregado a necessidade de aproximação de PSDB e DEM com dissidências de partidos governistas.

O objetivo seria formar um bloco em defesa de uma agenda de Estado.

Receita: sigilo era quebrado por encomenda

DEU EM O GLOBO

Corregedoria manda para o MP representação contra Addeilda, que operava o esquema de vazamento de dados

Fábio Fabrini

BRASÍLIA e SÃO PAULO. A Corregedoria da Receita Federal enviou ontem ao Ministério Público Federal representações que apontam a servidora Addeilda dos Santos, da Delegacia de Mauá (SP), como a principal responsável pelos vazamentos de dados fiscais protegidos por sigilo. Os dados de quatro tucanos ligados ao presidenciável José Serra teriam ido parar em suposto dossiê montado por integrantes da campanha da petista Dilma Rousseff, que nega.

Fontes ligadas à investigação dizem que as provas evidenciam que Addeilda operava de seu computador o esquema, classificado pelo corregedorgeral, Antônio Carlos Costa DÁvila, como um balcão de venda de sigilos.

O método de acesso às informações é uma das principais evidências contra Addeilda, cedida pelo Serpro. A corregedoria apurou que, antes de as declarações de IR de políticos, celebridades e empresários serem acessadas com a senha da analista Antônia Aparecida Rodrigues dos Santos Neves, a de Addeilda era usada para entrar no CPF das mesmas pessoas, e visualizar informações mais simples, como endereço e filiação.

A corregedoria concluiu que o acesso era sempre feito periodicamente e em pacotes, o que indica ação por encomenda. É o caso do vice-presidente do PSDB, Eduardo Jorge Caldas Pereira, e mais três pessoas ligadas a Serra, cujos sigilos foram violados por 16 minutos, em 8 de outubro do ano passado.

Eduardo Jorge acusa o comitê da candidata Dilma Rousseff de envolvimento na violação.

O advogado de Addeilda, Marcelo Panzardi, informou que a senha de sua cliente não permitia acesso mesmo a informações mais simples.

Mesmo assim, o fato de a senha pessoal dela ter sido usada não quer dizer que foi por ela. Addeilda deixava o computador ligado no sistema da Receita quando saía explicou.

Corregedor nega convite para depor no Senado As conclusões foram para o procurador da República Vinícius Alves, que já investiga o caso. O inquérito corre em segredo de Justiça.

O corregedor-geral da Receita recusou-se a comparecer hoje a audiência na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado para dar explicações sobre o caso. Os senadores devem ouvir o técnico Demétrius Sampaio Felinto, que acusa o Palácio do Planalto de sumir com fitas que registrariam um encontro de Dilma com a ex-secretária da Receita Lina Vieira. Segundo Lina, a então ministra da Casa Civil teria tentado favorecer o senador José Sarney (PMDB-AP).

Deve depor hoje no Senado Gerardo Santiago, ex-assessor da presidência da Previ, o fundo de pensões dos funcionários do Banco do Brasil. Ele sustenta que o fundo foi transformado numa fábrica de dossiês na gestão de Sérgio Rosa, também convidado pela CCJ.

Antônia Aparecida negou ter participado do vazamento e afirmou estar se sentindo uma vítima em todo esse processo, em carta divulgada pelo Sindicato Nacional das Carreiras de Auditoria da Receita Federal do Brasil (Sindireceita).

Ela disse que compartilhamento de uma de suas senhas para acessar o sistema de dados foi em função do volume de trabalho.

Servidora da Receita afirma que sua senha era socializada

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Acusada de participar da violação do sigilo fiscal do dirigente tucano Eduardo Jorge, a funcionária da Receita Federal Adeildda Ferreira dos Santos declarou à Folha que colegas na agência de Mauá tinham acesso livre ao seu terminal.

Santos afirmou ter cometido apenas um erro: "Como servidora, deveria ter sido mais cuidadosa".


Senha era socializada, diz servidora do fisco

Acusada pela violação de sigilo de tucanos, Adeildda Santos diz que colegas tinham acesso livre a seu terminal

Funcionária da Receita Federal diz que cometeu apenas um erro: "Como servidora, deveria ter sido mais cuidadosa"

Andréa Michael
DE SÃO PAULO

Responsável pelo computador no qual foram acessadas ilegalmente declarações de renda do dirigente tucano Eduardo Jorge e de outros integrantes do PSDB, Adeildda Ferreira dos Santos negou ontem em entrevista exclusiva à Folha responsabilidade na violação dos dados. Ela afirma que colegas da agência de Mauá (SP) da Receita usavam o seu computador e que a senha de acesso ao sistema era "socializada". E diz que cometeu um erro. "Como servidora, deveria ter sido mais cuidadosa". Adeildda afirmou que o terminal pode ter sido usado por alguém com má-fé.

Folha - Como é sua rotina de trabalho em Mauá?

Adeildda Ferreira dos Santos - Estou em Mauá desde 2007. Eu protocolava pedidos de retificação de declarações de renda, respondia memorandos e ofícios judiciais, e muitas vezes precisava da senha da Antonia Neves Silva para fazer isso.


Folha - Que serviço fazia a servidora Ana Maria Cano?

A mesma coisa que eu. Ela até pedia para usar a minha máquina. Dizia que estava com problemas e não conseguia entrar no sistema pela [máquina] dela.

Houve aumento de pedidos de acesso a dados sigilosos?

Houve. Outros funcionários, além da Antonia, também pediam: o Júlio [Bertoldo], a própria Ana Maria... O máximo que já fiz de uma vez, pelo me me lembro assim, foram uns 20. Mas eu nunca olhava nomes, porque era subordinada. Não conheço esse Eduardo Jorge.

A sra. sabe de alguma suposta venda de dados sigilosos?

Nunca ouvi nada.

A sra. acha que errou?

Não errei porque não acessei o sigilo de ninguém. Mas reconheço que, como servidora, deveria ter sido mais cuidadosa. Às vezes eu ia ao banco e deixava o meu terminal aberto. Outros dias eu chegava para trabalhar e a máquina já estava ligada. Todo mundo sabia que eu deixava minha senha anotada numa caderneta sobre a minha mesa. A senha do meu terminal era socializada, na verdade, era usada por todo mundo que quisesse, mas eu nunca pensei que fossem usar com má-fé.

Areia nos olhos do público – Editorial / O Estado de S. Paulo

A Receita Federal é um curioso organismo. Trata com implacável rigor o contribuinte, tido por definição como um sonegador em potencial a quem incumbe provar, obedecendo a exigências não raro bizantinas, que está com a sua vida fiscal em ordem. Ao mesmo tempo, para se autoconceder um atestado de inocência política, não se vexa de alegar que o vazamento das declarações de renda de pessoas ligadas ao candidato presidencial do PSDB, José Serra, se explicaria pelos indícios de existência de "um balcão de compra e venda de dados sigilosos", na delegacia do Fisco em Mauá, na Grande São Paulo, com vítimas a granel.

As palavras são do corregedor-geral do órgão, Antônio Carlos D"Ávila. Ele ecoou a posição do secretário da Receita, Otacílio Cartaxo, que disse não acreditar que tenha havido "fins específicos de natureza político-partidária" na devassa dos dados dos companheiros, amigos e familiares do ex-governador Serra, em outubro do ano passado. Tanto assim que, na mesma época e na mesma repartição, 140 outros contribuintes, entre eles os donos das Casas Bahia e a apresentadora de TV Ana Maria Braga, também tiveram os seus registros vasculhados em 320 acessos - dos quais 206 nos computadores de apenas duas servidoras. Destes, 151 não se justificariam.

Para jogar areia nos olhos do público e desmoralizar a denúncia de que Serra foi alvo de uma torpeza com intuitos eleitorais - numa repetição do golpe dos aloprados de 2006, que também o visava -, a cúpula da Receita preferiu se expor à desmoralização, ao mostrar como são porosas as barreiras do outro lado dos seus ávidos guichês que deveriam proteger a privacidade dos cidadãos da bisbilhotice dos próprios servidores públicos. Acionados a toque de caixa pelo governo, inquieto com a frouxidão das suas reações ao escândalo, os hierarcas do Fisco subitamente encontram a verdade que, na versão anterior, demandaria exaustiva investigação.

Essa história se desenrola há três meses. Em maio, a revista Veja informou que operadores da candidatura Dilma Rousseff tratavam de montar um dossiê com evidências comprometedoras para o seu adversário. A notícia custou a cabeça do jornalista que cuidava da assessoria de imprensa da campanha petista - y de otras cositas más. Em julho, o jornal Folha de S.Paulo revelou que um setor da equipe de Dilma estava de posse de cópias de declarações de renda do vice-presidente do PSDB, Eduardo Jorge Caldas Pereira. Na semana passada, enfim, o Estado adiantou que, segundo apurou a Corregedoria-Geral da Receita, foi também violado o sigilo de outros serristas.

Salta aos olhos a quem o golpe sujo poderia interessar. A alegação da Receita, que menciona o comércio de informações confidenciais com "pagamento de propina", em nada altera a substância dos fatos. Os dados passíveis eventualmente de servir de munição à campanha da candidata do presidente Lula podem ter sido oferecidos ou procurados, contra pagamento ou de favor. Em qualquer das hipóteses, a mercadoria chegou ao destino. O acesso a declarações de renda de terceiros - de muitos terceiros, a julgar pelo material clandestino que se vende em plena rua - é uma história à parte. Não tem que ver com a disputa pela Presidência da República.

O que estarrece na série de ilícitos com essa ou aquela intenção é a facilidade com que podem ser cometidos nas tumultuadas entranhas do Fisco. Reportagem publicada domingo neste jornal, com base em depoimentos de analistas tributários e servidores ouvidos no inquérito sobre a violação dos dados do tucano Eduardo Jorge, mostra como senhas individuais de acesso ao acervo de declarações armazenadas em computador passavam de mão em mão e ficavam anotadas em agendas ao alcance de todos quantos passassem pelas mesas dos colegas.

"A segurança dos arquivos da Receita é como queijo suíço, com buraco para tudo", resume o advogado de uma das funcionárias investigadas.

Se, causado por isso ou propiciado por isso, se formou no Fisco "um balcão de compra e venda de dados sigilosos", é de perguntar o que o seu titular, Otacílio Cartaxo, espera para se demitir. Só não é preciso perguntar por que o presidente Lula ainda não mandou demiti-lo.

Dirigente do Incra e mais 19 são presos em operação da PF

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Operação da Polícia Federal prendeu o superintendente do Incra de Mato Grosso do Sul, Waldir Cipriano Nascimento, e outros 19 suspeitos de fraude em lotes da reforma agrária.

De acordo com a investigação, áreas eram reservadas para líderes de movimentos sociais e vendidas. Exonerado, Nascimento negou as acusações.

PF acusa Incra de MS de fraudar reforma agrária

Operação prende o superintendente e mais 19 suspeitos de desviar lotes

Esquema impediu que mais de 400 famílias habilitadas recebessem terrenos a que tinham direito, diz investigação

Rodrigo Vargas

DE CUIABÁ - Lotes da reforma agrária em Mato Grosso do Sul eram reservados por meio de fraudes a líderes de movimentos sociais, vendidos a terceiros e, com a conivência de servidores do Incra, utilizados como ranchos de lazer e pesca.

Essas foram apenas parte das várias irregularidades apontadas pela Polícia Federal após quase oito meses de investigação sobre projetos coordenados pela superintendência regional do Incra.

A PF prendeu ontem 20 suspeitos de integrar o suposto esquema que, segundo o Ministério Público, causou prejuízo de R$ 62 milhões.

Entre os presos está o superintendente regional do Incra, Waldir Cipriano Nascimento (no cargo há pouco mais de um ano), servidores federais, empresários e líderes de movimentos sociais da região de Itaquiraí (MS).

O procurador Marco Antônio Delfino de Almeida disse que as irregularidades envolvem principalmente lotes destinados a assentados da Fetagri (Federação dos Trabalhadores na Agricultura).

Foi identificado ainda o direcionamento irregular de lotes a assentados da CUT e à FAF (Federação da Agricultura Familiar de MS).

"O processo de seleção das famílias beneficiárias, uma atribuição do Incra, foi delegado a movimentos sociais, que passaram a entregar listas prontas. Esse apoderamento é o cerne das irregularidades", disse Almeida.

Segundo a Procuradoria, a suposta quadrilha fraudou o sorteio de 497 lotes em assentamentos do complexo Santo Antônio, em Itaquiraí.

O número representa quase um terço do total de lotes (1.236) criados após investimento de R$ 130 milhões nos projetos: "Os melhores lotes não foram sorteados, ficando reservados aos líderes dos movimentos sociais".

A fraude prejudicou 425 famílias que não receberam seus lotes. A PF flagrou a venda de lotes que eram "regularizados", mediante propina, por servidores do Incra. Dentre eles, vários eram usados como "sítios de lazer".

O que pensa a mídia

Editoriais dos principais jornais do Brasil
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Quarteto Pererê - Trenzinho Caipira

'Jornal do Brasil' circula em papel pela última vez

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Aos 119 anos, diário fluminense passará agora a ter apenas a versão na internet, um recurso para superar os problemas financeiros da empresa

Márcia Vieira / RIO

Circula hoje pela última vez a edição impressa do Jornal do Brasil, fundado há 119 anos, no Rio. De agora em diante, o JB terá apenas a versão na internet, um recurso para superar os problemas financeiros da empresa. O passivo acumulado chega a R$ 800 milhões, em dívidas trabalhistas e fiscais.

A crise financeira se agravou na década de 90 até que, em 2001, a família Nascimento Brito arrendou a marca JB para a Docasnet, empresa de Nelson Tanure. No ano passado, outra marca de jornal arrendada pelo empresário, a Gazeta Mercantil, também deixou de circular.

Na sua página na internet, o JB - que chegou a tirar 230 mil exemplares aos domingos no fim dos anos 60 - lista 50 pontos sobre a nova fase do jornal. Num deles, se vangloria de ser o primeiro jornal 100% digital, garante que 150 pessoas estarão envolvidas no processo digital e que "o Jornal do Brasil está caminhando para uma nova e melhor fase". Mas, na Redação, o clima era de luto. Dos 50 jornalistas que trabalham na casa, só 10 devem ficar na versão digital. Procurado pelo Estado, o empresário Nélson Tanure não quis falar.

A Casa Brasil, no Rio Comprido, na zona norte, onde funcionava parte do jornal, já estava desde ontem com faixa de aluga-se. A Redação da versão digital continuará funcionando no prédio anexo.

Pedro Grossi, que presidia o jornal, foi contra a decisão de acabar com o jornal em papel.

"Não posso avaliar nem fazer juízo sobre a opinião do dono. Ele acha que o tecnológico será mais lucrativo", lamentou. Segundo Grossi, o jornal estava com tiragem de 30 mil exemplares (desde 2008, o JB não era auditado pelo Instituto Verificador de Circulação, IVC).

O custo mensal para colocar o jornal na banca estava em torno dos R$ 3 milhões, disse ele.

"Fico muito triste com o fim do JB, mas torço para que o Tanure consiga dar ao leitor brasileiro um produto de qualidade". O Jornal do Brasil é responsável por edições memoráveis da história da imprensa brasileira, principalmente no período da ditadura militar. Ficou famosa sua edição de 14 de dezembro de 1968, sobre o AI-5.

Para burlar a censura imposta pelos militares, publicou na primeira página, uma fictícia previsão do tempo. "Tempo negro. Temperatura sufocante. O ar está irrespirável. O país está sendo varrido por fortes ventos. Máx.: 38º em Brasília. Mín.: 5º, nas Laranjeiras." Na mesma edição, à direita, uma chamada para uma efeméride: "Ontem foi o Dia dos Cegos".

Também ficou famosa a primeira página do dia seguinte ao golpe militar no Chile, em 1973. Para driblar a censura brasileira que proibia manchetes sobre episódio, o JB fez uma edição sem títulos garrafais, nem fotos. Na primeira página, com o lugar da manchete em branco, foi publicado um longo texto sobre a morte de Salvador Allende, emoldurada apenas pelo serviço de classificados.

A um ausente :: Carlos Drummond de Andrade

Tenho razão de sentir saudade,
tenho razão de te acusar.
Houve um pacto implícito que rompeste
e sem te despedires foste embora.
Detonaste o pacto.
Detonaste a vida geral, a comum aquiescência
de viver e explorar os rumos de obscuridade
sem prazo sem consulta sem provocação
até o limite das folhas caídas na hora de cair.

Antecipaste a hora.
Teu ponteiro enlouqueceu, enlouquecendo nossas horas.
Que poderias ter feito de mais grave
do que o ato sem continuação, o ato em si,
o ato que não ousamos nem sabemos ousar
porque depois dele não há nada?

Tenho razão para sentir saudade de ti,
de nossa convivência em falas camaradas,
simples apertar de mãos, nem isso, voz
modulando sílabas conhecidas e banais
que eram sempre certeza e segurança.

Sim, tenho saudades.
Sim, acuso-te porque fizeste
o não previsto nas leis da amizade e da natureza
nem nos deixaste sequer o direito de indagar
porque o fizeste, porque te foste

Poema do jornal :: Carlos Drummond de Andrade

(Última edição impressa do JB-31/8/2010)

O fato ainda não acabou de acontecer
e já a mão nervosa do repórter
o transforma em notícia.
O marido está matando a mulher.
A mulher ensangüentada grita.
Ladrões arrombam o cofre.
A polícia dissolve o meeting.
A pena escreve.

Vem da sala de linotipos a doce música mecânica.

segunda-feira, 30 de agosto de 2010

O Regresso:: Luiz Werneck Vianna

DEU NO VALOR ECONÔMICO

Com suas ruas emudecidas, a sociedade prepara-se para revisitar o nosso abominável mundo velho

Não está fácil compreender o que anda se passando. Se em 2002, após a vitória eleitoral de Lula, houve quem a recebesse como uma queda da Bastilha, o que era um exagero, perdoável em jovens militantes intelectuais do PT, se vier mais uma vitória agora em 2010, qualquer tentativa de interpretá-la em chave grandiloquente é puro disparate. Nada vai cair, ao contrário, tudo que aí está vai se consolidar e mesmo se aprofundar. Não há paixões soltas nas ruas e nem debates acalorados entre os principais candidatos à sucessão presidencial que desfilam, em tom monocórdico, na TV e nas emissoras radiofônicas seus pontos programáticos em matérias de educação, saúde e segurança, obedientes à pauta que lhes empurram os seus especialistas em marketing eleitoral. Os dois principais candidatos oposicionistas sequer sugerem uma ameaça efetiva às linhas principais do governo e têm declarado em alto e bom som que serão, no fundamental, contínuos a elas.

Tudo isso, mais o fato de tanto Serra como Dilma serem personagens avessos a histrionismos carismáticos, com perfis políticos forjados em temas técnicos da economia e da administração pública, seriam indicações de que há algo de impostado nas manifestações exaltadas das hostes situacionistas, especialmente do presidente de honra do PT e da República, como se esta sucessão importasse um confronto dramático entre duas concepções do mundo. E a partir de considerações desse tipo, a análise chega ao território das coisas indemonstráveis, porque não se pode deixar de cogitar que é Lula, e não Dilma, o candidato às próximas sucessões, agora em 2010, por interposta pessoa, e nas vindouras em carne e osso. E se assim for, o cenário real em que se deve travar a disputa eleitoral não pode ser o do trinômio saúde, educação e segurança, nem o da questão social em geral. Sob esse véu das promessas compadecidas, o que rolaria, de verdade, seria um projeto de poder e de acumulação de mais poder.

A hipótese, vista ao lado de uma série de outros indicadores, não é para ser negligenciada, especialmente quando se considera, no caso de vitória de Dilma, a possibilidade de uma convocação de uma assembleia constituinte, mesmo que de poderes limitados para fins de reformas pontuais, como a tributária e a política. Não se põe de volta ao tubo a pasta de dentes que se extraiu dele. Na eventualidade, toda a obra da Carta de 1988 estará sob risco, em particular o regime de freios e contrapesos que ela criou para impedir a tirania de maiorias eventuais, e sabe-se lá qual modelo de democracia participativa vingaria com a vida associativa, inclusive os sindicatos, vinculada como está às agências estatais.

A ficar com as imagens da Revolução Francesa, são as do 18 Brumário de que estamos mais próximos, quando a nação francesa ao invés de seguir em frente com sua experiência republicana, temerosa dos setores populares, fez a opção de se voltar para o seu passado, retomando, em uma sociedade já prosaicamente burguesa, o mito napoleônico. Aqui, ao que parece, teríamos também um encontro marcado com o nosso passado, com a ressurgência do mito de Vargas, embora, é claro, estejamos em uma cena já esvaziada da carga dramática das lutas anti-imperialistas dos anos 1950 e diligentemente empenhados no aprofundamento da experiência capitalista brasileira sem os obstáculos, externos e internos, que Vargas conheceu e que levaram ao desfecho trágico do seu governo. Melancolicamente, esse "revival" do varguismo não se esquece de recordar o papel de pai dos pobres que lhe colou em sua campanha presidencial largamente vitoriosa; Vargas que, em suas últimas palavras, conclamava a mobilização popular em defesa do seu legado.

Mas por que essa viagem de volta na história, se há e havia um caminho promissor rumo ao futuro, na esteira do movimento de emergência popular, que, com inícios na resistência ao regime autoritário, se espraiou nas décadas seguintes com a conquista da Constituinte, no impeachment de Collor, e na vitória do PT na sucessão de 2002? Por que se retornou ao anacrônico dilema, opondo a democracia formal à substantiva, que grassa em surdina em certos círculos do poder? As respostas podem ser muitas, mas qualquer delas será falsa se não admitir que o princípio em vigência é o de acumular poder pelo poder. E para quem está à testa do Estado, em especial com as tradições de estadofilia que nos caracterizam, por que não fazer dele o centro estratégico da sua política?

Retorna-se, então, e agora com um mito vivo, ao modelo da modernização, aos seus ícones intelectuais e ao tema do nacional-desenvolvimentismo. Como no Império, findo o tempo em que a sociedade, no período regencial, ganhou alguma autonomia diante do seu aparato burocrático, podemos constatar que o Regresso, assim em maiúsculas, como se dizia em meados do século XIX, abre caminho, restaurando a majestade do Estado. A sociedade regride ao aceitar passivamente a verticalização a que estão sujeitas as questões que lhe dizem respeito, abdica do moderno, da autonomia de suas organizações, e até parece indiferente ao fato de as oligarquias tradicionais mais recessivas e cúpidas estarem instaladas nos postos de mando. Pachorrentamente, docemente resignada, com suas ruas emudecidas, a sociedade se prepara para revisitar o nosso abominável mundo velho.


Luiz Werneck Vianna é professor-pesquisador do Iesp-Uerj. Ex-presidente da Anpocs, integra seu conselho institucional. Escreve às segundas-feiras

PT Fisco :: Ricardo Noblat

DEU EM O GLOBO

"Precisamos abrir mais a campanha. Do jeito que está não dá mais"

(Fernando Henrique Cardoso, reclamando de Serra)


A senha para decifrar a história da violação do sigilo fiscal de Eduardo Jorge, vice-presidente do PSDB, e de mais três pessoas ligadas ao partido pode estar no livro do jornalista Amaury Ribeiro Jr., que, segundo ele mesmo, detonaria as pretensões de José Serra de se eleger presidente da República. E cadê o livro? Sumiu. O gato comeu.

Em maio último, quando a revista Veja publicou que setores da campanha de Dilma Rousseff haviam montado um dossiê contra Serra e outros tucanos emplumados, o PT se apressou em dizer que não havia dossiê algum. O que a Veja chamara de dossiê seria um livro inacabado de Amaury com o título provisório de Porões da Privataria.

A reportagem da Veja provocou a demissão do jornalista Luiz Lanzetta, responsável pela assessoria de imprensa da campanha. Juntamente com Amaury, ele procurara em Brasília o ex-delegado da Polícia Federal Onézimo Sousa para lhe propor que espionasse Serra e alguns membros da própria campanha de Dilma.

Foi o que confirmou Onézimo em depoimento no Congresso. Lanzettanega. Blogs simpáticos ao PT e a Dilma anunciaram então que o livro de Amaury acabaria divulgado na internet a cada semana, um capítulo. Mas até aqui só foi divulgada a apresentação do livro que irá descrever os porões da privatização na era FHC.

Entre as figuras de destaque na narrativa de Amaury estão o ex-tesoureiro de campanhas de Serra e de Fernando Henrique, Ricardo Sérgio de Oliveira, e mais Verônica, Alexandre Bourgeois e Gregório Marin Preciado, respectivamente filha, genro e primo de Serra. Todos eles teriam se envolvido com negócios suspeitos.

Sabe-se agora que Ricardo Sérgio e Gregório Marin, além de Eduardo Jorge e Mendonça de Barros, o exministro do governo FHC encarregado das privatizações, fazem parte da lista de 140 pessoas cujos sigilos fiscais foram violados em outubro do ano passado na delegacia da Receita em Mauá, no ABC paulista.

O PT controla o sindicato dos auditores da Receita desde o final dos anos 90. Com a eleição de Lula em 2002, tentou emplacar um dos seus simpatizantes, Deomar Moraes, na época chefe do serviço de inteligência da Receita, no poderoso cargo de secretário da Receita, até então ocupado pelo economista Everardo Maciel, ligado ao ex-PFL.

Foi Antonio Palocci, antes mesmo de tomar posse como ministro da Fazenda, que não deixou. Deomar escreveu uma carta agradecendo o apoio do sindicato. Everardo foi substituído por Jorge Rachid, um dos quatro secretários adjuntos. Mal sentou na cadeira, Rachid passou a ser alvo de ataques do que é conhecido na Receita como o PT Fisco.

Suportou seis meses de intenso tiroteio. Por fim, ganhou a confiança de Lula. Mas perdeu o lugar depois que Guido Mantega sucedeu a Palocci no ministério. Lina Vieira, a nova secretária da Receita, foi indicada por Nelson Machado, fundador do PT, fiscal do estado de São Paulo e atual secretárioexecutivo do Ministério da Fazenda.

Lina escancarou as portas da Receita para o PT Fisco. Presenteou-o com todos os cargos de chefia. Mas durou pouco. Foi vítima do mau desempenho de sua equipe e da crise econômica que provocou a queda da arrecadação. Saiu atirando em Dilma, a quem acusou de ter intercedido em favor da família Sarney, investigada pela Receita.

Otacílio Cartaxo, o atual secretário da Receita, é um técnico sem alinhamento partidário. Por ordem superior, admitiu a gravidade do episódio de Mauá e se disse perplexo. Não esperem, porém, que ele vá além disso. Antes de tudo, Cartaxo preza a própria carreira e detesta entrar em bola dividida.

No que depender governo, pois, jamais se saberá se o MauáGate serviu em parte para engordar o dossiê do PT contra Serra ou o inédito livro de Amaury. Assim como jamais se desvendou o caso dos aloprados que em 2006 montaram o primeiro dossiê contra Serra. São histórias que terminaram sem nunca ter chegado ao fim.

É de não acreditar :: Paulo Brossard

DEU NA ZERO HORA

Faz algum tempo, importante jornal paulista divulgou a ocorrência da violação do sigilo fiscal de pessoas próximas a um dos candidatos à Presidência da República e de ex-presidente da República e, como se isso não bastasse, a Receita Federal haver calado em todas as línguas, como se o silêncio não fosse pior do que o esclarecimento integral do caso. Como a Constituição, no inciso XII, do seu artigo 5º, assegura entre os direitos e garantias fundamentais, a brasileiros e estrangeiros residentes no país, a inviolabilidade de dados pessoais, ampliando desse modo direitos e garantias historicamente consagrados entre nós, dei-me pressa a comentar o fato, tanto mais quando ele estava no centro de um dos serviços de maior responsabilidade da administração, com acesso praticamente ilimitado sobre os dados de todo mundo e mais alguém.

Ora, jornais da semana passada, em sua primeira página, com o relevo ajustado à relevância do noticiado, acrescentavam que a Receita vinha blindando funcionários que, comprovadamente, haviam tido acesso ao violado sigilo fiscal. Tudo que se disser a respeito da gravidade do caso será pouco, não só porque pessoas tiveram seus direitos constitucionais violados, como o fato de a Constituição da República para a mais alta administração parecer valer menos que uma portaria. Se a cúpula administrativa do país não tem nenhum respeito por pessoas de presumida idoneidade, que se poderá imaginar em relação ao comum dos mortais. Aliás, diz a sabedoria popular que cesteiro que faz cesto faz um cento, de modo que o mal do fato difundido recaia sobre o próprio serviço e seja ilimitado. E a cobertura dispensada, segundo a própria notícia, aos até agora identificados como envolvidos, fere em cheio o próprio serviço. Desnecessário lembrar que o Código Penal, entre os crimes que elenca, não se esqueceu de arrolar o de violação de sigilo funcional. Diante dos fatos narrados com tamanha publicidade, parece sobrarem motivos para a ação saneadora do Ministério Público.

Viro a página para ocupar-me de outro assunto, que também me parece expressivo, ainda que, como o anterior, revelador do que pode parecer uma deformação do que se supõe seja ou deva ser a administração pública. Segundo notícias correntes, o sindicato dos professores públicos do Estado teria convidado candidatos ao governo do Rio Grande para uma entrevista ou apreciação acerca do ensino público esquecendo a governadora do Estado, que, é notório, é candidata à reeleição. Ora, há pessoas que aplaudem a governadora gaúcha, há pessoas que lhe são indiferentes, como há as que lhe são antipáticas e até hostis. E isto se pode dizer que se aplica a qualquer autoridade, por melhor que seja, ou por pior que pareça ser. E suponho essa variedade de opiniões a respeito de governantes não começou agora, nem vai terminar tão cedo, se é que possa esgotar-se em algum dia. Mas o que me parece pouco civil, ou pouco educado, uma vez que se trata do mundo do ensino e da educação que é mais ampla que aquele, é excluir a pessoa de uma candidata exatamente a que hoje é a governadora e que pretende voltar a ser. Será que existe tamanha inimizade entre o magistério estadual e a governadora, a ponto de caracterizar aquilo que as leis denominam de inimizade capital a contrastar com a amizade íntima? Se isto ocorrer, o que admito tão só para argumentar, seria o caso de dizer que mal vai o setor, que é dos mais relevantes no presente e no futuro de mais de uma geração.

Outrossim, não me parece que um sindicato ou que outro nome tenha possa posicionar-se com tamanho simplismo ou radicalismo ou personalismo. E se esses sentimentos medram a ponto de dominar e impor uma fisionomia a um setor da administração, exatamente o voltado à educação, não será temerário supor que ele mais se aproxime ou identifique com a antieducação do que com a educação que liberta, redime, eleva heróis e modelos, na postura cívica e pessoal, na família e na sociedade, no presente e no futuro. Ou teremos chegado a tamanho desconserto mental, sentimental ou humano que o veto oposto seja natural e apropriado?


*Jurista, ministro aposentado do STF

A igualdade não é uma bala de prata :: José Graziano da Silva

DEU NO VALOR ECONÔMICO

Um governo comprometido com a justiça social garante, ao menos, um ponto de partida igual para todos

Diferente da esfera política - onde a democracia requer, de saída, a equivalência consagrada no binômio a cada cidadão um voto - na esfera econômica o pleito da igualdade dissolve-se em utopia se não for materializado em metas de avanços progressivos. Não existe bala de prata nesse caminho.

O rumo de um governo comprometido com a justiça social consiste em perseguir, permanentemente, o ideal republicano de garantir, ao menos, um ponto de partida igual para todos. No entanto, a igualdade não pode ser tomada como um fetiche de boa sociedade. Comunidades mais pobres e primitivas se mostravam menos desiguais que as modernas economias do nosso tempo. É discutível, porém, que aquele padrão de vida fosse preferível ao atual. O legado da história nos deixa uma opção: avançar e corrigir.

No Brasil, o desafio hoje é assegurar às pessoas mais pobres direitos e acessos que permitam ascender a um padrão de vida mais digno. Ainda que isso esteja distante da "igualdade absoluta", diferentes pesquisas são unânimes em mostrar a importância dos ganhos obtidos nesse percurso até agora.

Em países em desenvolvimento como o Brasil é imperativo crescer para poder gerar empregos; e os empregos formais representam hoje a primeira aproximação indispensável de um Estado de Bem-Estar Social. Mais de 13 milhões brasileiros ingressaram no mercado de trabalho formal entre 2003 e 2010, um aumento de quase 50% segundo levantamentos da Caged/Ministério do Trabalho.

Reverter a engrenagem da exclusão acentuada nos anos 80 e 90 é outro requisito incontornável. Dados da PNAD constatam forte redução da pobreza. A proporção de brasileiros com renda mensal per capita inferior a meio salário mínimo caiu de 43% da população em 2003 para 29% em 2008. Em números absolutos, mais de 24 milhões de pessoas superaram a pobreza no período.

A classe media também aumentou. De 43% da população em 2003 passou a 54% em 2009, de acordo com a FGV. A desnutrição infantil em crianças menores de cinco anos foi reduzida de 13% para 5%, entre 2003 e 2008, segundo o Ministério da Saúde.

O primeiro Objetivo de Desenvolvimento do Milênio, de reduzir à metade a fome e a pobreza extrema até 2015, já foi alcançado e consagrou algumas ferramentas de política social enfeixadas no guarda-chuva do Fome Zero. Voltadas para a promoção da segurança alimentar, incluem ações que vão do Bolsa Família à agricultura familiar e que se tornaram uma referência para iniciativas semelhantes em diversos países em desenvolvimento.

Essas são evidencias de uma estratégia bem sucedida de reconciliação do crescimento com justiça social, o que, como sabemos, não decorre de automatismos de mercado, exigindo políticas de Estado para vingar.

O Brasil cresceu em média 3,6% desde 2003 (apesar do resultado negativo de 0,2% em 2009, decorrente da crise internacional). Ao contrário dos ciclos anteriores de expansão, desta vez a "divisão do bolo" ocorreu simultaneamente aos avanços do PIB. Podemos dizer que finalmente experimentamos o gosto de um ciclo de forte crescimento econômico com desenvolvimento social. E parece que os brasileiros gostaram dessa mistura, a julgar pelo grande respaldo da opinião pública ao Governo e a figura do presidente da República ainda que em final de mandato.

No entanto, nem tudo são flores. Em seu relatório regional, o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) destaca a contribuição de programas de transferência condicionada de renda ao combate à pobreza e à fome, mas também nota que a desigualdade continua muito alta no Brasil, assim como em toda a América Latina e Caribe, considerada a região mais desigual do planeta.

A elevada desigualdade brasileira decorre da má distribuição dos ativos que permitem gerar rendas, especialmente capital e terra. Se quisermos diminuir o fosso que hoje separa os ricos dos pobres e promover uma distribuição mais justa da renda temos que mudar as condições de acesso e usufruto a esses ativos.

O Brasil tem progredido no equacionamento da questão agrária, de modo especial no apoio à agricultura familiar. Também tem obtido sucesso em melhorar o acesso dos filhos dos mais pobres à educação e saúde, o que se espera possa ter um impacto futuro na distribuição da renda (infelizmente só na próxima geração).

Mas há que se reconhecer que ainda é preciso avançar muito no principal instrumento que permitirá uma melhoria imediata sobre a distribuição dos fluxos de renda: uma reforma tributária que aumente a progressividade dos tributos e reforce laços de solidariedade tratando de forma desigual aos desiguais.

Hoje fazemos o inverso: abstraindo os sonegadores, todos brasileiros pagam os mesmos impostos sobre bens de consumo e isso penaliza os mais pobres. Cálculos do professor Amir Khair, um dos maiores especialistas na matéria, mostram que quem ganha até dois salários mínimos no Brasil paga 49% em tributos e os que ganham acima de 30 apenas 26%.

A isenção de impostos sobre produtos da cesta básica e a redução do IPI para materiais de construção e outros bens de consumo popular - decisões tomadas pelo governo Lula no auge da crise mundial e que podem ser emuladas no ICMS dos estados - sinalizam um caminho a ser institucionalizado. Como observa Khair em artigo recente, "a desoneração gera aumento do poder aquisitivo, com elevação do consumo reprimido de outros produtos, compensando a perda aparente de arrecadação".

Khair também chama a atenção para a necessidade de elevar alíquota do imposto sobre heranças, tributada com alíquota de 4%, inferior ao cobrado internacionalmente, que pode superar em alguns países a 50%. O imposto sobre herança é outro debate a ser retomado se quisermos agir sobre as estruturas que reproduzem a desigualdade e permitir que as novas gerações nasçam num berço menos desigual.

E não vamos nos esquecer que o Brasil não tem imposto equivalente ao IPTU para a propriedade rural, permitindo que os grandes detentores de patrimônios rurais, em alguns casos formados por milhares de hectares, continuem sem pagar impostos.

Deter a concentração de terra e promover o acesso mais equilibrado a ativos, não apenas terra, mas também infraestrutura, financiamento e capacitação técnica, é outro degrau básico de aproximação do Estado de Bem Estar Social.

Também falta um conjunto de leis que regule a relação entre a agroindústria e os fornecedores, como já existe nos países desenvolvidos, para garantir a participação de autônomos e agricultores familiares nas cadeias produtivas.

Ações como essas ajudam a consolidar, como aconteceu com a inclusão do direito à alimentação na Constituição, os avanços conquistados nos últimos anos para evitar retrocessos. Esses são os desafios do novo ciclo, para que o Brasil continue avançando no rumo de uma sociedade mais igualitária.


José Graziano da Silva é representante regional da FAO para America Latina e Caribe

Opinião - Nara Leão