• Presidente corta oito pastas, mas amplia poder do PMDB e de Lula
Reforma para garantir maior apoio ao governo no Congresso prevê também o corte de 30 secretarias e de 3 mil cargos comissionados, além da redução de salários do primeiro escalão
Em meio às crises política e econômica, a aposta no que chamou de “governo de coalizão” levou a presidente Dilma a anunciar ontem o corte de oito ministérios, mas contemplando o PMDB com todas as pastas pleiteadas e ampliando o poder do grupo ligado ao ex-presidente Lula no governo. Dilma deixou claro o pragmatismo de sua decisão ao falar sobre a necessidade de pacificar sua base no Congresso: “Trata-se de articulação política que respeita os partidos que fizeram parte da coalizão que me elegeu e que têm direito e dever de governar comigo.” O corte atingiu duas pastas a menos do que a presidente havia anunciado — os 39 ministérios foram reduzidos para 31. Ela prometeu ainda extinguir 30 secretarias e 3 mil cargos. E também cortar em 10% os salários dela, do vice Michel Temer e dos ministros.
Cargos para pacificar a base
• Dilma reconhece que troca de ministros foi para reforçar sustentação política do governo
Catarina Alencastro, André de Souza, Fernanda Krakovics, Geralda Doca e Simone Iglesias - O Globo
BRASÍLIA - A presidente Dilma Rousseff apostou no pragmatismo para garantir sua sustentação no poder. No anúncio da reforma ministerial, ontem, Dilma explicou abertamente que o objetivo das mudanças é solidificar a base aliada no Congresso, onde tramitam propostas impopulares do governo na área fiscal e pedidos de impeachment contra ela. Como vacina às críticas, a presidente destacou que a reconfiguração dos espaços de aliados nos ministérios é um movimento natural na democracia e que está sendo feito “às claras”. Com a melhora do ambiente político, Dilma espera conseguir avançar nas iniciativas do governo para sair da crise econômica.
— Ao alterar alguns dirigentes dos ministérios, nós estamos tornando nossa coalizão de governo mais equilibrada, fortalecendo as relações com os partidos e com os parlamentares que nos dão sustentação política. Trata-se de uma ação legítima de um governo de coalizão e por isso tudo tem sido feita às claras. Trata-se de articulação política que respeita os partidos que fizeram parte da coalizão que me elegeu e que têm direito e dever de governar comigo. É com o Congresso, eleito pelo povo brasileiro para representá-lo, que meu governo, igualmente legitimado pelo voto dos brasileiros, tem que dialogar em favor do nosso povo para a aprovação de políticas que acelerem a saída da crise — disse Dilma.
Na reforma, a presidente cortou oito ministérios, dois a menos do que havia anunciado inicialmente. O PT perdeu quatro das 13 pastas que tinha, e o PMDB, principal aliado, manteve sete, mas com ganho de qualidade. Perdeu a Secretaria de Assuntos Estratégicos e Pesca e ganhou Saúde e Ciência e Tecnologia, entregues aos deputados Marcelo Castro e Celso Pansera.
No anúncio, Dilma disse que a mensagem que o governo quer passar para a sociedade com a reforma é que está em movimento para superar a crise.
— Não estamos parados. Sabemos que existem dificuldades econômicas que devem ser superadas para que o país volte a crescer. Sabemos que, se erramos, precisamos consertar os erros, se acertamos, precisamos avançar nos acertos e seguir em frente, mas para isso precisamos de estabilidade política — afirmou.
CGU mantém status de ministério
Além da mudança no Ministério, Dilma anunciou um enxugamento da máquina pública, medida de apelo popular com a qual se comprometera quando apresentou o pacote fiscal que inclui o aumento e a criação de novos impostos, como a CPMF. Ela resolveu cortar em 10% o seu salário, o do vice Michel Temer e o de todos os ministros. Com isso, a remuneração bruta mensal deles passa de R$ 30.934,70 para R$ 27.841,23. Além disso, serão extintas 30 secretarias em todos os ministérios, 3 mil cargos de confiança e cortados em 20% os gastos com o custeio. Também serão limitadas as despesas dos funcionários públicos com viagens e telefone, e vendidos imóveis porque, segundo a presidente, “a União não pode continuar sendo uma grande imobiliária”.
— Vamos dar hoje um primeiro e grande passo para reorganização da administração pública. Queremos contribuir para que o país saia o mais rapidamente da crise, crescendo, gerando emprego e distribuindo renda. A reforma vai propiciar o equilíbrio fiscal, o controle da inflação e consolidar a estabilidade macroeconômica, aumentando a confiança na economia — explicou a presidente.
Nas negociações de última hora, Dilma desistiu de tirar o status de ministério da Controladoria Geral da União (CGU) ao ser informada que o titular da pasta, Valdir Simão, deixaria o cargo por entender que não teria a segurança jurídica necessária para o exercício da função. No fim, prevaleceu o argumento de que a CGU tem função importante no combate à corrupção, alardeada pela presidente em meio às investigações da Lava-Jato. Ela também mudou de ideia sobre incorporar o Ministério do Desenvolvimento Social ao do Trabalho e Previdência.
— Ela tinha na cabeça um número mágico de dez ministérios. Não deu certo — disse um integrante do governo ao GLOBO.
Na quinta-feira à tarde, desmoronou a promessa da presidente de reduzir os ministério de 39 para 29. O PT pressionou para manter o Desenvolvimento Social. Junto à CGU, estavam AGU (Advocacia-Geral da União) e Banco Central. Ambos também conseguiram sair da mira há duas semanas. Outra decisão de última hora foi a manutenção de Nilma Gomes (Igualdade Racial) na Esplanada. Ela assumiu o Ministério das Mulheres, Igualdade Racial e Direitos Humanos. Integrantes do PT afirmaram que a deputada Benedita da Silva (PT-RJ) chegou a ser convidada, na noite de anteontem, mas disse que precisava consultar a família e acabou não aceitando.
Depois de perder quatro ministérios (Saúde, Mulheres, Direitos Humanos e Comunicações), o PT manteve o do Desenvolvimento Social, responsável pelo Bolsa Família e que continuará sob o comando de Tereza Campello. A presidente também desistiu de extinguir órgãos do segundo escalão. O ministro Aloizio Mercadante havia citado as fusões da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial e Agência Brasileira de Promoção de Exportações do Brasil; do Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) e CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), que acabaram mantidos.
No PMDB, Henrique Alves (Turismo) sobreviveu porque organizou uma operação de guerra. O Ministério do Turismo seria extinto, mas acabou mantido apenas para evitar novas arestas entre Dilma e o partido. Sem que a bancada do PMDB na Câmara o apadrinhasse, optando por levar à Dilma os nomes de Marcelo Castro e de Celso Pansera, Alves ligou para cerca de 20 deputados pedindo que o apoiassem. Na noite de quinta-feira, o susto. O ministro foi chamado pela presidente, que pediu a ele que aceitasse ser remanejado para a Ciência e Tecnologia, liberando o Turismo para a bancada da Câmara. Alves foi às lágrimas, segundo um auxiliar palaciano que presenciou a reunião. Dilma então optou por mantê-lo.
General Elito pede demissão
A reforma também gerou insatisfações. Horas depois do anúncio oficial da extinção do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), que tinha status de ministério, o comandante da pasta, general José Elito Siqueira, pediu demissão e divulgou nota lamentando a decisão da presidente de transformar a estrutura em um gabinete militar subordinado à Secretaria de Governo. “Ao saber no dia de hoje do conteúdo da reforma, cumpre-me, por um dever de lealdade e em memória aos que me antecederam, lamentar a decisão tomada que, no mais curto prazo, desejo que seja retificada para o bem da sociedade e do Brasil”, diz o texto.