*Antonio Gramsci (1891-1937). Cadernos do Cárcere, v.1. p. 105.
Civilização Brasileira, 2006.
Política e cultura, segundo uma opção democrática, constitucionalista, reformista, plural.
terça-feira, 23 de maio de 2023
Opinião do dia – Antonio Gramsci (a força das ideias)
Paulo Fábio Dantas Neto* - Virar a página no Judiciário também: o exemplo vem de cima
Com a dupla derrota da extrema-direita, em outubro e janeiro, além de se mudar o governo, os executores dos atos golpistas foram logo presos, estão sendo agora processados, com agilidade e rigor, pelo poder constitucionalmente autorizado a isso. O Judiciário tem agido em cooperação com órgãos da segurança pública, que também se dedicam, diuturnamente, a identificar os autores intelectuais e financiadores dos atos para também processá-los, conforme a lei. As corporações militares, tidas e havidas, na quadra mais recente da vida nacional (e nem sempre de modo justo) como potenciais fontes de desestabilização democrática, estão pacificadas e submetidas ao poder civil, sem prejuízo, como se vê, de indiciamento pessoal de militares. As instituições republicanas retomam sua normalidade e a rigor não se pode mais falar de conjuntura de risco à democracia. Ficaram abertos, a princípio, caminhos para que a política democrática cuide do que mais interessa, as avarias no seu edifício e na sua dinâmica institucional, para que tenham passagem as pautas econômicas, sociais e ambientais, em nome das quais se negou, à extrema-direita, a continuidade de sua experiência no governo.
Míriam Leitão - A difícil arte de governar
O Globo
Lula entre dois desafios: aprovar limite de
gastos e evitar o risco ambiental de explorar petróleo na costa da Amazônia
Governar exige escolhas e impõe limites. As
duas barreiras, o presidente Lula está enfrentando essa semana. De um lado, o
desenho final do arcabouço traz desafios. Em uma conta, feita ontem, ficou
claro que havia o risco de, em 2026, ano eleitoral, o governo não poder dar
aumento real ao Bolsa Família. A discussão foi então reaberta. Outro problema
que exige sabedoria é a exploração de petróleo na costa da Amazônia. O governo
Bolsonaro fez a política de fato consumado levando para lá equipamentos antes
de ter autorização do Ibama. Agora, a Petrobras do governo Lula alega que é
prejuízo tirar o que nunca deveria ter ido para lá.
O arcabouço deve ser votado amanhã, mas todo o temor da área econômica ontem era de que o debate esbarrasse nas brigas políticas da base parlamentar. Por isso, o ministro Fernando Haddad foi conversar com o presidente da Câmara, Arthur Lira, e, ao chegar, avisou que estava ali para “agradecer a aprovação da urgência”. Quis dizer com isso que o feito era resultado da articulação do próprio Lira.
Luiz Carlos Azedo - Ambiguidade de Lula pode levar ao desembarque de Marina
Correio Braziliense
A pior coisa que poderia ocorrer ao governo,
neste momento delicado da nossa política externa, em razão do posicionamento
sobre a Ucrânia, é uma crise no Meio Ambiente
A polêmica sobre a exploração de petróleo
na foz do Rio Amazonas, que opõe institucionalmente a Petrobras, que pretende
fazê-la, ao Ibama, que não autoriza, é nitroglicerina pura. Além de o ministro
das Minas e Energia, Alexandre Silveira, entrar em rota de colisão com a
ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, arrasta para o contencioso o
presidente Luiz Inácio Lula da Silva, numa hora em que o eixo da política externa
foi deslocado da economia sustentável para o tema da guerra e da paz.
A Petrobras pediu para explorar um campo
com potencial de 14 bilhões de barris de petróleo a 175km da costa do Amapá,
mas o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis
(Ibama) negou licença à estatal na quarta-feira.
A pior coisa que poderia ocorrer ao governo, neste momento delicado da nossa política externa, em razão do posicionamento de Lula em relação à guerra da Ucrânia, é um desembarque de Marina do governo. Ela é a fiadora da credibilidade do país nos fóruns internacionais sobre o meio ambiente, que abriram as portas da política mundial para o presidente Lula, antes mesmo de sua posse, além de desbloquear os recursos financeiros para o Fundo Amazônia.
Carlos Andreazza - Codevasfização
O Globo
Loja de políticos — assim reportagem da
Folha se referiu à Codevasf. Poderia ser “loja para políticos”, vitrine em que
parlamentares escolhem os produtos que mandarão a suas bases. Há até catálogo
com equipamentos que podem ser remetidos por meio da companhia. A própria
estatal, originalmente dedicada à irrigação, criou o mostruário. Além dos mais
frequentes tratores, já distribuiu freezers, batedeiras, notebooks e máquinas
de costura.
A Codevasf se tornou, a partir do governo
Bolsonaro, superfície essencial para o deságue de bilhões em emendas
parlamentares. Num milagre de proporções alcolúmbricas, os vales do São
Francisco e do Parnaíba chegaram ao Amapá. Multiplicação de alcances que não
mudou com o governo Lula. Nem poderia, já que o sistema do orçamento secreto —
deslocando-se para enganar — continua em operação.
Se o motor do orçamento secreto permanece acelerado, constante será a necessidade de a Codevasf ampliar a variedade de suas irrigações. Orçamento secreto e Codevasf são corda e caçamba. Evoluem — modernizam-se para continuar sob perversão — em dupla.
Merval Pereira - A praga do racismo
O Globo
Reação de Vinicius Jr. pode ajudar a conter
o racismo
Vini Jr. transformou-se num símbolo
internacional na luta contra o racismo não por ser ativista, mas simplesmente
por não admitir ser ofendido pela cor de sua pele ou ser cerceado nas
comemorações depois dos gols, fazendo dancinhas que não visam a diminuir os
adversários, simplesmente são reflexos de sua alegria e de sua cultura.
Sua resiliência, com o brilho de seu
futebol, está provocando mudanças na estrutura de um esporte que é o mais visto
no mundo, talvez o mais lucrativo. Uma indústria de bilhões de dólares que
perde muito com a imagem manchada pelo racismo.
Enquanto o presidente da Liga Espanhola, Javier Tebas, tenta transformar Vini Jr. em culpado e minimiza os ataques racistas, tanto por ser de extrema direita quanto pelo receio de perder dinheiro, o presidente da Fifa, Gianni Infantino, teve uma atitude firme e digna: apoiou o jogador ofendido e disse que a partida deveria ter sido encerrada, proposta que está se alastrando entre os jogadores nos times espanhóis.
Dora Kramer - Moeda de troca
Folha de S. Paulo
Cercado por CPIs, Lula se vê sob olhar
complacente da base
Se dependesse da vontade de gente séria do
governo e da oposição, a comissão
mista do Congresso para a alegada apuração dos fatos já investigados
em inquéritos sobre o 8 de
janeiro subiria no telhado e lá ficaria em eterno descanso. A má
vontade é evidente.
Na impossibilidade de recuo, a comissão
será instalada junto a outras três (MST,
fraudes nas apostas de futebol e Americanas) criadas na Câmara e mais
uma (abuso de autoridade) proposta na Casa comandada por Arthur Lira.
Governo nenhum gosta de CPI, o que dirá quatro, quiçá cinco. São instrumentos da minoria —normalmente residência de oposicionistas— e, portanto, carregam o potencial de provocar danos aos locatários do poder em curso.
Alvaro Costa e Silva - Os Bolsonaro enrolados
Folha de S. Paulo
A impressão é que qualquer pessoa próxima
do clã está sob suspeição
Em março de 2021, quando o presidente que
se elegera com o discurso de combater a corrupção estava havia quase dois anos
e meio no poder, os Bolsonaros bateram um recorde. Seguindo os passos do chefe
do clã, os quatro filhos de Jair enfrentavam investigações da Justiça e da
Polícia Federal. As rachadinhas de Flávio estouraram no início do mandato.
Hoje, com podres irrompendo a cada instante, a impressão é que qualquer pessoa que tenha tido um contato mais próximo com a família está sob suspeição. Uma amiga da ex-primeira-dama Michelle que emprestava o cartão de crédito a ela. Na hora de pagar a fatura, sempre em dinheiro vivo, entrava em cena o faz-tudo da Presidência, um tenente-coronel que está preso. A desculpa é que Bolsonaro é pão-duro. Mas só quando o capital sai do seu bolso. No cartão corporativo, chegou a gastar R$ 55,2 mil numa única padaria um dia após o casamento de Eduardo.
Hélio Schwartsman - O fim de uma era
Folha de S. Paulo
Vontade de Lula não deveria se contrapor a
decisão técnica do Ibama
"A Idade da Pedra não acabou porque
ficamos sem pedras." Essa frase é atribuída a Ahmed Zaki Yamani. Revela
uma lucidez surpreendente, considerando que seu autor foi durante décadas o
titular do Ministério do Petróleo e dos Recursos Minerais da Arábia
Saudita, um país cuja economia depende
essencialmente da venda de petróleo.
A era do petróleo não acabará por causa do esgotamento das reservas desse hidrocarboneto. Isso já estava claro nos anos 1970, quando Zaki teria proferido seu alerta. Avanços tecnológicos já se encarregariam de aposentar os combustíveis fósseis. Fazê-lo, no entanto, se tornou um imperativo agora que não há mais dúvidas de que o aquecimento global antropogênico é uma ameaça ao clima planetário e que ela só será atenuada se cortarmos as emissões de CO2. Teremos de deixar o petróleo de lado bem antes de esgotar as últimas jazidas. A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, parece ter assimilado essa lição; o presidente Lula, talvez não.
Joel Pinheiro da Fonseca - Máquina versus voto
Folha de S. Paulo
Não é cedo para pensar na eleição do ano
que vem, já que hoje a campanha é constante
Imagino que o MST não
queria piorar as chances da esquerda na maior cidade do país nas eleições de
2024, mas até agora é isso que a retomada de
invasões tem conseguido: servir de plataforma para a direita.
Toda a CPI do MST parece
um evento sob medida para lançar a candidatura de Ricardo
Salles e prejudicar Guilherme
Boulos. Ele já anunciou que colocará sob holofote não apenas o
MST como também o MTST, o movimento pela moradia urbana que, até onde se sabe,
não tem absolutamente nada a ver com as invasões ou ocupações rurais recentes.
O único motivo para isso é tentar jogar Guilherme Boulos —líder do MTST— na pior luz possível; mostrá-lo como um radical que patrocina a invasão de casas, os protestos violentos e a depredação da propriedade.
Andrea Jubé - O problema do governo é o ‘day after’ da votação da regra fiscal na Câmara
Valor Econômico
As apostas responsáveis voltam-se para a
aprovação do relatório do deputado Cláudio Cajado (PP-BA) sobre a nova regra
fiscal na sessão plenária desta quarta-feira na Câmara. Proposta em que o
presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), empenhou seu capital político para
caminhar com o governo na matéria. “O novo regime fiscal é prioridade para o
desenvolvimento econômico e social do país”, escreveu Lira em seu perfil no
Twitter no dia 15.
Dois dias depois, o plenário da Casa aprovou o regime de urgência para o projeto. O placar foi expressivo: 367 votos a favor, 102 contrários e uma abstenção, e com adesões relevantes da oposição. O PL do presidente Jair Bolsonaro, por exemplo, que orientou contra a matéria, entregou 29 votos. Desse total, o governo acredita que terá 25 ou 26 votos “permanentes” da dissidência do PL em outros projetos.
Pedro Cafardo - Os dez maiores economistas brasileiros, segundo a IA
Valor Econômico
Saiba também quem seriam os cinco maiores
economistas da atualidade no mundo
Quais são os dez maiores economistas
brasileiros de todos os tempos? A pergunta foi feita pelo colunista no dia 8/5
ao ChatGPT, site de inteligência artificial (IA) que dialoga com humanos. E o
número 1 da lista foi Celso Furtado, considerado pela IA como “um dos mais
importantes pensadores do desenvolvimento econômico do país”.
Antes de dar a lista, o site fez a ressalva de que a indicação dos maiores economistas pode variar de acordo com os critérios utilizados. E apresentou, em segundos, os dez que, em seu entendimento, são “frequentemente reconhecidos por sua contribuição para a economia brasileira ao longo do tempo”. O ranking abaixo e os minicurrículos são do ChatGPT:
Entrevista | Fernando Limongi: Plano de Moro e de Deltan é ‘profundamente antiliberal’
Marcelo Godoy / O Estado de S. Paulo
Para pesquisador, símbolos da Lava Jato revestiram ‘projeto arbitrário’ como algo positivo Cientista político, é professor da USP e da FGV. Autor do livro ‘Operação Impeachment: Dilma Rousseff e o Brasil da Lava Jato’
“A classe política não é a escória da
sociedade. O que há de pior também está no Judiciário, no Ministério Público,
em todo lugar”
O impeachment é um processo excepcional,
cujas consequências são incomensuráveis. A afirmação do cientista político
Fernando Limongi está logo na introdução de seu livro Operação Impeachment,
Dilma Rousseff e o Brasil da Lava Jato (editora Todavia, 304 págs., R$ 84,90).
Investigar o papel dos principais atores da crise que tirou o PT do poder e
pavimentou o caminho para a ascensão de Jair Bolsonaro (PL) revela ao mesmo
tempo os diversos projetos de políticos e de grupos sem os quais o processo que
convulsionou o Brasil seria ininteligível. Professor da Universidade de São
Paulo (USP) e da Fundação Getulio Vargas (FGV), Limongi diz que esquerda e
direita queriam capturar a Lava Jato, que, por sua vez, tinha seu próprio
projeto de poder.
Leia a seguir trechos da entrevista:
Aylê-Salassié Filgueiras Quintão* - No fundo, é tudo um "rachadão"
As instituições jurídicas são primeiras vítimas: a Constituição, a legislação complementar, decretos e portarias. A sobra fica para a História. O procurador da República, Augusto Aras, num estilo do bombeiro Montag, do livro Fahrenheit 451 (Bradbury, Ray, 1953), teria tido a "cachimônia" de mandar incinerar documentos da Lava Jato, e o ministro da Justiça, Flávio Dino, anunciou que a "liberdade de expressão no Brasil deixou de ser absoluta".
O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões
Crédito deverá continuar apertado para as empresas
Valor Econômico
Houve uma redução na demanda de recursos
para investimentos e subiu a busca por capital de giro
A economia surpreendeu no início do ano.
Puxado pela agropecuária, o Índice de Atividade do Banco Central (IBC-Br)
avançou 2,41% no primeiro trimestre, a terceira maior variação da série
histórica, e já está animando previsões mais positivas para o ano. Na
contramão, as empresas enfrentam cenário financeiro negativo, com o alto custo
dos empréstimos e o mercado de capitais travado, comparável a períodos críticos
de crise, como na freada brusca registrada no início da pandemia e na recessão
de 2015 e 2016, segundo números levantados pelo Centro de Estudos de Mercado de
Capitais da Fipe (Cemec-Fipe).
A captação líquida das empresas foi de R$ 37,092 bilhões na média móvel do primeiro trimestre. Foram seis meses seguidos de queda, acumulada em 84,1% a partir do pico de setembro, levando o número para o menor nível desde março de 2020, informa o Cemec-Fipe. O recuo é puxado pelas emissões de dívidas domésticas, devido à retração do mercado de capitais. Mas o crédito bancário não está melhor e caiu ao patamar mais baixo da série iniciada em 2016.