• "A gente está lutando contra o destino e lutando contra o tempo. A gente tem o programa eleitoral daqui a cinco dias"
• "Pelo que conversei com Marina, pelo que li dela e pelo que a conheço, ela na não é contra o agronegócio"
Raquel Ulhôa – Valor Econômico
BRASÍLIA - Após rompimento de 22 anos, o senador Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE) reaproximou-se do então governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), em 2012. Foi uma aliança local, para a eleição à Prefeitura de Recife. Em outubro de 2013, Jarbas anunciou da tribuna do Senado apoio à união entre Campos e a ex-ministra Marina Silva, que classificou como "um episódio antológico da História com H maiúsculo".
Agora, com a morte de Campos, Jarbas defende sua substituição por Marina, vice em sua chapa. Mais do que isso, cobra do PSB e dos partidos que integram a coligação "Unidos para o Brasil" (PSB, PPS, PPL, PRP e PHS) pressa nessa decisão. "O que a gente perdeu na tragédia tem de ganhar com iniciativas", disse, em entrevista ao Valor.
Para Jarbas, não há dúvida que Marina deve disputar a Presidência da República em substituição de Campos pela "confiança recíproca" existente entre eles. "Política tem lógica. E a lógica da política nesse caso específico é a ascensão rápida de Marina [de candidata a vice] para presidente", afirma.
O senador disse que há "preconceito" em relação a Marina e admitiu que sua candidatura trará "ônus e bônus". Por isso, ela precisa deixar claro que não é contra o agronegócio e assumir os compromissos de Campos.
"Ela precisa arrebentar o preconceito, a indiferença e o medo. Ela tem que ser uma candidata leve, tem que dizer que, se ganhar a eleição no Brasil, não vai ter nenhuma tragédia. Ao contrário, vai ser um Brasil decente e correto. Vai ser um Brasil em que não apenas o homem que mora na periferia será ouvido. Vai ser ouvido o homem que mora na periferia, a classe média e o empresário."
Valor: O PSB quer decidir o futuro da chapa presidencial depois do sepultamento do governador Eduardo Campos. O senhor cobra pressa. Por quê?
Jarbas Vasconcelos: É hora de chorar, mas também de trabalhar. Temos que compatibilizar as duas coisas. A coligação tem dez dias para resolver. Política tem lógica. E a lógica da política nesse caso específico é a ascensão rápida de Marina [de candidata a vice] para candidata a presidente. Que ela ascenda para a posição de Eduardo.
Valor: O senhor não tem dúvida de que Marina deve assumir?
Jarbas Nenhuma, nenhuma, nenhuma. Pela confiança recíproca que existia. Havia uma confiança entre os dois. Ele me disse isso. Eu vi de público e pessoalmente, ele conversando comigo. Então é natural. A candidatura da Marina pode causar algum dano aqui, acolá... Vai causar algum dano aqui e acolá. Pode desmanchar alguma coisa que estava feita. Mas política é risco. Tem que ser feito. Então eu defendo a ascensão rápida, o mais rápido possível, que não seja cumprido o prazo. A gente tem programa eleitoral terça-feira. Daqui para terça-feira, faltam cinco dias. Então a gente tem que correr com isso.
Valor: O programa deveria começar com a chapa definida?
Jarbas: Acho. Por que não? Por que não tirar esse final de semana para resolver isso? Se a gente perder um ou dois programas eleitorais será ruim. Só há 19 programas. As inserções já podem ser gravadas na segunda-feira com o novo candidato, para veiculação na terça.
Valor: E o vice? Deve ser do PSB?
Jarbas: Tem que fazer uma escolha casada. Marina ascende e escolhe o vice dentro da coligação. Eu acho que Marina, que está de passagem pelo PSB, deve disputar a presidência, com uma pessoa do PSB de vice. Ela não esconde de ninguém que está de passagem pelo PSB, até criar a Rede. Mas não quero me meter nisso, porque eu não pertenço à coligação.
Valor: Já falou com o PSB sobre essa urgência?
Jarbas: Liguei cedo para Geraldo Júlio [prefeito de Recife e um dos coordenadores regionais da campanha de Campos], única pessoa de coordenação que está aqui, porque a chapa majoritária está toda em São Paulo. Seguiram o Paulo Câmara [candidato do PSB ao governo], o Raul Henry [deputado do PMDB, candidato a vice na chapa de Câmara] e o Fernando Bezerra Coelho [candidato ao Senado]. Eu disse que o momento era muito grave e me coloquei à disposição dele. A gente está lutando contra o destino e lutando contra o tempo. O tempo não é favorável. A gente tem o programa eleitoral daqui a cinco dias.
Valor: O senhor não teme que a Marina enfrente muita dificuldade para manter a coesão dos aliados de Campos? Inclusive no PSB?
Jarbas: Ela pode desarrumar coisas já arrumadas, mas, por outro tempo, vai trazer bônus. Tem ônus e tem bônus. Tem coisas que são negativas, mas tem coisas que são muito positivas, como o capital eleitoral dela entre a juventude, na periferia das cidades, entre as pessoas mais humildes, no setor de igreja, de religião.
Valor: Qual discurso Marina deve assumir para conquistar setores que têm resistência a ela, no meio empresarial e no agronegócio, por exemplo?
Jarbas: Pelo que conversei com Marina, pelo que li dela e pelo que a conheço, Marina não é contra o agronegócio. Ela tem que explicar a questão do agronegócio, que nunca foi bem explicada. Pode colocar na minha boca a frase que eu queria que Eduardo dissesse: ninguém pode ganhar eleição sem o agronegócio nem ninguém administra o Brasil sem o agronegócio. Eu havia pedido ao Eduardo para cunhar essa frase.
Valor: Mas ele não chegou a ser tão explícito...
Jarbas: Acho que não faz mal nenhum que agora isso seja esclarecido. Mesmo que não seja ela, mas que a linha do programa eleitoral seja essa.
Valor: A resistência do setor produtivo à ex-ministra não está restrita ao agronegócio.
Jarbas: Há também um preconceito. Embutido nisso é um preconceito. Ela precisa arrebentar o preconceito, a indiferença e o medo. Ela tem que ser uma candidata leve. Tem que dizer que, se ganhar a eleição, não vai ter nenhuma tragédia. Ao contrário, vai ser um Brasil decente e correto. Vai ser um Brasil que vai ser ouvido. Não vai ser ouvido só o homem que mora na periferia. Vai ser ouvido o homem que mora na periferia, a classe média e o empresário. Ela deve assumir todos os compromissos do Eduardo, até porque ele assumiu ao lado dela.
Valor: Mas tinham divergências.
Jarbas: Tinham, mas sempre disseram que as divergências estavam muito conversadas. Vendiam abertamente a imagem de uma dupla que estava afinada. Que ninguém jogasse no choque entre os dois. Isso ficou muito claro.
Valor: Os dois sempre foram críticos do presidencialismo de coalizão e defensores de uma "nova política". Como Marina, se eleita, conseguiria governar?
Jarbas: Ela não precisa de uma base ampla, com toma-lá-dá-cá. Base ampla só dá problema. Ela precisa da base necessária. Essa é a verdadeira governabilidade, a nova política.
Valor: Se eleita, teria condições de garantir segurança jurídica e medidas atrativas a investimentos?
Jarbas: Não tenho a menor dúvida. O problema dela é com o agronegócio. Com os grandes e os pequenos, que têm medo de ser prejudicados. Esse tem que ser o foco dela: assumir e explicitar a garantia do cumprimento de contratos, da segurança jurídica. Quanto à capacidade de atrair investimentos, se ela quer uma economia sustentável, vai ter que ir atrás. Ela tem um discurso muito claro contra tudo isso que está aí. Contra a falta de investimentos, contra o avanço do Brasil e o desarranjo da democracia.
Valor: Qual o impacto da morte do ex-governador na eleição de Pernambuco, já que o candidato do PSB, Paulo Câmara, dependia do apoio dele?
Jarbas: No momento em que colocar no ar as gravações que Eduardo tinha feito para ele, elas não vão operar milagres, mas vão esclarecer as posições. O Paulo Câmara vai aparecer como o candidato de Eduardo. Eu já tinha certeza de que ele iria crescer. Isso agora vai se juntar à emoção e à comoção. Ele vai crescer e com amplas chances de ganhar.
Valor: Com a lacuna deixada na política de Pernambuco, o senhor pensa em retomar o protagonismo político no Estado?
Jarbas: Posso fazer isso. Vou conversar com a chapa majoritária, vou conversar com o prefeito de Recife, Geraldo Júlio, com outras lideranças do PSB local, com Roberto Freire [presidente do PPS], que é daqui de Pernambuco e tem influência no Estado. A gente precisa consolidar as coisas e avançar.
Valor: O senhor ficou rompido com Eduardo Campos por mais de 20 anos...
Jarbas: Comecei com o avô dele, Miguel Arraes, e ele era muito jovem. Quando ganhei a eleição para prefeito do Recife, ele tinha 20 anos e foi trabalhar comigo na prefeitura [Campos foi chefe de gabinete do secretário de governo, Fernando Correia]. Depois trabalhamos na eleição de doutor Arraes, em 86. Vieram as desavenças, mas depois a gente ficou com um ponto de vista muito comum com relação ao PT. A união começou por aí. Quando eu disse num programa que ele, agarrado com o PT, não iria para lugar nenhum. Eduardo foi o político mais brilhante de sua geração. Com uma inteligência, determinação e capacidade de trabalho admiráveis. O desaparecimento dele é praticamente uma perda irreparável para a política brasileira. E, sobretudo, para os familiares e amigos. Era um exemplar chefe de família e tinha um círculo de amizades muito grande.
Valor: Marina tem chance de ser eleita?
Jarbas: Tem chance e deve ser feito de imediato. Temos de correr com isso, para ganhar tempo. O que a gente perdeu na tragédia tem de ganhar com iniciativas.