quarta-feira, 22 de dezembro de 2021

Vera Magalhães: O Brasil colocou o futuro no prego

O Globo

A discussão do Orçamento de 2022 é a coroação de toda a deterioração do processo de definição de políticas públicas e planejamento de longo prazo que o Brasil vem sofrendo nos últimos anos.

A pandemia apenas agravou essa distorção absurda, que cada vez mais parece difícil de reverter, de prioridades diante das emergências do país.

O que os congressistas, em alinhamento com o governo Bolsonaro, trataram de consumar neste restinho de ano foi a confissão de que, diante de um barco à deriva, a ordem é salvar tudo o que for possível para a própria sobrevivência da classe política e deixar para ver se há algo a salvar ou reconstruir depois das eleições.

Aparentemente são fatos desconexos a demora proposital em começar a vacinar crianças contra a Covid-19 e a destinação de bilhões de recursos públicos a propósitos tão paroquiais quanto fundo eleitoral e emendas do orçamento secreto — mas não são.

Ambos os movimentos têm como origem um governo que abriu mão deliberadamente de salvar o futuro, colocou-o no prego das faturas eleitoreiras para tentar se salvar de uma derrota até aqui mais provável.

Bernardo Mello Franco: Alianças e botinadas

O Globo

Em setembro de 2018, Geraldo Alckmin jurou que nunca se aliaria ao PT. “Jamais terão meu apoio para voltar à cena do crime”, atacou. Três anos depois, ele parece ter mudado de ideia. Quer ser candidato a vice-presidente na chapa de Lula.

O petista já ensaia o discurso em defesa da dobradinha. “Não importa se no passado fomos adversários, se trocamos algumas botinadas, se no calor da hora dissemos o que não deveríamos ter dito”, penitenciou-se, na noite de domingo.

Lula custou a aceitar que não chegaria ao Planalto só com os votos da esquerda. Depois de três derrotas seguidas, mudou a estratégia e se juntou a um grande empresário. A guinada abriu caminho para a vitória de 2002.

No poder, ele se aproximou de velhos desafetos, como José Sarney e Fernando Collor. Na disputa municipal de 2012, radicalizou de vez no pragmatismo. Foi à casa de Paulo Maluf e tirou a célebre foto em troca do apoio a Fernando Haddad.

Alianças heterodoxas fazem parte da política. A chapa com José Alencar irritou setores da esquerda, mas ajudou Lula a subir a rampa. A foto com Maluf teve saldo mais controverso. Haddad ganhou um minuto e meio de TV, mas passou a campanha inteira explicando as novas companhias.

Luiz Carlos Azedo: Lula é o franco favorito, mas Bolsonaro não morreu

Correio Braziliense

Até agora, Bolsonaro mantém uma posição segura eleitoralmente para chegar ao segundo turno, como principal adversário de Lula. Dez meses até as eleições são uma eternidade. 

Musashi, o livro de Eiji Yoshikawa, em dois volumes de 900 páginas cada, é um romance publicado no Brasil pela editora Estação Liberdade, no qual se aprende um pouco sobre a história e os costumes do Japão antigo, por meio da primeira metade da vida do samurai Miyamoto Musashi, uma lenda para os japoneses e os praticantes de kenjutsu e outras artes marciais mundo afora. A obra é inspirada em fatos históricos, mas romanceada ao misturar personagens reais e da imaginação do autor.

No final de sua vida, com câncer, Musashi se isolou numa caverna da ilha de Kyushu, onde ficou por 1 ano e oito meses, período em que escreveu Gorin No Sho, ou O Livro dos Cinco Anéis, como é conhecido no Ocidente, concluído em 1645, antes de morrer, aos 61 anos. No xogunato Tokugawa, do qual foi chefe militar, o Japão se unificou, todos os senhores feudais foram obrigados a morar em Edo, a capital na época. Os portugueses foram expulsos do Japão, o catolicismo foi proscrito e os holandeses passaram a monopolizar o comércio com o Ocidente, como aconteceu com o Brasil, de 1624 a 1654, ou seja, até à Insurreição Pernambucana.

Elio Gaspari: Os avisos de Mourão e Santos Cruz

Folha de S. Paulo / O Globo

Com pandemia e inflação, ninguém precisa de mais encrencas

Bolsonaro encrencou com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária porque ela recomendou a vacinação das crianças. A Anvisa é presidida por um almirante-médico que ele indicou.

Ganha um fim de semana num garimpo ilegal da Amazônia quem souber qual é a utilidade pública dessa canelada, seguida por ameaças feitas aos funcionários da agência.

Ganha um lote desmatado quem for capaz de responder a qualquer uma dessas perguntas:

Qual foi a utilidade de se praticar uma diplomacia de caneladas com a China?

Que interesse tinha a diplomacia brasileira metendo-se na eleição americana e recusando-se a reconhecer a vitória de Joe Biden por 38 dias?

Que interesse essa mesma diplomacia defendia quando Bolsonaro hostilizou o candidato peronista Alberto Fernández? Ele se elegeu.

Por que Bolsonaro garantiu que o governo não compraria a vacina chinesa? Comprou.

Ganha dois lotes quem souber por que Bolsonaro disse em março de 2020 que a Covid seria uma "gripezinha". Mais um lote para quem souber por que ele disse, em dezembro, que a pandemia estava no "finalzinho". De lá para cá morreram mais de 400 mil brasileiros.

Nilson Teixeira: O que não ocorrerá em 2022

Valor Econômico

Afora o bem-vindo declínio da inflação, a chance de o ambiente doméstico em 2022 ser melhor do que o de 2021 é pequena

Em 23 de dezembro do ano passado, apresentei nesta coluna minhas previsões sobre o que não ocorreria no Brasil neste ano. Minha esperança era terminar errando ao menos algumas dessas projeções. Não foi o caso. Apresento agora minhas expectativas do que não ocorrerá em 2022, em particular para os temas que discuti na última coluna de 2020:

Nenhuma medida relacionada à Reforma Administrativa foi aprovada pelo Congresso neste ano. A probabilidade dessa reforma evoluir em 2022 é próxima a zero.

Nenhuma parte da Reforma Tributária foi aprovada no Congresso em 2021. A Câmara dos Deputados até que aprovou mudanças da legislação do Imposto de Renda, mas, de tão ruins, não foram adiante no Senado. A esperança é de que ao menos o tema seja debatido nas duas casas legislativas e entre os candidatos à Presidência da República em 2022 de forma a aumentar a chance de aprovação em 2023.

As renúncias tributárias que beneficiam os principais grupos de interesse não foram reduzidas neste ano. Em 2022, não haverá alteração desses privilégios.

O Brasil não implementou neste ano nenhuma medida estrutural para sair do grupo de países com os piores indicadores de qualidade da educação. Nada relevante foi feito pelo Ministério da Educação para recuperar a enorme perda de aprendizado provocada pela pandemia. O foco do governo definitivamente não é a educação e, portanto, não haverá nenhum progresso na área em 2022.

Luísa Martins: STF pondera o peso dos longos mandatos

Valor Econômico

Corte teme dar poder demais a fantoches políticos

Um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) certa vez compartilhou uma lição aprendida anos antes com um professor de direito: de dez em dez anos, um docente deve jogar fora todas as suas fichas de aula, repensar o conteúdo do zero e reformular seu modo de ensinar. Não deveria ser diferente, apontou esse magistrado, com a composição da Corte constitucional brasileira.

O ex-advogado-geral da União, ex-ministro da Justiça e “terrivelmente evangélico” André Mendonça foi o terceiro jurista consecutivo a alcançar o STF aos 48 anos. Antes dele, Nunes Marques e Alexandre de Moraes tomaram posse com a mesma idade, em 2017 e 2020, respectivamente. Prevista na Constituição, a aposentadoria compulsória aos 75 lhes garante que, se assim desejarem, serão homens poderosos - capazes de alterar os rumos políticos da República - por mais de 25 anos.

A perspectiva de longas jornadas nas cadeiras amarelas do STF ressuscitaram na Corte, como um burburinho que passa de gabinete em gabinete, um debate que até agora estava restrito aos corredores do Congresso Nacional: a conveniência de limitar a duração dos mandatos dos ministros. Não que os atuais integrantes estejam dispostos a entregar seus cargos antes do previsto, mas conversas internas sugerem haver ao menos uma simpatia pela “oxigenação”.

Como as nomeações para o Supremo cabem ao presidente da República, os holofotes se voltam às eleições de 2022. Os ministros sabem que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva lidera as pesquisas. Mas a avaliação é a de que, com muitas incógnitas ainda em jogo, a reeleição de Jair Bolsonaro ou mesmo a vitória de Sergio Moro não são hipóteses descartáveis.

José Nêumanne*: Amazônia, Minamata, Chernobyl

O Estado de S. Paulo.

Poluição em garimpo criminoso em rios da bacia do Amazonas pode repetir Minamata, e o governo não está nem aí

Há um mês, 300 balsas ocupadas por garimpeiros invadiram o rio Madeira e ameaçaram publicamente impedir a ordem da Polícia Federal (PF) de não garimparem em territórios reconhecidos como de posse e usufruto de tribos indígenas. A imagem nos jornais e emissoras de televisão daquele momento causaram forte impacto no Brasil, pela audácia do desafio à lei e à ordem e pelo abusado desprezo ao poder de fogo da PF, temido por traficantes de drogas, da política e da gestão pública. A barreira, contudo, se desfez e logo caiu no esquecimento um fato alarmante e secreto, como o orçamento clandestino do bolsolão. A morte insidiosa desliza no lugar das balsas na composição química de um metal tão precioso como o ouro, que os balseiros pretendem “bamburrar”, como se dizia nos tempos de Serra Pelada, sob o domínio do Major Curió. Ao contrário do novo coronavírus, que parou o Brasil e o mundo, o mercúrio não atua acobertado pela surpresa.

Fábio Alves: Aperto global

O Estado de S. Paulo.

O tema central dos principais bancos centrais de todo o mundo será o controle da inflação

Na semana passada nada menos do que 11 bancos centrais – entre países desenvolvidos, emergentes e subdesenvolvidos – elevaram suas taxas básicas de juros, em meio a um inimigo comum ao redor do globo: a inflação alta.

Além disso, o BC mais importante do mundo, o Federal Reserve (Fed), dos Estados Unidos, acelerou a retirada dos estímulos monetários adotados durante a pandemia de covid e sinalizou que iniciará um ciclo de alta de juros mais cedo do que previsto, provavelmente até junho do ano que vem. E até o reticente Banco Central Europeu (BCE) adotou uma postura monetária mais restritiva.

Os dirigentes de todos esses bancos centrais deixaram para um segundo plano a preocupação com o impacto à atividade econômica com o aumento de casos de covid em razão da nova cepa, a Ômicron, o que já forçou, por exemplo, alguns países europeus a voltar a impor medidas mais duras de distanciamento social.

Hélio Schwartsman - O pós-Bolsonaro

Folha de S. Paulo

Precisamos aprimorar nossas instituições, tornando-as menos sujeitas a caprichos de autoridades

Foi principalmente a vacinação que fez com que o Brasil passasse de picos de mais de 3.000 mortes diárias (média móvel) por Covid-19 em abril para menos de 200 hoje. Está ao alcance de qualquer pessoa alfabetizada constatar isso com uma rápida pesquisa na internet. Não obstante, o presidente Jair Bolsonaro segue em sua insensata campanha contra a imunização. Ele não apenas quer criar embaraços à inoculação do biofármaco para crianças entre 5 e 11 anos como também, numa atitude que provavelmente configura crime, fez ameaças veladas aos diretores e técnicos da Anvisa que recomendaram a vacinação.

Como já escrevi inúmeras vezes, o fato de não termos aberto um processo de impeachment contra Bolsonaro é o atestado de fracasso moral do país. Mas, mesmo fracassados, ainda precisamos sobreviver tão bem quanto pudermos os dez meses de mandato que restam ao capitão reformado, o que significa que temos de nos defender de seus desatinos.

Vinicius Torees Freire: O desgoverno de Bolsonaro, a Herodes

Folha de S. Paulo

Falta informação nacional sobre a epidemia, centrão saqueia Orçamento, Bolsonaro passeia

Faz dez dias, sabe-se pouco sobre o ritmo da epidemia no país. A ignorância aumentou por causa dos ataques de hackers aos sites do Ministério da Saúde, que não tiveram conserto satisfatório até agora. Neste momento em que o mundo se ocupa do que fazer com a ameaça grave da ômicron, estamos um tanto mais no escuro do que de costume. Mais sobre isso mais adiante.

Esses bandidos informáticos também atacaram outros sites do governo, como os das polícias federais. A baderna criminosa se torna uma rotina; os sites caídos permanecem em ruínas por tempo inaceitável. A segurança institucional é uma mixórdia negligente. É comandada por Augusto Heleno, ministro do Gabinete de Segurança Institucional, um general amigo da ditadura e da tortura, comparsa de Jair Bolsonaro nas campanhas golpistas.

Bruno Boghossian: Arminha, sim, vacina, não

Folha de S. Paulo

Esforço para dificultar a imunização de crianças é mais um lance desprezível contra a saúde pública

Para Jair Bolsonaro, um menino de nove anos pode trabalhar numa fazenda. Também vale ensinar uma criança a imitar uma arma com as mãos e tirar a máscara de proteção de outra. O governo pode recomendar cloroquina até para bebês, mas não tem pressa para oferecer uma vacina que salva vidas.

O esforço de Bolsonaro para dificultar a imunização de crianças é provavelmente o lance mais desprezível de sua campanha contra a saúde pública na pandemia. A Anvisa atestou que a vacina é segura, mas o presidente e seus auxiliares organizaram uma engenharia completa para atrapalhar essa etapa do combate à Covid.

Ricardo José de Azevedo Marinho* - Nova ode elementar

A memória do xará Ricardo Eliécer Neftalí Reyes Basoalto (1904-1973)

Um pouco mais de algumas horas do resultado do último turno da eleição presidencial no Chile, parece-me que maior parte das hipóteses interpretativas sobre a natureza desse segundo turno agora com os dados concretos nos permitem discernir e tirar conclusões.

Uma das coisas mais superficiais era afirmar que o eleitorado chileno estava polarizado entre dois extremos, e que a votação ficaria entre dois extremos: a extrema direita, na pessoa de José Antonio Kast, e a extrema esquerda (ou como a imprensa malsã tem chamado de esquerdista), representada por Gabriel Boric. Esta interpretação que já era uma lenda entre nós a bastante tempo graças as análises de Alberto Aggio[1] e que não houve a lucidez necessária entre nós (também na imprensa) para subscrevê-la. Mas, há motivos para que isso não se de pôr todos os lados.

Pode-se argumentar que, na realidade, a eleição era disputada entre um personagem da extrema direita que não precisava desesperadamente buscar votos do Centro e um jovem candidato de esquerda que precisa dialogar com eles, mas também de fincar suas raízes e compromissos com a tradição da Centro-Esquerda no Chile. Kast por sua vez conseguiu com alguma facilidade, obter os votos de grande parte do resto da direita - que pode ser quase tão radical quanto ele - e do candidato que rejeitava a ambos, Franco Parisi, que ficou em terceiro lugar com 13% dos votos, e vivendo fora do Chile, sem nenhum compromisso com moderação e Sebastián Sichel que ficou em quarto lugar com também quase 13% dos votos.

Boric sabia que seus eleitores radicais podem vê-lo como a única opção de voto, embora ele também soubesse que não venceria se não obtivesse a maioria dos votos do Centro (inclusa aqui a Centro-Esquerda) e de toda a Esquerda e de alguns eleitores que se abstiveram no primeiro turno. Importa reter que aconteceu um fenômeno novo na era democrática moderna do Chile, a saber, de que os dois principais candidatos do primeiro turno mal ultrapassaram a metade dos votos. Em outras palavras, metade dos votos expressos naquela ocasião, e mais uma parte das abstenções, foram parcialmente encontrados ontem. Dito de outro forma: havia um concurso para o Centro, e o Boric fez o melhor aceno para ele do que Kast.

Aylê-Salassié F. Quintão*: Papai Noel: um bilhão de dólares para as eleições de 2020

A televisão, particularmente, tem insistido nesses últimos trinta dias em disponibilizar dezenas de filmes com temas natalinos, relacionados com o amor, a solidariedade, a paz e a compaixão, contrapondo-os à enxurrada de enlatados policiais que tomou conta da telinha e da vida das pessoas, usurpando delas o tempo de recolhimento compulsório provocado pela pandemia.

O mundo natalino da TV tem direito, inclusive, a uma rainha: All I Want for Christmas Is You (Você é tudo que eu desejo no Natal), de Mariah Carey, que se insinua misturar a música pop com a sacralidade de Maria, mãe de Jesus. A música, lançada em 1994, ganhou popularidade em 2020, e graças ao sucesso alcançado, Carey passou a ser distinguida como a “Rainha do Natal”.

Diria que o espírito de Natal, às vezes um pouco piegas, seria uma espécie de” Agenda Positiva" para a sociedade, com a pretensão de amenizar a angústia de uma população cristianizada, desempregada e faminta, envolvida por uma retórica inconsequente de pessoas e políticos confusos, desocupados ou oportunistas. 

Roberto DaMatta: O papel da pompa

O Globo

“Ao alcançar o centro do recinto, o iniciante volta-se então para a Rainha e os Tronos e caminha para dentro do espaço ritual. Ele então se ajoelha, apoiando-se numa banqueta diante da Rainha, que está de pé sobre a plataforma, em plano um pouco mais elevado. A Rainha toca o cavaleiro ajoelhado em cada ombro com o lado chato da Espada do Estado, nomeando-o; ele se levanta; ela passa a fita da Ordem do Cavaleiro em torno de seu pescoço (isso também é outra inovação recente); eles apertam as mãos; a Rainha diz alguma coisa apropriada a cada um dos iniciantes; o iniciante inclina-se, recua andando para trás até sair do espaço ritual, depois sai para a esquerda. O iniciante então caminha até a parte de trás para se reunir ao público.”

Meu ilustre colega, Edmund Ronald Leach, de Cambridge, falecido em 1989, assim descreve e analisa a cerimônia do seu investimento como Sir, provando como a antropologia social é um valioso instrumento de entendimento de nossa própria vida social. Os leitores familiarizados com meus trabalhos sabem como tenho seguido esse caminho nos meus livros e aqui no jornal.

O que pensa a mídia: Editoriais / Opiniões

EDITORIAIS

General Heleno deve explicações sobre garimpo

O Globo

Se alguém ainda precisava ser lembrado de que o garimpo na Amazônia acontece à margem da lei, o reforço veio neste mês. Um grupo de trabalho coordenado pela Polícia Federal e pela Receita Federal investigou e estudou o assunto por cerca de um ano. O relatório final, aprovado pela secretaria executiva da Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro (Enccla), do Ministério da Justiça e da Segurança Pública, é categórico ao mostrar que o país não tem mecanismos para evitar que a exploração e o comércio de ouro sejam usados para lavagem de dinheiro.

Como se isso já não fosse uma catástrofe, o relatório também deixa claro que a Permissão de Lavra Garimpeira, licença necessária para o garimpo, é emitida sem critério pela Agência Nacional de Mineração, autarquia vinculada ao Ministério de Minas e Energia. Até áreas onde não há metal precioso são usadas para “esquentar” o ouro retirado de locais como terras indígenas e reservas ambientais.

“A caracterização constitucional do garimpeiro como trabalhador vulnerável contrasta com a realidade hoje verificada na maioria dos garimpos do país, em que a atividade é executada com o maciço emprego de maquinário e de outras tecnologias que exigem vultosos investimentos”, diz o estudo.

Estimativas do Ministério Público Federal mostram que 174 toneladas de ouro foram vendidas em 2019 e 2020, das quais cerca de 30% a partir de Permissões de Lavra Garimpeira e 70% de lavras mineradoras. Nem mesmo órgãos com a responsabilidade e os recursos do Gabinete de Segurança Institucional, sob o comando do experiente ministro Augusto Heleno, têm servido de anteparo para a barafunda mafiosa causada pela inoperância da Agência Nacional de Mineração.

Poesia | Manuel Bandeira: Arte de Amar

Se queres sentir a felicidade de amar, esquece a tua alma.
A alma é que estraga o amor.
Só em Deus ela pode encontrar satisfação.
Não noutra alma.
Só em Deus – ou fora do mundo.

As almas são incomunicáveis.
Deixa o teu corpo entender-se com outro corpo.
Porque os corpos se entendem, mas as almas não.

Música | Alceu Valença - Madeira do Rosarinho (Capiba)