segunda-feira, 5 de setembro de 2022

Fernando Gabeira - Sinais de vida na campanha

O Globo

Existe toda um futuro pela frente, quando Bolsonaro se tornar apenas uma lembrança amarga

O papel das mulheres foi um tema de destaque no debate entre os candidatos. Isso me alegra. Nas eleições no Chile e na Colômbia, o assunto surgiu no contexto do programa da esquerda, que venceu.

Aqui no Brasil, além de sua inserção clássica na esquerda, a dignidade e a importância das mulheres foram defendidas por uma candidata de centro e outra de centro-direita.

Isso me leva a considerar que as coisas foram tão longe que hoje não se pode associar a sociedade patriarcal ao capitalismo. A abertura para o imenso potencial humano relegado pelo machismo pode enriquecer o próprio sistema.

As mulheres são a maioria do eleitorado. Mas foi uma pergunta da jornalista Vera Magalhães que desfechou o debate, repercutindo até no exterior. Bolsonaro respondeu com agressões.

Carlos Pereira* - O bônus desproporcional de ser governo

O Estado de S. Paulo

Emendas impositivas são equivalentes a ‘isonomia salarial’ e retiram incentivos para que parlamentares participem da coalizão de governo

Embora pareça haver consenso quanto à necessidade de o presidente ter discricionariedade sobre “moedas de troca” para que o presidencialismo multipartidário seja minimamente funcional, existe muito ceticismo em relação à possibilidade de reversão das emendas impositivas.

Afinal de contas, por que os parlamentares abririam mão dos poderes conquistados via execução mandatória de suas emendas orçamentárias? Os parlamentares, supostamente, nunca foram tão felizes... O que o novo presidente eleito teria a oferecer aos legisladores?

Decisões coletivas em um Parlamento tendem a ser intransitivas quando desprovidas de coordenação pelo presidente. As maiorias que eventualmente se formam são cíclicas, o que gera maiores custos de governabilidade. E o que é mais grave, instabilidade e incoerência no perfil de políticas públicas aprovadas.

Marcus André Melo* - Orçamento secreto

Folha de S. Paulo

São variados os arranjos em torno do jogo orçamentário nas democracias consolidadas

Em Moçambique, veio à tona, em 2016, a existência de despesas não contabilizadas e desconhecidas do Poder Legislativo e do Tribunal de Contas no valor de US$ 2 bilhões. O ex-presidente e seu filho foram acusados. O ex-ministro das Finanças está preso na África do Sul. No Brasil, as despesas —muitas superfaturadas— são registradas ("A Organização", 2020, de Malu Gaspar).

jogo do Orçamento envolve os Poderes Executivo e Legislativo. Em democracias consolidadas o jogo é outro: o Orçamento é, em geral, impositivo e a execução, transparente. Nos EUA, Nixon chegou a contingenciar o Orçamento; o Congresso reagiu com o "Impoundment Act", que fechou as brechas de interpretação a respeito. Projetos localistas ("pork barrel") são objeto de intensa barganha que, no entanto, ocorre no Congresso. O Executivo não é parte da barganha.

Na maior parte das democracias parlamentaristas consolidadas a não aprovação do Orçamento do Poder Executivo equivale a uma moção de desconfiança. Não há emendas localistas ao Orçamento durante sua tramitação. Sob governos de coalizão, a barganha é programática.

Celso Rocha de Barros - Incompetência e morte!

Folha de S. Paulo

É triste que nosso bicentenário seja comemorado como festa em homenagem ao pior líder que o Brasil já teve

bicentenário da Independência do Brasil deveria ser um momento de grandes eventos culturais e discussões públicas sobre o que foi a história brasileira até aqui e o que devemos fazer de agora em diante. Em vez disso, Bolsonaro está andando pra lá e pra cá com um pedaço de defunto e vai fazer um comício a favor do golpe de Estado no dia 7 de setembro.

Ainda não se sabe o quanto o ato de quarta-feira será comício e o quanto será tentativa de golpe: só se sabe que será uma mistura dos dois, e que crimes serão cometidos. Golpe de Estado é proibido, usar as Forças Armadas em comício também.

Lygia Maria - Você conhece o "isentão"?

Folha de S. Paulo

Na disputa messiânica que se transformou a política brasileira, ele é o ateu e foi parar na fogueira

Quando todos começam a tomar partido, quem não toma geralmente é mal visto. Nas eleições esse fenômeno se escancara: quem vota nulo é criticado e recebe a pecha de "isentão". Nas redes sociais, conversas de botequim e almoços em família, vê-se o mesmo tipo de ataque, como esta postagem de um famoso jornalista no Twitter: "Isentos são cúmplices morais de assassinos". Ou seja, caso Bolsonaro vença, a culpa é do "isentão".

Curiosa essa visão de que voto nulo decide eleição. Na última eleição, por exemplo, seria necessário que todos os votos brancos e nulos fossem para Haddad para que ele pudesse vencer. Mais estranha ainda é essa ideia de que o eleitor seria obrigado a votar, mesmo que as opções disponíveis contrariem princípios que lhe são caros.

Bruno Carazza* - De D. Pedro para Lula e Bolsonaro, de coração

Valor Econômico

Crises fiscais e inflação assombram o país há 200 anos

Esqueça o brado retumbante de um povo heroico ouvido pelas margens plácidas do Ipiranga, cantadas no Hino Nacional. Há duzentos anos, quando rompemos os laços de submissão que nos prendiam a Portugal, o grito “ou ficar a Pátria Livre ou morrer pelo Brasil”, mencionado no Hino da Independência, foi apenas uma frase de efeito. Na verdade, “o Brasil nasceu de uma crise fiscal. Seu pai foi o déficit; sua mãe, a inflação”.

Provocadora, a frase sintetiza as conclusões de uma pesquisa profunda e um texto muito bem escrito conduzidos pelo jornalista Rafael Cariello e pelo economista Thales Zamberlan Pereira. “Adeus, senhor Portugal: crise do absolutismo e a Independência do Brasil”, que será lançado hoje em São Paulo, mais que uma robusta tese sobre o contexto da nossa Independência, utiliza a economia para conectar as circunstâncias do passado com os desafios do presente.

Desde que Dom João VI e a família Real se instalaram no Rio em 1808, após fugirem da invasão de Portugal pelas tropas de Napoleão, sobriedade e contenção não eram virtudes cultivadas por aqui.

Sergio Lamucci - Um orçamento irrealista e disfuncional

Valor Econômico

Seja pelo aperfeiçoamento do teto de gastos, seja pela adoção de uma nova regra, será preciso focar no controle dos gastos obrigatórios

O cenário para as conta públicas de 2023 está marcado por incertezas. O projeto de lei orçamentária anual (PLOA) apresentado na semana passada trouxe projeções irrealistas e prioridades discutíveis, além de reforçar o quadro cada vez mais disfuncional do Orçamento brasileiro. Como pano de fundo, há a indefinição sobre uma regra que dê previsibilidade para a trajetória fiscal de longo prazo, uma vez que o teto de gastos foi driblado várias vezes pelo governo de Jair Bolsonaro, minando a credibilidade do instrumento.

No terreno do irrealismo, um dos destaques é o Auxílio Brasil, que aparece no PLOA com valor médio de R$ 405, embora os candidatos à Presidência prometam manter no ano que vem os R$ 600 vigentes no segundo semestre deste ano. Isso deve exigir nova mudança na Constituição, para driblar mais uma vez o teto de gastos. O ministro da Economia, Paulo Guedes, cogitou na semana passada a prorrogação do estado de calamidade no ano que vem para seguir com o benefício nos atuais R$ 600.

Demétrio Magnoli - Gorbachev foi um herói trágico

O Globo

O último líder soviético desarmou a maior bomba-relógio do século XX

Mikhail Gorbachev desarmou a maior bomba-relógio do século XX. O timoneiro do naufrágio do Estado soviético desviou a nau fracassada dos escolhos da guerra civil e da guerra nuclear. A humanidade deve-lhe isso.

Não foi do jeito que ele queria. Gorbachev engajou-se na reforma da URSS, mas acabou gerenciando sua implosão. Imaginou um país de cidadãos livres, em que a lei prevaleceria; no fim, à sombra de um Z que é meia suástica, a Rússia tornou-se uma autocracia repressiva onde a palavra “paz” foi criminalizada. Sonhou com uma URSS integrada a uma Europa sem alianças militares; hoje, a Rússia putinista está mais isolada da Europa do que nunca, condenando-se a operar como posto de combustíveis da China.

O último líder soviético inspirava-se não em Marx ou Lênin, mas em Vissarion Belinsky (1811-1848) e Alexander Herzen (1812-1870), pensadores russos atraídos pelas ideias liberais e socialistas que sopravam da Europa. Belinsky escreveu uma carta aberta clamando pelo fim da servidão camponesa — e Dostoiévski foi preso por lê-la em eventos públicos. Herzen enxergou o caminho do futuro na Revolução Francesa e semeou as ideias do socialismo agrário russo.

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

Editoriais / Opiniões

Governo transforma o ensino superior em terra arrasada

O Globo

Matrículas caíram de 1,3 milhão para 1,2 milhão, segundo Censo — só em 2020, 270 mil alunos trancaram o curso

O último Censo da Educação Superior identificou queda no número de alunos matriculados nas universidades, de 1,3 milhão em 2019 para 1,2 milhão em 2020. Contribuiu para isso o trancamento de 270 mil matrículas. O enfrentamento da evasão nas universidades, num país que carece de profissionais qualificados, tem relação evidente com o corte nas bolsas de auxílio aos alunos carentes, não apenas dos cotistas, forçado pelo garrote orçamentário que o governo Jair Bolsonaro impôs às universidades federais. O tema foi abordado com destaque no VIII Fórum Nacional de Reitores e Dirigentes das Universidades Parceiras do Futura, canal ligado ao Grupo Globo que faz 25 anos.

Em 2020, no Censo universitário realizado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), do MEC, completou-se outra “década perdida” no ensino superior. A taxa anual média de crescimento foi de irrisório 0,3%, segundo a Fundação Getúlio Vargas. Na pandemia, a situação ficou ainda pior, devido à corrosão dos orçamentos familiares e à aceleração da inflação. A evasão do ensino superior está expressa também na queda no número de alunos que se formam: segundo o Censo, os diplomados nas universidades cresceram até atingir quase 157 mil estudantes em 2018, quando passaram a cair, até chegar a 118 mil em 2020.

Poesia | Bertolt Brecht - De que serve a bondade

 

Música | Sururu da Roda - Teresa Cristina / Diogo Nogueira e outros