Na hora de partida sua perícia já é testada pela falta de recursos orçamentários que viabilizem a continuidade do programa bolsa família, compromisso seu compartilhado com o governo a que sucede, a que se acrescenta igual carência, diante da crise social que aflige a imensa massa de vulneráveis em situação de pobreza extrema, de meios para enfrentar os males que padecem. Nessa aziaga circunstância, o governo eleito recorreu ao remédio heroico de uma emenda constitucional a fim de lograr uma dotação orçamentária capaz de minimamente garantir recursos para o atendimento emergencial das necessidades imperativas da população.
Política e cultura, segundo uma opção democrática, constitucionalista, reformista, plural.
quarta-feira, 21 de dezembro de 2022
Luiz Werneck Vianna* - Uma travessia difícil
Luiz Carlos Azedo - Do iliberalismo de Bolsonaro à partidocracia do Centrão
Correio Braziliense
O presidente eleito Lula da Silva se equilibra
numa corda bamba, embora tenha a legitimidade de eleição e o poder. O seu
problema é a captura pela partidocracia
Nas negociações em curso no Congresso para a aprovação da PEC da Transição, corremos o risco de pular da banha quente da frigideira para cair na panela com água fervendo. Explico: interromper o curso do projeto iliberal do presidente Jair Bolsonaro, porém ser aprisionado por uma partidocracia comandada pelo Centrão. Duas decisões judiciais tentaram interromper esse processo, aquela na qual o Supremo Tribunal Federal (STF), por maioria de 6 a 5, aprovou o parecer de sua presidente, ministra Rosa Weber, e considerou inconstitucional o chamado orçamento secreto; e a liminar do ministro Gilmar Mendes que possibilita a edição de medida provisória extraordinária para a concessão do Bolsa Família no valor R$ 600 e mais R$ 150 por criança de até seis anos.
Vera Magalhães - Responsabilização nos EUA e aqui
O Globo
Bolsonaro tem sido menos vocal que Trump em
incitar os atos contra o resultado das eleições, e leis são diferentes
Caminha para seus capítulos finais o
trabalho do comitê criado pela Câmara dos Representantes dos Estados Unidos
para investigar os eventos criminosos que culminaram na invasão ao Capitólio em
6 de janeiro de 2021, com cinco mortos e incontáveis danos ao tecido
democrático do país.
Depois de 18 meses, a comissão recomendou o
indiciamento do ex-presidente Donald Trump por quatro crimes derivados do não
reconhecimento do resultado das eleições de 2020, em que o democrata Joe Biden
venceu.
Os desdobramentos do pedido de indiciamento ainda são incertos, e há mais água para passar por baixo das pontes jurídica e política de um processo delicado, de contornos inéditos, mas que, para países como o Brasil, em que postulantes a autocratas seguiram a cartilha de Trump de forma mimética, merece ser acompanhado com lupa.
Helio Schwartsman - A política de volta
Folha de S. Paulo
Seria precipitado considerar Lira uma besta
desdentada incapaz de qualquer reação
Gilmar levantou e Lewandowski cortou. Sinto uma ponta de satisfação ao ver Arthur Lira e o centrão sofrendo uma derrota política. E uma
que em tese põe fim ao escândalo institucional que era o orçamento secreto.
Mas, como ensinava Sólon, dadas as reviravoltas do destino, só podemos dizer
que um homem foi feliz depois que seus dias tiverem se esgotado.
Lira saiu enfraquecido, mas seria precipitado considerá-lo uma besta desdentada incapaz de qualquer reação. A turma mais ouriçada, que já fala em lançar Boulos para substituir Lira na presidência da Câmara, me parece operar em outra realidade. O Congresso que saiu das urnas em outubro foi para a direita, não para a esquerda.
Bruno Boghossian - Depois do xeque-mate
Folha de S. Paulo
Petista recupera poder de articulação, mas
presidente da Câmara preserva influência sobre deputados
Ainda que alguns aliados de Lula tenham
tratado o fim das emendas de relator como um xeque-mate em Arthur Lira, o jogo
continua. A negociação
que foi aberta assim que o STF acabou com o mecanismo de
distribuição de verba dá pistas de como deve ficar o equilíbrio entre o
Planalto e o Congresso daqui por diante.
O novo governo e o presidente da Câmara voltaram à mesa para discutir o destino dos R$ 19,4 bilhões que, até aqui, estavam sob controle dos congressistas. A decisão de partilhar essa quantia foi o primeiro sinal de que os dois lados estão interessados em procurar acordos, ao menos por enquanto.
Elio Gaspari - Que tal cortar gastos?
O Globo
Só se discute como gastar mais
PEC pra cá, PEC pra lá, orçamento secreto,
emendas do relator, teto de gastos. Desde o início de novembro, o debate
nacional está tomado por uma algaravia que se resume a três palavras: como
gastar mais.
Cada despesa com o dinheiro da Viúva tem
defensores capazes de justificar suas propostas. Quase sempre, falam em nome
dos fracos e dos oprimidos. Não apareceu uma única voz propondo cortar gastos,
como se o problema do Orçamento estivesse no andar de baixo.
Começando pelo topo, imagine-se uma reunião dos seis ex-presidentes, incluindo Jair Bolsonaro. Todos podem defender gastos, pelas mais altas razões. Falta dizer que eles custam à Viúva pelo menos R$ 5,76 milhões por mês. Tudo de acordo com a lei. Nessa estatística do Portal da Presidência, incluem-se o custeio de equipes, diárias de hotel, passagens e combustível. Ela não tabula aposentadorias e benefícios legalmente acumulados. Nela, o teto fica com Lula (R$ 129.700) e o piso com José Sarney (R$ 76.600).
Alvaro Gribel - Ao fim e ao cabo, ganhou a economia
O Globo
Redução da PEC da transição para um ano
animou o mercado e aproximou o projeto da ideia de 'waiver' que vinha sendo
discutida durante a campanha
O STF acabou com o orçamento secreto, a Câmara reduziu o prazo da PEC da transição, e o governo eleito soube negociar e ceder para chegar a um acordo. Ao fim e ao cabo, ganhou a economia, e isso se refletiu nos principais indicadores financeiros ontem. A PEC virou um waiver de um ano, como se discutia antes das eleições. Os juros recuaram, o dólar despencou e o Ibovespa subiu, em dia de alívio para os investidores. Lula e Haddad garantiram recursos para combater a fome e recompor orçamentos que foram destruídos pela gestão Bolsonaro. Mas, ao mesmo tempo, terão que se apressar para apresentar uma regra fiscal que dê alguma previsibilidade para as contas públicas a partir de 2024. Isso reduzirá incertezas.
Vinicius Torres Freire – Gasto de Lula 3 ainda é mistério
Folha de S. Paulo
Despesa e dívida do próximo governo
dependem de sensatez, sorte e nova lei fiscal
As notícias mais recentes sobre os gastos
extras no Orçamento
para 2022 ajudaram a derrubar taxas de juros e o preço do dólar. É um
exemplo claro e prático de como uma administração econômica ao menos sensata
pode compensar o prejuízo causado desde o fim da eleição e ir além.
A autorização de gasto no pacotão de gasto da transição vai valer apenas por um ano. É o que o Congresso deve impor a Lula 3, pelo jeito. "Pelo jeito", pois, depois de tantas mudanças nos acordões entre os três Poderes, basicamente inconstitucionais, está difícil de prever como vão ser as leis na tarde de amanhã ou na noite de domingo.
Raphael Di Cunto - A reforma que se impõe para o governo
Valor Econômico
Criar o IVA é única alternativa para o PT
na economia
A reforma dos impostos sobre bens e
serviços vai se impor como agenda prioritária no começo do governo Lula (PT). O
motivo é simples: não há alternativas. A volta dos investimentos públicos não é
suficiente para fazer o país crescer de forma sustentada e o PT não está
disposto a fazer uma reforma no funcionalismo público, pelo menos, não uma que
agrade a investidores e empresários que defendem a redução do Estado.
Simplificar o pagamento de impostos sobre bens e consumo é a única grande pauta do novo governo capaz de estimular investimentos privados e gerar crescimento econômico sustentável. A definição da nova âncora fiscal, que tende a causar mais turbulências com o mercado financeiro, não será essa pauta, nem a discussão sobre corte de subsídios tributários, a reforma do imposto de renda ou o que fazer com os combustíveis.
Lu Aiko Otta - A trincheira liberal-democrata
Valor Econômico
Reforma tributária deverá ser ponto de
embate
Eleito com 13,5 milhões de votos para
comandar a maior economia do país, Tarcísio Gomes de Freitas (Republicanos)
quer estabelecer em São Paulo uma trincheira do pensamento liberal-democrata.
Com friso na palavra “democrata”.
Seu plano é projetar o Estado como um ator
de peso no debate nacional, informou a esta coluna o coordenador da transição
paulista, Guilherme Afif Domingos. Não será uma oposição pura e simples. Poderá
haver convergência com o governo federal em alguns temas, como a atração de
investimentos. Em outros, São Paulo deverá atuar como contraponto.
Não por acaso, é lá que estará o ministro da Economia, Paulo Guedes, a partir do dia 1º de janeiro. Atuará como conselheiro numa equipe formada por outros ex-integrantes de seu time no Ministério da Economia, como o próprio Afif e o futuro secretário de Fazenda, Samuel Kinoshita.
Nicolau da Rocha Cavalcant -i O resgate da religião depois da barbárie
O Estado de S. Paulo.
Bolsonaro deu a entender que o cristianismo negava o humano, abraçava a irracionalidade, desprezava a ciência, excluía o drama da vida
Um dos grandes males do bolsonarismo é o
uso da religião cristã para fins políticoeleitorais. Essa instrumentalização da
fé afeta não apenas a laicidade do Estado e o exercício dos direitos políticos,
mas a própria compreensão da religião. Muito se fala da importância de resgatar
o caráter laico do Estado e de reconstruir a racionalidade pública na
administração federal. De fato, trata-se de dois dos grandes desafios do País
neste momento. Mas, depois de quatro anos de uma política misturada com
religião (em especial, com a fé cristã), é preciso renovar, no cenário público,
a própria compreensão da religião, também como caminho para distensionar o
ambiente social.
Com suas palavras e ações ao longo do mandato, Jair Bolsonaro conseguiu dar à religião cristã o mais desfavorável enquadramento possível, reativando no imaginário coletivo os piores estereótipos: antidemocrática, violenta, irracional, hipócrita, desumana, machista, retrógrada, opressora de outras expressões religiosas. É de justiça prover agora um novo olhar sobre o tema. Aqui, recorro a um texto do papa Bento XVI publicado no Natal de 2005, a encíclica Deus caritas est.
Marcelo Godoy - Lula e os cavaleiros húngaros
O Estado de S. Paulo.
O presidente eleito devia ler Oliveiros em vez de se deixar enredar pelas tentações de Lira
O governo de Luiz Inácio Lula da Silva mal
começou e já se vê às voltas com as três tentações de Brasília: dinheiro, poder
e privilégio. É sobre elas que se parece organizar o Ministério – exceto seu
núcleo formado pelos cinco primeiros nomes anunciados – e se constrói a relação
do mandatário com o Congresso.
Se o vencedor da eleição procurasse apenas organizar suas fileiras sobre a realidade em vez de ficções, como as bancadas temáticas de Jair Bolsonaro, seria alvissareiro desde que a divisão do poder levasse os demais grupos da sociedade a compartilhar um modo de vida, de pensar e de agir, usando o máximo de consenso e o mínimo de força. Mas não. A organização parece obedecer a interesses paroquiais na disputa por cargos e sinecuras e à acomodação de compadres. Divide-se o botim em nome da PEC da Transição.
Aylê-Salassié F. Quintão** - Orçamento criativo pode implodir a governabilidade (*)
No governo Médici - entre os militares o mais violento - a indignação com a repressão acomodou-se na alegria incontida da população com o título de campeão mundial de futebol na Copa do México. Lá mesmo houvera o fuzilamento - massacre da Plaza das Três Culturas (Tlatelolco) - de mais de 200 estudantes durante uma manifestação contra os exagerados gastos do Governo com as Olimpíadas e para abrigar a Copa.
Ora, trinta e sete ministérios "sem aumentar o quadro de servidores". Bate que eu gosto. Orçamento secreto - felizmente caiu no Supremo Tribunal Federal -, verba discricionária, emendas impositivas de parlamentares, recursos extraordinários, incentivos, isenções fiscais para empresários e até pedaladas. Não é pouco, e nem fácil identificar os meandros dos gastos do Governo. Desde Guido Mantega, no Ministério da Fazenda, com seu orçamento criativo, as finanças públicas desestabilizaram o orçamento e as relações entre Poderes se acirraram.
O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões
Onda de reajustes ao funcionalismo já marca novo governo
O Globo
Aumentos para parlamentares, governadores,
presidente e ministros do STF desencadeiam efeito cascata
Não bastasse o impacto fiscal resultante da
intenção de recuperar gastos sociais, o novo governo Luiz Inácio Lula da Silva
promete começar com a marca das gestões petistas no passado: aumentos
indiscriminados ao funcionalismo, sem preocupação com o efeito nas contas
públicas. Já está a todo vapor a gigantesca engrenagem de reajustes em cascata,
posta em marcha pelos aumentos de parlamentares, governadores e ministros do Supremo
Tribunal Federal (STF).
A aprovação, pela Assembleia Legislativa de
São Paulo (Alesp), do reajuste de 50% (para R$ 34.600) no salário de Tarcísio
de Freitas, governador eleito do estado, deflagrou uma onda de aumentos nos
Executivos estaduais. Ao mesmo tempo, o STF encaminhou ao Congresso proposta de
reajuste de 18% no salário dos ministros da Corte (para R$ 46.300, em quatro
parcelas até 2024). Na sessão de ontem, a Câmara aprovou aumentos para diversas
categorias, inclusive o presidente, ministros e os próprios parlamentares.
A partir do Palácio dos Bandeirantes encapelou-se a onda de reajustes nos estados. O aumento salarial de Tarcísio foi aplaudido por policiais, auditores fiscais, procuradores, professores universitários e outras carreiras no topo do funcionalismo estadual. Como o teto é o salário do governador, elevá-lo facilita a reivindicação dos servidores.