quinta-feira, 30 de junho de 2011

Opinião - Fernando Henrique Cardoso: Partidos

"As vozes dos setores mais vigorosos da oposição se estiolaram, entretanto, nos muros do Congresso e este perdeu força política e capacidade de ressonância. Os partidos se transformaram em clubes congressuais, abandonando as ruas; muitos parlamentares trocaram o exercício do poder no Congresso por um prato de lentilhas: a cada nova negociação para assegurar a “governabilidade”, mais vantagens recebem os congressistas e menos força político-transformadora tem o Congresso.

Pois bem, a imensa maioria destes grupos – sem excluir as camadas de trabalhadores urbanos já integrados ao mercado capitalista – está ausente do jogo político-partidário, mas não desconectada das redes de internet, Facebook, YouTube, Twitter, etc. É a estes que as oposições devem dirigir suas mensagens prioritariamente, sobretudo no período entre as eleições, quando os partidos falam para si mesmo, no Congresso e nos governos. Se houver ousadia, os partidos de oposição podem organizar-se pelos meios eletrônicos, dando vida não a diretórios burocráticos, mas a debates verdadeiros sobre os temas de interesse dessas camadas.

Mas não é só isso: as oposições precisam voltar às salas universitárias, às inúmeras redes de palestras e que se propagam pelo país afora e não devem, obviamente, desacreditar do papel da mídia tradicional: com toda a modernização tecnológica, sem a sanção derivada da confiabilidade, que só a tradição da grande mídia assegura, tampouco as mensagens, mesmo que difundidas, se transformam em marcas reconhecidas. Além da persistência e ampliação destas práticas, é preciso buscar novas formas de atuação para que a oposição esteja presente, ou pelo menos para que entenda e repercuta o que ocorre na sociedade. Há inúmeras organizações de bairro, um sem-número de grupos musicais e culturais nas periferias das grandes cidades, etc., organizações voluntárias de solidariedade e de protesto, redes de consumidores, ativistas do meio ambiente, e por aí vai, que atuam por conta própria. Dado o anacronismo das instituições político-partidárias, seria talvez pedir muito aos partidos que mergulhem na vida cotidiana e tenham ligações orgânicas com grupos que expressam as dificuldades e anseios do homem comum. Mas que pelo menos ouçam suas vozes e atuem em consonância com elas. "

Fernando Henrique Cardoso, sociólogo e ex-presidente. O papel da oposição. Revista Interesse Nacional , n º 13 – abril-junho, 2011.

A Homenagem do PSDB pelos 80 anos de FHC

Gritos de “FHC, FHC, FHC..”, palmas e um parabéns pra você cantado por todo o auditório. Foi assim que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso foi recebido, nesta quinta-feira(30/06), no auditório Petrônio Portela, no Senado, para a homenagem do PSDB aos seus 80 anos. Governadores e representantes do partido, como os líderes no Senado, Alvaro Dias, e na Câmara, Duarte Nogueira, fizeram parte da mesa principal do evento.

O presidente nacional do PSDB, deputado Sérgio Guerra(PE), abriu a cerimônia falando sobre o orgulho do partido em realizar a homenagem: “Esta é uma homenagem que o PSDB faz com muito orgulho e satisfação, com todos os amigos se reencontrando em torno de FHC. Este é o reconhecimento da obra, trabalho e vida do grande líder FHC, que sintetiza um grande período da vida brasileira”, disse Sergio Guerra.

A atriz Fernanda Montenegro, mestre de cerimônia, se disse honrada por “se somar ao sentimento de gratidão também compartilhado por muitos brasileiros. Não sou e nunca fui militante partidária, mas esta é uma hora especial”. A atriz leu um trecho da carta da presidente Dilma Roussef elogiando FHC.

A platéia lotada assistiu a vídeos preparados pelo partido contando a trajetória de Fernando Henrique e destacando declarações do ex-presidente como essa: “Valeu a pena ter dedicado toda a minha vida à política. Creio que foi possível ter colaborado para o País.. A democracia está mais consolidada. Conseguimos avanços indiscutíveis. Apesar das adversidades, fizemos o possível porque o fundamental para governar não é a popularidade, mas o respeito conquistado. É preciso manter os pés no chão com os olhos abertos ”. Em outro vídeo intitulado ‘uma vida em muitos tempos’, FHC diz “Aos 80 anos, FHC diz que se sente de bem com a vida e com o mundo”.

O governador de Alagoas, Teotônio Vilela, falou em nome dos governadores tucanos, destacando a luta de FHC em prol das Diretas Já e o papel fundamental do ex-presidente na implantação do Plano Real. “Depois de tudo que FHC fez, destaco meu orgulho de brasileiro ao testemunhar um líder disposto a reiventar-se, a descobrir novos mundos a partir dos 80 anos. Ele nos aponta o futuro com a mesma jovialidade dos seus vinte e poucos anos. Nós é que estamos sendo homenageados pelo seu exemplo, sua coragem, sua alma inovadora e profundidade intelectual”, disse.

Políticos de outros partidos também fizeram questão de homenagear o ex-presidente: “É um momento histórico. Muitos podem estranhar a minha presença neste ato pela minha filiação partidária, mas reconheço na trajetória política de FHC um homem comprometido com os interesses do povo e do País”, disse o presidente da Câmara, deputado Marco Maia(PT/RS).

O presidente do ITV, Tasso Jereissati, disse que FHC é um dos maiores estadistas da história do Brasil. ”Uma das figuras mais emblemáticas do nosso partido. É difícil encontrar um homem público tão aberto a novas ideias. A sua posição foi sempre a de nunca ceder diante de um aplauso imediato, de nunca se render às tentações quando estava em jogo o futuro da nação . Essa é a sua marca ” .

O ministro da Defesa, Nelson Jobim, ministro da Justiça no governo FHC, ressaltou a transparência do ex-presidente na sua relação com o poder: “ Ele nos mostrou que a relação com o poder não se confunde com a pretensão e o autoritarismo. Só os ignorantes e inseguros são autoritários. Se cheguei até aqui na vida política por causa de FHC” .

O ex-governador de São Paulo e presidente do Conselho Político do PSDB, José Serra, lembrou a perda de Paulo Renato e disse que o tributo a FHC mostra a força do PSDB como um partido que pode fazer muito pela construção do País. ”FHC nos ensinou que é preciso ter valores, ter lado, apontar as mazelas adversárias e falar a todos neste nosso País. Sempre quis unir os brasileiros. Um exemplo de decoro, dedicação. E é por isso que todos nós o amamos”.

O senador Aécio Neves (PSDB/MG) , que está de licença médica, enviou uma declaração em vídeo : “ FHC é um ser plural. Para mim três facetas são marcantes: um homem de Estado, o grande pensador e o amigo. Se vivemos em um país melhor é por causa de sua capacidade e determinação. Vejo com enorme alegria que começa a haver, não apenas de seus aliados, mas de grande parte dos brasileiros, o reconhecimento em relação à relevância do seu papel na construção desse Brasil que estamos vivendo hoje. Não se trata mais de homenagear o homem e a sua obra, o que estamos fazendo é resgatando a verdade sobre um tempo ” .

Fernando Henrique Cardoso falou sobre os desafios do País, disse que é preciso melhorar a qualidade do ensino brasileiro; encontrar uma economia que se preocupe com o meio ambiente e dar voz aos que não têm: “ Não podemos ter a pretensão de que iremos dar a receita ou comandar. É preciso ter a sabedoria de ouvir e compreender as vozes que não ecoam aqui. Ouvir quem não tem voz ainda. Este é o desafio”.

FHC também falou, emocionado, que não tinha palavras para agradecer a homenagem.” Essa festa foi quase íntima para mim. A essa altura da vida nada é ridículo e fiquei muito tocado. Vi tanta gente falando coisas tão bonitas que me perguntei:eu já morri?. É engraçado se sentir um morto vivo, com tantas homenagens. Me sinto mais jovem hoje e, é com esse renascimento aos 80 anos, que tentarei com humildade seguir os conselhos que recebi aqui hoje. O meu impulso agora é ser amado e amar, e eu sinto que sou amado e feliz”, disse FHC, aplaudido por mais de mil pessoas presentes à homenagem.

Quando Chico Buarque pedia voto para FHC

Manchetes de alguns dos principais jornais do Brasil

O GLOBO

Cabral diz que vai 'rever conduta' e agora defende código de ética
Dilma cede à base e libera emendas
Pão de Açúcar na mira dos investidores

FOLHA DE S. PAULO

Hacker violou e tenta vender e-mails de Dilma
BC aumenta a projeção de inflação; juros devem subir
Grupo Casino compra US$ 1 bi em ações do Pão de Açúcar
Chávez cancela cúpula latina por razões de saúde
Senado quer tirar mandato de político que criar partido

O ESTADO DE S. PAULO

Ministro ataca bancos por não apoiarem fusão no varejo
Saúde de Chávez adia cúpula
Fifa se irrita ao perder poder sobre obras
Base aliada paralisa votações e faz ameaças

VALOR ECONÔMICO

Governo dá sinal verde à operação Diniz-Carrefour
Irrigação vai exigir US$ 1 tri até 2050
A tensa cordialidade da fronteira
Perda de eleitores aumenta a resistência do PT a Marta

ESTADO DE MINAS

Negociações mais difíceis por reajuste
Dilma prorroga liberação de emendas para conter rebelião

CORREIO BRAZILIENSE

Consumidor paga, mas luz e telefone pioram
Para acalmar aliados, Dilma prorroga validade de emendas
Cúpula é suspensa devido à saúde de Chávez
União infla gasto com pessoal, mas investimento cresce só 1%

ZERO HORA (RS)

Planalto amarra pacote para mudar previdência

JORNAL DO COMMERCIO (PE)

Oposição critica participação do BNDES em fusão
Doença de Chávez cancela encontro na Venezuela

Cabral diz que vai 'rever conduta' e agora defende código de ética

Ao romper um silêncio de quase duas semanas desde que vieram à tona suas delicadas relações com empresários que têm direta ou indiretamente negócios com o Estado do Rio, o governador Sérgio Cabral afirmou ontem, em entrevista à rádio CBN, que assume o compromisso de rever sua conduta e até propôs a elaboração de um código de ética para governantes. Ele se defendeu das críticas de beneficiar empreiteiras e disse que jamais misturou assuntos públicos e privados. ""Vamos construir um código juntos, estabelecer os limites. Tem um código nacional e deve ter nos estados. Adoro Direito Comparado", disse.

Cabral promete rever conduta

Governador propõe amplo debate para estabelecer limites e a criação de um código de ética

Fábio Vasconcelos, Luiz Ernesto Magalhães e Ruben Berta

Ao falar pela primeira vez sobre a tragédia no Sul da Bahia, que há 13 dias expôs suas relações próximas com empresários, incluindo Fernando Cavendish, dono da Delta Construções - uma das empreiteiras que mais têm obras no estado -, o governador Sérgio Cabral defendeu ontem um amplo debate sobre ética e propôs a criação de um código de conduta para ele mesmo cumprir. Em entrevista à Rádio CBN, Cabral se defendeu das críticas e disse que jamais misturou assuntos públicos e privados.

- Sempre procurei separar minha vida privada da pública. De fato há uma discussão sobre isso, e quero assumir também esse debate de quais são os limites. Quero assumir o compromisso de rever minha conduta. Vamos construir um código juntos. Há um código nacional, se não me engano feito no final do governo Fernando Henrique, e deve haver em outros estados. Adoro direito comparado. Vamos ver o que há em outros estados e no mundo.

No dia 17, Cabral embarcou no jatinho de outro empresário, Eike Batista, para a festa de aniversário de Cavendish num resort em Porto Seguro. Lá, no entanto, o helicóptero - pilotado por Marcelo Mattoso de Almeida, dono do resort - caiu, matando sete pessoas do grupo, entre elas a namorada de Marco Antônio Cabral, filho do governador.

Entre 2007 e 2010, a Delta ganhou contratos que chegaram a R$1 bilhão no estado. Ontem, O GLOBO revelou que o Tribunal de Contas do Estado encontrou 51 procedimentos irregulares em contratos da empresa no interior do estado, de 2002 a 2007. Os processos após 2007, já na gestão de Cabral, ainda se encontram em análise.

Cabral cita dados oficiais da Delta

Ao justificar o volume de obras que a Delta tem no estado, o governador repetiu informações divulgadas pela construtora num comunicado publicado nos jornais de ontem e também no site da empresa. Entre os dados citados por Cabral está o de que, há 11 anos, 80% do faturamento da construtora se referia a obras no Rio e que hoje esse índice seria menos de 25%. Ele argumentou ainda que conheceu o proprietário da Delta muito antes de ser eleito governador do estado.

- Ela (a Delta) cresceu no Brasil inteiro. Está em dezenas de estados. É uma empresa do Rio e tem 20 mil empregados no Brasil - disse, repetindo outra informação do comunicado.

O governador argumentou que o crescimento econômico do estado levou a um aumento no volume de obras públicas. E argumentou que outras empreiteiras também têm obras no Rio. Citou, por exemplo, a Odebrecht, que integra o consórcio que constrói a Linha 4 do metrô.

Cabral lembrou também que a Odebrecht participa da reforma do Maracanã para a Copa do Mundo de 2014, orçada em R$931,8 milhões. A empresa na verdade não está sozinha na empreitada. Ela integra o Consórcio Maracanã Rio 2014, que reúne ainda outras duas empreiteiras: Andrade Gutierrez e a própria Delta.

- O que tenho mais ouvido quando me encontro com empresários de outros estados é que o Rio vive uma dinâmica de crescimento muito rara em outras partes do Brasil. Todas as construtoras ganham, todas as empresas ganham.

Sobre os incentivos fiscais que o governo dá até a empresas com processos ou já condenadas na Justiça, Cabral argumentou que pelo menos a metade foi concedida antes de tomar posse, em 2007. E que fazem parte de uma estratégia política para atrair grandes empresas para o Rio:

- Essa disputa por empresas ocorre em diversos estados.

Sobre a crise com os bombeiros, que exigem aumento de salários, Cabral disse que exagerou quando chamou de vândalos os manifestantes que invadiram o Quartel Central da corporação, no início de junho:

- Eu errei quando os chamei de vândalos, porque eles erraram, se comportaram mal. Mas é uma instituição muito querida pela população. Quando os dois lados erram, os dois lados têm que avaliar. Estou fazendo um mea-culpa - disse.

Sobre a greve dos professores do estado, ele disse que o movimento teve pouca adesão. Cabral afirmou que tem uma política para valorizar o magistério, que, no início do seu primeiro governo, em 2007, estava sem aumento há 12 anos. Mas admitiu falhas também em sua estratégia:

- Reconheço que havia um erro no meu primeiro mandato de politização na escolha de coordenações na ponta. Isso prejudicava a política educacional - disse Cabral.

Em relação ao ataque de traficantes a PMs da UPP do Morro da Coroa, em Santa Teresa, ele classificou o caso como um incidente isolado. O governador acrescentou que irá hoje a Brasília para um almoço com colegas de outros estados a fim de negociar a votação da manutenção do veto presidencial à lei que cria novos critérios na distribuição de royalties do petróleo do pré-sal.

Colaborou Taís Mendes

FONTE: O GLOBO

Dilma cede à base e libera emendas

Sob pressão, a presidente Dilma cedeu e prorrogou o pagamento das emendas dos restos a pagar de 2009 - um custo de R$ 4,6 bi. A equipe econômica foi contra. Mas a ministra Ideli Salvatti avisou que seria quase impossível controlar a base no Congresso

Dilma cede à pressão

Presidente deixa discurso da austeridade fiscal de lado e prorroga emendas para conter base

Gerson Camarotti e Luiza Damé

Adeterminação da presidente Dilma Rousseff de não prorrogar o prazo para pagamento de emendas de parlamentares de 2009, no valor de R$4,6 bilhões, anunciado na terça-feira, durou pouco mais de 24 horas. O discurso do rigor fiscal, para combater a inflação, perdeu força ao longo do dia de ontem, com a crescente ameaça de sua base aliada, e à noite ela decidiu prorrogar por mais três meses o prazo do decreto que disciplina o pagamento dessas emendas, que estão nos chamados restos a pagar de 2009.

Assim que chegou da viagem oficial ao Paraguai, onde passou o dia, a presidente se reuniu com a ministra de Relações Institucionais, Ideli Salvatti, e cedeu aos apelos da articuladora política do governo, que reproduziu o clima de beligerância na base aliada no Congresso por causa da decisão do governo de deixar caducar as emendas, o que aconteceria a partir de amanhã. O decreto vence hoje.

Ideli disse à presidente que a situação era "seríssima e que os problemas seriam muito grandes na base" se o decreto não fosse prorrogado. A ministra reproduziu o que ouviu dos líderes governistas, que foram claros no alerta de que não tinham como controlar seus liderados em votações polêmicas como a da Emenda 29, que aumenta recursos para a Saúde, e a chamada PEC-300, que cria piso salarial para policiais e bombeiros.

Ao fim da reunião com Dilma, por voltar das 21h, Ideli começou a telefonar para os líderes aliados, avisando que a presidente aceitara prorrogar a validade das emendas por mais três meses, mas que esta será a última prorrogação.

- A prefeitura que conseguir viabilizar seus projetos dentro desse período terá o dinheiro das emendas. A que não conseguir, não terá mais prorrogação - disse Ideli.

- Está certo, nós aceitamos esse compromisso, de não mais pedir prorrogação do decreto - disse o líder do PTB, Jovair Arantes (GO).

O líder do PMDB, Henrique Eduardo Alves (RN), confirmou os termos da prorrogação do decreto, e afirmou:

- A solução é boa porque atende as prefeituras.

Ameaças explícitas ao longo do dia

Ao longo do dia, a área política do governo entrou em campo para convencer a presidente Dilma de que a briga que estava comprando com os parlamentares - ao não prorrogar as emendas dos restos a pagar de 2009 - poderia sair mais cara. O Palácio do Planalto foi informado de que setores da base aliada estavam decididos a dar o troco ao governo, pondo em votação duas propostas explosivas: a regulamentação da emenda 29, que trata do dinheiro para a Saúde, e o piso salarial dos policiais estaduais.

As emendas parlamentares que Dilma pretendia cancelar - mas acabou prorrogando à noite - custariam cerca de R$4,6 bilhões, se todos os projetos forem aprovados. Mas só o custo da aprovação dos dois projetos (Emenda 29 e piso salarial dos policiais) chegaria a pelo menos R$50 bilhões.

Na Câmara, ontem, não houve votações no plenário porque o governo não queria correr riscos. Mas, durante o dia, líderes aliados se revezaram em reuniões para decidir o que fazer nos próximos dias.

Os dirigentes petistas estavam preocupados com o acordo para aprovação de convite ao ministro da Ciência e Tecnologia, Aloizio Mercadante, para falar na Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara. Isso foi feito com a ajuda do vice-líder do PMDB, Eduardo Cunha(RJ), e de pelo menos dois petistas: Eduardo Santos (RJ) e Jorge Boeira (SC), o que foi entendido como uma ameaça velada de manter o assunto em pauta.

FONTE: O GLOBO

Pão de Açúcar na mira dos investidores

As ações do Pão de Açúcar movimentaram ontem 26,2% do total da Bolsa de São Paulo, chegando a R$ 1,7 bi. O valor é quatro vezes o da véspera. Para analistas, o Casino, sócio de Abílio Diniz, estaria comprando para ganhar força

Fome de ações

Volume de negociação do Pão de Açúcar na Bolsa quadruplica. Papéis caem 3% em dia de especulação

Lucianne Carneiro

Um dia depois do anúncio da proposta de fusão do Grupo Pão de Açúcar com o Carrefour no Brasil, o volume de negócios das ações da empresa na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) disparou para R$1,669 bilhão, quase quatro vezes o registrado na terça-feira (R$431,07 milhões). O montante correspondeu a 26,2% do volume do Ibovespa, índice que reúne as ações mais negociadas da Bolsa. No dia anterior, a participação tinha sido de 8,1%. O dia foi marcado por muita especulação, em meio a rumores de que o sócio francês Casino estaria comprando papéis da empresa em circulação no mercado. A ação preferencial (PN, sem direito a voto) da Companhia Brasileira de Distribuição (CBD, nome do grupo) chegou a subir 12,09% durante o pregão, mas acabou fechando em queda de 3,07%, a R$71, a maior desvalorização do Ibovespa. Investidores aproveitaram para embolsar parte dos ganhos, já que, na terça-feira, o papel tinha subido 12,64%.

O sócio francês do Pão de Açúcar é contra e já declarou que considera ilegal a operação com seu principal rival. O negócio entre Pão de Açúcar e Carrefour inclui ainda o banco BTG Pactual, que entraria como investidor, e o BNDES, via BNDESpar, o braço de equity do banco de fomento, que entraria com R$3,91 bilhões por uma fatia de 18% no capital do Novo Pão de Açúcar (NPA), nome da holding que comandaria os negócios integrados das duas redes de varejo. Para o analista da Empiricus Research Felipe Miranda, a forte compra das ações por operadores estrangeiros sugere que o movimento do Casino é possível:

- Não dá para afirmar que isso realmente ocorreu, mas seria algo como o Casino se armar para a guerra na negociação.

Por trás dos rumores está a ideia de que o Casino estaria buscando formas de se fortalecer para negociar sua posição no acordo. A compra de ações preferenciais (sem voto) não aumentaria o poder de decisão do Casino, mas, segundo analistas, poderia garantir algum poder de barganha.

- O movimento (das ações do Pão de Açúcar) foi bem atípico, com quase 30% do volume geral. O grosso foi de bancos estrangeiros - disse o analista da SLW Corretora, Cauê de Campos Pinheiro.

Diniz: "Sem emoção" por parte do Casino

Segundo dados da agência Bloomberg, a corretora Link Investimentos - que foi adquirida pelo banco suíço UBS no ano passado - foi a que teve o maior volume de compra de ações do Pão de Açúcar ontem, no montante de R$92,86 milhões. Em seguida, foi o Credit Suisse, com R$60,15 milhões.

- O que se viu foi um movimento mais de especulação que impulsionado pelos fundamentos da empresa - disse Paulo Hegg, da Um Investimentos.

Procurada, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) informou que não vai se pronunciar sobre o caso.

Ontem, o Ibovespa fechou com leve alta, de 0,05%, aos 62.333 pontos. No mercado de câmbio, o dólar recuou 0,38%, a R$1,572, menor valor desde 27 de abril, quando atingiu R$1,571.

Em entrevista ao "Jornal Nacional" ontem, o empresário Abilio Diniz, do grupo Pão de Açúcar, defendeu, a participação do BNDES na operação:

- O BNDES fez um bom negócio. Está evitando que o sistema de abastecimento seja totalmente desnacionalizado. Acho que está fazendo um serviço para o consumidor, para a sociedade, para todos os brasileiros.

Ele disse esperar que o Casino analise a oferta:

- O que eu espero é que o Casino analise a proposta que recebeu, com atenção, com cuidado, sem emoção.

FONTE: O GLOBO

Freire: fusão do Pão de Açúcar e Carrefour com dinheiro do BNDES é negociata

Valéria de Oliveira

“Isso cheira a negociata e deve ser barrado”, disse o presidente nacional do PPS, deputado Roberto Freire (SP), ao comentar o aporte de quase R$ 4,5 bilhões do BNDES na fusão do grupo Pão de Açúcar com o Carrefour. Para ele, o banco está sendo usado indevidamente “para criar grandes trustes nacionais, inclusive para fazer investimento no exterior”. A instituição, diz Freire, toma dinheiro no mercado a altas taxas de juros e empresta a baixo custo. “Quem paga a diferença é todo o povo brasileiro”.

As negociações privadas envolvendo o BNDES, diz Freire, não são novas. Vêm desde o governo Lula. Na administração Dilma Rousseff, a prática piorou, segundo ele, porque “o Cade levanta a possibilidade de concentração muito grande no ramo do varejo se concretizada a fusão; mais de 30% do mercado nacional do varejo vai ficar nas mãos desse grupo, o que, evidentemente, é um absurdo”.

O BNDES, insiste o deputado, “não foi criado para isso e muito menos um governo que se pretende progressista e de esquerda pode atuar para financiar a criação de conglomerados econômicos de alguns eleitos”. A operação de fusão entre Pão de Açúcar e Carrefour com dinheiro do banco deve ser detida, defende Roberto Freire.

“A concentração vai diminuir a concorrência, e o povo perde concorrência e empregos; o que o BNDES está fazendo no meio disso se ele trabalha com o dinheiro do povo trabalhador?”, questiona Freire. A instituição, ressalta, foi criada para financiar investimentos produtivos da economia brasileira “e não para patrocinar fusão de grupos que atuam meramente no varejo ou no consumo”.

Freire avalia que a fusão pode redundar em “claro processo de demissão”. Ele disse que já conversou com os dirigentes da UGT (União Geral dos Trabalhadores) sobre o assunto. “Podemos ter uma concentração no mercado e também de diminuição da oferta de empregos”. O cartel, afirma, vai controlar muito mais facilmente os preços, e não atenderá às necessidades do país, que se beneficia com uma maior concorrência. “Até porque esse capitalismo monopolista ou aproximado do monopólio não é de nenhum interesse do ponto de vista democrático de nenhuma economia”.

Segundo Roberto Freire, um patrocínio oficial como o que o BNDES oferece ao Pão de Açúcar “somente é possível em um governo mesquinho, como o que temos desde Lula; um governo atrelado e subalterno aos interesses do setor financeiro e do grande capital nacional”. Ele ressalta que essa conduta não ajuda a um processo de democratização da economia, não atende os consumidores brasileiros nem ao mercado de trabalho.

Ao avaliar a declaração do ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Fernando Pimentel, de que a fusão é estratégica para o Brasil, Freire disse que não vê estratégia “senão a de privilegiar aqueles que já privilegiam o grupo politicamente dominante que está no governo, um conluio que não significa transparência e muito menos República”.

Freire atacou ainda o discurso nacionalista usado pelo governo para justificar o negócio. “É um discurso antigo, de quando falávamos de burguesia nacional, do tempo do mundo da bipolaridade, da guerra fria; esse discurso no mundo da globalização chega a ser ridículo”.

FONTE: PORTAL PPS

Pão francês:: Míriam Leitão

Nunca como neste caso da possível fusão Pão de Açúcar-Carrefour o governo pareceu tão fora da realidade. Não é verdade que o negócio é estratégico para o Brasil, não será a globalização de um grupo brasileiro, não abrirá portas para a exportação de produtos brasileiros. Os argumentos usados até agora servem apenas para mostrar uma visão rudimentar da economia.

O negócio, se virar realidade, vai concentrar mais do que os 30% que o governo e os interessados estão dizendo. Em algumas regiões, pode ser muito mais. As pequenas redes se espalham pelo interior ou em áreas específicas da cidade. No estado de São Paulo, uma conta simples derruba o cálculo dos 30%. O faturamento do Pão de Açúcar está sendo estimado no setor como de R$25,3 bilhões; o do Carrefour, de R$17,4 bilhões. Isso representa 69,9% do total de faturamento do setor em São Paulo, que foi de R$61 bilhões em 2010.

Em determinadas cidades pode ser até maior que isso. Quem perde é o consumidor que ficará refém de um grupo só - ou no máximo com uma ou outra opção. Perderão também os funcionários porque algumas lojas serão fechadas. Como já são grupos grandes e bem estruturados o ganho de escala não será muito importante, portanto a ideia de que isso resultaria em preços menores é falsa. Perderão também os fornecedores porque não terão poder de barganha.

Capitalismo precisa de concorrência. A consolidação em alguns setores ajuda às vezes a aumentar a eficiência, formar grupos mais fortes, o que aumenta a competição. Certo nível de escala pode ser benéfico. Não é o caso aqui. Os dois já são grandes. Juntos, viram uma arma contra o consumidor e contra a economia.

Seria um assunto para ser resolvido pela lei contra a formação de trustes. Mas o BNDES entrará no negócio como sócio. Confusão insolúvel: o Estado participará do negócio que depois o Estado vai julgar se pode ou não ocorrer.

Ontem os interessados na fusão - ou seja lá o que for esta operação - tentaram influenciar os jornalistas conversando com alguns. Garantiam que era um excelente negócio para o BNDES. Detalhe curioso: preferem falar em off, ou seja, querem convencer os jornalistas de que é um excelente negócio para o país e o BNDES, mas não querem declarar isso publicamente. Que venham à luz defender seus interesses e sustentar seus argumentos.

Minha convicção é que a operação é ruim; a presença do Estado nela, desastrosa. O banco público brasileiro se tornará sócio de um negócio que pode ir parar na Justiça por acusação de quebra de contrato. O banco estatal não tem razão alguma para ser sócio de supermercado francês, porque é isso que o Pão de Açúcar vai se tornar. Virará um naco do grupo francês. O BNDES tem feito inúmeras operações controversas, ressuscitou o ideário de escolha de campeões do governo militar, beneficiou umas empresas em detrimento de concorrentes, forçou concentrações, salvou empresas quebradas. Neste caso, no entanto, ele extrapolou.

O argumento de que a operação abrirá o mercado francês para os produtos brasileiros é, para usar uma palavra educada, ingênuo. O mercado francês é o mais fechado da Europa. Eles são protecionistas por convicção e vocação. Subsidiam ferozmente seus produtores para que não venha de fora nada do que produzam internamente. O Carrefour em todas essas décadas no Brasil não foi uma rota para essa inclusão de produtos brasileiros, por que passaria a ser só porque agora ele terá capital brasileiro minoritário?

O Estado brasileiro é grande. Enorme. Recentemente a revista "Época" prestou um serviço ao país quando fez um levantamento e chegou à conclusão de que direta ou indiretamente 675 empresas no Brasil estão sob influência do Estado. Os jornalistas José Fucs e Marcos Coronato, que lideraram o estudo feito por uma equipe da revista, escreveram que: "A teia de interesses estatais nos negócios é tão complexa, tem tantas facetas e envolve tantos conflitos de interesse que o próprio governo não consegue avaliá-la." Por isso eles levaram três meses, tiveram a ajuda de uma consultoria, a Economática, e se restringiram às empresas que têm participações diretas ou indiretas do governo Federal apenas.

O BNDES sempre participou de empresas e sempre participará. Ele financia ou compra participações; entra e sai de negócios. Alguns bons, outros discutíveis. Mas o problema é que a partir da gestão Luciano Coutinho ele decidiu se transformar em fazedor de grandes grupos. No caso dos frigoríficos, decidiu que era preciso concentrar e por isso financiou o crescimento dos que ele considerou que deveriam ser os donos da carne. Virou sócio do Independência um pouco antes de o frigorífico quebrar. Só em uma das várias operações que fez com o JBS-Friboi ele comprou 99,9% de uma emissão de debêntures para a empresa comprar a Pilgrim"s nos Estados Unidos, e depois transformou os papéis em ações. Assim, ele virou dono de frigorífico nos Estados Unidos, na Argentina, e poderá ser sócio de supermercado francês. Em inúmeros casos, ele é o banco que financia e é sócio do negócio. Está dos dois lados do balcão. Agora, estará também no caixa do supermercado.

FONTE: O GLOBO

Às compras:: Eliane Cantanhêde

À perplexidade inicial com o anúncio de que o BNDES está despejando quase R$ 4 bi para o Pão de Açúcar comprar o Carrefour seguiu-se a expectativa de que logo haveria explicações. Em vão.

Quais os argumentos do Planalto, do BNDES e do empresário mui amigo Abílio Diniz para uma operação tão bilionária quanto estranha? Dizer que é para pôr produtos brasileiros em gôndolas internacionais é muito pouco. E nada mais foi explicado, muito menos justificado.

É legítimo que quem paga a conta -nós, contribuintes e consumidores, e eles, que trabalham nos dois supermercados- estejamos com a pulga atrás da orelha.

Começa com a definição do BNDES, banco de "desenvolvimento econômico e social" que deve investir na produção, na infraestrutura, na geração de empregos. Mas na fusão de supermercados?

Segue com os riscos de monopólio, o novo gigante dominando 32% do varejo supermercadista. Riscos para: fornecedores, que perdem margem de barganha; empregados, ameaçados de demissão; e consumidores, à mercê dos interesses e preços de um mercado praticamente sem competição.

Alguém aí acha que um proprietário vai manter dois supermercados um ao lado do outro? Que vai somar todos os atuais empregados? E que vai nivelar por baixo o preço de legumes, frutas, arroz, feijão, enlatados, produtos de higiene e limpeza e eletrodomésticos?

Sem falar nas questões jurídicas, pois a rede Casino, francesa, já contratou advogado brasileiro pronto para questionar a operação. O Brasil é acusado de não respeitar tratado bilateral com a Itália no caso Battisti e agora usa o BNDES para um negócio mal explicado que, aparentemente, rompe contratos. Bom para a imagem do país não é.

Que o beneficiário Diniz, o banco de fomento e o Planalto, que deu sinal verde para o negócio, venham a público não só explicar, mas também convencer. Se possível.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Nem tanto ao mar:: Dora Kramer

Não se pode tirar a razão da presidente Dilma Rousseff quando ela rejeita a liberação de R$ 4,6 bilhões do Orçamento em emendas parlamentares remanescentes (restos a pagar) de 2009, alegando que isso levaria ao descrédito a disposição do governo em cortar gastos.

Ao mesmo tempo não se pode tirar a razão dos parlamentares que reivindicam a execução da parte do Orçamento que constitucionalmente lhes cabe manejar. As emendas assumiram caráter pejorativo, mas são legais e legítimas. A questão está no uso do instrumento.

Por isso mesmo perdem ambas as partes a razão quando transformam isso, de um lado em um objeto de chantagem e, de outro, em uma tentativa de afirmação de autoridade e de certo modo de busca de popularidade em cima de um adversário, neste aspecto, fácil dada a má imagem dos políticos junto ao público.

Posta como está, a discussão não progride e fica torta: Dilma como a heroína da resistência, que acabará cedendo ou pagando o pato, e os parlamentares como um bando de achacadores que usam suas prerrogativas de votos para o atendimento de interesses supostamente obscuros.

Convém, portanto, ir devagar com a louça. De um modo geral, tais interesses são nítidos: levar recursos para obras em seus redutos eleitorais ou para quaisquer setores que considerem prioritários. As distorções são outro problema, da alçada policial. Da parte do governo há a responsabilidade para com o controle dos gastos. Responsabilidade esta que deveria também guardar austeridade em relação aos gastos de interesse imediato do Planalto. Eleitoral, por exemplo.

Não se pode considerar a presidente heroína por se recusar a pagar nem os parlamentares achacadores por reivindicarem receber. O erro é de origem: na Presidência quando usa as emendas como forma de assegurar fidelidade de votos no Congresso, e no Parlamento quando condiciona os votos à liberação das emendas.

Em tese, os dois lados estão certos. Na prática, juntos constroem uma deformação por ausência do sentido republicano no tocante à equivalência entre os Poderes.

A se continuar a tratar o assunto como uma relação mercantil, sem o cumprimento das regras (todas elas) tais como descritas em lei e prescritas na lógica da melhor condução das atribuições de Legislativo e Executivo, não há a menor chance de dar certo.

Retrato na História. Se o Itamaraty não tem nada contra, se o ministro da Defesa diz que os militares não têm nada contra, se a maioria do Congresso aprova, se a presidente Dilma Rousseff é a favor do texto da Lei de Acesso à Informação tal como está, por que José Sarney e Fernando Collor querem o sigilo eterno para documentos oficiais ultrassecretos?

Considerando que o prazo máximo para divulgação é de 50 anos e que até lá nenhum dos dois estará por aqui, só há uma razão plausível: legislam em causa própria temerosos do julgamento da posteridade.

Efeitos Battisti. Antonio Tabucchi, dos escritores europeus mais importantes da atualidade, desistiu de participar da Festa Literária Internacional de Paraty em razão da decisão brasileira de não extraditar Cesare Battisti. É mais uma entre várias manifestações de italianos que demonstram que a extradição não era só uma questão de governo na Itália.

Neste caso, ficamos assim: antes um terrorista condenado que um escritor consagrado.

Efeito Delúbio. O PT perdeu Vladimir Palmeira, uma figura histórica nem sempre alinhada aos interesses do partido. Em 1997, por exemplo, o PT nacional interveio na escolha da candidatura de Palmeira para governador do Rio de Janeiro em 1998, preferindo jogar o partido na aliança com Anthony Garotinho, que viria em pouco tempo conferir aos aliados o dístico de "partido da boquinha".

Vladimir agora sai pelo simbolismo que representa a volta de Delúbio Soares.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Pressionada:: Merval Pereira

Nada indica que haverá uma mudança brusca de alianças partidárias no Congresso, mas está ficando cada vez mais claro que os termos em que se estabelecem as coalizões são inaceitáveis e começam a ser recusados pela presidente Dilma Rousseff, mesmo que não seja apenas pela rejeição a esse ambiente baseado em chantagens políticas, mas simplesmente porque ela não tem temperamento para ser colocada contra a parede sem reagir.

O recuo que ela foi obrigada a fazer diante da pressão da base aliada, que a chantageou para que liberasse os restos a pagar de emendas parlamentares pode ser um ponto de não retorno logo no início do seu governo. Ou ela se submeterá às chantagens, ou montará um Plano B para poder governar sem essa ameaça permanente.

O ex-presidente Lula tentou reagir à entrada do PMDB no seu primeiro governo, tendo vetado um acordo feito pelo então ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu.

Mas, convencido de que a política congressual se fazia assim mesmo, foi deixando que as bases de troca de apoio ao governo seguissem a lógica do favorecimento, o que resultou no escândalo do mensalão.

Esse esquema nada mais era do que a compra de votos no Congresso, às vezes com dinheiro vivo mesmo, outras com nomeações e favores diversos.

Depois da crise, optou-se por escancarar o esquema de toma lá dá cá, incluindo no Ministério as duas bandas do PMDB da Câmara e do Senado, deixando de lado lideranças políticas independentes.

A presidente Dilma Rousseff recebeu essa herança da era lulista, que, por ter ajudado a elegê-la, agora cobra seus nacos de poder.

A maior aliança política já formada por um governo desde a redemocratização não significa, no entanto, uma força política para levar adiante um projeto de transformação do país, mas apenas um agrupamento de diversas correntes interessadas em esquartejar o governo para dele tirar o maior proveito político possível.

O assédio fisiológico tem sido tão descarado que a própria presidente Dilma tem reagido mandando avisar, especialmente ao PT e ao PMDB, que não pretende abrir mão da capacidade de decisão presidencial que lhe foi atribuída pelas urnas.

Além do mais, está ficando explícito que setores importantes da aliança, especialmente do PT, tratam sua gestão como um mero intervalo obrigatório entre os governos de Lula, que já seria o candidato natural para a eleição de 2014.

A cordialidade com o PSDB pode ser apenas uma tentativa de marcar posição distinta da de Lula, que depois de um período em que, ainda sonhava com uma aproximação com os antigos parceiros políticos, decidiu que a separação litigiosa seria mais proveitosa para fortalecer sua imagem de líder.

É verdade, porém, que, sempre que pode, desde o discurso de posse, a presidente Dilma Rousseff faz um apelo à união nacional e ao desarmamento dos espíritos em prol de objetivos maiores.

A carta que enviou ao ex-presidente Fernando Henrique, pela comemoração dos seus 80 anos, e a nota oficial que emitiu sobre a morte do ex-ministro da Educação Paulo Renato Souza, um dos fundadores do PSDB, são exemplos de civilidade política que ela já havia dado ao convidar FH e outros ex-presidentes para o almoço em homenagem ao presidente dos EUA, Barack Obama, colocando o tucano em lugar de destaque especial.

Assim como se recusou a comparecer ao almoço, Lula não se dignou a enviar os cumprimentos ao seu antigo aliado e amigo que a política distanciou.

Mas as palavras de Dilma, em poucas linhas, desconstroem a estratégia marqueteira montada em muitos anos de embate entre PSDB e PT.

A presidente Dilma Rousseff elogiou por escrito: "(...) o ministro-arquiteto de um plano duradouro de saída da hiperinflação e o presidente que contribuiu decisivamente para a consolidação da estabilidade econômica".

Ela destacou também o espírito democrático do homem público, que se traduziu "na crença do diálogo como força motriz da política e foi essencial para a consolidação da democracia brasileira em seus oito anos de mandato".

Sobre Paulo Renato, foi mais comedida, mas admitiu que ele prestara "relevantes serviços ao país". Diversas manifestações petistas puseram em destaque o papel do ministro da Educação dos oito anos do governo de Fernando Henrique na universalização do ensino básico e na implantação da cultura de avaliação na educação brasileira, pontos fundamentais para uma renovação que precisaria ser seguida da melhoria da qualidade do ensino que, infelizmente, não atingimos ainda.

Sem dúvida a orientação da presidente Dilma no sentido de desobstruir os canais de entendimento com o maior partido de oposição, e o reconhecimento de fatos positivos dos governos tucanos, desanuviaram o ambiente político, dando condições para que a presidente resista à chantagem política a que PMDB e PT querem submetê-la.

Também no PMDB já existe um movimento que se amplia, especialmente na bancada do Senado, com parlamentares tentando se diferenciar da moral homogênea (com licença do Marcito) que impera no partido.

O senador Pedro Simon (PMDB-RS) leu da tribuna uma "carta aberta" à presidente Dilma Rousseff para pedir à petista que resista à pressão de aliados para a ocupação de cargos e maior espaço no governo, incluindo expressamente seu partido entre os que assim agem.

Ter "um quinhão" do governo é legítimo, ressalvou Simon, mas não "para tirar vantagem".

Num ambiente conturbado como esse dentro de sua base aliada, até que uma boa vontade da oposição não é mau negócio para o governo. resta saber se ela tentará um Plano B ou se aceitará o papel de uma presidente-tampão dominada por uma coalizão política montada por seu mentor.

FONTE: O GLOBO

Amigo ou inimigo, o jogo continua :: Sergio Fausto

A carta de Dilma Rousseff a Fernando Henrique Cardoso reconhecendo os seus méritos como político, intelectual e presidente da República tem importância histórica. Tem também significação política, na medida em que desdiz a catilinária lulopetista sobre a "herança maldita". Não tem, contudo, efeito sobre o jogo político-partidário do PT porque, neste, quem continua a dar as cartas é o ex-presidente Lula. E ele já deixou bem claro que continua a operar dentro da lógica amigo-inimigo, como se de fato a política fosse o prolongamento da guerra por outros meios.

Que o PSDB é o inimigo escolhido já se sabe há muito tempo. É escolha feita desde a preparação do Plano Real, quando Lula, sob os maus conselhos de seus assessores econômicos, preferiu denunciar o suposto "estelionato eleitoral" a apoiar o programa que pôs fim a mais de duas décadas de inflação alta, crônica e crescente e criou as condições para a retomada do crescimento com distribuição da renda. Na Presidência, buscou apropriar-se dos louros da vitória sobre o processo inflacionário, como se fosse ele, e não o seu antecessor, o responsável político pela estabilização monetária, embuste que Dilma indiretamente denuncia em sua carta a FHC.

Desde meados dos anos 90, a escolha do PSDB como inimigo principal vem sendo reiterada a cada passo, sem nenhum escrúpulo de consciência. Ainda recentemente, em meio à crise que levou à renúncia do ministro Antônio Palocci, Lula atribuiu ao PSDB paulista o surgimento na imprensa das informações sobre a inexplicada - possivelmente porque inexplicável - evolução patrimonial de seu ex-ministro da Fazenda. Provas? Não as tinha. Nem mesmo indícios. A acusação leviana servia a um único e deliberado propósito: arregimentar a tropa petista no Congresso Nacional para blindar Palocci na Casa Civil. Em vão.

O pouco-caso pelas instituições e pelos princípios republicanos - para não falar no desdém pela verdade histórica - é parte da lógica amigo-inimigo. Em encontro de dirigentes petistas realizado no interior de São Paulo, logo após a queda de Palocci, o ex-presidente afirmou em discurso que os problemas com os companheiros só surgem quando o partido está desunido. Foi assim no "mensalão", disse ele, invocando o testemunho de José Dirceu, postado ao seu lado. Foi assim também agora, arrematou, fazendo referência ao escândalo que derrubou o ministro da Casa Civil de Dilma Rousseff. Ou seja, não importa se houve ou não houve corrupção, desvio de recursos públicos, enriquecimento ilícito, etc., nesses e em outros tantos casos envolvendo dirigentes do PT e ministros de seu governo. O que importa é preservar a unidade e a força da organização, na luta contra o inimigo.

Mais uma vez, no discurso referido, o propósito do ex-presidente foi arregimentar a base parlamentar petista, desta feita em apoio a Dilma Rousseff. Objetivo legítimo e iniciativa oportuna do ponto de vista do governo. Como líder partidário, Lula tem todo o direito de convocar os seus a respaldar a presidenta. Ninguém o faria com maior eficiência.

O problema é que o ex-presidente, e não é de hoje, se comporta como chefe de uma organização dedicada a acumular poder e evadir-se tanto quanto possível do controle público (não para se autorregular, mas para proteger os companheiros, aloprados ou não). Cada vez mais raras são as vezes que se vê em Lula o homem público preocupado com as instituições e a qualidade da vida política. Vício adquirido na oposição, agravado na Presidência e cultivado depois de deixar o cargo.

Dilma Rousseff não é capaz de operar com a mesma eficiência política, o que era previsível. A presidenta é mulher de convicções - não importa se certas ou erradas - e compromisso com o que lhe parece tecnicamente correto. Custa-lhe visivelmente abrir mão deles, assim como é perceptível sua falta de gosto pelo fazer convencional da política.

Tipo meio ascético, Carlos Lacerda, em seu livro de memórias, relata as dificuldades que vivia para controlar uma parte da bancada da UDN na Câmara dos Deputados no final dos anos 1950, formada por parlamentares boêmios que viviam na noite carioca. Resolveu, então, fazer o sacrifício pessoal de cair na farra por uns dias para criar maior camaradagem com seus liderados. Virou duas noites, de bar em bar. Diz ele que deu certo.

Registro essa história para ressaltar o tamanho do desafio político com que se defronta a presidenta. Sua tarefa é muito maior e mais complexa que a de Lacerda. Para começar, porque não é na farra boêmia que está interessada a maioria da base de sustentação do governo. Para concluir, porque liderar uma bancada parlamentar é algo infinitamente mais simples do que presidir um país como o Brasil.

Passados seis meses de governo, Dilma Rousseff ainda não encontrou resposta para o desafio básico da boa governança no sistema presidencial brasileiro: como compor e preservar de modo estável uma coalizão de partidos que dê sustentação parlamentar ao governo, entregando-lhes cargos e recursos na administração federal, e ao mesmo tempo realizar um programa que requer coerência e eficácia na implementação das políticas públicas.

Jejuna na vida político-partidária, em geral, e na vida parlamentar, em particular, a presidenta acumula tropeços e zigue-zagues na relação de seu governo com o Congresso, como mostram as idas e vindas na questão do sigilo dos documentos oficiais.

Tomara que ela se firme, consiga estabelecer limites à voracidade dos aliados, separando o joio do trigo, e imprima a sua marca pessoal ao governo. É importante para o País que faça um bom trabalho e não permita a Lula exercer, desenvolto, o seu protagonismo anti-institucional, seja em cena aberta ou nos bastidores da vida política (e empresarial).

Diretor Executivo do IFHC, é membro do GACINT-USP

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

O que pensa a midia - Editoriais dos principais jornais do Brasil

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Serra: até as paredes sabem sobre Mercadante

É público que ministro coordenou escândalo dos aloprados, diz tucano; a convite, petista deve falar na Câmara

Isabel Braga e Maria Lima

BRASÍLIA. O ex-governador tucano José Serra disse ontem que não ficou surpreso com as novas denúncias envolvendo o ministro da Ciência e Tecnologia, Aloizio Mercadante, com o escândalo dos aloprados. Na campanha de 2006, os dois disputavam o governo paulista e petistas ligados à campanha de Mercadante foram acusados de tentar comprar um falso dossiê contra Serra. Há duas semanas, a revista "Veja" divulgou que um dos petistas, Expedito Veloso, admitiu recentemente que Mercadante não só sabia de toda a negociação como a autorizou.

- Passaram cinco anos que R$1,7 milhão foi apreendido e até hoje não se sabe a origem. O processo foi coordenado pelo então candidato ao governo de São Paulo, senador Aloizio Mercadante, isso todo mundo sabe, inclusive as paredes. Agora não só as paredes, como um próprio integrante eminente do PT deu entrevista que está gravada falando desse envolvimento do atual ministro - disse Serra, em Brasília.

Ontem, a Comissão de Fiscalização e Controle da Câmara derrubou pedido de convocação de Mercadante. Governistas fecharam acordo para aprovar, na próxima semana, um convite para ouvir o ministro. Segundo o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), o ministro será convidado para falar sobre sua pasta, mas deve ser abordado o caso do dossiê. O ministro também deverá ir à Comissão de Ciência e Tecnologia da Câmara como convidado.

FONTE: O GLOBO

Serra endurece críticas tucanas a governo Dilma

Conselho Político do PSDB faz 1ª reunião

Maria Lima

BRASILIA. Na primeira reunião do Conselho Político do PSDB, criado para acomodar José Serra na direção do partido, o ex-governador paulista apresentou documento contendo duras críticas ao governo da presidente Dilma Rousseff e com recados a tucanos para evitar a divisão interna em função de disputas eleitorais.

O documento, no entanto, só será divulgado amanhã, depois de ser submetido ao senador Aécio Neves (MG), que é membro do Conselho mas estava ausente por problemas de saúde. O documento de análise de conjuntura centra na herança do governo Fernando Henrique Cardoso, que estaria sendo mal administrada pelo governo Dilma, chamado de "hesitante" e "sem rumo".

Ao discutir o texto, o presidente do partido, deputado Sérgio Guerra (PE), sugeriu que ele seja submetido a Aécio antes de ser divulgado. Guerra disse que o texto assinado por Serra, e que sairá em nome do Conselho, pode sofrer alterações, mas isso não significa que há discordâncias. Além de Serra, Guerra e Aécio, integram o Conselho o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e os governadores Geraldo Alckmin (SP) e Marconi Perillo (GO).

Segundo um dos participantes da reunião, o tom das críticas ao governo Dilma é muito mais duro do que o habitual entre os tucanos. Ao ser questionado sobre mudanças no texto original, Fernando Henrique disse que seguiria a proposta de Serra:

- É um bom documento. Como toda herança, pode-se perdê-la ou aumentá-la. Houve algumas coisinhas perdidas. Em outras houve ganhos, o que é natural, assim é a vida.

O ex-presidente, que recebeu elogios de Dilma, não quis detalhar onde o governo do PT estaria pondo a perder a herança dos anos FH.

- Já chega, vocês querem que eu fale mal da minha presidenta? - brincou, dizendo que não a convidou para a homenagem aos seus 80 anos, hoje no Senado, porque coube a Sérgio Guerra fazer os convites.

Sobre as orientações internas, Serra sugere, no documento, como a oposição deve se comportar, afirmando que "o maior inimigo é a desunião do partido".

Serra disse que o partido pode adotar o modelo de prévias para as eleições municipais onde houver disputa, como em São Paulo.

FONTE: O GLOBO

Dilma/Congresso. Os problemas Políticos e econômicos à frente:: Jarbas de Holanda

Após as turbulências da “crise Palocci” e da votação do Código Florestal na Câmara dos Deputados, o primeiro semestre de 2011 termina com boas – embora passageiras ou sazonais – notícias da economia; com uma primeira vitória do Itamaraty em disputas de postos internacionais desde a chegada de Lula à presidência em 2003, e com a redução ao menos retórica de conflitos entre o PMDB e o PT, entre as alas deste, e dos relacionados a outros atores da base parlamentar governista, em resposta a apelos da própria Dilma Rousseff e ao atendimento de parte das demandas deles por cargos e liberações de verbas dos chamados restos a pagar.

Calmaria relativa perturbada pela cobrança de outra parte dessas verbas e pela volta à mídia do escândalo dos aloprados de 2006, gerada a partir de luta interna entre petistas. Mas que oferece uma espécie de trégua ao Palácio do Planalto, na qual a presidente, de um lado reafirma seu ativismo gerencial, por meio do lançamento de novos programas sociais e de intensa promoção de atos ou promessas de caráter administrativo (inclusive de privatizações na área de infraestrutura que desmentem o radicalismo estatizante de sua campanha eleitoral). E, de outro lado, procura demonstrar capacidade de liderança política. Esta tornada ainda mais necessária do que na fase inicial do governo em face de um dos efeitos mais significativos das recentes turbulências: a avaliação crescente, no próprio PT, de que ela cumpre um mandato tampão, preparatório da candidatura de Lula em 2014.

Avaliação essa a que, enquanto está difusa, Dilma busca responder com algumas manifestações indicativas de autonomia em relação ao seu partido e ao antecessor. Como a da mensagem que dirigiu a FHC, na comemoração do seu 80º aniversário, com enfático e até caloroso reconhecimento de grandes méritos dos dois mandatos dele nos planos econômico, social e político. Mensagem inteiramente contraposta ao sistemático tratamento crítico de FHC, de radical condenação de seu governo, por parte dos sucessivos dirigentes do PT e do próprio Lula; que mereceu aplausos generalizados da imprensa; e com a qual Dilma acenou com uma abertura à oposição.

Mas a calmaria do final de semestre será certamente substituída por novas evidências de divisão e fragilidade da base parlamentar governista já na decisão do Senado sobre o Código Florestal e na apreciação de outras matérias polêmicas nas duas casas do Congresso. Entre estas a do piso nacional unificado dos salários das polícias e bombeiros, a do projeto que restringe o uso de MPs, da distribuição dos royalties do pré-sal . Definições legislativas que passarão a ser influenciadas por um complicador adicional: o aumento dos conflitos nessa base por causa dos objetivos partidários diferentes e contraditórios nas eleições municipais à vista. Especialmente entre o PT e o PMDB, empenhados em reforçar-se, em muitos casos um contra o outro, mas envolvendo também os demais partidos da base, entre os quais o PSB, cujo plano de ampliação do peso que já tem no Nordeste e de avanço em mais regiões conflita com o projeto de hegemonia petista. Como conduzir as relações com a heterogênea base de sustentação do Executivo, com os governadores e com o Congresso nesse cenário delicado – e no qual a oposição liderada por um hábil articulador como Aécio Neves poderá ganhar bem mais espaço – é o grande desafio político de Dilma a partir já do semestre que começa esta semana.

Quanto à economia, as preocupações maiores dos analistas se voltam para o próximo ano. Parte delas foi bem tratada em reportagem do Estado de S. Paulo, de domingo último, com o título “Governo empurra despesas para 2012”. Abertura da matéria: “O governo vem empurrando com a barriga uma série de despesas cuja fatura será cobrada em 2012, tornando o quadro econômico do ano que vem bastante complicado. Um grande reajuste do salário mínimo, quitação de subsídios dados pelo BNDES, investimentos (inclusive os da Copa e da Olimpíada) e as pressões da base política em ano eleitoral são apenas alguns exemplos dos problemas que terão de ser enfrentados. Nessa conta ainda tem de ser acrescentada a soma da decisão do STF que mandou o governo pagar de uma só vez a dívida judicial (precatórios) que havia sido parcelada em dez anos”. Declaração de uma das fontes da reportagem, o economista Fernando Montero, da Corretora convenção: “Isso (a expansão das despesas) vai fazer com que o Banco Central segure os juros e as medidas macroprudenciais por muito tempo. O BC sabe que há esses fatores expansionistas já contratados”.

Jarbas de Holanda é jornalista

Aliados reagem a mudanças na Previdência

No Congresso, propostas do governo para tentar conter despesas são mal recebidas

Isabel Braga e Maria Lima

BRASÍLIA. Aliados do governo demonstraram ontem forte resistência às medidas da minirreforma previdenciária em estudo no governo e que deverá ser enviada ao Congresso este ano. Segundo aliados, o tema é árido, impopular e precisa ter uma base fundamentada para ser aceito pelos parlamentares. Elaborado por técnicos dos ministérios da Fazenda e Previdência, o texto, antecipado ontem pelo GLOBO, altera regras das pensões pagas a viúvas e viúvos e prevê mecanismos alternativos ao fator previdenciário, com aumento de idade e tempo de contribuição para trabalhadores pedirem suas aposentadorias ao INSS.

O ponto mais criticado pelos parlamentares governistas e de oposição foi a intenção de aumentar, para as mulheres, o tempo de contribuição de 30 anos para 33 anos e a idade mínima, de 60 anos para 63 anos. A resistência vem até de PT e PMDB.

- Vou conversar com o Garibaldi (Alves, ministro da Previdência) em Natal, em uma praia, de forma relaxada, para que ele possa me convencer - brincou o líder do PMDB na Câmara, Henrique Alves (RN). - É um tema árido, mas pode ser necessário para o país.

Oposição diz que está disposta a discutir tema

Ex-ministro da Previdência, o senador José Pimentel (PT-CE) foi cauteloso. Disse que hoje o Senado debate outros temas prioritários:

- Os pontos que estrangulavam a Previdência foram resolvidos. Não há reforma, mas modificações pontuais: o fator previdenciário, que já está em debate no Parlamento, e as pensões. Toda vez que se discute Previdência, a sociedade tem resistência por não saber a limitação das mudanças - disse Pimentel, evitando opinar sobre a ideia de ampliar a idade mínima de aposentadoria para mulheres: - Deixa chegar. Hoje já há idade mínima. Esse não é ponto principal.

Para a deputada Alice Portugal (PCdoB-BA), o governo federal deveria se preocupar em ampliar o pagamento para categorias que não têm esse direito, citando o caso das donas de casa:

- O argumento para as reformas da Previdência, no Brasil e no mundo, sempre foi o de que há déficit. Nossa Previdência é superavitária. Já em 2003, votei contra a reforma e votarei novamente. Qual o interesse em aumentar a idade mínima para as mulheres se as contas estão superavitárias? É maldade!

A oposição foi cautelosa. Para o líder do DEM na Câmara, ACM Neto (BA), o governo deve estimular um amplo debate com o Parlamento:

- Não vou demonizar o assunto e não vou especular. Estamos abertos ao diálogo, basta o governo não partir para o enfrentamento e transformar essa questão em questão de governo e oposição. Deve tratar como questão de Estado.

O tucano Jutahy Junior (BA) concordou que é preciso mudar regras para a concessão de pensões porque há distorções, caso de jovens que se casam com idosos para herdar a aposentadoria do INSS. As pensões, disse, prolongam-se de forma indefinida, o que, a seu ver, não é correto. Mas discordou da intenção de alterações nas aposentadorias de mulheres:

- Votei a favor do fator previdenciário. É preciso ter responsabilidade com as contas pública para preservar a Previdência, mas é preciso cuidado com a questão das mulheres - disse Jutahy .

Paim desafia governistas a aprovar PEC com mudanças

Tradicional defensor dos aposentados - uma de suas principais bandeiras eleitorais -, o senador Paulo Paim (PT-RS) desafiou os autores da proposta a aprovar uma emenda constitucional que retire direitos das mulheres. Ele criticou especialmente a proposta de desonerar a folha de pagamento, reduzindo a contribuição patronal, hoje em 20%, e, em troca, reduzir benefícios dos trabalhadores e aposentados. Paim disse que a desoneração da folha representaria uma renúncia anual de pelo menos R$100 bilhões no caixa da Previdência:

- Aumentar o tempo de contribuição e a idade mínima e reduzir a contribuição dos empregadores na folha de pagamentos é uma contradição! Como reduzir as contribuições (do patrão) e, em contrapartida, dificultar os benefícios? Se reduz a contribuição dos patrões é porque a Previdência está muito bem de caixa e não precisa reduzir benefícios - protestou. - Essa reforma vai penalizar justamente as mulheres? Acho que a presidenta Dilma não vai concordar em tirar direitos justamente da mulher, que tem tripla jornada. Quero ver quem tem três quintos (de votos) para derrubar esses direitos!

Sindicalistas rejeitam propostas

Geralda Doca

BRASÍLIA. A proposta de minirreforma da Previdência feita por técnicos da Fazenda e da Previdência deixou indignados dirigentes das centrais sindicais e da Confederação Brasileira de Aposentados e Pensionistas (Cobap). Eles dizem não ter sido informados na mesa de negociação, coordenada pela Secretaria Geral da Presidência, e ameaçam mobilizar filiados se o governo enviar o texto ao Congresso.

- Todo mundo vai chegar à reunião envenenado. Havia o compromisso do governo de apresentar proposta para discussão com as centrais. Não vamos aceitar mudanças para piorar o que já tem - - reagiu o presidente da Força Sindical, deputado Paulo Pereira da Silva (PDT-SP), o Paulinho.

O presidente da Cobap, Warley Gonçalles, disse que a entidade não aceita que o valor da pensão caia para 70% se a viúva não tiver filhos. Também rejeita o item prevendo que o benefício seja pago só por dez anos se a beneficiária tiver menos de 35 anos.

O secretário nacional da CUT, Quintino Severo, disse que falta articulação entre a Fazenda, a Previdência e a Secretaria Geral:

- Se o governo tem proposta, deve apresentar na mesa de negociação. Isso não foi falado - disse, destacando que a CUT não negociará o fim do fator previdenciário em troca de mudanças nas pensões.

FONTE: O GLOBO

Fusão inexplicável:: Folha de S. Paulo/Editorial

Negócio entre Pão de Açúcar e Carrefour não deve receber apoio do BNDES; sob a ótica dos consumidores, alto grau de concentração gera temor A notícia da possível fusão entre as redes Pão de Açúcar e Carrefour parece inexplicável. Chama a atenção por ao menos dois aspectos muito negativos. Ambos dizem respeito diretamente a milhões de contribuintes e consumidores.

O primeiro refere-se à participação de um banco público no financiamento do negócio. O BNDES entraria na operação, entre empresas privadas, com cerca de R$ 4 bilhões para que a fusão possa vir a ser viabilizada.

Não é a primeira vez que o banco elege um "campeão nacional" para receber dinheiro dos contribuintes sem dar maiores explicações à sociedade.

O argumento de patrocinar grupos nacionais para evitar que estrangeiros dominem o mercado brasileiro é tão falho quanto ruim. Pois abre o precedente para que dezenas de outros setores possam querer o mesmo tipo de tratamento. Desconhecem-se os motivos de o banco apoiar este e não outros empreendimentos.

Do ponto de vista do consumidor, a fusão é ainda mais incompreensível. E merece uma avaliação o quanto antes das autoridades de defesa da concorrência.

Com a fusão, Pão de Açúcar e Carrefour abocanhariam 32% de participação na média do varejo supermercadista brasileiro. Argumenta-se que tal concentração seria equivalente à encontrada nos Estado Unidos.

No Brasil, porém, a fatia de mercado decerto é maior em grandes centros como São Paulo e Rio, onde a presença e a capilaridade das duas redes é dominante.

Os interessados na fusão defendem que o negócio permitirá ganhos administrativos e logísticos nas duas redes. Isso acabaria redundando, de acordo com esse raciocínio, em preços finais menores para os consumidores.

Argumenta-se também que o NPA (Novo Pão de Açúcar) seria mais eficiente e difundiria práticas modernas de gestão, chacoalhando a concorrência em busca de inovações e custos menores.

Mas é inevitável que em fusões desse tipo haja uma diminuição importante de empregos e, neste caso específico, o fechamento de lojas que fiquem em áreas próximas umas das outras.

Por último, o negócio poderá auxiliar, com o patrocínio do Estado, a família Diniz, principal acionista do Pão de Açúcar, a contornar cláusula contratual que permite à rede Casino, concorrente do Carrefour na França, controlar o grupo brasileiro a partir de 2012.

Tal intenção vem provocando forte polêmica, que já chegou a um foro privado de arbitragem de conflitos empresariais.

Com tantos questionamentos, deve-se cobrar mais transparência tanto dos envolvidos na futura fusão quanto do banco público, que não deveria se propor a financiar esse tipo de negócio.

Mais um desvio de função do BNDES:: O Globo/Editorial

Fundado em 1952, no segundo governo Vargas, o BNDE - sem o "s" de social - surgiu para ser o grande suporte financeiro da industrialização. Numa economia em que uma das doenças crônicas é a falta de financiamento de longo prazo para projetos de maturação demorada, o banco ocupou, e ocupa, espaço vital.

Nesta condição, o quase sexagenário BN DES, por ser estatal, tem sido usado como instrumento de toda sorte de programa, dos mais consequentes aos delirantes. Foi peça-chave na montagem da espinha dorsal da indústria automobilística no país, na siderurgia, mas também atuou na linha de frente na política de substituição de importações no governo Geisel, da qual, se restou capacitação técnica em algumas áreas, herdaram-se "esqueletos" nos armários da dívida interna, constituídos por pesados subsídios na criação frustrada de grandes grupos nacionais. Subjacente àquela enorme transferência de dinheiro público para alguns empresários eleitos, agravou-se o sério problema da distribuição de renda.

Na execução de uma série de medidas para se contrapor às pressões recessivas vindas de fora, geradas pela explosão do mercado de hipotecas nos Estados Unidos, o banco foi peça fundamental. Não poderia ser diferente. Ali, porém, a partir de 2009, na fase final do governo Lula, emergiu de maneira explícita, sob a justificativa da "política anticíclica", um projeto de converter - mais uma vez - o Estado no grande indutor do crescimento. Ressuscitou-se o geiselismo, inclusive com direito a dinheiro subsidiado em operações de apoio a empresários para serem "os campeões nacionais" na economia globalizada.

Neste contexto é que se coloca a inadequada participação do banco para viabilizar a megaoperação de junção do grupo Pão de Açúcar e do Carrefour, e criar, no Brasil, de longe a maior rede de supermercados, uma empresa de R$65,1 bilhões de faturamento anual, só menor que a Vale e a Petrobras.

A rigor, o que tem a ver um banco estatal de fomento, num país como o Brasil, com fusão de redes varejistas? Nada. Pelos números divulgados na terça-feira, o BNDESpar, braço de participação em empresas do banco, entraria com R$3,91 bilhões no negócio, em troca de 18% do capital do Novo Pão de Açúcar, a surgir do negócio - caso Abílio Diniz consiga demover a resistência do sócio Casino, também francês como o Carrefour.

É risível a justificativa do banco de que a operação facilitaria a colocação de mercadorias brasileiras no exterior. Melhor caminho para aumentar as exportações nacionais é investir na infraestrutura portuária, rodoviária e ferroviária, sabidamente subdimensionada diante do tamanho que atingiu a economia. Não faz sentido gastar dinheiro subsidiado pelo contribuinte - mesmo que não fosse - para facilitar uma fusão que deve ser resolvida entre empresas privadas, da forma usual. Grupos fortes que são, têm acesso fácil ao crédito no mercado financeiro mundial.

O mesmo erro já foi cometido pelo BNDES numa fusão de frigoríficos, fora dos verdadeiros interesses estratégicos do país. Mais uma vez, a ideologia que move o projeto do "Brasil Grande", outra herança dos militares, pode desperdiçar volumosos recursos no plano obsessivo de criação de grandes empresas, enquanto as reais necessidades de investimentos públicos são deixadas de lado.

Paulinho da Viola - Filosofia/Noel Rosa