sábado, 4 de novembro de 2017

Opinião do dia: João Domingos

Ulysses Guimarães e Tancredo Neves costumavam dizer que a política é a arte de construir consensos a partir das divergências. Dessa prática eles fizeram a sua profissão de fé. Na política, enfrentaram a ditadura, cada um a seu modo, sempre na tentativa de construir o consenso. Tancredo aceitou as regras do regime para acabar com ele. Uniu-se a dissidentes e venceu a eleição realizada no último Colégio Eleitoral dos militares. Não assumiu a Presidência porque adoeceu e morreu. Mas deixou em seu lugar o vice José Sarney, que seguiu sua orientação e convocou a Assembleia Constituinte de 1987/88, responsável pela Constituição atual, a mesma Constituição que deu a Ulysses a condição política de dizer que tinha “ódio e nojo à ditadura”.

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João Domingos é jornalista, ‘Tucanos amadores’, O Estado de S. Paulo, 4/11/2017.

TSE julga Bolsonaro e Lula por anteciparem campanha

TSE vai julgar Bolsonaro e Lula por antecipação de campanha

Ministério Público Eleitoral acusa deputado e ex-presidente de adiantar início da campanha eleitoral; eles afirmam que não podem ser responsabilizados por apoio

Rafael Moraes Moura / O Estado de S.Paulo

BRASÍLIA - O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o deputado federal Jair Bolsonaro (PSC-RJ) entraram na mira do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) por propaganda eleitoral antecipada. A Corte Eleitoral deve julgar ainda neste ano dois processos que envolvem a divulgação na internet de vídeos que fazem referência às candidaturas de Lula e Bolsonaro ao Planalto. Os dois, que lideram as pesquisas, já anunciaram publicamente a intenção de concorrer em 2018.

Na Corte Eleitoral, a avaliação é a de que esses julgamentos devem estabelecer as balizas que nortearão o entendimento do tribunal sobre o tema nas eleições de 2018. A legislação permite a propaganda eleitoral somente a partir de 15 de agosto do ano da eleição e prevê multa de R$ 5 mil a R$ 25 mil para quem violar a restrição.

O primeiro caso que está na pauta é o de Bolsonaro. Em 21 de setembro, o TSE iniciou o julgamento sobre a retirada da internet de vídeos de apoio ao deputado fluminense. O ministro Admar Gonzaga, que havia solicitado mais tempo para analisar o caso, deve devolver o pedido de vista nos próximos dias.

O Ministério Público Eleitoral (MPE) questiona a publicação no YouTube de vídeos que mostram o parlamentar sendo recepcionado em aeroportos por simpatizantes. Para o MPE, as gravações fazem “clara menção à pretensa candidatura” do deputado. Além de acusar Bolsonaro de ter conhecimento prévio das gravações e pedir a retirada do material, o MPE quer que o deputado se abstenha de veicular peças de conteúdo similar até o início do período eleitoral do ano que vêm.

Bem-vindos a 2018

Legislação sobre antecipação de campanha é dúbia e multas previstas são tão baixas frente ao poderio econômico candidaturas, que nada deve mudar

Daniel Falcão* / O Estado de S.Paulo

Após a votação da Câmara dos Deputados que rejeitou, pela segunda vez, denúncia penal apresentada pela Procuradoria-Geral da República contra o Presidente Michel Temer, a imprensa vaticinou: começou a corrida ao Palácio do Planalto nas eleições de 2018.

A pouco menos de um ano da eleição, este cenário está confuso, como é de se esperar. Diversos nomes são especulados pelos partidos, mas a definição final dos candidatos, por meio das convenções partidárias, só sairá em entre 20 de julho e 5 de agosto de 2018.

Apesar do ainda obscuro panorama, possíveis candidatos já se posicionam, fazendo caravanas, apresentações e verdadeiros comícios visando à aproximação com os eleitores e à busca dos holofotes dos veículos da mídia.

Diante desse fenômeno, começam a aparecer ações judiciais apresentadas pelo Ministério Público Eleitoral com o objetivo de punir os possíveis presidenciáveis pela prática de propaganda eleitoral antecipada. Nessas ações, há requerimentos para retirada de vídeos postados em mídias sociais nos quais os pré-candidatos são recepcionados por apoiadores.

A legislação eleitoral brasileira caracteriza-se pela tentativa incansável de tutelar os eleitores e por sua notória dubiedade. Quando trata sobre a propaganda antecipada não é diferente.

O Congresso Nacional, ao fazer a legislação, acredita piamente que o eleitor é um indivíduo que deve participar do processo de escolha de governantes sob uma proteção normativa que em poucos casos faz sentido em pleno século XXI.

Quanto à ambiguidade, a Lei n. 9.504/1997 veda a propaganda eleitoral realizada antes de 15 de agosto do ano eleitoral que envolva “pedido explícito de voto”. O mesmo dispositivo, paradoxalmente, permite que o político faça antes da campanha eleitoral “menção à pretensa candidatura”, exalte suas “qualidades pessoais”, peça “apoio político” e proceda à “divulgação da pré-candidatura, das ações políticas desenvolvidas e das que se pretende desenvolver”.

Além disso, as multas pecuniárias previstas na legislação são, na maior parte das vezes, tão baixas diante do poderio econômico das campanhas presidenciais que não se tornaram uma barreira a condutas irregulares dos candidatos. Dessa forma, percebe-se que mesmo diante das ações do MPE na Justiça Eleitoral, os postulantes provavelmente continuarão a promover-se na imprensa e nas mídias sociais, o que nos coloca nos primeiros passos da maratona eleitoral.
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* Professor doutor da USP e do Instituto Brasiliense de Direito Público

PMDB já busca alianças com petistas em 8 Estados

Partido desistiu da ideia de barrar alianças regionais com o PT, legenda com o qual rompeu no plano nacional desde o impeachment de Dilma Rousseff; objetivo é se manter como dono das maiores bancadas no Congresso na próxima legislatura

Igor Gadelha e Julia Lindner / O Estado de S.Paulo

BRASÍLIA - Sem um candidato próprio à Presidência da República em 2018, o PMDB definiu como prioridade nas eleições do próximo ano a manutenção do seu poder de fogo no Congresso Nacional. Para isso, o partido desistiu da ideia de barrar alianças regionais com petistas e liberou peemedebistas para se coligarem nos Estados com o PT, legenda com o qual rompeu no plano nacional desde o impeachment da presidente cassada Dilma Rousseff, em 2016.

A aliança PT-PMDB deve ocorrer em ao menos oito Estados. O objetivo da sigla é se manter como dono das maiores bancadas na Câmara e no Senado na próxima legislatura (2019-2022).

Presidente nacional do PMDB, o senador Romero Jucá (RR) disse ao Estadão/Broadcast que as alianças regionais podem ser feitas com qualquer legenda. "Não há nenhum tipo de proibição. Cada Estado tem uma realidade diferente", disse. O senador admitiu que membros do partido já estão conversando com integrantes do PT nos Estados e avaliou que não há "nenhum problema nisso". Segundo o dirigente, a questão será oficializada na reunião da executiva do partido, ainda sem data definida para ocorrer.

Presidente do Senado e tesoureiro da sigla, Eunício Oliveira (CE) é um dos que devem se aliar a uma chapa petista para se reeleger. Ele já afirmou que apoiará uma eventual candidatura de Luiz Inácio Lula da Silva no ano que vem e deve fechar aliança com o governador Camilo Santana (PT) no Ceará. “O PMDB é plural. Não tem essa história de não poder fazer aliança com A ou com B”, disse.

PT e PMDB já negociam aliança em seis estados

Partidos deixam rixa do impeachment para trás, de olho em 2018

Renan e Eunício, antes contra Dilma, estão com Lula

Afastados desde o impeachment de Dilma Rousseff, PT e PMDB já negociam alianças eleitorais locais em pelo menos seis estados: Alagoas, Ceará, Minas Gerais, Paraná, Piauí e Sergipe. Em alguns casos, se conseguir ser candidato, o ex-presidente Lula, defensor da tese de que o afastamento de Dilma foi um “golpe”, deve dividir o palanque com políticos que inclusive votaram a favor da saída da petista, como os senadores peemedebistas Renan Calheiros (AL) e Eunício Oliveira (CE).

Do ‘golpe’ ao palanque

E ao menos seis estados, PT deve se aliar a PMDB e a políticos que apoiaram o impeachment

Cristiane Jungblut e Patricia Cagni / O Globo

BRASÍLIA - No plano nacional, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva deverá martelar a tecla de que o impeachment de Dilma foi um “golpe”. Mas, quando subir nos palanques de ao menos seis estados brasileiros, o petista vai estar lado a lado com os “golpistas” que sempre atacou.

Os exemplos mais notórios são os dos senadores peemedebistas Renan Calheiros e Eunício Oliveira, que deram votos favoráveis à saída da ex-presidente, afastada por 61 a 20 no Senado em 30 de agosto de 2016. Mas não é só nas Alagoas de Renan ou no Ceará de Eunício que as conversas entre petistas e peemedebistas estão aceleradas para alianças nas eleições de 2018. Além desses dois, há negociações em Minas Gerais, Piauí, Sergipe e Paraná.

Ao menos nesses seis estados, PT e PMDB, além de outros partidos da base que apoiaram o impeachment, já deflagraram negociações para alianças locais. Em Minas Gerais, se Dilma conseguir a vaga para disputar o Senado, o PMDB pode integrar a sua chapa. A explicação para essa aparente contradição de princípios é, acima de tudo, pragmática. Em especial no Nordeste, onde Lula chega a ter mais de 50% segundo as pesquisas de intenção de voto, a aliança interessa aos dois lados: para o petista, ter candidatos fortes pode impulsionar ainda mais suas possibilidades; para os “ex-golpistas”, ir contra um político tão popular pode complicar as eleições.

O líder do PT na Câmara, deputado Carlos Zarattini (SP), disse que no nível nacional não há negociações, mas confirmou que existem conversas informais nos estados onde os dois partidos já tinham aliança, que perduraram apesar do impeachment e da implosão das relações em Brasília.

Dez prefeitos de capitais podem concorrer em 2018

João Pedro Pitombo / Folha de S. Paulo

SALVADOR - João Doria (PSDB-SP) fugiu de ovadas e foi aplaudido por empresários no Nordeste. ACM Neto (DEM-BA) foi à vaquejada de Serrinha, no sertão. Marcus Alexandre (PT-AC) palestrou em cidades do Alto Acre. Carlos Amastha (PSB-TO) percorreu o norte do Tocantins.

Os quatro são prefeitos de capitais em seus respectivos Estados e, com viagens a outras cidades e regiões, miram voos mais altos em 2018.

A cinco meses do fim do prazo para desincompatibilização para quem quer disputar as eleições, pelo menos dez prefeitos de capital são cotados para concorrer a governos estaduais, ao Senado e até à Presidência.

Caso o número se confirme, será um recorde. Desde a redemocratização, 20 prefeitos de capital deixaram seus cargos para tentarem ser governadores ou senadores; seis deles em 2010, ano em que houve mais renúncias.

A história mostra que deixar o cargo traz riscos: desde 1989, destes 20 prefeitos, 9 perderam nas urnas. Foi o caso de Tarso Genro (PT), de Porto Alegre, em 2002, e Iris Rezende (PMDB), de Goiânia, em 2010 –ambos tentaram o governo estadual.

'Terra arrasada' coloca em xeque caciques do Rio Grande do Norte

João Pedro Pitombo / Folha de S. Paulo

SALVADOR - Com o governador investigado e o seu principal adversário atrás das grades, o Rio Grande o Norte vive um cenário de "terra arrasada" para as eleições de 2018.

Se há três anos Robinson Faria (PSD) e Henrique Eduardo Alves (PMDB) duelavam em uma das disputas mais acirradas do país, hoje ambos enfrentam reveses que devem mudar completamente o quadro eleitoral no Estado, tradicionalmente dominado por quatro clãs: os Alves, os Maia, os Rosado e os Faria.

Eleito em 2014, Robinson Faria vive seu momento mais difícil: foi denunciado pela Procuradoria Geral da República por suspeita de obstrução de Justiça no âmbito da Operação Dama de Espadas, que investigou fraudes na Assembleia Legislativa.

No campo administrativo, enfrenta uma grave crise financeira que resultou em atrasos no pagamento aos servidores –os salários de setembro terminarão de ser pagos apenas em novembro. "A questão eleitoral se tornou acessória diante das adversidades da crise que o governo enfrenta", diz o vice-governador Fábio Dantas (PC do B).

Merval Pereira: A velha política

- O Globo

Pelo jeitão que as alianças políticas para a eleição de 2018 estão tomando, dificilmente veremos uma renovação profunda dos quadros políticos nacionais, por mais que essa seja a vontade do cidadão comum.

Os partidos políticos, que fazem as regras eleitorais, já estão retomando velhos hábitos, e as alianças partidárias continuam refletindo interesses regionais que têm mais a ver com vantagens pessoais do que com programas de governo.

Ao anunciar, terça-feira passada, que estava “perdoando” os golpistas, Lula deu o sinal esperado para reagrupar antigos interesses fisiológicos, separados momentaneamente no impeachment da ex-presidente Dilma. Ela, aliás, vai ser a grande abandonada desta campanha.

Embora insista em que a anulação do impeachment na Justiça é possível, Dilma, pelo jeito, não tem a menor chance de ganhar o respaldo político para tarefa tão ingrata. Mesmo que tenham surgido denúncias de que o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha andou distribuindo dinheiro para ganhar votos contra Dilma, houve também informações de que os executivos da JBS entraram em campo do outro lado, ajudando a comprar votos em favor de Dilma.

E ninguém esquece a presença de Lula na suíte presidencial de um hotel em Brasília, tentando ganhar votos contra o impeachment, tendo ao lado Joesley Batista e suas burras cheias de dinheiro. Não bastassem essas dificuldades, Lula já havia dito dias atrás que o eleitorado se sentiu traído pela ex-presidente quando ela começou a tentar fazer o reajuste das contas públicas com um ministro da Fazenda saído das hostes adversárias.

João Domingos: Tucanos amadores

- O Estado de S.Paulo

O PSDB é hoje um partido sem identidade e sem rumos, que busca o estelionato eleitoral

Ulysses Guimarães e Tancredo Neves costumavam dizer que a política é a arte de construir consensos a partir das divergências. Dessa prática eles fizeram a sua profissão de fé. Na política, enfrentaram a ditadura, cada um a seu modo, sempre na tentativa de construir o consenso. Tancredo aceitou as regras do regime para acabar com ele. Uniu-se a dissidentes e venceu a eleição realizada no último Colégio Eleitoral dos militares. Não assumiu a Presidência porque adoeceu e morreu. Mas deixou em seu lugar o vice José Sarney, que seguiu sua orientação e convocou a Assembleia Constituinte de 1987/88, responsável pela Constituição atual, a mesma Constituição que deu a Ulysses a condição política de dizer que tinha “ódio e nojo à ditadura”.

Se estivessem vivos, certamente Ulysses e Tancredo estariam estarrecidos com o que está acontecendo com o PSDB. Como é que um partido que tem todas as condições de construir o consenso em torno de um candidato de centro, com possibilidade de sair vitorioso na disputa pela sucessão de Michel Temer, pode arrumar uma crise interna grave como a atual, que pode até levar ao primeiro grande racha da legenda?

A impressão que se tem é de que o PSDB é formado por amadores da política, mais preocupados com um pequeno detalhe aqui, outro ali, com o que o eleitor do PT pensa dele hoje, do que com o que o eleitor dele pensa sobre o futuro do País.

Duas eleições recentes, uma no Brasil, outra na França, deveriam servir de lição para o PSDB numa hora tão importante quanto a atual. Em primeiro lugar, a eleição para a prefeitura do Rio. O centro político se dividiu em pelo menos quatro candidaturas. Com isso, os extremos, representados pelo vencedor, Marcelo Crivella, do PRB, e por Marcelo Freixo, do PSOL, passaram para o segundo turno. Caso Pedro Paulo, do PMDB, e Carlos Osório, do PSDB, tivessem se unido, eles poderiam ter chegado a cerca de 25% dos votos, cerca de sete pontos porcentuais acima de Freixo. Disputariam o segundo turno com Crivella com chances totais de vitória. Como não construíram o consenso, ficaram no meio do caminho.

Míriam Leitão: O presidenciável

- O Globo

O ministro Henrique Meirelles sempre sonhou com a Presidência desde que se candidatou em 2002 a deputado. Eleito, pelo PSDB, ele não exerceu um dia de mandato porque foi convidado pelo ex-presidente Lula para a presidência do Banco Central. O presidenciável Meirelles atrapalha o ministro da Fazenda de forma até imediata, porque pode prejudicar a aprovação das medidas para limitar o déficit.

O déficit do ano que vem tem chances de ficar nos R$ 159 bilhões, mas para isso é preciso que sejam aprovadas as medidas que foram enviadas esta semana pelo governo ao Congresso. São políticas que encontrarão a barreira da pressão dos funcionários públicos e da pouca boa vontade dos parlamentares de comprarem essa briga em época em que já se vive um clima de pré-campanha. Se Meirelles for visto como um competidor para os partidos que pensam em lançar candidatos próprios, mesmo da base, haverá menos interesse ainda em aprovar essas medidas.

Os deputados terão que brigar com as muitas categorias de servidores em nome de uma causa abstrata demais: evitar que o déficit supere R$ 159 bilhões. Não é em nome do equilíbrio fiscal, é algo bem menos concreto. Como explicar isso para o eleitor? Agora, um ingrediente a mais se soma ao problema: o fato de que no comando dessas propostas, e da política econômica, está um ministro que diz que sabe que é presidenciável.

Julianna Sofia: Empurrãozinho

- Folha de S. Paulo

O desatino da ministra Luislinda Valois (Direitos Humanos) pode se tornar o empurrãozinho que faltava ao governo Michel Temer para engatar já uma reforma ministerial. O centrão e uma ala da "cozinha" do Palácio do Planalto pressionam o presidente a redimensionar o espaço dos aliados na Esplanada dos Ministérios depois da derrubada das duas denúncias contra o peemedebista na Câmara.

Sem o reequilíbrio das forças de apoio, julgam que o governo enfrentará dificuldades para obter os votos necessários às medidas impopulares de ajuste fiscal –principalmente as propostas que afetam o funcionalismo, com aumento de contribuição e adiamento de reajuste salarial. Servidores federais ameaçam paralisar atividades para forçar o Congresso a barrar o pacote do Executivo.

A mudança ministerial também seria condição para levar adiante a –cada dia mais improvável– reforma da Previdência. Com menos descontentamento na base governista, haveria chances de votar, pelo menos na Câmara, um texto desidratado ainda em 2017. Restam cerca de sete semanas para lograr o feito.

Hélio Schwartsman: Cadeia para quem precisa

- Folha de S. Paulo

A prisão é um castigo ultrapassado que as sociedades modernas utilizam mal. Ela até surgiu como um avanço humanitário, já que o encarceramento substituía a pena capital. Mas o tempo passou, o mundo e a criminologia evoluíram, sem que o sistema jurídico, em especial a parte relativa à atribuição de penas, acompanhasse.

Longos períodos de prisão têm modesto efeito sobre as taxas de criminalidade e alto custo social, tanto para o pagador de impostos como para condenados e suas famílias. No caso brasileiro, há o agravante de os presídios terem se tornado os celeiros nos quais organizações criminosas recrutam e treinam seus quadros. Por qualquer análise racional, cadeias deveriam ter se tornado um último recurso, reservado a delinquentes violentos cuja liberdade represente risco físico para a sociedade.

Roteiro para um ano difícil – Editorial: O Estado de S. Paulo

O governo continuará batalhando no próximo ano para realizar os gastos obrigatórios, conter o Orçamento dentro do limite oficial – um déficit primário de R$ 159 bilhões – e, se possível, aplicar um pouco mais de dinheiro no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). O projeto de lei orçamentária enviado ao Congresso no fim de agosto previa um buraco de R$ 129 bilhões nas contas primárias. Uma atualização do projeto foi remetida ao Legislativo segunda-feira passada, com o saldo negativo revisto e novas projeções tanto da receita como de alguns grupos de despesas. Para maior segurança, o Executivo editou duas medidas provisórias (MPs), uma com aumento de Imposto de Renda sobre fundos exclusivos, outra com providências mais duras: o reajuste salarial de várias categorias do funcionalismo será adiado de 2018 para 2019 e a contribuição previdenciária de alguns grupos de servidores passará de 11% para 14%. Este aumento valerá para a parcela dos salários acima do limite máximo fixado para os benefícios da Previdência.

Representantes do funcionalismo já se manifestaram contra o adiamento do reajuste salarial e a elevação das contribuições. Protestos foram anunciados e já se mencionou a hipótese de greve. Também deverá haver resistência no Congresso e o Executivo, mais uma vez, terá de negociar a aprovação das mudanças. Mas quase certamente haverá problemas também na atualização da proposta orçamentária.

Reação de ministra é exemplo da cultura do privilégio – Editorial: O Globo

A afirmação de Luislinda Valois de que é submetida a ‘trabalho escravo’ por receber R$ 33 mil reflete o distanciamento entre o mundo dos servidores e o país real

Ao reclamar por não poder somar a aposentadoria de desembargadora com os proventos de ministra dos Direitos Humanos, Luislinda Valois demonstrou a que ponto servidores públicos podem chegar na defesa de privilégios. Impedida de embolsar mensalmente R$ 61,4 mil, devido ao dispositivo constitucional, nem sempre cumprido, que limita os vencimentos do funcionalismo ao salário de ministro do Supremo Tribunal Federal (R$ 33,7 mil), Luislinda, indicada pelo PSDB, se disse vítima de “trabalho escravo”. Uma afirmação descabida.

Revelado pelo “Estado de S.Paulo”, o pleito da desembargadora aposentada baiana é exemplo da cultura do privilégio desenvolvida no funcionalismo público em geral. Por trás da reação da ministra tucana está o entendimento arraigado de que seria muito justo receber R$ 61,4 mil por mês, dos quais a parcela de R$ 30,4 mil refere-se ao benefício da aposentadoria como desembargadora.

Efeito Mariana – Editorial: Folha de S. Paulo

Dois anos após a tragédia que soterrou o subdistrito de Bento Rodrigues, em Mariana (MG), e enlameou a bacia do rio Doce com uma montanha de rejeitos do tamanho do Corcovado, vai se provando acertada a iniciativa de criar um órgão independente para comandar a mitigação do maior desastre da mineração mundial.

A Fundação Renova, que começou a funcionar dez meses depois do rompimento da barragem de Fundão, tem dotação mínima de R$ 11 bilhões da Samarco e suas controladoras (Vale e BHP Billiton) para reparações e compensações até 2030. Já gastou R$ 1,8 bilhão.

Em pouco mais de um ano, a Renova reuniu considerável portfólio de realizações. Enviesado, porém.

A recuperação do ambiente afetado caminha mais rapidamente que o previsto. Um conjunto de 101 tributários do Doce teve suas margens estabilizadas e recompostas. O esforço de revegetação progride bem, mesmo onde o lodo derramado permanece sobre o solo.

Coluna do Estadão: O Estado de S. Paulo

Declaração de Torquato barra mudança na PF

A polêmica envolvendo o comentário do ministro da Justiça, Torquato Jardim, interrompeu uma nova tentativa de trocar o diretor-geral da PF, Leandro Daiello, em curso no Planalto. Os defensores da mudança recuaram porque a troca na PF é sensível, por ser associada a movimentos para estancar a Lava Jato, para ser efetuada em meio à crise motivada por declaração do ministro de que policiais do Rio são sócios do crime organizado. As articulações contrariam o Ministério da Justiça e ocorrem após Daiello já ter decidido que fica até 2018.

» Bunker. As conversas sobre a mudança no comando da PF são tocadas no gabinete do ministro Eliseu Padilha e envolvem o delegado Fernando Segovia. O nome dele chegou ao chefe da Casa Civil pelo ministro Augusto Nardes, do TCU.

» Com a palavra. Padilha diz que a informação “não tem fundamento”. A Coluna não conseguiu localizar o ministro Augusto Nardes.

» Jogo... O ministro Torquato Jardim recebeu um pedido do colega Moreira Franco para que recuasse da polêmica declaração sobre a PM no Rio. No dia seguinte, Torquato manteve o que disse e se aprofundou em entrevista ao Globo.

» ...Jogado. Com esse movimento, o ministro levantou em alguns gabinetes a suspeita de que decidiu tentar evitar que lhe impusessem um nome para o comando da PF. Se insistirem na troca, ele já tem uma versão para sua saída.

Painel: Folha de S. Paulo

Por 2018, Marina faz reunião com PSB e prega terceira via ‘contra a polarização’ na eleição

Sonháticos 2.0 Marina Silva, da Rede, teve um encontro com a cúpula do PSB nesta semana e pregou a formação de uma terceira via para 2018. Segundo Pedro Ivo, um dos dirigentes da sigla mais próximos à ex-senadora, os partidos trataram da “importância de constituir um bloco fora da polarização” com “alianças programáticas”. Marina ainda não se assume candidata ao Planalto nem dentro da própria legenda, mas deu sinais claros de que tentará reeditar a aliança que a levou às urnas em 2014.

O meu time Participaram da reunião nomes do PSB que fazem oposição a Temer, como o presidente da sigla, Carlos Siqueira, o governador Paulo Câmara (PE) e o ex-governador Renato Casagrande (ES). O partido não bateu martelo e tem conversado com outras legendas de seu campo, como o PT.

Animei Mesmo sabendo que não tem exclusividade nas negociações, a ex-senadora saiu animada do papo com os socialistas. Disse a aliados que foi “a melhor conversa que teve com o PSB desde as eleições de 2014”.

Logo mais Adilson Barroso, presidente do PEN, sigla que mudará a alcunha para Patriotas na esperança de ser fiadora da candidatura de Jair Bolsonaro (PSC-RJ) ao Planalto, diz que o deputado deve apresentar até janeiro seu programa de governo.

Minha praia Criticado por assumir publicamente que entende pouco de economia, Bolsonaro começou a abordar o assunto em suas redes sociais. “Precisamos de Banco Central independente para definir metas, diminuir juros, reduzir inflação e obter previsibilidade econômica”, escreveu nesta sexta (3).

Bolsonaro é um ‘populista perigoso’

Entrevista: Francis Fukuyama

O professor de Stanford, que criou uma aula específica em que aborda o populismo no seu curso sobre democracia, acompanha de perto o que se passa no Brasil, é um defensor intransigente da Lava-Jato e defende que precisa haver mais protestos

Guilherme Amado / O Globo

STANFORD - Francis Fukuyama está preocupado com o Brasil. O cientista político, professor da Universidade Stanford, nos Estados Unidos, e um dos mais célebres intelectuais de sua geração, incluiu o Brasil no rol dos países em que ele vê o risco da ascensão de um representante do que chama de “Internacional Populista”: políticos de extrema-direita com pouco ou nenhum apreço pela democracia e que seduzem o eleitorado com promessas fáceis para problemas complexos. O impacto das descobertas da Lava-Jato sobre a contaminação do sistema político, diz Fukuyama, pode levar os eleitores brasileiros a optarem por alguém que prometa ter mão de ferro contra a corrupção. Na semana passada, Jair Bolsonaro, o intrépido deputado do PSC do Rio de Janeiro, tornou-se um dos personagens sobre quem Fukuyama discorre na nova aula sobre populismo que, em tempos de Donald Trump, decidiu incluir em seu tradicional curso sobre democracia. Um dos expoentes do pensamento conservador, o professor é enfático sobre Bolsonaro: “Seria um grande desastre se ele fosse eleito. Ele parece ser um populista genuinamente perigoso”. Em entrevista ao GLOBO, em sua sala no Centro de Democracia, Desenvolvimento e Estado de Direito, que dirige, em Stanford, Fukuyama criticou a proteção do Congresso a Michel Temer, lamentou a falta de protestos contra a corrupção este ano no Brasil, nos mesmos moldes dos que ocorreram em 2015 e em 2016, e, aos descrentes sobre o futuro da democracia, fez um alerta: “As pessoas precisam entender que a democracia depende delas. Precisam sair às ruas, protestar contra a corrupção e se insurgir contra o populismo”.

• Perto de se completarem quatro anos de Lava-Jato, qual sua visão sobre a operação?

Eu tenho sido em geral muito mais positivo sobre a operação do que alguns brasileiros e mesmo observadores internacionais porque sei que não há muitos países com Judiciários que consigam fazer a lei valer para todos. Na América Latina, isso tem sido especialmente problemático. No Brasil, agora parece que todo mundo é corrupto. Não acredito que isso seja algo novo. Acho que sempre foi desse jeito. Pelo menos, agora você tem um sistema judiciário que está colocando alguns deles na cadeia. E você tem a imprensa livre, que está fazendo um trabalho muito bom, expondo a corrupção e apoiando o sistema judicial. Eu tenho conhecimento das acusações que políticos da direita e da esquerda fazem contra o Judiciário, dizendo que há razões políticas por trás das acusações. E sei que há críticas por influência política no Judiciário e por terem deixado Michel Temer (no cargo). Mas tudo é relativo e, em relação ao padrão predominante na América Latina, é bom o Brasil ter feito o que fez. O que eu considero perigoso é que foi revelado um nível tão grande de corrupção que todos vão ficando cínicos e podem pensar que não há como fazer a lei valer para todos e que é necessária uma solução populista para acabar com o sistema e recomeçar tudo. Isso é muito perigoso.

Box reúne toda a produção de Vinicius de Moraes

Quarteto. Manuel Bandeira, Chico Buarque, Tom Jobim e Vinicius de Moraes 


Ubiratan Brasil / O Estado de S.Paulo


Lançada em 1968, a Obra Poética de Vinicius de Moraes (1913-1980) buscava reunir a quase totalidade da escrita produzida pelo autor até então, mas o volume seguia uma catalogação que rompia com a cronologia, ainda que tomasse por base uma certa ordem temporal da escrita. Assim, destacavam-se arranjos geográficos, que associavam poemas a algumas cidades onde viveu o poeta, como Los Angeles, Paris, Montevidéu.

A opção provocava uma lista de problemas, como omissões ou desvalorização de trabalhos grandiosos, o que só foi ajustado em 2004, com o lançamento de Poesia Completa e Prosa (Nova Aguilar), sob a coordenação de Eucanaã Ferraz. É dele também a organização do box lançado agora pela Nova Fronteira, Vinicius de Moraes, continuação do primeiro trabalho e que reúne (em dois volumes) toda sua produção em música, poesia, prosa e teatro.

Estabelecida, portanto, a magnífica escrita de Vinicius em ordem cronológica, é possível notar com mais clareza sua evolução e, principalmente, como o poeta passou de uma evidente preocupação religiosa no início da carreira para temas mais mundanos, como o cotidiano das pessoas e, principalmente, as relações amorosas.

“A obra de Vinicius de Moraes é um longo aprendizado do amor”, escreve Eucanaã na introdução de outra obra organizada por ele, Todo Amor, lançada pela Companhia das Letras. “Em seus primeiros livros, a temática amorosa viu-se embaçada pela religiosidade do jovem atormentado por sentimentos e desejos que traziam consigo a nódoa do pecado. Otávio de Farias referiu-se a esse momento de poesia de Vinicius como o de uma luta entre a pureza impossível e a impureza inaceitável. Foi aos poucos que o poeta conquistou maturidade e desenvoltura nos planos afetivo e estético.”

Fernando Pessoa: Reticências

Arrumar a vida, pôr prateleiras na vontade e na ação.
Quero fazer isto agora, como sempre quis, com o mesmo resultado;
Mas que bom ter o propósito claro, firme só na clareza, de fazer qualquer coisa!

Vou fazer as malas para o Definitivo,
Organizar Álvaro de Campos,
E amanhã ficar na mesma coisa que antes de ontem — um antes de ontem que é sempre...
Sorrio do conhecimento antecipado da coisa-nenhuma que serei.
Sorrio ao menos; sempre é alguma coisa o sorrir...
Produtos românticos, nós todos...
E se não fôssemos produtos românticos, se calhar não seríamos nada.
Assim se faz a literatura...
Santos Deuses, assim até se faz a vida!

Os outros também são românticos,
Os outros também não realizam nada, e são ricos e pobres,
Os outros também levam a vida a olhar para as malas a arrumar,
Os outros também dormem ao lado dos papéis meio compostos,
Os outros também são eu.
Vendedeira da rua cantando o teu pregão como um hino inconsciente,
Rodinha dentada na relojoaria da economia política,
Mãe, presente ou futura, de mortos no descascar dos Impérios,
A tua voz chega-me como uma chamada a parte nenhuma, como o silêncio da vida...
Olho dos papéis que estou pensando em arrumar para a janela,
Por onde não vi a vendedeira que ouvi por ela,
E o meu sorriso, que ainda não acabara, inclui uma crítica metafisica.
Descri de todos os deuses diante de uma secretária por arrumar,
Fitei de frente todos os destinos pela distração de ouvir apregoando,
E o meu cansaço é um barco velho que apodrece na praia deserta,
E com esta imagem de qualquer outro poeta fecho a secretária e o poema...
Como um deus, não arrumei nem uma coisa nem outra...

Trio Madeira Brasil e Roberta Sá - Mandingo