O Estado de S. Paulo
Diante de nós está a evidente tarefa de
desagregar o consenso nacional-populista, esvaziando a base de massas do
autoritarismo
Menos desglobalizada do que parece, a
política de diferentes países continua atravessada por riscos, tensões e até
conjunturas críticas que podem ser comparadas, como as que, nas últimas
semanas, marcaram as duas maiores democracias das Américas. Por aqui nos
livramos da ameaça do segundo mandato do governante nacional-populista, quando
costuma tomar forma não propriamente uma tradicional ditadura militar, mas um
regime de controle estrito das alavancas do Estado e das instâncias da
sociedade civil. Mais ao norte, nos Estados Unidos, desmentindo previsões
sombrias, Joe Biden e seu partido ganharam tempo precioso até as eleições de
2024, livrando-se o presidente do destino que se reserva aos lame ducks,
os governantes enfraquecidos em final de mandato.
Trata-se de dois países cujas circunstâncias, segundo insight do cientista político Jairo Nicolau, estão no ponto máximo de proximidade, a começar pela radical divisão da sociedade – e dos eleitores – e pela presença de atores com vocação subversiva. Em ambos os casos, líderes de extrema direita, com séquito de massas e traços de um fascismo reformulado, ou de um pós-fascismo, tomaram o lugar da direita constitucional, ameaçando sem nenhum pudor o mecanismo da alternância. Voto eletrônico ou impresso, eleições centralizadas ou descentralizadas, nada disso importa. O script é monotonamente previsível, os resultados só valem se o autocrata vencer.