sexta-feira, 25 de setembro de 2009

Entrevista especial com Luiz Werneck Vianna

DEU NO IHU ON-LINE

Marina Silva, ex-ministra do meio ambiente do governo Lula, foi filiada ao PT durante 30 anos. Ontem, ela anunciou sua saída, aumentando a expectativa de sua vinculação ao Partido Verde e sua candidatura à presidência em 2010. A senadora, desde que foi afastada do ministério, estava vivendo uma relação desgastada com o PT, mas, ao anunciar sua saída, diz que quer fazer mais pelo meio ambiente. "Saí do PT para poder ficar livre para negociar com outro partido. Não ficaria bem negociar com um partido estando em outro", disse Marina ontem.

A IHU On-Line conversou com o professor Werneck Vianna, por telefone, sobre a possibilidade de Marina Silva entrar na disputa pela presidência. Segundo ele, “é uma candidatura que vem com muita força, traz novidade, traz o tema da ética de uma maneira forte pela trajetória dela, especialmente, nesse cenário de escândalos políticos”. Vianna também analisou como a
candidatura de Marina pode mexer no cenário para o qual as eleições presidenciais se encaminhavam, com Dilma e Serra apenas na disputa. Ao falar sobre as alianças que o presidente Lula tem feito, o professor afirmou que “não se governa o país sem o PMDB”, uma vez que é o maior partido do país.

Luiz Jorge Werneck Vianna é graduado em Direito e Ciências Sociais pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. É mestre em Ciência Política e Sociologia pelo Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro e doutor em Sociologia pela Universidade de São Paulo. Recebeu o título de pós-doutor na Universita Degli Studi di Milano. Ele é professor no IUPERJ. Entre seus livros citamos Esquerda brasileira e tradição republicana: estudos de conjuntura sobre a era FHC-Lula (Rio de Janeiro: Editora Revan, 2006).

Confira a entrevista.

IHU On-Line – Como o senhor analisa a candidatura de Dilma?

Werneck Vianna – É uma candidatura forte, embora não tenha saído do partido, saiu de uma decisão do Presidente da República, o que é uma dificuldade para ela, pois se fosse uma candidatura do partido ela teria mais força. Mas isso não importa. O prestígio popular que o presidente tem compensa. E ela tem uma trajetória de administradora bem sucedida. Por isso, é uma candidata forte.

IHU On-Line – Qual a novidade na candidatura Marina?

Werneck Vianna – Primeiro, nós precisamos acreditar que ela efetivamente vai ser candidata. Se isso se confirmar, acho que é uma candidatura que vem com muita força, traz novidade, traz o tema da ética de uma maneira forte pela trajetória dela, especialmente, nesse cenário de escândalos políticos. Ela tem uma imagem antipolítica que poderia ajudá-la junto ao eleitorado, isso a favorece. Por outro lado, ela representa um tema de projeção mundial, que é o meio ambiente. Creio que, a partir dos temas do meio ambiente e da ética, ela aparece com força. Eu diria que o potencial dela é imenso. Claro que isso depende do desenvolvimento da sua campanha, da energia que ela está disposta a dedicar a isso. Vejo com uma mutação na política brasileira muito severa, sairíamos de São Paulo, do ABC, do mundo dos sindicatos, da classe operária para o Acre, para Xapuri, para os seringais. É uma mudança política, sociológica e antropológica que, se confirmar a candidatura de Marina, deve marcar muito essa competição eleitoral. Enfim, vejo a candidatura de Marina como de alta relevância do ponto de vista político, sociológico e antropológico, com a transferência do coração político do Brasil e da capital da esquerda do ABC paulista para o Xapuri, no Acre.

IHU On-Line – Como Marina influencia a candidatura de Serra e Ciro?

Werneck Vianna – O Serra pode sofrer “influência” tanto quanto a Dilma. A candidatura da Marina, existindo, desmarca esse quadro e passam a ser três candidaturas e, eventualmente, quatro candidaturas, com a entrada de Ciro. Ou seja, nos aproximamos de uma sucessão presidencial muito competitiva, o que torna tudo bastante imprevisível. Agora, o que o Serra tem, sem dúvida, é o seu Estado lhe fornecendo uma bela base de votos. Quanto mais dividir, mais chance, eu penso, o Serra terá.

IHU On-Line – E quem poderia ser o vice de Marina?

Werneck Vianna – O Cristovam Buarque vai ter dificuldades por causa do PDT. A candidatura de Marina introduz um elemento de descontinuidade da política brasileira muito grande se ela enfrentar com muita energia a sua campanha. Só o deslocamento da “fábrica para a selva”, de São Paulo para o Acre, isso é de uma importância imensa. Essas são as questões dominantes. Vamos para uma eleição muito imprevisível, onde as peripécias da campanha podem se tornar decisivas, ao contrário do que se esperava. Esperávamos uma candidatura morna, com dois candidatos previsíveis: a Dilma e o Serra. Agora, há uma reconfiguração da cena. Vamos ver como as organizações internacionais vão olhar essa candidatura, vão analisar o tema da Amazônia, por exemplo.

IHU On-Line – Como o senhor contextualiza a situação ideológica da relação de Marina com o PV?

Werneck Vianna – Ela sempre foi uma “verde”. A identidade dela é bem definida, é uma ambientalista, construiu sua vida política em torno dessa questão, no Parlamento ela deu representação a esse tema. Com isso, ela dá ao Verde, pela primeira vez, uma estrutura de partido nacional. O PV, com a Marina empunhando suas bandeiras, vai ser um dos partidos importantes do país. Ele vai criar raiz, vai se nacionalizar. E vão ter que cuidar direitinho do seu programa. Sabemos o que eles pensam a respeito do ambiente, mas o que eles pensam para o desenvolvimento, para o emprego... Fora as fórmulas retóricas do desenvolvimento sustentável, vamos ter que esperar pelos programas e pelos debates.

IHU On-Line – Dentro das relações de força da América Latina, onde podemos situar a candidatura de Marina?

Werneck Vianna – Tudo depende de como ela vai se apresentar. De qualquer modo, Marina não é uma candidata que pode vir pela direita, não é verdade? Ela não tem trajetória, perfil ou programa para isso. Tem a esquerda ambientalista. Mas o tema do ambiente não basta. São necessárias outras perspectivas mais largas, senão fica uma candidatura muito estreita, muito ideológica. Para ganhar tem que ser uma candidatura política, não apenas a expressão de uma ideologia. A vitória de Marina mudará o Brasil e muda as relações do Brasil com o mundo. É um “efeito Obama” muito maior.

IHU On-Line – E o que significa para o PT a saída de Marina?

Werneck Vianna – É uma perda de um quadro importante, de um tema – que vai embora, de certa forma, com Marina. Ela é a maior liderança do PT em relação ao tema meio ambiente. O partido vai ter que enfrentar uma eleição competitiva, coisa que o PT não estava se preparando. Ele preparava-se para uma eleição plebiscitária e não com uma disputa com várias candidaturas. E entre várias candidaturas, a representação do Lula não é tão forte. A própria Marina poderá, na sua campanha, aparecer como uma pessoa vinculada ao Lula. E o Ciro Gomes, se for candidato, também, e por aí vai.

IHU On-Line – Marina é evangélica e se diz contra o aborto. Como essas características implicam em termos sociológicos eleitorais?

Werneck Vianna – Como eu falei, isso é “sair de São Paulo e ir para Xapuri”, com a tradição dos seringais, das relações comunitárias. Não é uma candidatura moderna no sentido das atitudes ou dos sistemas de orientação.

IHU On-Line – E nesse sentido, a visão criacionista de Marina explica como seria um projeto de governo dela?

Werneck Vianna – A única coisa que podemos especular é que a candidatura dela desorganiza totalmente o quadro, modifica a posição dos atores e torna a eleição mais competitiva e acirrada do que já era. Não teremos dois candidatos muito parecidos, do ponto de vista de perfil e de programa com Serra e Dilma. Temos que esperar, pois daqui dez dias o cenário pode estar completamente diferente.

IHU On-Line – O que significam as alianças de Lula com Renan Calheiros, Collor e Sarney? A imagem do presidente sai como dessas relações?

Werneck Vianna – Ele é da governabilidade, como sempre sustentou. Imagino que alguma coisa tenha chegado nele, mas parece que continua gozando de altíssima popularidade, mas alguma coisa chegou, certamente. Agora, não se governa o país sem o PMDB, não adianta. É o maior partido. A não ser que partidos que se definam por um programa de mudanças queiram correr o risco da mobilização popular e enfrentar uma trajetória afirmativa nessa direção. O governo Lula não quis isso em nenhum dos mandatos. Ele governou com a política que havia e procurou encontrar estabilidade para realizar seu programa. E alguma coisa realizou.

República de Bananas

Merval Pereira
DEU EM O GLOBO


O presidente deposto de Honduras, Manuel Zelaya, e o protoditador venezuelano Hugo Chávez encarregaram-se em questão de poucas horas de desmontar a versão oficial de que as autoridades brasileiras nada sabiam sobre a sua estratégia de regressar ao país e abrigar-se na embaixada brasileira em Tegucigalpa. Falando à rádio Jovem Pan, o presidente deposto, Manuel Zelaya, disse que a escolha da representação diplomática brasileira foi uma “decisão pessoal”, depois de consultas feitas ao presidente Lula e ao chanceler Celso Amorim.

Já Chávez revelou, rindo, como “enganou” todo mundo, monitorando a viagem de Zelaya através de um telefone via satélite, e que quando todos esperavam que o presidente deposto estaria em Nova York, para a reunião da ONU, ele “se materializou” na embaixada brasileira.

A reboque da estratégia bolivariana, o governo brasileiro está participando de uma farsa política com ares de “república de banana”, só que dessa vez o papel de interventor não é dos Estados Unidos, mas do Brasil, conivente com a irresponsabilidade de Chávez.

Um advogado paulista, Lionel Zaclis, doutor e mestre em Direito pela USP, publicou no site “Consultor Jurídico” um estudo detalhado sobre o processo de destituição do presidente hondurenho, à luz da Constituição do país, e chegou à conclusão de que não houve golpe de Estado.

Segue um resumo de seu relato: “De acordo com a Constituição de Honduras, como destacamos aqui ontem, o mandato presidencial tem o prazo máximo de quatro anos (artigo 237), vedada expressamente a reeleição.

Aquele que violar essa cláusula, ou propuserlhe a reforma, perderá o cargo imediatamente, tornandose inabilitado por dez anos para o exercício de toda função pública.” “(...) Em 23 de março de 2009, o presidente Zelaya baixou o Decreto Executivo PCM-05-2009, estabelecendo a realização de uma consulta popular sobre a convocação de uma assembleia nacional constituinte para deliberar a respeito de uma nova carta política.” “(...) Em 8 de maio de 2009, o Ministério Público promoveu, perante o ‘Juzgado de Letras Del Contencioso Administrativo’ de Tegucigalpa, uma ação judicial contra o Estado de Honduras, pleiteando a declaração de nulidade do decreto (...).” “(...) E, como tutela antecipatória, que foi aprovada, requereulhe a suspensão dos efeitos, sob o fundamento de que produziria danos e prejuízos ao sistema democrático do país, de impossível ou difícil reparação, e em flagrante infração às normas constitucionais e às demais leis da República, para não falar dos prejuízos econômicos à sociedade e ao Estado, tendo em vista a dimensão nacional da consulta.” “(...) Em 3 de junho, o Juizado proibiu o presidente Zelaya de continuar a consulta.

Contra essa decisão, impetrou ele um Recurso de Amparo — similar ao nosso Mandado de Segurança — perante a Corte de Apelações do Contencioso Administrativo, o qual foi rejeitado em 16 de junho.” “(...) Assim, o Juizado do Contencioso Administrativo expediu, no dia 18 de junho, uma segunda ordem contra o presidente, tendo uma terceira sido expedida nesse mesmo dia. Em virtude dessa desobediência, o promotor-geral da República ofereceu, perante a Suprema Corte, denúncia criminal contra o presidente Zelaya, sustentando configurar sua conduta crimes de atentado contra a forma de governo, de traição à pátria, de abuso de autoridade e de usurpação de funções, em prejuízo da administração pública e do Estado.” “(...) A Suprema Corte aceitou a denúncia em 26 de junho, com fundamento no art. 313 da Constituição e designou um magistrado para instruir o processo.

Foi decretada a prisão preventiva do denunciado, com o que foi expedido mandado de captura, cujo cumprimento ficou a cargo do chefe do Estado-Maior das Forças Armadas.” “(...) No mesmo dia, o Juizado de Letras do Contencioso Administrativo deu ordem às Forças Armadas para suspender a consulta pretendida pelo presidente Zelaya e tomar posse de todo o material que nela seria utilizado.” “(...) O presidente Zelaya, então, ordenou ao chefe do Estado-Maior das Forças Armadas que distribuísse o material eleitoral de qualquer modo, porém o último, invocando a ordem judicial, se negou a fazê-lo, ao que foi destituído, tendo, em seguida, impetrado junto à Suprema Corte um recurso de amparo para ser reconduzido ao cargo.” “(...)
Em 25 de junho a Suprema Corte cassou o ato do presidente Zelaya, sob o fundamento de que a remoção do chefe do EstadoMaior das Forças Armadas constitui ato privativo do Congresso Nacional nos termos do artigo 279 da Constituição.” “Uma frase famosa na diplomacia brasileira é a do chanceler do governo Geisel Azeredo da Silveira, que vivia repetindo: “O Brasil não pode dar a impressão de que é uma Honduras”.

A preocupação tinha sentido: Honduras é o país inspirador do termo “República de bananas” ou “República bananeira” cunhado pelo escritor americano O. Henry, pseudônimo de William Sydney Porter, que, no livro de contos curtos Cabbages and Kings, (Repolhos e Reis) de 1904, usou pela primeira vez a expressão, que passou a designar um país atrasado e dominado por governos corruptos e ditatoriais, geralmente na América Central.

O principal produto desses países, a banana, era explorado pela famosa United Fruit Company, que teve um histórico de intromissões naquela região, especialmente Honduras e Guatemala, para financiar governos que beneficiassem seus interesses econômicos, sempre apoiado pelo governo dos Estados Unidos.

A cláusula pétrea da Constituição de 1982 de Honduras tinha justamente o objetivo de cortar pela raiz a possibilidade de permanência no poder de um presidente, pondo fim à tradição caudilhesca no país.

Janela de oportunidade

Dora Kramer
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Muita gente no PT enxerga na subida de Ciro Gomes nas pesquisas a chance de o partido se livrar do casamento por conveniência com o PMDB e adotar um plano B: com Ciro de vice ou, no limite, com a substituição de Dilma Rousseff na cabeça da chapa presidencial.

Não é assim, porém, que a direção do PMDB desenha o cenário cujos prós e contras detalhará para o presidente Luiz Inácio da Silva ao longo das conversas sobre a definição da aliança entre os dois partidos, previstas para o mês de outubro.

Os dirigentes pemedebistas acham o oposto dos petistas: consideram que os bons índices de Ciro e a "patinada" de Dilma obrigam o Palácio do Planalto a reforçar a candidatura da ministra da Casa Civil antes que ela perca mais densidade.

Por "perda de densidade" entenda-se o abandono do barco por parte do PMDB, o que, na concepção do partido, seria fatal para a candidatura oficial.

Há hoje três hipóteses no horizonte pemedebista: que o presidente Lula aceite a antecipação da definição da aliança e obrigue o PT a firmar compromisso dando a vaga de vice para o PMDB; que não haja definição e o presidente juntamente com seu partido abram as negociações, mas arrastem a conclusão a fim de ganhar tempo; que Lula informe ao PMDB que não há interesse em dar a vice ao partido e dê por encerrado o assunto sem aceitar as condições impostas.

A única possibilidade de o governo poder contar com o PMDB na eleição - vale dizer, com o tempo de televisão reservado à legenda no horário eleitoral - é a rendição às exigências: o vice, palanques duplos onde for absolutamente impossível de fazer composição estadual e negociação em "condições igualitárias" para desistência de candidaturas próprias de governador onde for possível.

Sem isso, tem dito em alto e bom som a direção do PMDB, não será possível "segurar o partido". Com isso, ponderam os dirigentes, eles se dispõem a sair a campo para "construir a maioria" na convenção nacional que, então, aprovaria oficialmente a aliança, em junho de 2010.

Até lá, valeria um acerto publicamente firmado. Pelo calendário do PMDB, o mais tardar no início de novembro, e mediante não apenas a palavra do presidente, mas com comprometimento assinado em cartório do céu pelo PT.

Mas vamos entender melhor essa história: se a direção do PMDB controla o partido a ponto de poder garantir hoje o resultado de uma convenção que se realizará daqui a oito, nove meses, por que não teria condições de "segurar" os correligionários até lá, se a vontade de fazer a coalizão é genuína como alegam?

Em tese, bastaria a convicção de que esse é o melhor caminho.

Aí é que está. Não é uma questão de convencimento, mas de oportunidade. Se não tiver o vice, o PMDB acha que, na posse de Lula como cabo eleitoral, o PT pode pintar e bordar para cima do parceiro nas eleições estaduais.

Com o vice - significando o que no PMDB é chamado de "eixo de organização" -, o partido compartilha a chapa e, consequentemente, tem aumentado seu controle sobre a campanha nacional em face dos embates estaduais. Nisso se inclui o poder de criar dificuldades se, e quando, for necessário.

Ao menor sinal de problema aqui ou ali, o vice pode interferir, para o bem ou para o mal, com autoridade de parceiro do candidato a presidente. Qualquer conflito "na base" repercute no topo da campanha.

A vaga de vice é uma espécie de fiança. Que não garante o êxito do candidato, mas dá ao PMDB segurança naquilo que interessa: eleger governadores, deputados, senadores para manter substancioso o seu cacife.

Nada obriga

O líder do governo no Senado, Romero Jucá, diz que "não faz sentido" um ministro do Supremo Tribunal Federal ganhar mais que o presidente, um senador ou um deputado.

O que não faz sentido é o pedido de equiparação por parte dos parlamentares aos salários do STF, assim que o Congresso autorizou o reajuste de R$ 24.500 para R$ 26.723, a partir de fevereiro de 2010.

Pelo simples fato de que o valor dos salários do Supremo é o teto do funcionalismo e não o piso assegurado à casta do primeiro escalão da República como parece - ou quer fazer - acreditar o senador Jucá.

Dos combates

Senadores e deputados lutaram por quatro anos para recompor em parte as mais de 8 mil vagas de vereadores cortadas em 2005 pela Justiça Eleitoral, em função de um novo cálculo na relação entre o número de cadeiras disponíveis nas Câmaras Municipais e a população das cidades.

À exceção do PSOL, todos os partidos liberaram suas bancadas para votar como bem entendessem, o que significa que nenhum deles ficou contra a proposta.

Um índice de apoio e empenho inéditos que, se fossem empregados em causas mais úteis, o grau de rejeição da sociedade em relação aos políticos seria bem menor.

O Itamaraty e seu aliado, Zelaya

Francisco C. Weffort
DEU EM O GLOBO


Para quem observa a política externa brasileira, a entrada escandalosa de Manuel Zelaya em nossa embaixada em Tegucigalpa só teve, até o momento, um efeito: o de fazer esquecer o novo fracasso do Itamaraty, derrotado nas eleições para a direção da Unesco. Como se sabe, mesmo quando se cogitava de um candidato brasileiro, Márcio Barbosa, vice-diretor geral da Unesco, o Itamaraty passou a apoiar o egípcio Farouk Hosni. Mas venceu a embaixadora búlgara Irina Bokova, cujo nome só chegou ao conhecimento do distinto público no Brasil depois das eleições.

Minha pergunta é a seguinte: o Itamaraty é mal informado? Ou, supondo-o bem informado, faz por mal informar o público brasileiro? Como outras, essa nova derrota do Itamaraty parece ter pouca importância no Brasil.

Até porque não há nenhuma segurança de que o egípcio fosse melhor que a embaixadora.

O caso de Manuel Zelaya, também confuso desde o início, é, porém, um pouco diferente. E agora pode, com a sua espetacular entrada na embaixada brasileira em Tegucigalpa, envolver algum risco. Ao que se sabe, a Constituição de Honduras é rigidamente contrária à renovação de mandatos de presidentes.

É contrária mesmo à realização de consultas populares a respeito. Mas, seguindo uma tendência que se ampliou depois de Chávez, da Venezuela, o então presidente Manuel Zelaya que, como vemos agora, é de uma teimosia incontrolável, insistiu em realizar uma consulta popular visando a abrir caminho para um novo mandato. Para realizar a consulta, designou o chefe do EstadoMaior das Forças Armadas e este, alegando inconstitucionalidade da ordem presidencial, recusou-se a obedecer.

Zelaya o destituiu do cargo. O caso foi então julgado no Parlamento, que decidiu destituir Zelaya da Presidência, e determinou que fosse substituído pelo então presidente do Congresso, Michelletti.

Assumindo a Presidência, Michelletti expulsou Zelaya do país. Contra o expresidente foi elaborada uma longa lista de acusações e uma ordem de prisão em caso de regresso. Zelaya, porém, teve enorme êxito em difundir, sem margem para contestação ou dúvida, a notícia de que teria sido expulso por um golpe militar. E muitos passaram a defendê-lo em nome de uma Constituição que, segundo seus acusadores, ele próprio não respeitava. Teria sido mesmo um golpe militar? É difícil decidir de fora sobre essa questão.

Em todo caso, quando se revisam os fatos com alguma distância, percebese que há uma grande confusão em todo este problema hondurenho. Aliás, tudo é muito estranho nas histórias em torno de Zelaya.

Mais confusa, porém, do que a sua queda do governo foi a chegada de Zelaya à embaixada brasileira. Depois de perto de um mês buscando a atenção da mídia em diversos países, ele decidiu alojar-se na Embaixada do Brasil em Honduras, invocando a proteção de Lula e tecendo loas ao ministro Amorim e ao assessor Marco Aurélio Garcia. Vejamos, porém, alguns detalhes do périplo que realizou para chegar lá. Zelaya partiu da Nicarágua em um avião da Venezuela, parou em El Salvador, onde carros o esperavam para levá-lo a Tegucigalpa, de onde havia sido expulso e era, supostamente, procurado pela polícia.

São muitas as perguntas que se colocam: só Zelaya sabia destes planos? Ninguém mais sabia disso na Venezuela? Nem na Nicarágua? Ninguém sabia disso em El Salvador, onde o esperavam alguns carros? E a pergunta mais importante para nós: tendo Lula visitado recentemente a América Central, nenhum funcionário ou autoridade brasileira tinha conhecimento prévio disso?
O único ponto claro dos planos de Zelaya é que ele continua em campanha para reassumir a Presidência de Honduras. Se isso acontecer, por que haveria ele, reconduzido então “nos braços do povo”, como costumam dizer os políticos, de deixar de lado seu sonho continuísta? Ele disse que entrou na embaixada brasileira sob a “proteção do presidente Lula”. Mas que significa isso se ele já declarou que não aceita pedir asilo? Aliás, neste detalhe, ele tem razão: se o que ele quer é voltar à Presidência do seu país, sua presença na embaixada só lhe será útil se ele não for um asilado. O que, evidentemente, cria para o Brasil um enorme problema.

Estar na embaixada serve a Zelaya para criar um novo ponto de atração para os jornalistas, atraídos pela figura que se pretende romântica do “rebelde latino”, com seus bigodes tingidos de negro e seu enorme chapéu texano.

Além disso, ele ostenta (sempre que pode) as aparências de uma vítima de golpe militar. O que o atrapalha neste aspecto é que vai ficando nítido aos olhos de quem quer ver que ele é apenas um fazendeirão, “um hacendado” tão rico e tão reacionário quanto os examigos da oligarquia que o expulsou do poder. Seu objetivo na embaixada é só um, o de encontrar uma brecha nas eleições de seu país, em novembro, eleições das quais, como ex-presidente, não tinha como participar.

Uma pergunta final: e o Brasil como fica nesta trapalhada toda? Como já disse o senador Heráclito Fortes, Zelaya transformou a embaixada em seu escritório político, pondo nosso país no meio de uma confusão sem tamanho.

Michelletti cobra do Brasil que caracterize a condição de Zelaya como asilado ou que o entregue à polícia hondurenha, já que há mandado de prisão contra o ex-presidente.

Neste sentido, é sintomático o apelo de Lula a Zelaya que não faça nada que possa provocar a invasão da embaixada pelo governo. É que, se por desgraça isso vier a ocorrer, a desmoralização do Brasil no incidente se tornará inevitável.

À distancia de apenas dois meses das eleições em Honduras, mandar tropas para proteger um demagogo como Zelaya é algo impensável. Não fazer nada é também absolutamente constrangedor.

Daí o apelo do Itamaraty ao Conselho de Segurança das Nações Unidas.

É o que resta para salvar a face. Tirar as castanhas do fogo com a mão do gato.

É, aliás, o que sempre resta a fazer quando se trabalha com uma política externa como a nossa, na qual a marquetagem dos governantes se sobrepõe aos interesses do país.

Francisco C. Weffort é sociólogo.

Sobre a ponte de Ciro com o PSDB

Maria Cristina Fernandes
DEU NO VALOR ECONÔMICO


Em visita ao Ceará no mês passado, o governador de Minas, Aécio Neves (PSDB), ouviu de Ciro Gomes que se sua candidatura vingasse no PSDB teria o apoio do deputado federal pelo PSB cearense. Na quarta-feira, quando pesquisas registravam sua ascensão, Aécio e Ciro voltaram a se falar. E o compromisso foi reiterado.

A candidatura Ciro atende aos mesmos apelos do mercado eleitoral que a de Marina Silva - a despolarização da disputa. E se o desmonte da lógica plebiscitária não interessa ao governador José Serra (PSDB) ou à ministra Dilma Rousseff (PT), anima, sim, o governador de Minas a permanecer na disputa.

Foi em dobradinha com Ciro que Aécio lançou e elegeu o ex-secretário-executivo do Ministério da Integração Nacional Márcio Lacerda (PSB) à Prefeitura de Belo Horizonte.

O desmonte da lógica plebiscitária ressuscita o discurso que Aécio tentou emplacar naquela eleição ao lado do ex-prefeito de BH, Fernando Pimentel (PT): o de que o país tem mais a ganhar numa rota de aproximação entre PT e PSDB do que na colisão.

Pimentel embarcou na candidatura Dilma e virou a página, enquanto Aécio recolheu suas armas face à liderança de Serra nas pesquisas até que Ciro, paradoxalmente o mais bélico do panorama eleitoral, lhe permitiu entoar novamente o mantra da conciliação.

O momento levanta temores de que o embate plebiscitário chamusque o tucanato. Aécio é favorável, por exemplo, a que o PSDB não obstrua a tramitação dos projetos do pré-sal para que a votação não chegue à fase mais quente da campanha eleitoral.

Se o debate, amplificado, não expõe posições tão antagônicas entre os dois partidos, explicita, por exemplo, o discurso do principal aliado tucano, o DEM, que tem batido de frente com os governistas no tema.

Aécio não despreza a capacidade de transferência de voto de um presidente da República com 80% de aprovação. Luiz Inácio Lula da Silva + Partido dos Trabalhadores levariam Dilma a 30% das intenções de voto. Além disso, caberia à candidata ampliar.

Para isso, dependeria além de seu carisma e traquejo político, do trânsito junto aos partidos da base governista, os mesmos que se alvoroçam quando surge uma terceira via ao plebiscito.

Dado que a relação histórica de Ciro com o senador Tasso Jereissati não reverbera fora do Ceará, e tendo Serra se tornado um adversário figadal, o governador de Minas tornou-se o principal interlocutor de Ciro no PSDB.

Face às pretensões nacionais do governador de Pernambuco e presidente de seu partido, Eduardo Campos, Aécio também acabou se tornando o principal aliado de Ciro na política nacional.

Oriundos do mesmo partido e região, Eduardo e Ciro não cabem numa mesma chapa. O mesmo já não se poderia dizer de uma chapa Aécio-Ciro, sonho ainda acalentado no Palácio da Liberdade.

O governador de Minas tem até meados de dezembro para decidir que rumo tomar. Não tem demonstrado estar empenhado numa disputa a ferro e fogo. Se avaliar que sua candidatura tem condições políticas e eleitorais de evoluir, vai entabular a realização de prévias.

No Palácio da Liberdade, a avaliação é de que estas só não aconteceriam se Serra decidir permanecer no governo de São Paulo, perspectiva alimentada pela possibilidade de o cargo ser entregue de volta ao seu antecessor, Geraldo Alckmin.

As pesquisas que chegam ao Palácio da Liberdade dão conta de que o governador paulista está próximo do teto de conhecimento - em torno de 90% -, Dilma já seria conhecida de sete em cada dez brasileiros e Aécio, de 60%.

O governador de Minas, estacionado num patamar de votos aquém dos 15%, terá, de imediato, poucas possibilidades de aumentar sua exposição nacional, única condição para fazê-lo deslanchar. A ascensão de Ciro não muda esse cenário, mas lhe dá uma âncora política.

Uma aliança com o PSB ainda seria conveniente para personagens do PSDB nacional como o presidente nacional do partido, o senador Sérgio Guerra (PE) e Tasso Jereissati.

A ambos, possibilitaria aproximar sua candidatura à reeleição ao palanque dos governadores de seus Estados, ambos do PSB e favoritos na disputa. Além do mais, uma candidatura Aécio, em aliança com o PSB, teria uma conotação de menor confrontação com o lulismo acachapante do Nordeste.

Na negociação com o PMDB, aposta-se que o PSDB tem espaço para evitar que o partido firme aliança formal com o PT. Os pemedebistas contam porque têm grandes bancadas na Câmara e no Senado, egressas de fortes estruturas partidárias nos Estados. Ao partido interessaria, acima de tudo, mantê-las e ao PSDB, abrir espaço para tanto.

No Sul, além dos palanques gaúcho e catarinense, o PSDB estaria disposto até mesmo a negociar a candidatura ao governo do Estado do prefeito de Curitiba, Beto Richa, em favor do senador Osmar Dias (PDT), um candidato que comporia mais facilmente com o PMDB.

Em Minas, Aécio mostra-se mais disposto do que a dupla petista Pimentel/Patrus Ananias a negociar com o senador Hélio Costa (PMDB). Na Bahia, os tucanos confiam que o rompimento do ministro Geddel Vieira Lima (PMDB) e o governador Jaques Wagner (PT) é para valer.

A perspectiva de Lula ausentar-se dos palanques estaduais pemedebistas não seria suficiente para ameaçar o partido, dado que haveria poucas candidaturas da base governista, a começar daquelas encabeçadas pelo PT, favoritas nos Estados.

O tom de Aécio em relação a Serra é conciliatório, mas está descartada, em definitivo, a chance de o eleitor mineiro aceitá-lo como vice. No Palácio da Liberdade ainda se avalia a conveniência de o governador licenciar-se por 15 dias para uma viagem pela Amazônia e pelo Nordeste no final do ano.

Ainda aguarda, sem afobamento, os desdobramentos políticos trazidos pela despolarização da campanha eleitoral. Das poucas certezas que exibe, está a de que o PSDB não terá outra chance como a de 2010 para chegar ao poder.

Maria Cristina Fernandes é editora de Política. Escreve às sextas-feiras

O azar e o porquê

Eliane Cantanhêde
DEU NA FOLHA DE S. PAULO


BRASÍLIA - A queda de dois aviões Rafale franceses foi provavelmente como a maioria dos acidentes: descuido humano e um baita azar. É improvável que dois aviões da mesma marca, da mesma Marinha, do mesmo porta-aviões tenham sofrido panes separadamente na mesma hora e caído. Ou seja: não é crível que foi falha técnica e que, portanto, os aviões são ruins.

Mas a queda esquenta a discussão sobre o programa FX-2 (de renovação da frota da FAB), pois a aparente decisão de Lula a favor dos Rafale tem muito a ver com a indicação de José Antônio Dias Toffoli para o Supremo. Um ato de voluntarismo explícito, sem a devida correspondência técnica e de argumentos.

Em outras palavras: tanto os Rafale quanto Toffoli parecem carregar uma lista de desvantagens, sem que as vantagens fiquem claras e consistentes. Sabe-se por que não. Não se entende por que sim.

A fábrica Dassault anda mal das pernas, como relata a imprensa francesa. Os Rafale só foram vendidos para as Forças Armadas da própria França, enquanto os F-18 da Boeing (EUA) rodam o mundo. E o preço e a manutenção são bem mais altos do que os do Gripen NG da Saab (Suécia), por exemplo.

Assim como Toffoli só tem 41 anos, não tem mestrado nem doutorado, levou duas bombas para juiz estadual e responde a dois processos na própria Justiça.

Então, por que Lula insiste nos Rafale, a ponto de o presidente da França, Nicolas Sarkozy, se dar ao direito de anunciar publicamente que o negócio já está virtualmente fechado?

Porque o governo brasileiro decidiu fazer uma tal "aliança estratégica" com os franceses.E por que Lula insiste em Toffoli e já está tudo bem amarrado no Congresso e no Supremo para nomeá-lo ministro da mais Alta Corte? Porque Toffoli foi um bom advogado das campanhas do PT.

Ou seja, no duro, no duro, a resposta é uma só: porque Lula quer.

Uma jogada em Honduras

Fernando Gabeira
DEU NA FOLHA DE S. PAULO


RIO DE JANEIRO - Estamos com um pepino em Tegucigalpa. Foi o que disse para apressar um debate e correr para o Congresso. Zelaya entrara na Embaixada do Brasil. Nesses momentos, discute-se a responsabilidade ou concentra-se em resolver uma situação delicada.

Política externa no Brasil não dá nem tira um mísero voto. Mas nossa importância está crescendo no mundo. Com ela, cresce a audácia de seus formuladores. O egípcio Farouk Hosni, que tanto criticamos, foi abraçado orgulhosamente por Lula e Amorim. Perdeu a eleição na Unesco. Quanto mais criticávamos a escolha, mais assumiram que era esse o caminho correto.

Já pedi asilo, já levei amigos que se asilaram e visitei outros que foram acolhidos. Conheço um pouco esse processo. Não acredito na versão. Mas é preciso contribuir para que o governo saia dessa situação delicada. Mesmo porque a melhor maneira de influenciá-los não passa pela crítica. De um modo geral, sentem-se feridos e empacam.

Manter a integridade de nosso prédio e das pessoas é uma causa comum. A outra é impedir que Zelaya transforme a representação brasileira numa sede de governo. A partir dessas premissas, é possível que o pior seja evitado.

Há uma chance de que a crise se arraste até as eleições. Nesse caso, o problema seria resolvido pelo novo governo, investido do voto popular.

Vamos jogar paciência. Se Honduras não se importa que Zelaya fique um tempo, como declarou Micheletti, se Zelaya não se importa em ficar calado, há uma ampla margem de manobra.

Num outro país, talvez fosse possível influenciar o governo a partir do Congresso. Aqui é difícil. Há uma santíssima trindade que tudo sabe, tudo vê, tudo decide. Se optou por um salto no escuro é preciso ajudá-la. Caso contrário, a saída é tomar um porre com Farouk em Charm El Sheik.

E o Fed começou a se mover...

Luiz Carlos Mendonça de Barros
DEU NA FOLHA DE S. PAULO

As primeiras medidas, longe de sinalizar aperto monetário, são uma resposta à exigência de menor liquidez do mercado

OS MERCADOS estão claramente precificando uma recuperação econômica na maior economia do mundo. Embora ainda se ouçam algumas advertências, a grande maioria trabalha hoje com esse cenário.

A recessão ficou para trás, embora os obstáculos para uma normalização do crescimento se projetem para 2010 e, provavelmente, para 2011. Portanto nada mais natural que os instrumentos monetários que foram utilizados pelo Fed (banco central dos Estados Unidos) para evitar um colapso do sistema financeiro americano sejam desativados ao longo dos próximos meses. A questão que se coloca é a forma e a rapidez com que serão retirados mais de US$ 1 trilhão do sistema bancário norte-americano.

Como sempre ocorre com as questões econômicas mais sensíveis, os analistas estão divididos em grupos: de um lado, os que projetam uma explosão inflacionária se o Fed não agir já; no outro extremo, os que defendem a manutenção da liquidez atual sob o risco de abortar uma recuperação econômica ainda muito frágil. Finalmente, os que entendem que ainda é muito cedo para mudar a ação do Fed, mas que este já deveria anunciar seu plano de ação para o futuro.

O movimento do Fed -quando ocorrer- vai provocar grande volatilidade com ajustes discretos de preços dos ativos financeiros. Por isso, a instituição presidida por Ben Bernanke sabe que está pisando em ovos. A forma como ele vai comunicar ao mercado uma mudança em sua política monetária precisa ser construída com a sabedoria e a sutileza de um artesão. Por isso, tenho procurado identificar pequenos sinais que possam sinalizar o início de sua ação.

Aconselho aqueles que estão comigo na mesma busca a não esperar que isso venha a acontecer de maneira formal nas reuniões periódicas do comitê de política monetária americano. Antes, os mercados serão informados de maneira indireta -certamente em pequenas pílulas- da decisão de encerrar o chamado "afrouxo monetário quantitativo".

Essa forma de agir tem a grande vantagem de não fixar prazos para seu início, além de permitir uma meia-volta se a economia reagir mal a esse movimento. Também é uma maneira eficiente de lidar com a tradicional histeria dos investidores em momentos cruciais como esse que será vivido à frente.

Foi o que aconteceu nesta semana. Em um primeiro e sutil movimento, o Fed iniciou uma série de consultas a instituições financeiras e a fundos de investimento para discutir a mecânica para realizar operações de curto prazo -chamadas de venda de compromisso de recompra- tendo como lastro títulos de crédito que hoje compõem sua carteira de mais de US$ 2 trilhões. Essas operações permitem que o Fed retire liquidez rapidamente dos mercados quando achar necessário.

Outra "piscada" veio na quarta-feira e ontem com uma série de medidas que afetam as intervenções do Fed no mercado bancário e de títulos, diminuindo o volume e o prazo dos leilões de crédito (os chamados TAF e TSLF) e estendendo o prazo das compras dos títulos lastreados em empréstimos imobiliários. Essas medidas, longe de sinalizar um aperto monetário, foram uma resposta à necessidade menor de liquidez do mercado.

Apesar de não terem efeitos no curto prazo, elas sinalizam uma ação mais efetiva no futuro. Certamente, os mais preocupados com os efeitos inflacionários do excesso de liquidez atual vão ficar mais calmos, e os que se preocupam com a eventual volta da recessão não podem ainda criticar a ação do Fed.

Luiz Carlos Mendonça de Barros , 66, engenheiro e economista, é economista-chefe da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações (governo Fernando Henrique Cardoso).

O QUE PENSA A MÍDIA

Editoriais dos principais jornais do Brasil
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Em SP, Serra e Dilma protagonizam duelo de números sobre habitação

Clarissa Oliveira e Silvia Amorim
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Ministra propõe meta de 8 milhões de moradias em 15 anos; tucano cita investimento de R$ 1,9 bi no setor em SP

Prováveis candidatos à Presidência da República no próximo ano, a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff (PT), e o governador de São Paulo, José Serra (PSDB), usaram ontem o palanque em um evento do setor imobiliário na capital paulista para mostrar o poder de fogo de cada um em uma área de forte apelo popular, a habitacional. Numa prévia do que pode ser a campanha de 2010, eles expuseram um cardápio de realizações e promessas.

A ministra propôs como meta zerar o déficit habitacional de 8 milhões de moradias em 15 anos. "Eu acho 15 anos uma meta factível. Vamos atingir com tranquilidade, porque tenho certeza de que este país vai crescer."

Serra prometeu entregar até o fim de sua gestão 100 mil unidades habitacionais e ainda lembrou que foi um dos criadores da estatal paulista Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU). "Até há pouco a CDHU talvez fosse a única do Brasil, pelo volume e pela ênfase, a atender a faixa da população de 0 a 3 salários mínimos", disse, na abertura de tradicional feira de imóveis na zona norte da capital.

Em 14 minutos de discurso, ele mencionou sete ações de seu governo na habitação e apresentou uma lista de números sobre investimentos e obras. Cerca de R$ 1,9 bilhão de gastos com moradia e urbanização de favelas, 367 mil casas entregues até agora e outras 65 mil em construção foram alguns dos itens citados. "Nunca em São Paulo o poder público esteve tão envolvido com essas comunidades como nos últimos anos", afirmou.

"ESPETÁCULO"

Deixando claro que vai trabalhar o programa Minha Casa, Minha Vida como uma de suas bandeiras de campanha, Dilma até ressuscitou a promessa feita por Lula de comandar o "espetáculo do crescimento", feita ainda no início do governo petista. "Acho que o programa Minha Casa, Minha Vida é uma pré-estreia. Porque vai ser, como o presidente uma vez disse e foi muito ironizado, o espetáculo do crescimento." Serra, sem citar o nome do programa federal, anunciou que fechou parceria com o Ministério das Cidades para a construção de 13 mil moradias no Estado.

A aparição conjunta de Serra e Dilma num evento público ocorre dois dias após a divulgação de pesquisa CNI/Ibope. Segundo a sondagem, Serra mantém a liderança na corrida presidencial, apesar de uma queda de 4 pontos em relação ao levantamento anterior, e Dilma aparece tecnicamente empatada com o deputado Ciro Gomes (PSB-CE) no segundo lugar.

Embora em lados opostos no campo político, o clima ontem foi amistoso. O governador e a ministra cumprimentaram-se com dois beijos, caminharam pela feira lado a lado e trocaram algumas palavras no percurso.

Gabeira reflui e Zito avança no PSDB

Ana Paula Grabois, do Rio
DEU NO VALOR ECONÔMICO

Enquanto o PSDB do Rio segue sem definir se terá candidatura própria ao governo do Estado em 2010, o prefeito de Duque de Caxias, José Camilo Zito, tenta se aproximar das lideranças nacionais da legenda para emplacar sua candidatura ao governo do Estado do Rio no ano que vem. Na terça-feira, vai a Belo Horizonte conversar com o governador de Minas Gerais, Aécio Neves. "Tem que ver primeiro qual será o candidato a presidente. Mas a minha candidatura precisa ter apoio nacional. Não serei candidato só para fazer média e servir à candidatura presidencial", disse o prefeito de Caxias.

Presidente regional do PSDB do Rio, Zito passou a ser opção de boa parte dos tucanos no Estado porque a candidatura do deputado federal Fernando Gabeira (PV-RJ) para governador ficou mais complicada com a entrada da senadora Marina Silva no PV e o eventual lançamento de sua candidatura a presidente em 2010. O deputado do PV pretendia ter dois palanques na eleição: o de Marina Silva e o do candidato do PSDB.

Agora, Gabeira avalia ser mais provável sair como candidato a uma das duas vagas ao Senado no ano que vem. "O problema não é a candidatura Zito, é o palanque duplo", disse o deputado do PV. Seu próprio partido defende a disputa ao Senado. Nas eleições para prefeito do Rio do ano passado, Gabeira fechou coligação com PSDB, PPS e DEM e perdeu no segundo turno por pouco para Eduardo Paes (PMDB).

Zito, de estilo popular e polêmico - tem acusações de envolvimento com grupos de extermínio da Baixada Fluminense -, classifica Gabeira como "uma pessoa light, da classe fina", "político elitista" e dono de um perfil que não atrai o eleitorado popular. Critica Gabeira pelo fato dele nunca ter sido eleito para um cargo executivo. "Ele precisa sentir o problema do povo trabalhador", afirmou Zito, deputado estadual mais votado no Estado em 2006.

O prefeito de Duque de Caxias tem o apoio da maior parte do PSDB do Rio, como o presidente de honra do partido, o ex-governador Marcello Alencar. Sofre resistências, contudo, por parte dos outros partidos da coligação tucana. DEM e PPS preferem o nome de Gabeira. A exceção entre os tucanos do Rio é o ex-deputado federal Márcio Fortes, ligado ao governador de São Paulo, José Serra, que também apoia o nome de Gabeira para governador em busca de um palanque no Estado.

O deputado estadual Luiz Paulo Corrêa da Rocha, que antes de uma reunião da coligação na semana passada defendia abertamente a candidatura de Zito, resolveu não se manifestar sobre o assunto. "Nada está decidido. Só vou me posicionar no fim de março. Estamos em reflexão", afirmou o deputado.

Na corrida pelo governo do Estado em 2010 também está o atual governador do Rio, Sérgio Cabral (PMDB). O prefeito de Nova Iguaçu (RJ), Lindberg Farias (PT), tenta ganhar terreno no seu partido para lançar-se candidato, mesmo contrariando os interesses de Cabral, aliado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O ex-governador Anthony Garotinho (PR), também já anunciou a intenção de sair como candidato ao governo do Estado no ano que vem.

Marina critica Lula

DEU EM O GLOBO

Ela queria discurso sobre clima na ONU

BRASÍLIA. A senadora Marina Silva (PV-AC), pré-candidata à Presidência da República, criticou ontem a atuação do presidente Lula na abertura da Assembleia Geral da ONU, quarta-feira, em Nova York. Ela classificou como frustrante o discurso de Lula, por ter se concentrado apenas na crise em Honduras, e não nas mudanças climáticas e na necessidade de redução da emissão de gases de efeito estufa.

Para ela, o Brasil perdeu a oportunidade de liderar esse processo. Um dia antes da abertura da Assembleia Geral, cerca de cem chefes de estado participaram de uma reunião convocada pelo secretário-geral da ONU, Ban Ki-Moon, para discutir o aquecimento global. Lula não participou.

— O caráter da reunião exigia que o Brasil tivesse posição mais firme, inclusive na reunião que tratou especificamente da questão do clima e que lá não tivemos o nosso presidente. Perdemos uma boa oportunidade na reunião da ONU, devido à falta de foco do nosso presidente em relação ao clima. Ficamos só em Honduras, que também é importante — disse a presidenciável.

Decisão da ONU aponta para mundo sem armas nucleares

Marília Martins
Correspondente
DEU EM O GLOBO


Numa sessão histórica, o Conselho de Segurança da ONU aprovou por unanimidade uma resolução pedindo o fortalecimento do Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares. Primeiro presidente dos EUA a presidir uma reunião do conselho, Barack Obama disse que a decisão reafirma o compromisso dos países “com a meta de um mundo sem armas nucleares". O secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, elogiou a decisão: "Vivemos hoje o começo de um novo futuro. Os cínicos diriam para sermos realistas, mas estão errados porque o desarmamento é o caminho mais seguro."

Resolução histórica contra as armas nucleares

Conselho de Segurança da ONU, presidido por Obama, aprova pedido pelo fim da corrida armamentista atômica

NOVA YORK. Numa sessão histórica, o Conselho de Segurança da ONU aprovou ontem por unanimidade uma resolução pedindo o fortalecimento do Tratado de Não-Proliferação de Armas Nucleares e a convocação de uma nova conferência sobre o tema para 2010. Foi a primeira vez que um presidente americano presidiu uma reunião do Conselho de Segurança. Barack Obama, que chegou à ONU acompanhado da secretária de Estado Hillary Clinton e da embaixadora americana na ONU Susan Rice, elogiou a resolução por “reafirmar o compromisso de todos com a meta de um mundo sem armas nucleares”.

Ao longo da reunião, que durou duas horas, Obama alertou que um único artefato nuclear em mãos de terroristas numa grande cidade poderia matar milhões de pessoas, deflagrando um conflito de proporções globais e lembrou que a ONU tem um papel central da prevenção de novas crises mundiais.

— Em meu país existe hoje um consenso entre democratas e republicanos na busca de ações pelas quais possamos reduzir o arsenal nuclear mundial e os riscos de um conflito.

Uma guerra nuclear não pode ser vencida e jamais deveria ser lutada — disse Obama.

Irã e Coreia do Norte não foram citados na resolução O texto da resolução foi feito pela diplomacia americana e aprovado por unanimidade, após serem retiradas menções nominais ao Irã e à Coreia do Norte, a pedido da China e da Rússia. Em seu discurso, porém, Obama citou os dois países e cobrou compromisso com resoluções já aprovadas contra eles, mas ainda sem resultados: — Não se trata de cobrar de nações individualmente, mas sim de trabalhar para uma união mundial de modo a provar que o direito internacional não é apenas uma promessa vazia.

O secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, também qualificou o momento atual como o de uma “decisão histórica”: — Vivemos hoje o começo de um novo futuro. Os cínicos diriam para sermos realistas, mas hoje eles estão errados porque o desarmamento é o caminho mais seguro para garantir um futuro para todos — avaliou o secretário, que previu uma nova rodada de negociações em busca de consenso para a conferência de 2010 e de novos signatários para o Tratado de Não-Proliferação de Armas Nucleares, assinado por 188 nações, mas que exclui nove países-chave, entre eles Israel, Índia, Paquistão e Coreia do Norte. O Irã é signatário do tratado.

A presença de Obama na reunião do Conselho de Segurança pretendeu, disse a Casa Branca, chamar atenção para o novo papel reservado para a ONU na política externa americana.

A reunião teve presença de 14 dos 15 líderes que atualmente estão no Conselho e o único ausente foi Muamar Kadafi, presidente da Líbia. Fazem parte do conselho EUA, Costa Rica, Croácia, Rússia, México, Áustria, Vietnã, Uganda, China, França, Burkina Faso, Reino Unido, Japão, Turquia e Líbia (num assento temporário). Também esteve presente Mohamed El Baradei, o diretor da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA).

Chávez diz que ONU não cheira mais a enxofre O texto da resolução pede que esses quatro países assinem o tratado e que aqueles que têm armas nucleares façam esforços para reduzir o arsenal existente e trabalhem em prol de um “tratado de desarmamento geral e completo sob rígido controle internacional”.

E inclui medidas citadas por Obama em discurso em Praga, em abril, como um banco de combustível internacional para salvaguardar o material nuclear e negociações para um tratado que acabe com a produção dos materiais físseis usados nas armas atômicas.

Rússia e EUA devem assinar em dezembro um acordo para novas reduções em seus arsenais nucleares, e Obama promete o início de uma rodada de negociações com vistas a proibir a fabricação de artefatos nucleares de nova geração. E disse esperar que o Congresso americano ratifique um acordo para o banimento de testes nucleares: — Os próximos 12 meses serão decisivos para saber se nossos esforços para estancar a proliferação de armas nucleares poderão ser bem-sucedidos.

O presidente da China, Hu Jintao, disse que o país não planeja extinguir seu arsenal nuclear.

— Vamos manter nossas instalações nucleares no nível mínimo exigido para garantir a Segurança Nacional, e faremos esforços para avançar no processo de desarmamento internacional.

As críticas a Obama vieram de centros de delegações de países do movimento pelo não-alinhamento, que condenaram o texto da resolução pelo tom de ameaça para os que violarem obrigações nucleares.

— Obama está tentando promover a política externa americana como a busca de uma nova liderança mundial, mas o Conselho de Segurança vota apenas segundo os interesses de seus membros — diz Henry Sokolski, diretor-executivo do Centro de Educação e Políticas de Não-Proliferação de Armas.

Em discurso na ONU, o venezuelano Hugo Chávez acusou o Pentágono de estar por trás do golpe em Honduras e disse que há divergências entre os departamentos de Defesa e o de Estado.

Mas afirmou que o “cheiro de enxofre” da era Bush havia sido trocado pelo “cheiro de esperança” de Obama, e que temia muito pela vida do presidente americano. Ele convidou ainda Obama a se juntar ao socialismo e integrar “o eixo do mal”: — Não cheira mais a enxofre.

Cheira a outra coisa, a esperança.

E é preciso colocar a esperança no coração.

Nova versão põe Brasil no centro da operação Zelaya

Gilberto Scofield Jr. e Marília Martins
Enviado especial e correspondente
Pittsburgh, Nova York e Tegucigalpa
DEU EM O GLOBO


Num duro comunicado, o governo comandado por Roberto Micheletti acusou o Brasil de intromissão em assuntos internos, mencionando declaração do presidente deposto, Manuel Zelaya, que, em entrevista a uma rádio brasileira, disse ter consultado o presidente Lula e o chanceler Celso Amorim antes de refugiar-se na embaixada em Tegucigalpa. O texto diz ainda que recai sobre o Brasil "a responsabilidade pela vida e segurança” de Zelaya, assim como as consequências por "permitir que se converta a missão (diplomática) numa plataforma de propaganda política e concentração de pessoas armadas". Em Pittsburgh, Lula negou as acusações: "Vocês vão ter que acreditar ou num golpista ou em mim. Ele tinha que parar em alguma embaixada e eu acho que a preocupação não é saber em que embaixada ele está e como chegou lá". O presidente da Venezuela, Hugo Chávez, reconheceu que não só sabia da volta de Zelaya como ajudou a simular que estava viajando para Nova York, para a Assembleia Geral da ONU. "Foi uma operação secreta, um truque."

Micheletti liga Brasil à volta de Zelaya

Governo interino acusa Lula de ter conhecimento da viagem de presidente deposto. Chávez admite participação

Os rumores e versões de envolvimento de países das Américas do Sul e Central no regresso do presidente deposto Manuel Zelaya a Honduras são cada vez mais fortes e envolvem agora não apenas Venezuela, Nicarágua e El Salvador, mas também o Brasil. Num duro comunicado ontem, o Ministério de Relações Exteriores do governo interino hondurenho acusou o Brasil de intromissão, mencionando uma declaração de Zelaya de que teria consultado o presidente Luiz Inácio Lula da Silva antes de buscar abrigo na embaixada brasileira.

Em entrevista à Rádio Jovem Pan, Zelaya responde por que escolheu a Embaixada do Brasil: — Foi uma decisão pessoal e foi consultada com o presidente Lula, o chanceler Amorim e o encarregado de negócios em Tegucigalpa.

Em reação, a Chancelaria hondurenha reclamou da “intromissão do Brasil em assuntos internos”, afirmando que a declaração do governo brasileiro de que não tinha conhecimento prévio sobre a viagem foi desmentida pelo presidente deposto na entrevista.

O texto afirma ainda que recai sobre o Brasil “a responsabilidade pela vida” de Zelaya, assim como as consequências por “permitir que se converta a missão (diplomática) numa plataforma de propaganda política e concentração de pessoas armadas”.

O Ministério da Informação interino, porém, descartou um rompimento de relações.

Em Pittsburgh, o presidente Lula negou as acusações: — Vocês vão ter que acreditar num golpista ou em mim — disse. — Veja, ele tinha que parar em alguma embaixada e acho que a preocupação não é saber em que embaixada ele está e como chegou lá. O caso concreto é que tem um golpista no poder. Eu não vejo nenhuma justificativa para o golpe.

Peças para formar esse quebracabeças vêm surgindo. Em compromissos nos Estados Unidos, o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, admitiu que não só tinha conhecimento do regresso de Zelaya como ajudou-o a simular que estava viajado para Nova York, para a Assembleia Geral da ONU.

— Foi uma operação secreta, um truque — disse Chávez.

Para García, uma cortina de fumaça

O jornal espanhol “El País” já havia revelado que Zelaya havia seguido num avião venezuelano até El Salvador, e de lá entrado por terra em Honduras.

Na quarta-feira à noite, Chávez contou que ele e Zelaya conversaram por telefone e, temendo serem grampeados, discutiram planos para assistirem à Assembleia Geral da ONU. Zelaya, no entanto, voou para El Salvador, onde pousou no domingo.

— O avião decolou, mas sem Zelaya e aqui (em Nova York) esperavam por ele — disse Chávez, afirmando que “foi Zelaya quem traçou o plano” e que acompanhou a viagem por telefone.

“El País” sugere ainda o envolvimento de outros países. O avião com Zelaya, vindo da Nicarágua, pousou em San Salvador, onde foi recebido por dirigentes do partido no governo: a Frente Farabundo Martí para a Libertação Nacional (FMLN). A partir daí, Zelaya teria entrado em Honduras de carro. Rumores sugerem que Chávez teria sugerido a Zelaya procurar a embaixada brasileira em Tegucigalpa.

O assessor internacional da Presidência da República, Marco Aurélio Garcia, afirmou que a sugestão de que a volta do presidente deposto tenha sido planejada por Chávez serve apenas para desviar a atenção do fato de que houve um golpe de Estado.

— Ainda que seja verdade, a sugestão de que Chávez está por trás da volta de Zelaya não tem a menor importância diante do fato de que houve um golpe de Estado que possui ressonância no continente inteiro. Quem defende esta tese quer mesmo é pôr uma cortina de fumaça para esconder o golpe — disse Garcia, afirmando que não houve qualquer participação do governo brasileiro e que o Brasil não teria nenhum pudor em admitir isso.

Amorim fez coro ao rebater as acusações contra o Brasil e de que Zelaya não seria o presidente legítimo.

— Deve haver procedimentos legais para tirar um presidente do poder.

Não é chamar o Exército, botar um fuzil na cabeça, sequestrá-lo de madrugada, enviá-lo a outro país. Isso acabou na América Latina e no Caribe.

O embaixador do Brasil na OEA, Ruy Casaes, afirmou: — Para nós não interessam as acusações que (o governo) Roberto Micheletti possa fazer. Não tem credibilidade para fazer acusações. E Honduras continua responsável pela integridade da embaixada e de Zelaya.

A polêmica chegou à Venezuela com a publicação do artigo do respeitado colunista Nelson Bocaranda Sardi no jornal “El Universal” afirmando que o Brasil planejou o retorno de Zelaya.

O objetivo era fazer com que ele chegasse à Casa da ONU, em Tegucigalpa, transformando Honduras no assunto principal da Assembleia Geral. Mas o anúncio prematuro de Chávez de que o presidente deposto estava em Honduras teria alterado o trajeto.

Bocaranda diz que a Venezuela tinha três planos para a volta de Zelaya e que eles teriam sido passados a um alto funcionário do governo brasileiro — ele indaga se seria Garcia — pois o Brasil estava montando uma estratégia para o regresso. Zelaya teria seguido com um guarda-costas venezuelano, e Chávez acabou anunciando o retorno antes que chegasse ao prédio da ONU, deixando Lula contrariado com um resultado diferente do previsto.

Com agências internacionais

Bancários prometem ampliar greve hoje

Claudia Rolli
DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Paralisação atingiu 2.881 locais de trabalho, diz sindicato; Febraban não divulga adesão, mas contesta dados

Bancários de 2.881 agências e locais de trabalho de 27 Estados e do Distrito Federal entraram em greve ontem, segundo a Contraf (Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro), ligada à CUT.

A paralisação deve se ampliar, de acordo com entidade, que representa cerca de 420 mil dos 450 mil bancários em campanha salarial no Brasil.

O número de trabalhadores que paralisaram as atividades nas 106 regiões do país em que a greve foi aprovada anteontem não foi divulgado pelos dirigentes. Em São Paulo, o sindicato da categoria estimou que a adesão à greve foi de 29 mil dos 134 mil bancários da capital e região, em 679 locais de trabalho, incluindo agências, centros administrativos e operacionais.

A Febraban (federação dos bancos) não sabe informar quantos trabalhadores aderiram ao primeiro dia da greve, mas considera que a adesão não foi expressiva devido ao baixo número de reclamações. "Isso prova que a paralisação não prejudicou o trabalho nas cerca de 20 mil agências e nos 15 mil postos de atendimento no Brasil. Acho exagero dizer que a greve afetou 15% dos locais de trabalho", afirma Magnus Apostólico, da Febraban.

Agências foram parcialmente afetadas e voltaram a funcionar ontem à tarde, segundo ele.

"Nossa maior preocupação é com o pagamento dos aposentados, que se inicia na sexta [hoje] e vai até o quinto dia útil de outubro."

Carlos Cordeiro, presidente da Contraf-CUT, rebate: "Nosso objetivo não é prejudicar nem os aposentados nem os clientes. Mas a categoria quer aumento real e uma participação nos lucros maior. O setor tem condições de atender o pedido com os lucros obtidos, resultado da receita de prestação de serviços e tarifas cobradas. Somente no primeiro semestre, os bancos lucraram R$ 19,3 bilhões, segundo o BC."

A greve atingiu bancos públicos (Banco do Brasil e Caixa) e privados (principalmente Bradesco, Itaú Unibanco e Santander-Real). A categoria quer 10% de reajuste e PLR no valor de três salários mais R$ 3.850 fixos. Os bancos ofereceram 4,5% de reajuste (para repor a inflação) e PLR calculado em duas partes -a primeira de 1,5 salário com teto de R$ 10 mil e 4% do lucro líquido deste ano. E a segunda, de 1,5% do lucro líquido, distribuído entre os empregados, com teto de R$ 1.500.

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