domingo, 31 de janeiro de 2016

Opinião do dia: José de Souza Martins

Se o PT não é de esquerda, por que tende a demonizar tudo o que é divergência como sendo de direita?

A explicação está, mais uma vez, na influência da Igreja. Isso vem do dualismo Deus e diabo, o bem e o mal. Como aprenderam a pensar a política em termos dicotômicos, os petistas têm, em grande parte, dificuldade para lidar com a diversidade. Para eles, se o PT é de esquerda e a esquerda é o PT, qualquer coisa que difira disso é direita. É uma bobagem quando falam que o PSDB é direita, por exemplo. O PSDB é tão social-democrata quanto o PT. A direita de que falam os petistas é uma invenção. Nós não temos direita e esquerda no Brasil. A maioria da população nem sabe o que é isso. Embora Lula seja mais aberto a ideias de fora, o partido é totalmente intolerante a qualquer ponto de vista que não seja o dele. Essa é a característica do PT.
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José de Souza Martins, sociólogo, autor do livro: ‘Do PT das Lutas Sociais ao PT do Poder’ (Editora Contexto), da entrevista à revista Veja, edição 2 463 – ano 49 – nº 5, 3 de fevereiro de 2016.

Ligação com Lula ajudaria montadora, diz lobista preso

Em carta, lobista preso cita ‘ligação’ com Lula como facilitadora de negócio

• Em texto apreendido, Mauro Marcondes diz a executivo de multinacional que pode ajudar a empresa por ter ‘ligação com o presidente’ e com ‘vários ministros de Estado'

Fábio Fabrini, Adriano Ceolin, Fausto Macedo - O Estado de S. Paulo

Uma carta apreendida pela Polícia Federal na Operação Zelotes indica que o lobista Mauro Marcondes Machado, preso em Brasília, usava de sua suposta proximidade com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para vender seus serviços a potenciais clientes.

Em texto enviado ao ex-presidente da Scania para a América Latina Sven Harald Antonsson, Marcondes se colocou à disposição da companhia para ajudá-la em função de sua “ligação com o presidente da República, vários ministros de Estado e instituições ligadas à indústria”. A mensagem não é datada, mas, segundo a investigação, coincide com a vinda do executivo ao Brasil, o que ocorreu em 2008, no segundo mandato de Lula.

Marcondes está preso desde outubro do ano passado e responde a ação penal por participação em esquema de lobby e corrupção para viabilizar a edição, pelo governo, e a aprovação, pelo Congresso, de medidas provisórias de interesse do setor automotivo. Ele atuava como lobista de montadoras em diversas frentes, fazendo chegar pedidos a Lula e ministérios.

A Zelotes apura se pagamentos de R$ 2,5 milhões feitos pelo lobista a um dos filhos do ex-presidente, o empresário Luís Cláudio Lula da Silva, têm relação não só com a edição de medidas provisórias, mas com a aquisição dos jatos suecos, da Saab, para a Defesa brasileira.

‘Ajuda’. Então representante da multinacional sueca em entidades do segmento veicular, Marcondes escreveu ao executivo que assumia o comando da Scania para avisar que tinha, naquele momento, interesse de se manter na função ou passar a outros cargos de direção.

“Com a sua vinda para o Brasil, assumindo a presidência da Scania, com a atual situação de crise que estamos vivendo, não me sinto bem em deixar a cia. (companhia). Principalmente neste momento em que eu tenho convicção que posso ajudar muito a empresa e o setor, em função da minha ligação com o presidente da República, vários ministros de Estado e as instituições ligadas à indústria”.

Em 2008 o então ministro do Desenvolvimento, Miguel Jorge, levou a Lula solicitação do representante da Scania para que adiasse a entrada em vigor de uma norma ambiental mais rigorosa sobre emissão de poluentes por veículos a diesel.

Depois disso, o governo fez um acordo com o Ministério Público Federal e outros órgãos cancelando a medida, o que interessava à multinacional. Porém, não se sabe se a decisão foi, de fato, influenciada pela empresa. Uma nova regra só entrou em vigor em 2012.

Num dos inquéritos da Zelotes, a PF destaca que, na carta, Marcondes fala da suposta aproximação com Lula como uma de suas “habilidades empresariais”. A mensagem não descreve quais gestões ele faria naqueles tempos de crise para ajudar a Scania. Apenas afirma que não gostaria de se sentir como “aquele que abandona o barco num momento de turbulência”. Em interrogatório no último dia 7, questionado a respeito, o lobista silenciou.

Sven Harald presidiu a Scania na América Latina de 2008 a 2011. Não há informação, nas investigações, sobre se o executivo recebeu a carta e sobre qual foi sua reação. Marcondes se desvinculou da companhia em 2010. A relação do lobista com Lula, citada na missiva, remonta à década de 1970, quando Mauro Marcondes trabalhava no setor de Recursos Humanos da Volkswagen e o petista era líder sindical no ABC.

Em depoimento à PF, Lula afirmou nunca ter atendido a pedido de Mauro Marcondes enquanto presidente e que, depois de deixar o cargo, não foi demandado por ele a intervir no governo federal. O petista disse não ter nenhuma relação com o lobista ou suas empresas. Procurada, a Scania no Brasil não se pronunciou, justificando que precisava consultar a matriz na Suécia. O Instituto Lula, presidido por Paulo Okamotto, disse que não iria se manifestar.

Ex-primeira-dama comprou barco de pesca para sítio em Atibaia

• Nota fiscal mostra que Marisa Letícia, mulher do ex-presidente Lula, adquiriu embarcação em setembro de 2013

- O Estado de S. Paulo

A ex-primeira-dama Marisa Letícia, mulher de Luiz Inácio Lula da Silva, adquiriu um barco e indicou como endereço para entrega o sítio em Atibaia (SP) que é frequentado pela família do ex-presidente, segundo reportagem do jornal Folha de S. Paulo.

O sítio de 170 mil metros quadrados é alvo de inquérito da Operação Lava Jato desde meados do ano passado. A investigação que inicialmente apurava envolvimento da empreiteira OAS com a ampla reforma do imóvel ganhou novos contornos após a suspeita de que as intervenções no local foram pagas pela Odebrecht. As duas empreiteiras são investigadas na Lava Jato por formação de cartel. Executivos e sócios das empresas são réus por corrupção, acusados de pagar propinas para obter contratos com a Petrobrás.

O ex-presidente confirma que, “em dias de descanso”, frequenta o sítio. A área está registrada em nome de dois sócios de Fábio Luís da Silva, filho do ex-presidente - Jonas Leite Suassuna e Fernando Bittar, filho de Jacó Bittar, fundador do PT e amigo próximo de Lula.

A reportagem da Folha de S. Paulo obteve nota fiscal que registra a compra do barco de alumínio, com seis metros de comprimento, modelo Squalus 600. A embarcação foi adquirida em setembro de 2013 por R$ 4.126. O jornal informou que a nota fiscal foi fornecida pela fabricante do barco, a empresa Alumax, do grupo Levefort.

O Estado não conseguiu contato ontem com o Instituto Lula.

Intimação. O Ministério Público de São Paulo, o promotor de Justiça Cássio Cosserino intimou anteontem Lula e Marisa para deporem, como investigados em um inquérito aberto para investigar oito empreendimentos da Bancoop assumidos pela OAS. Um desse empreendimentos é o condomínio Solaris, no Guarujá (SP). O promotor já admitiu a possibilidade de denunciar o ex-presidente pela ocultação de patrimônio na propriedade do tríplex 164 A, que foi reformada pela OAS ao custo de R$ 777 mil. Lula nega ser proprietário do imóvel. O Instituto Lula, presidido por Paulo Okamotto, afirma que Marisa Letícia desistiu no ano passado da opção de compra do apartamento e classificou como “infundadas” e “levianas” as suspeitas da Promotoria.

Alckmin: ‘Lula é o retrato do PT, sem compromisso com a ética’

• Ex-presidente rebate e cita denúncias sobre metrô de SP e merenda

- O Globo

O governador Geraldo Alckmin (PSDB) disse que Lula é o retrato do PT, “sem ética, sem limites”. O ex-presidente rebateu. O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), afirmou ontem que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva é “o retrato do PT”, partido “sem compromisso com as questões de natureza ética”, segundo ele. A declaração foi feita quando o tucano comentava as investigações do Ministério Público sobre o apartamento tríplex no Guarujá, construído e reformado pela empreiteira OAS, que teve dirigentes condenados na Operação Lava-Jato, e sobre o sítio em Atibaia que seria frequentado pelo petista.

— O Lula é PT, o Lula é o retrato do PT, partido envolvido em corrupção, sem compromisso com as questões de natureza ética, sem limites. É muito triste o que estamos vendo, e o que a sociedade espera é que seja apurado com rigor e que se faça justiça — disse Alckmin, que comentou a investigação num evento de entrega de carros para as polícias Militar e Civil.

— O Brasil sempre teve, lamentavelmente, impunidade com o crime do colarinho branco. O Brasil está dando um salto importante, é doloroso, mas é necessário — acrescentou o governador.

Poucas horas após tomar conhecimento das declarações do tucano, o ex-presidente rebateu Alckmin por escrito. A assessoria do Instituto Lula divulgou nota e disse que o governador deveria explicar os escândalos em São Paulo.

“Seria mais proveitoso para a população de São Paulo se o governador explicasse os desvios nas obras do metrô e na merenda escolar, a violência contra os estudantes e os números maquiados de homicídios no estado, ao invés de tentar desviar a atenção para um apartamento que não é e nunca foi de Lula”, diz a nota.

O presidente do PT, Rui Falcão, também citou o escândalo da merenda em seu perfil no Twitter: “Em vez de atacar Lula, o Alckmin deveria cuidar do governo dele, que tira comida da boca das crianças”.

Lula deve depor no dia 17
O ex-presidente e a mulher dele, Marisa Letícia, deverão depor no próximo dia 17 sobre o caso do tríplex no Guarujá, segundo informou o promotor do caso, Cássio Conserino. O promotor já tomou depoimentos de testemunhas que revelaram a presença de Marisa supervisionando a obra. Todo o apartamento foi reformado pela OAS em obra que teria custado R$ 777 mil, segundo um sócio da Talento Engenharia, contratada pela construtora. A OAS teria pagado até mesmo eletrodomésticos da cozinha do tríplex.

Na investigação do Ministério Público de São Paulo sobre as irregularidades no fornecimento de alimentos para merenda, o secretário de Transportes de Alckmin, Duarte Nogueira, e o ex-chefe de gabinete da Secretaria da Casa Civil Luiz Roberto dos Santos, conhecido como Moita, foram acusados de envolvimento.

Outros petistas reagiram às críticas de Alckmin. O vice-líder do governo na Câmara, Paulo Teixeira (PT-SP), afirmou:

— Essa posição do Alckmin revela a hipocrisia tucana neste momento em que o governo dele está envolvido no profundo escândalo da merenda escolar. Ele não tomou nenhuma providência para apurar seus escândalos e afastar os envolvidos, e atira pedra no adversário. Na verdade, ele tenta mudar o foco. Realmente, a impunidade tem que acabar, e os que estão envolvidos com a merenda escolar em São Paulo devem ser punidos.

Para Teixeira, Lula está sofrendo ataques de agentes do Estado e da mídia sem que haja acusação formal contra ele.

Empreiteiro dirá que ex-presidente pressionou por ajuda a Lulinha

• Segundo ‘Veja’, a informação estará em delação de executivo da Andrade Gutierrez

- O Globo

Segundo reportagem da revista “Veja”, o presidente licenciado da Andrade Gutierrez, Otávio Azevedo, decidiu contar em delação premiada informações sobre a sociedade entre a antiga Telemar e a Gamecorp, que tem entre seus sócios Fábio Luís Lula da Silva, o Lulinha, filho do ex-presidente Lula. Segundo a revista, Azevedo dirá que a antiga Telemar, que tinha a Andrade Gutierrez entre os controladores, comprou 30% da Gamecorp “a pedido de Lula”. O negócio foi fechado em 2005 por R$ 5 milhões.

Segundo “Veja”, o executivo dirá que, três anos depois, Lula alterou a legislação para permitir que a Telemar/Oi se fundisse com a Brasil Telecom. Azevedo confidenciou a advogados que, em seguida à mudança na lei, os sócios da Gamecorp e integrantes do governo passaram a exigir mais ajuda financeira da empreiteira.

A Andrade Gutierrez, por meio da Oi, teria passado a contratar serviços desnecessários da Gamecorp, e foi estabelecido “um canal permanente de repasse de dinheiro” para Fábio Luís e seus sócios, entre eles Fernando Bittar e Jonas Suassuna. Os dois são os donos formais do sítio de Atibaia usado por Lula, que teve parte da reforma paga por empreiteiras.

Segundo “Veja”, Azevedo dirá que em 2014 houve pressão de Edinho Silva, tesoureiro da campanha de Dilma Rousseff, e Giles Azevedo, assessor especial da presidente, para repasse de dinheiro. Em nota, Edinho afirmou que todas as doações estão declaradas ao TSE. Giles disse que, como coordenador geral da campanha, esteve uma única vez com Azevedo. Procurados, o Instituto Lula e a Andrade Gutierrez não se manifestaram.

Obra em tríplex atendia ao gosto de Lula, diz engenheiro

Bela Megale, Rayanne Azevedo – Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - O engenheiro e funcionário da OAS Igor Pontes, que acompanhou as reformas no tríplex cuja opção de compra pertencia à família de Luiz Inácio Lula da Silva, disse ser possível inferir que a obra estava sendo feita seguindo o gosto do ex-presidente, segundo pessoas que tiveram acesso ao depoimento dele.

Pontes foi ouvido na semana passada por procuradores da força-tarefa da Lava Jato que vieram a São Paulo apurar informações sobre os apartamentos do Condomínio Solaris, no Guarujá (SP), alvo de uma nova fase da operação deflagrada na última quarta-feira (27).

O imóvel era originalmente da cooperativa Bancoop, que depois o repassou à OAS. O Ministério Público suspeita que a empreiteira tenha pago reforma do apartamento para o ex-presidente.

O engenheiro é apontado por testemunhas ouvidas pelo Ministério Público do Estado de São Paulo, que também investiga o caso, como o principal elo entre a família do petista e a empreiteira OAS, que fez a reforma na unidade 164A, atribuída ao ex-presidente.

Por essa razão, ele é visto como testemunha central no curso da investigação.

O engenheiro Armando Magre, sócio da Talento Construtora, contratada pela OAS para a obra no tríplex, afirmou em dezembro a promotores que Pontes o chamou para fazer serviços de reforma que consistiam em "mudança de layout, troca de acabamento (pintura, piso, elétrica, hidráulica), execução de impermeabilização, refazimento da piscina, troca de escadas e colocação de elevador privativo".

Magre contou também que teve contato com a ex-primeira-dama Marisa Letícia quando estava em reunião com Pontes.

No relato, Magre diz que Marisa entrou no apartamento acompanhada do filho Fábio Luís e de Léo Pinheiro, sócio da OAS que foi condenado a 16 anos de prisão.

As obras foram realizadas entre abril e setembro de 2014, segundo o engenheiro.

Vistoria
Outra testemunha que afirmou ter presenciado Pontes acompanhando o próprio ex-presidente Lula foi Wellington Aparecido Carneiro da Silva, que trabalhou na OAS entre os anos de 2011 e 2014 como assistente de engenharia.

O ex-funcionário da empresa disse que viu Pontes acompanhar Lula e Marisa Letícia em "uma vistoria padrão" de áreas comuns do condomínio.

Silva relatou que segurou a porta do elevador para ambos e "não acompanhou o casal presidencial; tarefa, pois, incumbida a Igor Pontes".

O engenheiro da OAS também será chamado para depor no Ministério Público do Estado de São Paulo.

Além deles, serão intimados Lula e Marisa Letícia na condição de investigados.

Lula e Marisa negam que tenham participado da reforma no apartamento e dizem que desistiram da opção de compra.

Políticos estarão no foco da Lava Jato em 2016

• Expectativa é de que operação avance no Supremo, onde tramitam 38 inquéritos

Beatriz Bulla, Ricardo Brandt - O Estado de S. Paulo

Com duas frentes principais de investigação, a Lava Jato vai avançar este ano nos inquéritos e processos envolvendo políticos. Até o momento, quase dois anos depois de deflagrada, a operação se caracteriza por um ritmo mais acelerado na 1.ª instância, comandada pelo juiz Sérgio Moro. A expectativa, porém, é de que em 2016 as apurações atinjam uma nova etapa no Supremo Tribunal Federal.

Após o recebimento de ao menos 38 inquéritos desde março de 2015, o tribunal vai fazer a análise das primeiras denúncias oferecidas pela Procuradoria-Geral da República como desdobramento das apurações.

O caso que deve inaugurar essa nova fase é o do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Os ministros devem se debruçar sobre as seis acusações formais envolvendo sete parlamentares.

Na Corte, a perspectiva é de que, ainda no primeiro semestre, o plenário do Tribunal julgue a denúncia contra Cunha por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. A elaboração do voto sobre a acusação de Cunha já está avançada no gabinete do ministro Teori Zavascki, relator da Lava Jato na Corte.

Os ministros decidem, neste primeiro momento, se aceitam ou não a denúncia. Se aceitarem, é aberta uma ação penal contra o parlamentar, que passa a ser réu. No caso contrário, a investigação é arquivada. Ministros do Supremo acreditam que Zavascki leve simultaneamente ao plenário o julgamento sobre o recebimento da denúncia e o pedido de afastamento do peemedebista do cargo de deputado, apresentado pela Procuradoria-Geral da República dias antes do início do recesso.

Fila. O STF ainda tem na fila outras denúncias oferecidas no ano passado, de agosto a dezembro, que envolvem os senadores Fernando Collor (PTB-AL), Delcídio Amaral (PT-MS) e Benedito de Lira (PP-AL) e os deputados Nelson Meurer (PP-PR), Arthur Lira (PP-AL) e Vander Loubet (PT-MS), além de investigados sem foro privilegiado que têm situação ligada à dos parlamentares.

Apesar de a denúncia de Collor ter sido protocolada no STF ao mesmo tempo que a de Cunha, a situação do senador e ex-presidente é tida como mais complexa. A peça de acusação tem mais de 200 páginas e investigações paralelas sobre o parlamentar continuam correndo.

O tribunal deve “desovar” as pendências existentes sob a perspectiva do recebimento de novas denúncias nos casos de investigações mais avançadas. São esperadas acusações formais, por exemplo, sobre a existência de conta na Suíça que tinha como beneficiário o presidente da Câmara, além de desdobramentos dos inquéritos envolvendo o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). O grupo de trabalho do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, ganhou reforços desde o fim do ano passado.

Na 1.ª instância, a Lava Jato inaugurou 2016 com a operação Triplo X, 22.ª fase que investiga o condomínio Solaris, no Guarujá (SP), onde Marisa Letícia, mulher do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, tinha opção de compra de um imóvel que hoje está no nome da OAS. A suspeita, conforme despacho do juiz Sérgio Moro, é de que o empreendimento tenha sido usado para repasse disfarçado de propina no esquema da Petrobrás. Lula não é formalmente investigado na Lava Jato, mas a ação se aproximou de negócio envolvendo sua família.

O destaque nos primeiros meses do ano deverão ser os julgamentos dos principais nomes dos chamados núcleos político (José Dirceu) e empresarial (Marcelo Odebrecht). Em 2016 iniciam-se as ações cíveis contra partidos políticos. “Há muito que fazer ainda na área investigativa”, disse o procurador Carlos Fernando Lima.

Lava-Jato investiga venda de outros imóveis pela Bancoop

• Aquisição de apartamento por presidente da CUT é um dos alvos

Thiago Herdy - O Globo

Além do Solaris, em Guarujá, onde Lula já teve um tríplex, a Lava-Jato investiga outros condomínios que eram da Bancoop e foram assumidos pela OAS. Um dos imóveis sob investigação é o do presidente da CUT, Vagner Freitas, relata THIAGO HERDY. Além do condomínio Solaris, no Guarujá, onde o expresidente Lula já teve um apartamento, a força-tarefa da Lava-Jato investiga outros empreendimentos que eram da Cooperativa Habitacional dos Bancários de São Paulo (Bancoop) e foram assumidos pela OAS. Os investigadores apuram crimes de sonegação e ocultação patrimonial, além de indícios de que parte dos imóveis tenha sido usada para repasse de propina. Um dos apartamentos investigados é o do presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Vagner Freitas, dono de imóvel registrado em nome da empreiteira OAS em bloco do Residencial Altos do Butantã, na Zona Oeste de São Paulo.

O apartamento tem área total de 100,6 metros quadrados e está situado no segundo andar do bloco B do residencial, no bairro Butantã. Por meio de sua assessoria, Freitas negou qualquer crime e disse ter comprovantes de quitação do imóvel. Ele disse que, apesar de ter pagado pelo apartamento “há três ou quatro anos”, ainda não tomou providências para alterar o registro em cartório. Diante da divulgação do caso, disse que pretende fazer a transferência de registro nesta segunda-feira.

Em despacho da Operação Lava-Jato na última quarta-feira, chamada de “Triplo X", o juiz Sérgio Moro atendeu o pedido do Ministério Público Federal ( MPF) de determinar a apreensão, nas sedes da OAS e da Bancoop, de documentos referentes a quatro empreendimentos, entre eles o Altos do Butantã, onde Vagner tem seu apartamento, e o Mar Cantábrico, atual condomínio Solaris, no Guarujá, onde a família do ex-presidente Lula era dona de apartamento que atualmente está em nome da OAS e foi o único a passar por uma reforma bancada pela construtora.

Segundo os procuradores da Lava-Jato, o objetivo é “verificar se houve ou não algum tratamento desigual em relação aos ex-cooperados” vinculados aos imóveis. O alvo inicial da força-tarefa eram imóveis relacionados ao ex-presidente da Bancoop e extesoureiro do PT, João Vaccari Neto, que está preso desde abril de 2015 e foi condenado a 15 anos de prisão na LavaJato. A investigação deve ser ampliada com base no material colhido nesta semana.

No passado, Vagner dividiu com Vaccari funções na Bancoop; em 2007, o atual presidente da CUT assinou pareceres na condição de conselheiro fiscal da cooperativa. A Polícia Federal investiga um imóvel adquirido pela mulher do ex-tesoureiro petista, Gilselda Rousie de Lima, no condomínio Solaris, no Guarujá. Ela declarou o apartamento no imposto de renda, embora ele esteja registrado em nome de uma funcionária da OAS. A suspeita da força-tarefa é que o imóvel tenha sido usado para lavagem de dinheiro e que o ex-tesoureiro o teria recebido como suborno da empreiteira.

Uma cunhada de Vaccari também é investigada sob suspeita de ter usado um imóvel no Guarujá para receber propina da OAS no Solaris. Em 2011, Marice Corrêa de Lima comprou um apartamento por R$ 150 mil. Dois anos depois, a OAS recomprou o imóvel por R$ 432,7 mil. A construtora o revendeu em seguida, amargando prejuízo, por R$ 337 mil.

Também estão sob investigação outros apartamentos em nome da OAS e da offshore Murray Holdings, criada pelo escritório Mossack Fonseca, alvo da operação. Presa na operação, a publicitária Nelci Warken seria responsável pela offshore, embora não tivesse patrimônio suficiente para realizar os negócios operados pela Murray, conforme detectaram os investigadores. O GLOBO perguntou à assessoria da OAS por que o apartamento de Vagner Freitas continua em nome da empreiteira, mas ela não respondeu. (Colaborou Sérgio Roxo)

Sergio Fausto*: No Brasil faltam elites dirigentes

- O Estado de S. Paulo

Passando os olhos pela História republicana do Brasil, constata-se que sempre houve grupo(s) dirigente(s) pronto(s) a substituir os que falharam na condução do Estado em momentos críticos. Refiro-me a falhas na capacidade de perceber a debilitação de modelos políticos e/ou econômicos antes que fosse tarde demais. A disponibilidade de elites dirigentes alternativas que, em aliança com grupos dissidentes do “antigo regime”, imprimiram novos rumos ao País evitou impasses políticos prolongados. Nem sempre com resultados desejáveis, como no golpe militar que pôs fim à democracia do período 1945-1964.

Esse padrão histórico contrasta com a situação atual. De positivo destaca-se a inexistência de ameaça ao regime democrático. De negativo, a dificuldade de articulação de uma nova coalizão de forças capaz de fazer o que o atual governo não tem mais condições de realizar: mudar os rumos do País.

A culpa pela ausência de uma alternativa clara ao status quo em geral é atribuída aos partidos de oposição, particularmente ao PSDB. Em boa medida a crítica é merecida, com uma ressalva importante: ela confunde a parte com o todo e o conjuntural com o estrutural.

Tornou-se comum dizer que faltam lideranças políticas no Brasil. É verdade. A geração composta por remanescentes do período pré-1964 (Ulysses Guimarães, Tancredo Neves, etc.) e por políticos que se formaram na oposição ao regime autoritário (incluídos os que, uma vez no poder, jogaram na lata do lixo sua responsabilidade histórica, confundindo o País com o partido) não foi substituída por outra à altura. Sem idealizá-la, em comparação com a atual aquela geração tinha maior noção da responsabilidade pública inerente à sua condição de dirigentes políticos.

Menos notada é a escassez de lideranças reconhecíveis e consolidadas na sociedade. No mundo empresarial, não se fazem mais Antônios Ermírios de Moraes e Josés Mindlins. Assim como na esfera sindical já não surgem mais Luizes Inácios da Silva. Não apenas porque os mecanismos de cooptação do Estado, aguçados no período recente, e a tendência à eternização dos dirigentes sindicais de patrões e empregados nas entidades de representação de classe limitam a emergência de novas lideranças, mas porque a sociedade brasileira já não é a mesma. A “velha indústria” perdeu peso relativo, um amplo e ainda mais heterogêneo setor de serviços se expandiu, empresas familiares se profissionalizaram, dando maior proeminência a muitos CEOs do que a alguns donos-fundadores. 

Também não se fazem mais dons Paulos Evaristos Arns e Ivos Lorscheiters porque o universo das igrejas no Brasil se diversificou muito, com a perda de densidade da católica e a multiplicação de denominações evangélicas. A crise da mídia tradicional produz efeitos semelhantes, assim como a emergência de um ativismo político explicitamente antipartidário e contraestatal, em parcial substituição à “sociedade civil organizada” que conhecemos no passado.

Há nesse quadro elementos positivos e negativos. De um lado, reflete a democratização do País, que se tornou mais diversificado e plural. De outro, a fragmentação da sociedade, que tem mais dificuldade para se reconhecer no espelho e produzir lideranças identificáveis e abrangentes.

Acresce que a sociedade se afastou da política, com exceção de setores empresariais mais organizados (quando não cartelizados), que com frequência se mantiveram ligados a governos e partidos pelos piores canais, e de alguns movimentos sociais que se partidarizaram e se deixaram cooptar pelo Estado. A participação na política e no setor público tornou-se cada vez menos atraente para os quadros da elite econômica, intelectual e científica, em comparação com as oportunidades oferecidas no setor privado e no terceiro setor, que passou a absorver a maior parte da vocação pública dos mais jovens. O global tornou-se mais atraente que o nacional e o privado; e o não governamental, mais atraente que o político-estatal.

O fenômeno não é exclusivo do Brasil. Há uma perda de qualidade das elites dirigentes dispostas a disputar e assumir a condução política do Estado mesmo nos países mais desenvolvidos. Entre nós, porém, o problema é agravado pela elevação dos riscos reputacionais e jurídicos associados à participação na política eleitoral e no desempenho de funções de direção no Estado.

Campanhas cada vez mais caras e financiadas de forma heterodoxa, criando relações de dependência com governos e/ou financiadores privados, a desorganização do sistema partidário, a prevalência de formas arbitrárias e/ou oligárquicas de seleção de novos quadros políticos dentro dos partidos, tudo isso desestimula a participação na política “por vocação”. Mecanismo análogo de seleção adversa opera em relação às funções públicas de direção. De um lado, formas de controle excessivamente formais punem o gestor disposto a inovar, sem necessariamente coibir aquele interessado em desviar recursos públicos. De outro, o loteamento político do Estado aumenta o risco jurídico de o gestor bem-intencionado se ver envolvido em esquemas ilícitos orquestrados e executados à sua revelia.

Refletindo e reforçando esses problemas, prevalece na sociedade a ideia de que a política é essencialmente “suja” e os governos, necessariamente “corruptos”, num círculo vicioso que afasta da vida pública a maior parte dos indivíduos que mais poderiam contribuir para melhorar a qualidade da política e do Estado. Como contraexemplo disso, logo vem à mente a nova geração de promotores, tecnicamente muito bem preparada e movida pelo interesse público. Mas é sintomático que desempenhem uma função judicial, e não política.

É essencial romper esse círculo vicioso. Sem elites dirigentes, com uma certa visão do Brasil, do seu passado e do seu futuro, corremos o risco de perder o rumo da História.
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*Sergio Fausto é superintendente executivo do IFHC, colaborador do Latin American Program do Baker Institute of Public Policy da Rice University, é membro do Gacint-USP.

Fernando Gabeira: Nem tudo acaba na quarta-feira

- O Globo

O carnaval é o tempo da alegria, em que as pessoas se irmanam no riso. Segundo o teórico russo Mikhail Bakhtin, a alegria popular é uma contrapartida à seriedade e chatice dos ritos oficiais. Acontece entre nós uma certa carnavalização da política. Algo diferente de se fazerem milhares de máscaras do japonês da Federal e sair cantando: vem pra cá, você ganhou uma viagem ao Paraná. Isso é a política no carnaval. Os discursos de Dilma e Lula são o carnaval na política. Ela conseguiu emplacar dois sucessos em 2015: “Saudação à mandioca” e “Armazenando o vento”.

Na primeira, Dilma pré-colombiana se entusiasmou com nossas origens indígenas. Na segunda, apenas mencionou um processo real mas que ainda não está consolidado: armazenar o vento nas rochas, como um ar comprimido. O sucesso da “Saudação à mandioca” é o entusiasmo de Dilma que se derrama para o milho. No “Armazenando o vento”, o refrão “daqui pra lá, de lá pra cá” transmite ação, é bastante expressivo para descrever o vento.

Deixando sua fase mais popular, Dilma ficou zangada com as previsões do FMI. “Estou estarrecida”, confessou. Como se nunca tivesse lido uma previsão que falasse do buraco em que caímos, até 2018, no mínimo. Mas estava reservada ao criador da criatura o papel de vocalista do bloco. Lula disse aos seus blogueiros de estimação que não existe no Brasil alma viva mais honesta do que ele. Com todas as reservas sobre a existência da alma, e dúvidas sobre se a de Lula está realmente viva ou é apenas um fantasma fugindo da polícia, esta frase abriu o carnaval de 2016.

Lula disse isso num momento em que está acossado por várias investigações, medida provisória vendida, compra de caças, triplex, sítio, enfim tudo o que aparece nas notícias e mais alguma coisa escondida nos inquéritos ou no fundo da garganta de um potencial delator premiado. Ao se proclamar a mais honesta alma viva do Brasil, Lula optou por um passe de mágica que deve ter maravilhado seus intérpretes oficiais, os blogueiros que levam grana do governo. É como se o protagonista, completamente cercado pela polícia, ficasse invisível, ou voasse como um herói de história em quadrinho: shazam.

Ele decidiu ocupar um lugar no Olimpo. O interessante é que, ao contrário dos deuses que tudo sabem, Lula nunca sabe de nada. É uma figura mitológica que derrota o amante traído na disputa por ser o último a saber. Bakhtin tem uma outra visão da etimologia do carnaval. Ao contrário dos que dizem que é a festa da carne, amparando-se na palavra latina, Bahktin mostra que a raiz germânica indica para a expressão: procissão dos deuses mortos.

O fato de os dirigentes serem carnavalescos não intencionais não teria o poder de atenuar seus erros com um pouco de humor? Sei que muitos vão escrever: onde está a indignação diante de tudo que roubaram? Não há espaço para rir deles. Concordo com a indignação com a roubalheira porque ela representa sofrimento, e no caso da saúde, morte precoce para o povo brasileiro. O fato é que eles estão aí. Sérios ou engraçados, assaltariam o país de qualquer maneira. Um pouco de humor não atrapalha. Como dizia Vinicius de Moraes, a gente trabalha o ano inteiro, por um momento de sonho, para fazer a fantasia de rei, ou de pirata ou da jardineira.

O sonho de carnaval, na canção de Vinicius, acaba na quarta-feira. Mas nesse ponto concordo com Bakhtin: o carnaval é mais longo. Aí está o nó. O Brasil oficial vive o sonho de uma potência emergente, incessante redistribuição de renda, orgulhase de sair no bloco bolivariano e rejeita quem insiste que já é Quarta-feira de Cinzas. No entanto, é um país decadente, que puxa para baixo a própria economia global, e está infestado de mosquitos do Aedes aegypti real ao tsé-tsé simbólico. Aqueles blocos que saem depois do carnaval são animados, ganham alguns minutos na TV, mas sabem que são efêmeros.

Os blocos oficiais parecem não saber. Não adianta gritar que o carnaval acabou. Eles não ouvem. Se ouvirem, daqui a alguns meses, vão responder como Dilma ao documento do FMI: “estou estarrecida”. Estamos estarrecidos há muito tempo. E não apenas com a situação econômica, mas com a gravidade da crise, com a perda de oportunidades nacionais, com o estado da imagem do Brasil no mundo, enfim essa longa lista de choros.

O carnaval demarca o tempo da alegria, um prazer com tempo para acabar, a finitude como a qualidade do próprio prazer. O bloco do governo não soube brincar. Confundiu festa e trabalho, realidade e fantasia, partido e país, dinheiro público e patrimônio. É um dos blocos que o carnaval popular rejeita. De um modo geral, são os que saem fantasiadas da cadeia, na Quarta-feira de Cinzas.

Mesmo na política carnavalizada, no entanto, nem tudo acaba na quarta-feira. Um japonês sem máscara vai bater o ponto na Federal de Curitiba, os processos correm, as línguas desatam, daqui a pouco, quem sabe, é domingo de Aleluia.

Bolívar Lamounier*: Impeachment e reforma do Estado-camarão

- O Estado de S. Paulo

No artigo Patrimonialismo de longa data, publicado neste espaço no dia 26 deste mês, o professor Ricardo Vélez Rodriguez foi ao âmago do que considero a grande questão política brasileira. Magnífico no conteúdo e na forma, seu texto sugere os rumos de um debate sério, que, infelizmente, não teremos como encetar enquanto a sra. Dilma Rousseff tiver condições de obstruir o processo político. A preliminar a resolver é, pois, a renúncia ou o impeachment da primeira mandatária.

O foco do professor Vélez Rodriguez é o patrimonialismo, ou seja, o sistema de poder despótico que chegou até nós, na América Latina, na modalidade pós-feudal de Estados mais fortes do que a sociedade. Em 1958, o jurista Raimundo Faoro colocou esse tema na agenda intelectual brasileira ao abordá-lo em seu livro Os Donos do Poder - Formação do Patronato Político Brasileiro (Editora Globo, 1958). Mas entre colocá-lo na agenda intelectual e conseguir que o “patronato político” referido no subtítulo da obra se decida a reformar ou a desmantelar de vez tal sistema, vai evidentemente uma grande distância.

Na excrescente fase a que chegou, o patrimonialismo brasileiro pode ser apropriadamente descrito como um Estado-camarão, por analogia com o crustáceo decápode que todos conhecemos. O traço distintivo do Estado-camarão é sua cabeça avultada e mal suprida de substâncias culinariamente aproveitáveis. A tenacidade com que se incrustou no casco da nau brasileira recomenda que sua cabeça seja urgentemente decepada. Eis aí, em poucas palavras, a base da reforma que me parece necessária.

Com tal estrutura de Estado, salta aos olhos que o Brasil jamais saltará do grupo de países de “desenvolvimento médio” para o nível mais alto, no qual se situam os países de fato desenvolvidos. 

A realidade aí está à vista de todos: um Estado que se apropria de uma parcela enorme da riqueza nacional, mas não consegue sequer educar direito as crianças; que “perde feio” (como disse outro dia o ministro da Saúde) na luta contra o Aedes aegypti; que insiste em assumir o controle direto de empresas nos setores que denomina de “estratégicos” - neste momento, a Petrobrás é o exemplo inevitável, e imagina dirigi-la por meio de um Conselho de Administração incapaz de enxergar uma manada de búfalos passando sob seu nariz.

Na esfera econômica, há que privatizar tudo o que o setor privado puder assumir de imediato, reduzindo ao mínimo o intervencionismo empresarial do Estado, fortalecendo as agências reguladoras e tratando de assegurar a previsibilidade e a segurança jurídicas.

Na área trabalhista, desmontar o sistema corporativista de inspiração mussoliniana - “herança maldita” da ditadura Vargas -, substituindo a unicidade (artigo 8, II, da Constituição federal de 1988) pelo pluralismo sindical e suprimindo o poder normativo da Justiça do Trabalho.

No plano político, descentralizar a Federação, com a devida reorganização das receitas e competências; fortalecer as Assembleias estaduais e reduzir correlativamente o tamanho do Congresso Nacional; e reorganizar no mesmo sentido o sistema de representação: relações Executivo x Legislativo moldadas segundo os princípios do parlamentarismo, voto distrital e alguma sobriedade na cômica permissividade da legislação partidária.

Num país escandinavo o modelo federativo de três níveis desenhado pelos constituintes de 1988 seria provavelmente saudável para a democracia. No Brasil - e nem falemos do Brasil da era petista! - tal expectativa carece totalmente de sentido. A discrepância entre a autonomia formal dos Estados e municípios, de um lado, e a dependência financeira real em relação à União, do outro, abastarda a vida política do País, transformando a maioria dos congressistas em “despachantes federais” e fomentando o espetáculo periódico de governadores e prefeitos acorrendo à capital em peregrinações de mendicância. Pereniza uma classe política subserviente, mas ao mesmo tempo propensa a espasmos anarquistas, como a “pauta-bomba” de 2014-2015.

Na afoiteza com que tentaram desincumbir-se de sua missão constituinte, os congressistas de 1987-1988 assumiram posições e abraçaram argumentos não raro bizarros. Entenderam que a realização do princípio democrático se reduzia praticamente a dilatar a base da pirâmide política, objetivo que se poderia alcançar com umas poucas decisões quase consensuais - a suspensão de algumas restrições e a extensão de certos direitos. Esqueceram-se de refletir, por exemplo: por que o Brasil, que à época contava 148 milhões de habitantes, precisava de 513 deputados federais, se os Estados Unidos, com 245 milhões, tinham (como têm até hoje) apenas 435? Será a House of Representatives americana menos eficiente ou menos democrática que a nossa Câmara dos Deputados?

Meramente numérica na aparência, tal inquirição diz respeito ao poder que se julga que os legisladores devam ter. Numa democracia digna do nome, o Legislativo precisa ser capaz de ombrear-se com o Executivo, mas tal poder dificilmente se tornará realidade se seus integrantes forem individual e coletivamente débeis. Em 1788, no Paper Federalista número 51, James Madison refletiu essa questão e sentenciou: “Com dez mil membros, mesmo a assembleia de Atenas não passaria de uma turba”. Se uma máquina do tempo o tivesse trazido a Brasília durante aquele saudável alvoroço, ele provavelmente diria aos nossos constituintes que a melhor forma de manter um Executivo discricionário e um Estado-camarão virtualmente indestrutível seria criar uma Câmara povoada por 10 mil deputados e dividida em 100 partidos.

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*Bolívar Lamounier é cientista político, sócio-diretor da Augurium Consultores, é autor do livro ‘Tribunos, Profetas e Sacerdotes’ (Companhia das Letras, 2014)

Merval Pereira: Em busca do futuro

- O Globo

A Macroplan, empresa de consultoria especializada em estratégia e cenários de longo prazo, em estudos para a atualização das análises para o Brasil 2016-2035, identificou e delineou “fatos portadores de futuro” — eventos ou processos em fase de amadurecimento no país, que carregam consigo o germe de mudanças significativas.

A tentativa é superar o pessimismo e a falta de perspectivas que predominam hoje, embaçando a visão de longo prazo e encurtando os horizontes de análise, na opinião do economista Claudio Porto, presidente da empresa. A convicção de Porto é que existem pelo menos dois fatos ou processos portadores de novos e melhores padrões no futuro, o que seria o “novo normal” brasileiro.

O primeiro é o fim da impunidade dos poderosos, como consequência, principalmente, da operação Lava-Jato, que teve sua gênese no mensalão. O segundo é o esgotamento da expansão do Estado brasileiro, instituído na Constituição de 1988 e que dá sinais evidentes de exaustão com a explosão do endividamento público e o colapso financeiro e operacional de vários estados do país.

Três outros fatores, de acordo com a Macroplan, explicam o elevado poder de influência e transformação da Lava-Jato: (1) a competência e independência dos policiais, procuradores e juízes nela envolvidos, e que, na primeira instância, operam com modernos métodos de investigação e comprovação; (2) a capacidade de comunicação e a grande repercussão social das operações que é amplificada por todas as mídias; e (3) o amplo apoio da opinião pública.

O novo padrão de comportamento e desempenho induz à busca da mesma performance por operações semelhantes, como a “Zelotes” e “Acrônimo”, produzindo-se assim uma saudável pressão por resultados. Além disso, é sintomático o fato de que o tema corrupção no país hoje está situado no topo dos problemas nacionais que afligem a população.

Para Claudio Porto, se o fim da impunidade dos poderosos passar a fazer parte do “novo normal” brasileiro, isto implicará o robustecimento das instituições, uma melhoria imediata no ambiente de negócios e, mais adiante, uma mudança, para melhor, nos padrões do capitalismo e do sistema político do país.

Com relação ao tamanho do Estado brasileiro, a Macroplan ressalta análise dos economistas Mansueto Almeida, Marcos Lisboa e Samuel Pessoa, que demonstraram recentemente que a atual trajetória de aumento dos gastos públicos do Brasil é insustentável e exigirá um ajuste maior, sob risco de um desastre econômico.

A carga tributária, revelam, passou de cerca de 25% do PIB em 1991 para mais de 35% em 2014. Nesse período, a renda real do país cresceu 103%, enquanto a receita de impostos cresceu quase 184%.

Os economistas destacam que nos últimos 23 anos o setor público apropriou-se de 45% do crescimento da renda nacional para financiar seus gastos – uma impressionante elevação dos gastos anuais de quase R$500 bilhões, entre 1991 e 2014, que não resultou em equivalente melhora na qualidade das políticas públicas, como em saúde e em educação.

E o aumento previsto dos gastos públicos anuais até 2030 requereria uma nova CPMF a cada governo. As despesas públicas anuais serão R$ 300 bilhões maiores em 2030, o que representa uma elevação de R$ 20 bilhões por ano. Mansueto, Lisboa e Pessoa ressaltam que nos últimos quatro anos, a receita recorrente cresceu apenas 1,5% ao ano, enquanto a despesa do governo central manteve ritmo acelerado de crescimento, de 5,4% acima da inflação.

Como consequência, o país entrou em uma rota de crescente endividamento público, cuja trajetória se revela explosiva: a dívida bruta provavelmente alcançará 80% do PIB até 2018. A menos que uma agenda extensa de reformas seja iniciada, com a reversão da trajetória de aumento do gasto público, o Brasil estará condenado a uma longa estagnação.

Na visão do economista Claudio Porto, da Macroplan, contudo, o ajuste do Estado é inevitável. Um dos sinais mais promissores é o Pacto pela Reforma do Estado, articulado pelo Movimento Brasil Competitivo que reúne 14 governadores estaduais e lideranças empresariais.

A Macroplan destaca ainda que alguns estados começam a preparar projetos de Lei de Responsabilidade Fiscal Estadual e tomam iniciativas para realizar ampla revisão de benefícios concedidos a grupos cada vez maiores de pensionistas, além de estabelecer tetos de gastos em todos os poderes.

Deste modo, na conclusão da Macroplan, estará posta uma saudável pressão sobre o governo federal e o Congresso Nacional para que finalmente façam andar a agenda de reformas antes que a crise as imponha em um cenário de emergência.

Dora Kramer: A estrela desce

- O Estado de S. Paulo

A estrela do PT mandada desenhar nos jardins do Palácio da Alvorada, em 2004, e depois transportada para a Granja do Torto - duas residências da Presidência da República - já indicava a tendência do casal Luiz Inácio e Marisa Letícia da Silva de tomar por privado o patrimônio público.

As investigações do Ministério Público de São Paulo que servirão como subsídios à Operação Lava Jato relevam mais que isso: um possível favorecimento ilícito por parte de duas empreiteiras, OAS e Odebrecht, na aquisição e reforma de um apartamento no Guarujá e na execução de melhorias de um sítio em Atibaia, respectivamente litoral e interior de São Paulo.

Qualquer semelhança com a reforma dos jardins da Casa da Dinda - residência particular do então presidente e hoje senador igualmente investigado, Fernando Collor - com dinheiro obtido a partir de arrecadação de propinas pelo chamado esquema PC Farias, não é mera coincidência.

Ambos os fatos desenham um elo entre os dois ex-presidentes: a falta de cerimônia no uso do poder para o financiamento do gosto por hábitos de luxo. Prática cultivada desde sempre por Collor, oriundo de família rica de Alagoas, e adquirida ao longo da trajetória política de Lula, filho da pobreza reinante no agreste pernambucano.

A jardinagem e a compra de um Fiat Elba, pagos pelo tesoureiro da campanha e eminência parda do governo, Paulo César Farias, derrubaram Fernando Collor de Mello, castigo (como se vê agora) insuficiente para o aprendizado da lição. De rivais, transformaram-se em compadres da irresponsabilidade e da transgressão.

A compra e reforma do triplex no condomínio Solaris, se não muito bem explicadas ao Ministério Público têm potencial para desalojar Lula do panteão dos invencíveis onde foi posto pelo eleitorado, e ainda fazê-lo perder a vaga no altar das santidades em que ele mesmo se colocou ao se declarar “a alma viva mais honesta do País”.

Com a convocação do MP paulista para depoimento em meados de fevereiro junto com a mulher Marisa e o empreiteiro Léo Pinheiro, Lula transita da condição de testemunha e/ou informante para a posição de investigado. Em miúdos: antes o que se pedia ao ex-presidente eram informações a respeito de fatos que poderiam ou não ser do conhecimento dele; agora, o que o MP apura é a participação do ex-presidente no suposto uso da comercialização dos apartamentos em esquema de lavagem de dinheiro.

A consequência é que se não convencer os procuradores, provavelmente sairá do depoimento denunciado e, com isso, irremediável e gravemente ferido do ponto de vista político. Não será fácil a tarefa de demonstrar sua inocência. Primeiro, porque já foram apresentadas diversas e contraditórias versões a respeito da propriedade.

Em 2006, ele declarou o imóvel no Imposto de Renda; em 2010, confirmou a propriedade imaginando se defender de uma infração tributária; em 2014, confirmou a versão para duas semanas depois adaptá-la, dizendo que Marisa Letícia tinha uma cota do empreendimento, mas que não havia feito opção de compra da unidade. Seis meses depois, sua assessoria passaria a negar a existência de posse.

Em segundo lugar, o ex-presidente terá de desmontar de maneira definitiva os depoimentos de testemunhas que confirmam a presença dele e de Marisa, esta com maior frequência, no condomínio para acompanhar as obras de reforma e decoração do imóvel. Se o apartamento não pertencia a eles, o que faziam lá?

A princípio, cuidavam do patrimônio do casal. A menos que zelador e moradores, cujas versões confirmam as presenças, sejam insidiosos conspiradores cooptados pela nossa diligente e sempre alerta oposição.

Luiz Carlos Azedo: A porteira e o zelador

• Antes mesmo das redes sociais, com a democratização, o motorista, a ex-mulher, a secretária e o caseiro foram protagonistas de grandes crises políticas, pelo simples testemunho honesto sobre os fatos

- Correio Braziliense

Foi-se o tempo em que os jornalistas tinham o monopólio da notícia. Hoje, os grandes acontecimentos mundiais são registrados em primeira mão pelos cidadãos com seus celulares nas redes sociais. Mas os jornalistas, simples mortais, ainda correm atrás dos acontecimentos, em busca de respostas para as perguntas clássicas que têm obrigação de fazer: o quê, quem, quando, onde, como e por quê?

Essas perguntas revolucionaram o jornalismo impresso nos Estados Unidos no fim do século 19, estabelecendo um padrão universal para a abertura das matérias, o chamado lead, que consiste em respondê-las logo no primeiro parágrafo. A informação instantânea pela internet, nas rádios e na tevê, porém, colocou em xeque a obrigatoriedade do lead, revalorizou os estilos e ameaça a padronização e simplificação do texto jornalístico.

O lead foi uma exigência dos tempos da composição a quente, no qual o texto era transcrito em linhas de chumbo, antes da impressão. A necessidade de hierarquizar a informação era absoluta porque permitia cortar as matérias na hora da edição, até o primeiro parágrafo, sem deixar de publicar a notícia. Para o jornalismo impresso, ainda é uma regra básica; mas o jornalismo on-line não tem a mesma limitação.

Um fenômeno correlato é a quebra do monopólio da política. A política era praticada apenas por aristocratas, diplomatas e militares; com a democracia liberal, passou a ser atribuição dos políticos e seus partidos. Deixou, porém, de ser um monopólio com os meios de comunicação de massa. Antes mesmo das redes sociais, com a democratização, o motorista, a ex-mulher, a secretária e o caseiro foram protagonistas de grandes crises políticas, pelo simples testemunho honesto sobre os fatos.

É que mentiras precisam de cúmplices. Um simples testemunho pode por tudo a perder, como aconteceu com o ex-presidente Collor de Mello, o ex-prefeito de São Paulo Celso Pitta, o publicitário Marcos Valério e o ex-ministro Antônio Palocci. A Operação Lava-Jato não abriu uma investigação contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, embora a cúpula do PT e o próprio líder petista estejam denunciando uma suposta tentativa de incriminá-lo por parte de delegados da Polícia federal e procuradores do Ministério Público da União que investigam o escândalo da Petrobras. Entretanto, uma investigação sobre a suposta ocultação de patrimônio por parte do ex-presidente da República foi aberta pelo Ministério Público de São Paulo.

Alguns depoimentos apontam a suposta ligação entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o apartamento tríplex no Guarujá que também está sendo investigado pela Lava-Jato, o que o ex-presidente nega veementemente. Os engenheiros Rosivane Soares Cândido e Armando Dagres, da construtora Tallento — responsável pela reforma do tríplex — disseram ter presenciado a participação da ex-primeira-dama Marisa Letícia em duas reuniões sobre a reforma do apartamento. O ex-funcionário da OAS Wellington Aparecido Carneiro da Silva, responsável por fiscalizar os empreiteiros que trabalhavam nas obras, disse ter acompanhado o ex-presidente até a porta do tríplex para uma vistoria do imóvel.

Visitas
Mais preocupantes, porém, são os depoimentos do zelador do Edifício Solaris, José Afonso Pinheiro, e da porteira do condomínio, Letícia Eduarda Rodrigues da Silva Rosa, ao Ministério Público. Pinheiro relatou ter visto Lula no condomínio duas vezes na época em que o tríplex estava sendo reformado pela Tallento Construtora Ltda, empresa contratada pela OAS. A primeira vez foi quando estava sendo feita uma “limpeza geral” no imóvel. Na ocasião, destacou o funcionário, Lula estava acompanhado da ex-primeira-dama. A segunda coincidiu com a instalação do elevador privativo no apartamento. Pinheiro não detalhou aos promotores a data das supostas visitas. Em ambas as ocasiões, a OAS limpara o prédio e decorara a entrada com arranjos florais para receber Lula e dona Marisa Letícia. O zelador disse que a esposa de Lula chegou a visitar o espaço comum do edifício indagando sobre o salão de festas, a piscina e outras áreas comuns.

A porteira Letícia Eduarda também relatou ter visto Lula no prédio durante a reforma do apartamento tríplex, no fim de 2013. De acordo com a funcionária, o ex-presidente “entrou, subiu até o apartamento 164-A e foi embora”. Ela disse que viu a ex-primeira-dama no condomínio apenas uma vez por meio da câmera de monitoramento. Letícia ressaltou aos promotores que apenas familiares de Lula frequentavam o apartamento. Nas ocasiões em que Lula e familiares visitaram o tríplex, os seguranças do ex-presidente interditavam o acesso aos elevadores de uso comum do prédio. Segundo a porteira, a iniciativa não chegou a gerar “muita polêmica” porque, à época, havia poucos moradores no condomínio. Já o zelador contou que a interdição temporária dos elevadores, entretanto, “gerava muitas reclamações”. Até agora, não apareceu nenhuma foto ou gravação comprometedora, mas se alguém fez um selfie...

Eliane Cantanhêde: A gangorra do PT em risco

- O Estado de S. Paulo

Na gangorra petista, Lula está em baixa e Dilma parece em alta, mas esse movimento não tem mais como se inverter. Lula parou onde está: não tem como sair do atoleiro e voltar a subir ao patamar de líder político mais popular da história recente. E a posição de Dilma é incerta: ela ainda não escapou de afundar junto com a economia.

Abraçado a sua mulher, Marisa Letícia, e a seu filho caçula, Luis Cláudio, Lula vem sendo sugado para o centro dos escândalos pelo peso de um tríplex no Guarujá, um sítio em Atibaia, envolvimento com as maiores empreiteiras da Lava Jato, suspeita de venda de medidas provisórias e o envolvimento em série de seu primeiro escalão no mensalão, na Lava Jato e na Zelotes.

O valor do tríplex na Lava Jato vai muito além dos três andares, do elevador personalizado e dos R$ 777 mil da reforma, R$ 380 mil só para o mobiliário da cozinha e do quarto doados pela OAS. Ele vale principalmente por ser do Edifício Solaris, a maquete de concreto, tijolo e vidro de como o roubo na Petrobrás se processava.

Assim: o dinheiro saía da maior estatal brasileira, passava para os cofres de uma das maiores empreiteiras e dali era distribuído alegremente para a turma que comandava e comanda a política e o Executivo do país. Claro que passando por atalhos convenientes, como offshores e uma cooperativa de bancários presidida pelo PT - inclusive por um dos presos da Lava Jato.

Pelo tríplex, a situação de Lula mudou drasticamente de patamar. Se já era espantoso um ex-presidente ter de papear horas e horas na Polícia Federal, Lula e sua mulher agora estão intimados pelo Ministério Público de São Paulo para depor. Ele não é mais só testemunha.

Lula classifica as dúvidas do MP paulista de “infundadas e levianas” e o presidente do PT, Rui Falcão, diz que tentam “derreter Lula” para “destruir o PT”. São adjetivos e expressões fortes, mas procuradores, delegados e opinião pública querem algo mais substantivo: as empreiteiras davam ou não imóveis milionários para Lula, Marisa e companheiros do PT? Em troco do quê? E quem bancava era a Petrobrás?

Enquanto Lula se debate entre a serra e o mar, Dilma vai navegando, ora com ondas imensas, ora só sacolejando - como neste momento em que a agenda da presidente tem um objetivo político claro: demonstrar que tem como atravessar a tempestade e chegar viva à praia de 2018.

Numa só semana, antes do fim do recesso do Congresso, Dilma reuniu dezenas de representantes das finanças, da indústria, do comércio, da sociedade civil; anunciou sete medidas para tentar injetar R$ 83 bilhões de crédito na economia anoréxica; acenou com a redução da conta de luz; reuniu-se com líderes americanos; falou ao telefone com Obama.

Ao dizer que “vamos ganhar a guerra” contra o Aedes aegypti, o que Dilma tenta gritar é: “Eu vou ganhar a guerra!” Nenhuma das duas é fácil. Oferecer crédito a pessoas e empresas que não querem contratar dívidas? Usar o FGTS, um fundo dos trabalhadores, para corrigir erros do seu próprio governo? Centrar o discurso e a saída fiscal na CPMF, que o Congresso e a sociedade rejeitam?

Bem, o fato é que Lula está muito pior do que Dilma, que pelo menos saiu dos holofotes negativos para os positivos. É um avanço, ou um alívio. Só não se sabe até quando. E é aí o nó da questão: se o lado de Lula está no chão (e de lá não vai sair) e Dilma não está firme e forte em cima, o risco é os dois desabarem e a gangorra do PT se espatifar.

Alerta. Só na quinta e na sexta-feira passadas, o Consulado de São Francisco, nos EUA, emitiu ARB (Autorização de Retorno ao Brasil) para 12 turistas sem passaportes, documentos nacionais, dinheiro e pertences furtados em diferentes carros alugados. Furto, como o zika, não é exclusividade do Brasil.

Elio Gaspari: A lâmina do STF e os réus da Lava Jato

- O Globo

Má notícia para quem torce contra a Lava Jato. A faculdade de Direito da Fundação Getúlio Vargas do Rio concluiu uma pesquisa sobre o desempenho do Ministério Público em suas causas junto ao Supremo Tribunal Federal e concluiu: "Nos processos da Operação Lava Jato, que tanta atenção têm recebido recentemente, o Supremo dificilmente reverteria uma decisão desfavorável aos réus emitida pelo TRF-4. Em 2013, as chances de isso ocorrer eram de 1%".

Essa é a taxa de reversão pelo STF de decisões vindas do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, que cobre Curitiba, em processos abertos pelo MP. Quem conhece o STF arrisca dizer que, de 2013 até hoje, essas chances encolheram. Nunca se deve esquecer de que, em setembro, a ministra Carmen Lúcia assume a presidência da corte.

Assinada pelos professores Joaquim Falcão, Alexandre de Moraes e Ivar Hartmann, a pesquisa da FGV levou um ano para ser concluída. Isolou 40,6 mil processos originados pelo Ministério Público Federal e pelos estaduais que tramitaram entre 1988 e 2013, fechando o foco no desfecho das ações.

A pesquisa mostra um Ministério Público mais atuante, com taxas de sucesso superiores à da média das outras partes. O campeão é o MP de Santa Catarina. Ganha em 38% dos casos e perde apenas em 1,8%. Nos grandes números, a lanterna ficou com o MP do Maranhão, com 4,5% de sucessos e 12,7% de derrotas. (Essas percentagens não somam 100% porque se referem a universos diferentes.)

Reapareceu 'Silvinho', um personagem do mensalão
A defesa do comissário José Dirceu soltou uma informação de aparência banal: quem nomeou Renato Duque para uma diretoria da Petrobras não foi ele, mas Silvio Pereira, o "Silvinho", secretário-geral do PT até 2005. No seu depoimento na sexta-feira, Dirceu limitou-se a dizer que não indicou Duque, sem citar "Silvinho".

"Silvinho" não era um petista qualquer. A primeira sede do partido, em Osasco, funcionou nos fundos da lanchonete Cebolinha, de sua família. Em 2003, ele coordenava a distribuição de cargos para o partido, com a ajuda de 130 cadernos e blocos. É plausível que o nome de Duque tenha passado por "Silvinho".

Nessa época, o PT ajudava a manutenção de alguns de seus quadros do novo governo. Nada a ver com a máquina distributivista do mensalão, cuidava-se apenas do Executivo. Uma pessoa que viu um dos cadernos de "Silvinho" chamou-o de "gibi".

Em 2005, quando a palavra "mensalão" entrou no léxico nacional, Silvio Pereira formou com José Dirceu e o tesoureiro Delúbio Soares a trindade do poder petista acusado de corrupção. Ele submergiu, mas meses depois a empresa de engenharia GDK, fornecedora da Petrobras, reconheceu ter dado a "Silvinho" um jipe Land Rover. (Ele devolveu o carro, quanto à GDK, conseguiu 19 novos contratos com a Petrobras e reapareceu dez anos depois na Lava Jato.)

"Silvinho" deixou o partido e em 2008 fez um acordo com a Procuradoria-Geral da República, aceitando cumprir 750 horas de serviços comunitários. José Dirceu e Delúbio não fizeram acordo, um tomou uma sentença de sete anos e o outro, de seis.

Paga a conta, "Silvinho" voltou para Osasco, fez um curso de gastronomia e voltou ao restaurante da família, o Tia Lela, localizado em frente à prefeitura.

Apesar de Silvinho ter dito que "há cem Marcos Valérios atrás do Marcos Valério", as investigações do mensalão deram pouca importância à conexão Petrobras e sua rede de fornecedores. Veio a Lava Jato e deu no que deu. É possível que o Ministério Público se interesse em ouvir de novo Marcos Valério. O sinal dado pela defesa de José Dirceu sugere que talvez valha a pena conversar com Silvio Pereira.

Um jabuti à solta
Realizou-se na manhã de terça (26) uma reunião na Casa Civil. Diretores da Agência Nacional de Saúde Suplementar receberam ordens para retomar as análises e estudos no sentido de liberar os reajustes dos planos de saúde individuais.

Se essa velha aspiração de amigos do palácio for em frente, acertará o bolso de 10 milhões de pessoas.

Fazer isso numa hora em que há gente perdendo o emprego e o plano de saúde da empresa é, no mínimo, uma covardia.

Vale tudo
Na busca de uma blindagem que a proteja da deposição, a doutora Dilma liberou sua tropa para atacar a área cultural do governo, que de certa maneira era respeitada.

O perigo da orla
Apartamento de político em lugar visível, sobretudo quando fica de frente para o mar, tem mau-olhado. Talvez Lula não soubesse disso quando se enamorou do tríplex em Guarujá, onde achou boa ideia instalar um elevador interno.

Juscelino Kubitschek comeu o pão que o Tinhoso amassou porque comprou um apartamento na avenida Vieira Souto.

Carlos Lacerda, por muito menos, pois construiu um novo andar no seu, na praia do Flamengo, para instalar a biblioteca. Com a obra, seu edifício ficou com a mesma altura do prédio vizinho, mas não adiantou muito.

Tancredo Neves e Magalhães Pinto, chefes de partidos rivais, foram para o edifício Rio das Velhas na avenida Atlântica. Os adversários, o que significa dizer, todo mundo, chamavam-no de "São Dimas", o bom ladrão crucificado no Calvário.

(A pedido de sua mulher, Magalhães conseguiu que o Rio das Velhas mudasse de nome.)

Israel
O governo israelense resignou-se e já entendeu que Dani Dayan não terá o beneplácito do Itamaraty para assumir a embaixada no Brasil.

A doutora Dilma está sendo gentil. Depois de ele ter dito que o governo israelense devia reagir ao silêncio brasileiro "segurando o touro pelos chifres", a indicação devia ser simplesmente recusada.

É nisso que dá preencher embaixadas no exterior olhando para arranjos de política interna. Dayan é um empresário, militante de causas radicais em seu país.

Dakota
Para quem gosta de ler bobagens, está na rede o livro "Life at the Dakota" (A Vida no Dakota - O endereço mais esquisito de Nova York").

Conta a história do edifício onde foi filmado "O Bebê de Rosemary" e em cuja entrada morreu o morador John Lennon. Nele habitaram pelo menos dois fantasmas, os elevadores andavam sozinhos e objetos moviam-se por conta própria. Para piorar, um de seus moradores foi o ator Boris Karloff, o grande vampiro de filmes de terror.

Erguido em 1884 na banda errada da cidade numa época em que morar em edifício era coisa de gente sem classe, em 1960 todo o prédio foi comprado por US$ 4,6 milhões, vindo junto um terreno adjacente que valeu US$ 2 milhões. Um avaliador contratado por um banco estimou que os terrenos valiam US$ 3,8 milhões. Quanto ao prédio, zero. Nessa época, a atriz Lauren Bacall comprou seu apartamento de três salas e três quartos por US$ 48 mil. Ele foi vendido em julho passado por US$ 23,5 milhões.
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Bernardo Mello Franco: Uma coisa, outra coisa

- Folha de S. Paulo

Luiz Inácio Lula da Silva deixou o poder nos braços do povo. Literalmente. No dia em que passou a faixa presidencial, ele quase foi tragado pela multidão que se apertava na praça dos Três Poderes para vê-lo descer a rampa do Planalto pela última vez.

O calor da despedida tinha motivo. Lula foi o presidente mais popular do período democrático. Em dezembro de 2010, seu governo era aprovado por 83% dos brasileiros. A economia cresceu em ritmo acelerado, o desemprego caiu pela metade, a concentração de renda se tornou menos indecente.

O ex-metalúrgico também deixou muito por fazer, mas entregou um país melhor do que recebeu. Nos últimos dias, o PT tem usado esse saldo positivo como argumento para defender seu líder das suspeitas da Lava Jato. Não deveria. Como ensina a filosofia popular: uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa.

Os avanços da era Lula são inegáveis, mas não servem como indulto para o resto. Seu governo deixou um megaescândalo conhecido, o mensalão, e outro que ainda oferece revelações diárias, o petrolão. O ex-presidente nunca deu uma explicação convincente para o primeiro e tenta sair pela tangente ao ser questionado sobre o segundo.

Agora as investigações se aproximam dele como pessoa física. Depois do Carnaval, Lula terá que depor sobre o rolo do tríplex da OAS no Guarujá. Novos indícios publicados pela Folha ligam a Odebrecht a obras no sítio frequentado por sua família em Atibaia.

As empreiteiras não são entidades beneficentes, e o petista continua a ser um homem público, com influência no governo e pretensões eleitorais. Ele merece ser tratado com respeito, mas não está acima da lei e tem explicações a dar.

Driblar o assunto com propaganda do governo passado é um discurso que só cola com militantes fervorosos. Se Lula insistir nessa tática, eles serão cada vez menos.

Míriam Leitão: Dissonâncias

- O Globo

Há uma dissonância entre os cenários que muitos economistas fazem para a política e para a economia. Eles traçam um quadro de inflação alta, alguns falam em continuação dos dois dígitos, recessão de 4%, déficit público persistente, dívida bruta em rota perigosa e desemprego que ceifará milhões de vagas. No cenário político, acham que tudo ficará na mesma.

Um cenário não conversa com o outro. Em artigo neste jornal na sexta-feira, o economista Rogério Werneck chamou a atenção para esse desencontro. Se houver um aumento da deterioração econômica, isso trará mais desassossego social, maior turbulência política, o que é incompatível com o cenário “mais do mesmo”. A presidente Dilma terá que fazer um esforço maior de estabilização da economia para se manter no cargo, porque mesmo no presidencialismo, em que a troca de chefe de governo não é trivial, há vários caminhos para mudanças previstos na Constituição, portanto, não golpistas.

Nesta semana, os políticos voltam ao Congresso, depois do recesso em que estiveram em suas bases e ouviram inúmeras reclamações de eleitores sobre a situação econômica. Voltam, portanto, para o início de uma temporada de reclamações. Sabem que têm que demonstrar estarem sensíveis ao que lhes disseram os seus eleitores. Ainda mais em ano eleitoral. As prefeituras que estão sendo disputadas este ano serão a base para a campanha eleitoral de 2018. Há uma ligação direta entre este pleito e o que os parlamentares enfrentarão dentro de dois anos. Poucos vão querer defender, na campanha deste ano, um governo que tem como cartão de visita o trio inflação-recessão-desemprego.

Cálculos de consultorias e de bancos apontam para o quadro extremo de uma taxa de desemprego que pode chegar a 12%. Como o último dado conhecido foi 9% e cada ponto percentual a mais significa um milhão de pessoas procurando emprego sem encontrar, o que esses cálculos projetam é um aumento de dois a três milhões no número de desempregados este ano. A decisão do Banco Central de não subir juros, se de um lado poupou as contas públicas, de outro alimenta a expectativa de inflação alta por mais tempo. O único fator deflacionário é exatamente o que se quer evitar: a recessão.

Além disso, a base parlamentar está em frangalhos desde o ano passado, e a presidente não tem sido capaz de liderar a coalizão. Um cenário depende do outro. A coalizão só ficará mais coesa se houver alguma perspectiva de melhora, já que, por outro lado, não se pode contar com a habilidade política da presidente. Um segundo ano consecutivo de recessão é algo que não conhecemos, porque na história do país só aconteceu nos anos 1930.

Se há incerteza na política, na economia há certezas. A cada semana alguns temores se materializam. Na semana passada, foram os dados das contas públicas. O déficit nominal está em 10% do PIB. Este é um número grego. O déficit primário trouxe as sequelas das pedaladas que, em boa hora, o Tribunal de Contas da União desmascarou mostrando que jogava-se para os bancos públicos e fundos o que era obrigação orçamentária do governo.

Há dissonância também no que alguns falam sobre o impeachment. Acham que a razão que fundamentou o pedido dos juristas é fraco e nada ali se configura razão para o processo. Seria diferente se fosse através do Tribunal Superior Eleitoral porque então haveria razão suficiente para o afastamento.

O que o TCU mostrou, os fatos comprovam, e os juristas usaram em seu pedido é que a presidente infringiu a Lei de Responsabilidade Fiscal. O enorme rombo de 2016 tem as cicatrizes das pedaladas. Se ela tivesse provocado a ruína econômica por má gestão, mas seu governo não tivesse manipulado estatísticas fiscais nem tivesse desrespeitado o princípio legal de que bancos públicos não financiam o governo, se poderia até descartar o embasamento econômico. Mas esse raciocínio cria duas classes de leis. E a fiscal seria de segunda classe, já que desrespeitá-la seria um crime menor. Se nada mais houvesse em torno do governo Dilma, seu mandato estaria sob risco por ter desrespeitado a lei que sustenta a estabilidade monetária e ter provocado a maior crise dos tempos recentes. Nesse ambiente de crise, é difícil que nada aconteça na política.

Ferreira Gullar: Errando e aprendendo

- Folha de S. Paulo

Não sei se foi de dona Zizi, minha mãe, ou de Newton Ferreira, meu pai, que herdei esta tendência a não me submeter a verdades indiscutíveis.

Talvez tenha sido dela, pouco afeita a euforias e conversa fiada. Mas, para ser justo, devo reconhecer, lembrando certas histórias que me contava, que ele tampouco se deixava iludir pelo papo beleza dos espertos. Isso eu aprendi com ele, mas não herdei o talento de jogador de futebol, pois, já logo cedo, me revelei um perna de pau, enquanto ele chegou a centroavante da seleção maranhense.

O papo que me ganhou mesmo foi o dos poetas que, se não falam propriamente a verdade, tampouco têm a intenção de tomar teu dinheiro. O que pretendem é que você embarque com eles no "barato" que costumam inventar. Não só embarquei na conversa deles como passei, eu mesmo, a usar dessa mesma conversa.

A religião não tinha muita presença em nossa casa. Meu pai e minha mãe, embora católicos, não frequentavam igreja. Às vezes, via-a rezando; ele, nunca. Desse modo, a explicação que eu tinha para a existência do mundo não era a de que Deus o criara, nem mesmo de que tivesse sido criado por alguém. De fato, não me preocupava com isso.

Essa questão só se colocou para mim quando me matricularam no Colégio São Luiz de Gonzaga, da professora Zuleide Bogéia, católica praticante. Em seu colégio, todos os dias, antes das aulas, às sete da manhã, as turmas de alunos se reuniam na sala principal para rezar um terço. A reza terminava com todos cantando uma oração –ela, os alunos, as professoras e os funcionários, sem exceção.

Posso dizer que me tornei adulto sem acreditar em nada, senão nas leis da natureza e nas noções de propriedade e direitos que regiam a sociedade. Difusamente, opunha-me às desigualdades sociais, que me pareciam injustas, mas não me dispunha a lutar contra elas.

Isso só mudou muito tempo depois, em 1961, quando li o livro de um padre francês, Jean-Yves Calvez, sobre o pensamento de Karl Marx. Na primeira parte do livro ele expõe o pensamento de Marx e, na segunda, mostra que padre não pode ser marxista. Como não era padre, só li a primeira parte e virei marxista.

Pouco depois, passei a militar no Centro Popular de Cultura da UNE, que atuava no meio universitário, pregando a revolução comunista. Em 1º de abril de 1964, um golpe militar derrubou o governo do presidente João Goulart e impôs ao país um regime autoritário. Desfeito o CPC da UNE e a própria UNE, os integrantes criaram o Grupo Opinião que, através da atividade teatral, integrou-se na luta contra o regime militar.

Nós éramos todos comunistas, embora não o proclamássemos abertamente, uma vez que o governo militar que assumiu o poder no Brasil era declaradamente anticomunista. A opção pela luta armada, por parte de uma facção dos adversários do regime, ofereceu aos militares o pretexto para introduzir na repressão aos adversários, a tortura e até mesmo a eliminação física de militantes.

Os anos se passaram. A ditadura ruiu e o regime democrático retomou seu lugar no processo político brasileiro. Hoje, décadas depois, relembro momentos daquele período, quando a luta pelo fim do regime militar era o objetivo principal de nossa atividade política e cultural, e reflito sobre o que aconteceu.

Lembro de nossas reuniões no pequeno teatro que inventamos no shopping center da rua Siqueira Campos, usando velhas cadeiras de um cinema que fechara. Vianinha, Armando, Thereza, João das Neves, Paulo Pontes, Denoy, Pinchín, todos nós entregues a uma tarefa que tanto tinha de generosidade quanto de risco, mas que era o sentido maior de nossa vida.

A certa altura, uma parte dos militantes antiditadura optou pela luta armada. Fomos contra, pois acreditávamos que era mudando a visão das pessoas que se consegue mudar a sociedade. Não pensávamos em dinheiro nem em tirar qualquer proveito de nossa luta pela instauração de um regime econômico sem desigualdade e exploração.

Apenas um sonho, que não se realizou, mas nossa generosidade era verdadeira, e ela só existe onde há utopia, a luta por um mundo melhor. É que, sem utopia, a vida não basta.