Que o ex-secretário de Comunicação de Bolsonaro Fabio Wajngarten mentiu na CPI da Covid, disso não há dúvida. A partir daí, é possível detectar como os senadores estão despreparados para os interrogatórios e prospectar um resultado muito mais político do que real, se não mudarem de postura. Um resultado político pode ser sem grande valia, pois a própria característica da decisão poderá dar ao presidente Bolsonaro uma escapatória, atribuindo às acusações da CPI um teor eleitoral.
Política e cultura, segundo uma opção democrática, constitucionalista, reformista, plural.
quinta-feira, 13 de maio de 2021
Merval Pereira - Mentiras perigosas
Malu Gaspar – Está liberado mentir
Então
fica combinado assim: de agora em diante, está liberado mentir em sessão de
Comissão Parlamentar de Inquérito. Também não tem problema chamar o colega
parlamentar de “vagabundo” para melar um depoimento. E tudo bem escancarar ao
distinto público a constatação de que, afinal, a apuração das responsabilidades
pelo descaso no combate à pandemia da Covid-19 só não é mais importante que uma
ampla gama de conveniências políticas.
Qualquer
brasileiro medianamente informado sabe que o destino mais provável de uma CPI é
terminar em pizza. Mas as cenas exibidas ao vivo e em cores durante o depoimento do ex-secretário de Comunicação do governo federal
Fabio Wajngarten, na CPI da Covid, elevaram a expressão popular a um novo
patamar.
Primeiro
por causa da insistência do ex-secretário em desdizer tudo o que havia afirmado
à revista “Veja” em abril, numa entrevista cheia de recados subliminares ao
presidente da República e ao ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello.
Em seis horas de exposição, Wajngarten recusou-se a repetir que o governo poderia ter comprado vacinas meses antes do que de fato ocorreu, negou ter afirmado que houve “dolo, incompetência ou as duas coisas” na ação do ex-ministro da Saúde e, mais de uma vez, tentou sepultar a versão de que Bolsonaro o havia autorizado a negociar a aquisição dos imunizantes, passando por cima do colega de Esplanada Pazuello.
Míriam Leitão - O falso testemunho
Pegue-se
de qualquer ponto o depoimento que o ex-secretário Fabio Wajngarten deu à CPI e
é possível encontrar uma inconsistência. Foi tanta mentira e contradição que,
durante a tarde, instalou-se uma discussão entre o presidente Omar Aziz e o
relator Renan Calheiros. O relator queria prender. O presidente, não. Renan
temia a desmoralização, Aziz disse que estava salvando a CPI. A prisão faria a
Comissão Parlamentar escalar o grau de conflito. A não prisão daria a qualquer
um o direito de mentir ali. Cada um dos dois tinha um ponto, não era fácil
decidir. Senadores que a coluna ouviu acham que era caso de prisão. O senador
Alessandro Vieira, que é suplente, quando acabou de interrogá-lo e pegar novas
contradições, concluiu:
—
Eu apenas reforço, e pode ser uma tendência desta comissão. Não há nisso
ameaça. Há um justo alerta à testemunha. Cabe ao senhor presidente determinar
se é o caso de prisão em flagrante por mentir à CPI. Essa decisão será
constante. É impressionante vir aqui e agir com essa desfaçatez.
Wajngarten negou que tivesse dito à “Veja” que foi incompetência do Ministério da Saúde. A “Veja” postou o áudio em que ele dizia “incompetência, incompetência”. A senadora Leila o colocou para ser ouvido. Ele disse que fez 11 campanhas vinculadas à pandemia. O senador Humberto Costa mostrou que algumas eram para estimular as pessoas a saírem para as ruas. O senador Tasso Jereissati perguntou sobre a campanha “O Brasil não pode parar”. Ele alegou desconhecimento, dizendo que em março do ano passado estava em casa com covid. Na época, deu entrevista a Eduardo Bolsonaro dizendo que de casa continuava trabalhando e aprovando campanhas.
Ricardo Noblat - No seu pior momento e no melhor de Lula, Bolsonaro perde feio
Ainda
faltam 20 meses para a eleição presidencial do ano que vem. É preciso cautela
na análise de pesquisa eleitoral
Um
truísmo, mas vá lá. Pesquisa de opinião é um retrato do momento. Tendência, a
evolução de alguma coisa num sentido determinado. O que uma pesquisa revela só
vira uma tendência se confirmada por futuras e sucessivas pesquisas.
Os resultados da pesquisa Datafolha divulgada nas últimas
horas foram péssimos para o presidente
Jair Bolsonaro e ótimos para o ex-presidente Lula. Manda a prudência, contudo, que se
esperem novas pesquisas para conferir se isso configura uma tendência.
Pode
ser também o que pesquisadores chamam de “soluço”, algo ocasional que, mais
tarde, será naturalmente corrigido. De resto, faltam 20 meses para o primeiro
turno da eleição presidencial do ano que vem. Mesmo uma tendência pode ser
revertida.
Tais ressalvas não tiram a importância do que a pesquisa Datafolha registrou: se a eleição tivesse sido realizada nessa quarta-feira (12/5), Lula teria batido Bolsonaro com folga de votos no primeiro ou no segundo turno. Bolsonaro deve preocupar-se, e Lula comemorar.
William Waack - Acabou o ‘toma lá’
As
verbas que Bolsonaro distribui aos parlamentares sinalizam descontrole político
Qualquer
o nome que se dê ao monte de dinheiro que Bolsonaro entrega
a parlamentares amigos, do ponto de vista político equivale à esperteza de
amarrar uma corda ao redor do próprio pescoço. Desde a redemocratização não há
registro de chefe do Executivo brasileiro que tivesse se rendido dessa forma às
amorfas forças políticas conhecidas como Centrão,
especializadas em manter-se próximas dos cofres públicos.
Desde sempre (tomando 1988 como data-base) o sistema de governo brasileiro opõe uma figura forte (o presidente da República, vencedor de uma eleição plebiscitária) a um Legislativo com extraordinárias prerrogativas (e cada vez mais fracionado e sem coesão ideológica). O instrumento “tradicional” nesse regime, desde sempre, foi a troca de cargos políticos (especialmente os que “furam poços”) e verbas orçamentárias por apoio no Congresso.
Carlos Melo* - A mentira e a linha de um tempo de absurdos
Precipitadamente,
esperava-se que o depoimento de Fabio Wajngarten trouxesse revelações
bombásticas e viesse a entregar ex-colegas de governo. Afinal, o ex-secretário
viveu os bastidores da presidência de Jair Bolsonaro, foi integrante do núcleo
dirigente e, sobretudo, por meio da Revista Veja havia dirigido artilharia
pesada contra o Ministério da Saúde.
No
entanto, sendo evasivo, Wajngarten buscou se caracterizar como um burocrata
distante do centro do poder. Defendeu-se e optou pela fidelidade ao presidente
e à sua alma mater, o bolsonarismo. E era mesmo essa a perspectiva mais
realista a respeito do depoimento.
Contudo, ele não combinou com a maioria da CPI. Determinados em revelar erros do governo e do presidente da República, os membros não governistas da comissão resolveram apertar o ex-secretário. E assim explicitaram inúmeras contradições em suas declarações. Sobretudo, em relação ao que disse à revista Veja.
José Serra* - Orçamento sem bom censo
Indicadores
censitários são fundamentais para decidir e formular políticas públicas
O
Orçamento público aprovado no final de abril, com atraso e inconsistências
técnicas, compromete o desempenho das políticas públicas no País e cancela, na
prática, os recursos para a realização do Censo 2021. Nos Estados Unidos, o
presidente Joe Biden defende seu ambicioso plano de Estado para os próximos dez
anos; já no Brasil, os formuladores de políticas governamentais promovem
desorganização das contas públicas e desmantelamento de programas de governo
indispensáveis ao desenvolvimento do País.
Soma-se
a esse inadmissível desacerto na condução da política econômica a inepta tese
de que o Orçamento público deve ser decidido pelos parlamentares. Como se o
papel do Executivo fosse somente largar na porta do Congresso Nacional o
principal instrumento de planejamento e gestão do País. Não é admissível que um
governo se exima de governar.
Nossa Constituição federal confere ao Poder Executivo competência privativa para elaborar o Orçamento, em função de metas e prioridades estabelecidas pelo presidente da República. Quando o governo abre mão dessa prerrogativa durante o processo de elaboração do Orçamento, o Parlamento ocupa esse espaço e, por inércia, tende a avançar na alocação unilateral dos recursos públicos, por meio de emendas orçamentárias.
Bruno Boghossian - Petista retorma territórios, e presidente vê base mais restrita
Petista
tem vantagem em grupos de baixa renda, enquanto presidente vê deserções em
núcleo fiel
A fidelidade da base lulista e a hesitação do eleitorado que aderiu a Jair Bolsonaro (sem partido) em 2018 ajudam a explicar o descolamento entre os dois principais personagens da próxima corrida presidencial.
De
volta ao jogo depois que o STF
(Supremo Tribunal Federal) anulou condenações que o impediam de
concorrer no ano que vem, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT)
retomou o controle de territórios tradicionalmente petistas, de acordo com
números da primeira
pesquisa do Datafolha para a disputa de 2022.
Uma fatia da vantagem que o ex-presidente abriu sobre seus adversários aparece principalmente no grupo mais pobre da população —o que sugere que bandeiras petistas como as plataformas de distribuição de renda e redução da pobreza ainda ressoam nesse eleitorado.
Maria Hermínia Tavares* - Autobiografia de uma nação
O
crescimento da extrema direita, na última década, é um lado da história recente
do país
Em
um artigo publicado em 1994 no jornal turinês La Stampa, sob o título
"Aquela Itália modelo Berlusconi", o filósofo Norberto
Bobbio (1909-2004) se perguntou, com um misto de espanto e
tristeza, se o berlusconismo não seria "uma espécie de autobiografia da
nação, da Itália de hoje".
A pergunta vale para o Brasil, embora talvez seja precipitado falar em bolsonarismo para designar, seja os seguidores militantes do presidente —os seus minions—, seja o sentimento difuso de apatia benevolente ou simpatia aberta de quase a metade dos brasileiros em relação ao chefe do desgoverno. A despeito da administração catastrófica da pandemia —responsável por um número decerto elevado de mortes evitáveis e estagnação econômica—, sucessivas sondagens indicam que segue estável o contingente dos que consideram o desempenho de Bolsonaro ótimo ou bom, na casa de 30%, e o dos que lhe atribuem conceito regular (da ordem de 20%).
Bruno Boghossian – Jogando no desespero
Na
CPI, Wajngarten esconde campanhas negacionistas e tenta proteger autores do
desastre
O
ex-secretário Fabio
Wajngarten lançou mais do que um punhado de contradições,
versões desencontradas e puras mentiras na
CPI da Covid. Ele queria proteger o antigo chefe Jair Bolsonaro, mas provou que
é impossível defender o governo falando a verdade.
O aliado do presidente tentou descrever uma gestão que seguia orientações das autoridades de saúde na área de comunicação. Não colou. Ele teve que esconder a campanha que dizia que a cloroquina apresentava “bons resultados” contra a Covid e as postagens contra medidas de isolamento, feitas em março de 2020 pela Secretaria de Comunicação.
Mariliz Pereira Jorge - Wajngarten, o tchutchuca na CPI da Covid
Nas
redes sociais, ex-secretário faz o tipo tigrão
Pelo
que vimos nesta quarta (12), bolsonarista é o tipo tigrão nas redes sociais,
quando escorado pelo aparato do governo, mas muito tchutchuca quando precisa
enfrentar uma CPI. Fabio
Wajngarten gaguejou, disse e desdisse, caiu em contradição,
suou, tremeu e, sobretudo, mentiu em seu depoimento à comissão que investiga a
má gestão da pandemia.
O ex-secretário da Secom sofre do mal que acomete essa turma que chegou ao Planalto com a eleição de Jair Bolsonaro. Cria as suas próprias narrativas, seguro de que pode manipular não apenas a opinião pública mas os fatos. Ignora que uma coisa é alimentar a militância bolsonarista com mentiras, a outra é bancá-las quando o que está em jogo é prisão.
Vinicius Torres Freire – Falta gente para mentir na CPI
Senadores
deveriam chamar Braga Netto e Paulo Guedes para saber de vacinas
A CPI da Covid e
parte do país parou para discutir se Fabio Wajngarten deveria
ser preso por ter mentido em seu depoimento no inquérito parlamentar. O
país já deveria ter aprendido a besteira violenta que dá sair prendendo gente a
torto e a direito, mas o assunto de interesse mais imediato nem é esse. A CPI
não deve ameaçar os depoentes. Deve chamar mais gente para mentir mais ou até
contar a verdade. Seja qual for a opção dos inquiridos, o governo Bolsonaro vai
ficar exposto, para usar um eufemismo juridicamente seguro.
O general
Eduardo Pazuello, ex-chefe do almoxarifado da Saúde, é o próximo da fila do
vexame e de um futuro programa de acareações, mas já é uma figura manjada. A
fila tem de andar. Por exemplo, quando a CPI vai convocar o general
Braga Netto, ora ministro da Defesa e ex-ministro da Casa Civil?
Braga Netto tomou decisões relativas à vacina. Um documento do governo diz que ele liderou o “processo decisório” de adesão do Brasil à iniciativa da OMS (ACT Accelerator) do qual fazia parte a Covax (distribuição de vacinas para países mais pobres). Muito bem. O que ele mais sabe sobre os processos decisórios? A Casa Civil, o ministério da Saúde e o ministério da Economia fizeram reuniões para decidir o que fazer da vacina da AstraZeneca, em 19 de junho de 2020, por exemplo. Os ministros dessas pastas também receberam a célebre carta ignorada em que a Pfizer oferecia vacinas.
Maria Cristina Fernandes - Bolsonaro aposta na polarização e radicaliza
No
melhor das hipóteses, embate será resolvido nas urnas
Com
a manifestação marcada para este sábado, o presidente Jair Bolsonaro antecipou
sua reação ao Datafolha que registrou a maior vantagem da temporada para o
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Se
Lula está focado em atrair, pela base, os palanques regionais que dariam
sustentação a uma terceira via, Bolsonaro mira na mobilização de setores
anti-petistas por excelência: ruralistas, fundamentalistas religiosos,
caminhoneiros e movimentos pró-armas.
O
clímax, dizem os organizadores, será a chegada do presidente da República, a
cavalo, por trás do Itamaraty, para se unir aos apoiadores. À Secretaria de
Segurança Pública do Distrito Federal, o coordenador da Marcha da Família
Cristã pela Liberdade, Wellington Macedo informou a previsão de cinco trios
elétricos, 200 ônibus e, como o céu é o limite, 100 mil pessoas.
À
marcha, que reúne batistas, adventistas, as igrejas Universal, “Deus é amor”,
“Plenitude do trono de Deus”, “Ministério da fé”, várias denominações da
Assembleia de Deus e o movimento católico “Dom Bosco”, se unirão ruralistas e
entidades de caminhoneiros, como o “Lux Brasil”, de Emílio Dalçóquio, aliado
bolsonarista desde a greve de 2018.
Os ruralistas são liderados por Antonio Galvan, presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Soja (Aprosoja). Conta com entusiastas em quase todas as entidades do setor e o silêncio daqueles que, embora não subscrevam o apoio à radicalização do bolsonarismo, cruzam os braços à espera de que projetos como o da flexibilização do licenciamento ambiental, em pauta na Câmara, passem.
Fabio Graner - Melhora da economia não é jogo ganho
Se
governo não agir, espaço fiscal será menor, diz Claudio Considera
Indicadores
econômicos menos piores do que se previa em março levaram, nas últimas semanas,
a um processo de alta nas projeções de crescimento do país neste ano. A
estimativa média do mercado passou de 3,04% de expansão do Produto Interno
Bruto (PIB) em 2021 para em torno de 3,2%, no espaço de um mês. Casas como XP
Investimentos e Itaú ficaram mais otimistas e já anunciaram novos números,
vendo expansão da ordem de 4%.
No
governo, os dados mais recentes colocaram tendência de alta na estimativa
atual, de 3,2%. Não está garantida, porém, uma revisão já no próximo relatório
bimestral, a ser divulgado neste mês. A mudança pode ficar para depois, quando
houver mais números disponíveis, como o PIB do primeiro trimestre.
De qualquer forma, esses primeiros meses do ano foram melhores do que se esperava para a atividade. Um número positivo para o período já não é mais uma hipótese distante, na avaliação do governo. A tese do abismo fiscal (“fiscal cliff”) de grande parte dos economistas, que era rebatida enfaticamente pela equipe econômica, não se confirmou. Ao contrário.
Jorge Arbache* - A política industrial do século XXI
Agenda
do clima pode criar oportunidades de negócios que passariam dos US$ 70 trilhões
até 2030 e muitos empregos
A
pandemia da covid-19 nos alertou para a relevância da cooperação para o enfrentamento
de grandes desafios comuns. Essa advertência também é oportuna para outro
grande desafio coletivo: as mudanças climáticas. As previsões científicas do
aquecimento do clima são bastante preocupantes e apontam para consequências
sociais e econômicas devastadoras, o que vai requerer transformações
estruturais para o seu enfrentamento e mobilização de recursos e esforços
próprios de períodos de guerra.
Dentro do espírito surgido durante a pandemia para aproveitar a ocasião e reconstruir um mundo melhor, estão avançando esforços políticos e econômicos para fortalecer acordos e instituições e encorajar o desenvolvimento de inovações, tecnologias, mercados e modelos de negócios para acelerar a transição para a economia de baixo carbono e oferecer soluções para a prevenção, adaptação e mitigação dos riscos das mudanças climáticas.
O que a mídia pensa: Opiniões / Editoriais
Lula
x Bolsonaro
Folha
de D. Paulo
Datafolha sobre 2022 mostra liderança do petista no pior momento do mandatário
Embora
a dimensão da liderança de Lula seja algo surpreendente, era previsível que o
ex-presidente assumiria protagonismo nas pesquisas após a anulação de suas
condenações por corrupção e lavagem de dinheiro. O PT, não é demais lembrar,
foi ao segundo turno nas últimas 5 eleições presidenciais, das quais saiu
vitorioso em 4.
A
volta por cima do provável candidato do partido ocorre num momento
especialmente negativo para Bolsonaro —logo depois de recordes trágicos de
infecções e mortes provocadas pelo novo coronavírus, durante uma CPI que expõe
os desmandos de seu governo na gestão da pandemia e com inflação e desemprego
em níveis elevados.
Não por acaso, a aprovação ao presidente, que nunca foi majoritária no eleitorado, caiu ao menor patamar desde o início de seu mandato. Consideram a gestão boa ou ótima apenas 24%, ante 30% em março. Já a reprovação se manteve estável, oscilando de 44% para 45%.
13 de maio de 1888 - Abolição da escravatura
Pablo Neruda - Castro Alves do Brasil
Para à flor cantaste? Para a água
cuja formosura diz palavras às pedras?
Cantaste para os olhos para o perfil recortado
da que então amaste? Para a primavera?
Sim, mas aquelas pétalas não tinham orvalho,
aquelas águas negras não tinham palavras,
aqueles olhos eram os que viram a morte,
ardiam ainda os martírios por detrás do amor,
a primavera estava salpicada de sangue.
- Cantei para os escravos, eles sobre os navios
como um cacho escuro da árvore da ira,
viajaram, e no porto se dessangrou o navio
deixando-nos o peso de um sangue roubado.
- Cantei naqueles dias contra o inferno,
contra as afiadas línguas da cobiça,
contra o ouro empapado do tormento,
contra a mão que empunhava o chicote,
contra os dirigentes de trevas.
- Cada rosa tinha um morto nas raízes.
A luz, a noite, o céu cobriam-se de pranto,
os olhos apartavam-se das mãos feridas
e era a minha voz a única que enchia o silêncio.
_ Eu quis que do homem nos salvássemos,
eu cria que a rota passasse pelo homem,
e que daí tinha de sair o destino.
Cantei para aqueles que não tinham voz.
Minha voz bateu em portas até então fechadas
para que, combatendo, a liberdade entrasse.
Castro Alves do Brasil, hoje que o teu livro puro
torna a nascer para a terra livre,
deixam-me a mim, poeta da nossa América,
coroar a tua cabeça com os louros do povo.
Tua voz uniu-se à eterna e alta voz dos homens.
Cantaste bem. Cantaste como se deve cantar.