terça-feira, 15 de novembro de 2022

Merval Pereira -O futuro em discussão

O Globo

Em seminário em Nova York, ministros do STF deixam claro que a instituição será um agente importante na retomada democrática do país

O seminário promovido em Nova York pelo grupo Lide, que reuniu nada menos que cinco ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), deu sinais importantes sobre o presente e o futuro do país.

Parte do presente, um país dividido e radicalizado manifestava-se histericamente em frente ao Harvard Club e na caça a ministros pela cidade. O futuro desenhou-se durante os debates, onde se viu um grupo inusualmente unido em defesa da democracia, com uma visão de futuro que privilegia a luta contra a desigualdade em suas diversas facetas e a preocupação com a questão climática, que pode vir a se transformar num ativo social e econômico do país. Também a demarcação das terras indígenas e a proteção dos povos originários serão tema prioritário para o Supremo.

Um Supremo unido pelo espírito de corpo que os ataques sofridos suscitaram parece caminhar para uma ação mais propositiva na defesa da democracia, sintetizada pela luta contra as desigualdades sociais. As ações, embora agressivas e violentas, dos bolsonaristas golpistas levaram vários ministros a realçar a necessidade de o Estado brasileiro atender às demandas básicas da sociedade.

Míriam Leitão - País entre o vácuo e a expectativa

O Globo

No Egito, Lula será visto como chefe de Estado. No Brasil o Orçamento continua enrolado

Dois eventos brasileiros ocorriam em Sharm el-Sheikh. No estande Brazil Hub, da sociedade civil, estavam representantes do futuro governo como Marina, Izabella Teixeira, Randolfe Rodrigues, Joenia Wapichana. Foram assistir pessoas de diversos países, organizações e empresas. Havia espaço para 80 pessoas, apareceram 500. A segurança da ONU teve que ser chamada para abrir um corredor em frente ao Brazil Hub porque a aglomeração impedia a passagem. No pavilhão oficial do Brasil, às moscas, o ministro Joaquim Leite dava uma palestra para vinte pessoas sobre suas propostas. Este ano ,o governo Bolsonaro decidiu que não fala de Amazônia, apenas de energia.

O presidente eleito Lula, que desembarca hoje no Egito, já é considerado o evento político mais importante dessa Conferência da ONU para o Clima. Doze chefes de estado pediram reuniões bilaterais, além da presidente da Comissão Europeia, e do secretário geral da ONU. E a lista cresce. Isso tem o significado claro: para o mundo, Lula já é chefe de Estado.

Carlos Andreazza - Expectativas

O Globo

Mercado não é monólito pontificando desde a Faria Lima. Não somente o banqueiro. Mercado é algo tão concreto quanto possam ser os humores. É expectativa. Capta, avalia e difunde humores.

Se a expectativa é ruim, mobiliza-se a prevenção. Erguem-se as defesas. Se a projeção é ruim, protejo-me. A empresa se protege. São sinais gerados a partir de sinais. Reage-se. O caldo engrossa. O dólar sobe. É resposta. Você de repente deixa de consumir elemento da cesta básica cujo preço é dolarizado. Sinal. Também resposta. É mercado. Se o governo — ou futuro governante — emite indicativo lido como ruim, reage-se. É do jogo.

Reagiu-se muito a Bolsonaro: à PEC dos Precatórios, às intervenções na Petrobras, à destruição do teto de gastos. Nenhuma reação — à sua responsabilidade sobre a inflação dos alimentos — sendo maior que a materializada em derrota nas urnas. Movimentos que sugiram insegurança geram desconfiança. E desconfiança, na linguagem do mercado, desdobra-se em inflação e juros, conjunto perverso especialmente contra os mais pobres.

Luiz Carlos Azedo - Questão ambiental reposicionará o Brasil no mundo

Correio Braziliense

Há muitos recursos no mundo para a Amazônia, que foram desperdiçados durante os anos de governo Bolsonaro, em sua aliança com garimpeiros, pecuaristas, madeireiros e outros desmatadores

O presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva é a estrela da Cúpula do Clima das Nações Unidaes (COP27), no Egito, que marca sua volta à grande política mundial em grande estilo. Fará seu primeiro pronunciamento em fórum internacional como presidente eleito e tem encontros confirmados com o secretário geral da ONU, António Guterres, o presidente egípcio, Abdel Fattah El-Sisi, e com lideranças de outros países interessados em auxiliar no combate ao desmatamento.

O evento Carta da Amazônia sinalizará para o mundo uma guinada na política ambiental, reunindo Lula e os governadores da região: Gladson Cameli (PP), do Acre; Waldez Góes (PDT), do Amapá; Mauro Mendes (União Brasil), de Mato Grosso; Helder Barbalho (MDB), do Pará; Wanderlei Barbosa (Republicanos), do Tocantins; e Marcos Rocha (União Brasil), de Rondônia.

Os governadores devem entregar um plano de ação para controle do desmatamento como parte de um movimento para conseguir financiamento e realinhamento internacional após a derrota de Jair Bolsonaro (PL). Há muitos recursos no mundo para a Amazônia, que foram desperdiçados durante os anos de governo Bolsonaro, em sua aliança com garimpeiros, pecuaristas, madeireiros e outros desmatadores.

Eliane Cantanhêde - A quem interessa a guerra?

O Estado de S. Paulo.

A eleição acabou, o novo governo nem começou e a República continua ameaçada por fanáticos

A capital da República está isolada, com bloqueio das pistas de acesso à Esplanada dos Ministérios e à Praça dos Três Poderes, onde ficam o Planalto, o Supremo e o Congresso. E não é por causa do feriado da Proclamação da República, mas para evitar ataques justamente à República com caminhões e motociatas antidemocráticas. A eleição acabou, o novo governo nem começou e os bolsonaristas não sossegam.

Saber perder ou ganhar é para quem tem grandeza política e de alma, mas o Brasil assiste a um triste espetáculo em que grupos de fanáticos, surpreendentemente grandes, se enrolam na bandeira, usam o hino e os símbolos nacionais para baderna, insulto, ataques às instituições e à democracia. E para cenas de um ridículo inacreditável.

Hélio Schwartsman - 8 bilhões em ação

Folha de S. Paulo

É bom que haja mais gente no planeta porque, como ensinava Julian Simon, a riqueza são pessoas

Se as projeções da ONU estiverem corretas, acaba de nascer ou nascerá em algumas horas o octabilionésimo ser humano da Terra. Essa é uma boa e uma má notícia. A parte negativa não é difícil de compreender.

Embora temores neomalthusianos de superpopulação causando fomes apocalípticas tenham ficado no passado, temos motivos legítimos para nos preocupar com a questão do clima e da sustentabilidade na exploração dos recursos naturais. É até concebível imaginar que uma combinação de autocontenção com avanços tecnológicos diversos nos leve a evitar os piores cenários, mas isso só parece possível com o sacrifício da justiça social. É que, se todos os habitantes do 3º Mundo passassem a viver materialmente melhor e atingissem padrões de consumo semelhantes aos dos norte-americanos, a pressão sobre o ambiente aumentaria magnificamente.

Cristina Serra - Lula, a fome e o mercado

Folha de S. Paulo

Não há razão para o pânico da semana passada, reverberado pelos bonecos de ventríloquo na mídia

O mercado toma café, almoça e janta, mas ficou todo arrepiado e histérico quando Lula repetiu o que vem falando há décadas: que o combate à fome é sua prioridade. E que é preciso discutir, sim, o que é gasto, o que é investimento, regra de ouro e outros parâmetros que acabam deixando pouco espaço para incluir o pobre no orçamento público.

Lula tem legitimidade para pautar esse debate. Não é um doidivanas. Tem histórico de responsabilidade fiscal em seus dois mandatos anteriores. A equipe de transição (com Alckmin no comando e a presença de Pérsio Arida e Lara Resende entre seus economistas) também aponta para o equilíbrio entre o controle das contas e as urgências sociais neste terceiro mandato, como os 33 milhões de brasileiros de barriga vazia.

Alvaro Costa e Silva - Refém da política, Copa do Mundo está banalizada

Folha de S. Paulo

Divórcio entre a seleção e o torcedor atinge ponto mais alto

Os brasileiros enfim estão descobrindo que em menos de uma semana começa a Copa do Mundo. A bola vai rolar — e quem sabe até ser bem tratada — no deserto do Qatar. Nas ruas daqui, no entanto, não se nota o clima festivo e confiante de outras Copas. A tensão política pós-eleitoral não deixa.

Desde o Mundial do Uruguai, em 1930, não se registrava expectativa tão pequena. Sem consultar o celular, quem é capaz de dizer o nome do primeiro adversário do Brasil? (É a Sérvia.) E a escalação do time? Alguém confia em Neymar para repetir o brilho de um Garrincha em 1962, de um Romário em 1994? O divórcio entre a seleção e o torcedor — que hoje dá preferência ao clube do coração — atingiu um ponto traumático e possivelmente sem volta.

Joel Pinheiro da Fonseca - Não torça contra o Brasil só por birra com Lula

Folha de S. Paulo

O governo nem começou e já tem gente cravando seu fracasso

Entendo e até simpatizo com a expressão "votei nele, mas serei oposição desde o primeiro dia de governo". Numa eleição polarizada como foi a nossa, muita gente acabou votando no Lula sem gostar dele, e sabe que, uma vez começado o novo governo, divergências profundas a levarão naturalmente para a oposição. Foi graças a esse compromisso que se formou uma frente ampla para eleger Lula por uma vantagem ínfima; e a separação futura é do jogo.

Só que o governo nem começou, não temos a menor ideia de quem serão os ministros e já tem gente cravando seu fracasso. Para alguns, 2022 nem terminou e já somos uma Venezuela e a culpa é do Lula.

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

PEC da Transição não deve criar gasto permanente

O Globo

Excluir R$ 175 bilhões do teto para pagar novo auxílio não é melhor ação contra pobreza — e agrava crise fiscal

Na semana passada o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva deu declarações que frustraram quem imaginava uma gestão da economia semelhante à de seu primeiro mandato. O discurso desastrado de Lula é corroborado pelas negociações em curso no Congresso para retirar do teto de gastos o equivalente a R$175 bilhões, destinados a financiar seu novo programa de ajuda aos mais pobres, rebatizado de Bolsa Família.

Na forma como vem sendo encaminhada a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) da Transição, não há apenas uma permissão excepcional — ou waiver — para gastar R$ 70 bilhões em duas medidas emergenciais: 1) o aumento de R$ 200 reais no Auxílio Brasil previsto no Orçamento de 2023, para mantê-lo em R$ 600 (o gasto subiria de R$ 105 bilhões a R$ 157 bilhões); e 2) um novo benefício de R$ 150 destinado a crianças de até seis anos (mais R$ 18 bilhões). Em vez disso, Lula quer manter todo o programa — R$ 175 bilhões — fora do teto. Isso abriria mais R$ 105 bilhões sob o teto, para o novo governo gastar como quiser.

Poesia | Carlos Drummond de Andrade - O tempo passa? Não passa

 

Música | Francis Hime - Vai Passar (Francis Hime/Chico Buarque)