segunda-feira, 21 de janeiro de 2019

Opinião do dia: Luiz Sérgio Henriques*

"Uma esquerda tão desprovida, se não existisse, teria de ser inventada pela extrema direita que ora ensaia seus primeiros passos no governo do País. Deve-se constatar, de início, que a linguagem do poder, especialmente de vocação autoritária, nunca é muito original: também no universo da ultradireita temos de nos haver eternamente com inimigos internos e agentes de ideologias exóticas, como se homens e mulheres de esquerda não pudessem ser atores legítimos numa democracia digna do nome ou, ainda, como se fosse possível imaginar um Brasil sem Graciliano, Niemeyer, Portinari ou Gullar.

Mas não nos interessam tanto a cultura ou as infames “guerras culturais” que, envenenando generalizadamente o discurso público, poderiam justificar e até dar tons ainda mais obscuros ao proverbial pessimismo que orientou, ou desorientou, a obra de tantos pensadores que se debruçaram sobre a grande crise existencial moderna. Aqui não se trata de filosofia, mas da resposta dada por próceres do novo oficialismo à crise em curso da globalização – uma resposta mais vulgar, certamente, mas nem por isso menos capaz de incidir nos nossos destinos individuais. Curiosamente encontraremos pontos de contato significativos entre as posições extremadas, que, como sugere o senso comum, muitas vezes se tocam e vivem parasitariamente umas das outras"

*Tradutor e ensaísta, é um dos organizadores das ‘Obras’ de Gramsci no Brasil. Sobre vieses e viseiras, O Estado de S. Paulo, 20/1/2019

Marcus André Melo*: Bolsonaro em 3D

- Folha de S. Paulo

Resultado de focos de tensão definirá a natureza iliberal ou não do governo

Como pensar o governo Bolsonaro, que é liberal na economia, conservador nos costumes e ambivalente nas suas prática e retórica iliberais? Identifico focos de tensão cujo desenlace definirá a natureza iliberal ou não de seu governo. Retomo a questão após discutir essas três dimensões.

Os estudos empíricos de preferências do eleitorado passaram desde os anos 1980 a considerar duas dimensões —economia e comportamento.

Podemos, assim, identificar grupos do eleitorado que combinam, por exemplo, preferências pró-mercado com valores conservadores na dimensão do comportamento.

A onda populista recente, no entanto, trouxe à baila uma dimensão faltante: o posicionamento quanto ao “rule of law” (império da lei). Líderes populistas ascendem ao poder em eleições competitivas, mas aderem a uma pauta de pouco respeito à separação de poderes que combinam com uma retórica nacionalista e de intervencionismo governamental.

Retomando a questão do iliberalismo de Bolsonaro, o ponto a destacar é que a escolha de Sergio Moro representou aquilo que a literatura chama de “compromisso crível” —a promessa de que o governo não cruzará a linha demarcatória do iliberalismo.

A promessa é “crível” pelo custo político elevadíssimo de sua eventual saída, mas que pode acontecer numa sucessão de crises que afetem fortemente a popularidade presidencial. A primeira delas já se instalou.

O segundo foco de tensão diz respeito à economia na qual o anti-internacionalismo na política externa conflita com a agenda econômica doméstica, liberalizante e pró-mercado.

Celso Rocha de Barros*: Nova era para o baixo clero

- Folha de S. Paulo

A turma do PSL aderiu ao anticomunismo para ganhar dinheiro

Na semana passada, o senador Flávio Bolsonaro, filho menos maluco do presidente da República, entrou no STF (Supremo Tribunal Federal) para exigir foro privilegiado, interrupção das investigações do caso Queiroz e anulação das provas, bem como ativação da cláusula do acordo secreto com Netanyahu que prevê a reconstrução do Templo de Salomão e, consequentemente, a nova vinda de Jesus. Afinal, a essa altura, Flávio só se salva com milagre. Se Jesus não se prestar ao papel,talvez Renan resolva.

Com o passar da semana, a reputação de honestidade do governo Bolsonaro foi cada vez mais entrando em estado de “morreu ou foi para a Record?”.

Enquanto isso, o partido de Bolsonaro, o anticomunista PSL, resolveu aproveitar a boca livre oferecida pelo governo da China. Viajaram, comeram café da manhã de hotel bacana, devem ter descolado uns brindes, fizeram lá uma “farra dos guardanapos” do baixo clero.

A comitiva incluía o cara que rasgou a placa da Marielle no comício do governador Witzel. Vai lá, filho, vai para a praça da Paz Celestial e rasga a placa com o nome do premiê chinês. Vai lá, mostra contra o Exército Popular de Libertação a mesma macheza que mostrou contra militante pelos direitos dos favelados que já tinha sido assassinada. Cadê a marra, filho? Vai fugir chorando, filho, vai fugir ganindo?

Pessoalmente, acho que o Brasil tem que ter as melhores relações possíveis tanto com a China quanto com os Estados Unidos. Mas eu sou petralha, sou pago pelo George Soros, distribuo mamadeira com pênis na ponta, não fiz o curso do Olavo, só estou sendo consistente.

No fim das contas, os malandros do PSL ficaram impressionadíssimos com um recurso valioso a ser usado na luta contra a espionagem comunista, um programa de reconhecimento facial que diz para o governo comunista onde as pessoas estão.

Denis Lerrer Rosenfield*: Armas e direitos

- O Estado de S.Paulo

A ideia de que povo armado piora o índice de homicídios é falácia desarmamentista

Quem é contra o direito à legítima defesa? Não, certamente, a imensa maioria dos brasileiros que votaram no hoje presidente Jair Bolsonaro. Tiveram consciência da necessidade de resgate de um direito republicano que fora usurpado por sucessivos governos, com base em posições de esquerda e no politicamente correto. Saliente-se, aliás, que boa parte dos que são contra esse direito vive em condomínios com forte segurança e circula em carros blindados. É a elite, embora seu discurso seja supostamente antielitista!

O novo governo, em seu decreto, foi extremamente sensato, regrando objetivamente a posse de armas, deixando pouca margem para interpretações subjetivas ou politicamente corretas. Disciplinou a posse em domicílios e estabelecimentos comerciais de tal modo que cada pessoa possa ter quatro armas. Aliás, nem muito é, pois se uma família possuir duas ou três casas e igual número de negócios, sua cota já estará preenchida. Trata-se, diria, de um direito primeiro, o de a pessoa poder, em seus lugares próprios, usufruir sua vida, defendendo seu corpo, sua família e seu patrimônio.

Sem isso o cidadão fica claramente desprotegido, à mercê de qualquer ameaça. Quem se beneficia dessa situação são os bandidos, os criminosos, que podem invadir qualquer domicílio e estabelecimento sem medo algum. Meliantes têm “direito” à violência e à apropriação de corpos e bens alheios!

O Estatuto do Desarmamento cometeu a proeza de desarmar as pessoas de bem, deixando os criminosos à vontade, esses se armam a seu bel-prazer. Isso quando não são auxiliados por esses representantes do politicamente correto, que correm em seu apoio toda vez que são mortos, feridos ou presos. Quando um policial morre, silêncio absoluto; quando um criminoso sofre o mesmo destino, surge imediatamente uma imensa barulheira, como se seus supostos direitos não tivessem sido observados. É um mundo invertido!

José Goldemberg*: Aquecimento global e desinformação

- O Estado de S.Paulo

Questionar a realidade é obscurantismo, como o foi negar que a Terra gira em torno do Sol

Informação é um elemento essencial para a nossa sobrevivência e a tomada de decisões. É por isso que ninguém se lança de um edifício de dez andares, em lugar de descer as escadas, para ganhar tempo: jamais houve uma violação das leis da gravidade.

O mesmo acontece com tomadas de decisão. Se uma pessoa deseja viajar de avião para Nova York, ela se informa da hora da partida antes de ir ao aeroporto. Caso contrário, corre o risco de perder o voo.

Acontece muitas vezes que a informação não é completa. Nesse caso, o que funciona é saber a probabilidade de ocorrência do evento. Prever quando vai chover é um exemplo. Desde a mais remota Antiguidade a previsão do tempo foi essencial para saber quando plantar e quando colher, e erros graves nestas previsões – que eram frequentes – tiveram sérias consequências.

Nos dias de hoje, com o avanço da tecnologia, as previsões de tempo melhoraram muito e os meteorologistas já são capazes de nos dizer qual a probabilidade de chover amanhã ou no fim de semana, e acertar, na maioria das vezes.

O bom senso comum, que nessas áreas é aceito por todos, não existe, contudo, no tocante a outro problema de grande importância, que é o aquecimento do nosso planeta, que está em curso. A temperatura média já subiu mais de um grau centígrado desde 1800 e provavelmente vai subir mais dois graus até o fim do século 21.

Fernando Gabeira: Lições do terror

- O Globo

No fundo, a simples enumeração de ataques é, de forma involuntária, o jogo que interessa aos líderes de facções criminosas

Calor absurdo aqui no interior do Mato Grosso do Sul. Coisas do marxismo internacional. Acabo de ler o livro de Afonso Arinos, graças às longas viagens de avião: 1.780 páginas.

De tantos pedaços da história, discursos internacionais, personalidades, tenho espaço apenas para destacar uma frase da neta de Arinos. A mulher dele disse que ele andava triste. A menina resolveu consolá-lo:

— Vovô, não fique triste, o senhor tem sua casa, seus filhos, a sua bengala…

Livros como o de Arinos e Joaquim Nabuco me reconciliam com o Brasil. Fico orgulhoso de me dedicar ao estudo do país.

Em Fortaleza, vi um homem com um carrinho de pequenas frutas amarelas ao longe e disse: seriguelas. O homem se aproximou e, ao passar por nós, perguntei: que fruta é essa? Seriguelas, respondeu.

Fiquei feliz como um menino que passa na prova. Deveria ser um pouco mais sério porque estava cobrindo precisamente a onda de ataques no Ceará.

Acontece que estou reavaliando um pouco minha noção de jornalismo. Nossa tendência é dramatizar ataques, cortar as imagens de forma que o fogo e a destruição se destaquem.

Quando examino mais de perto, os ataques, na verdade, são feitos em lugares desertos e em altas horas da noite. Um exemplo disso foi a dinamite que apareceu no metrô. Não tinha detonante, seu objetivo era assustar.

Ana Maria Machado: Desconfianças

- O Globo

Poucos confiam tanto como nós em políticos corruptos e falsos. Ou em lideranças religiosas as mais variadas

Recente pesquisa internacional concluiu que somos um dos povos menos confiantes do mundo.

Desconfio que estão errados. Só se consideram quem não dá a menor confiança aos fatos. Mesmo evitando palavras como crédulo ou ingênuo, constato o oposto: nossa gente confia até demais. Pode desconfiar das instituições, mas confia em pessoas. E psicanalistas dizem que descrer do coletivo leva a buscar um salvador individual. Em manada, até gente inteligente dá fé a palavras ocas e versões suspeitíssimas. Longe dos fatos.

Poucos confiam tanto como nós em políticos corruptos e falsos. Ou em lideranças religiosas as mais variadas. Incontáveis igrejas proliferam, ancoradas na isenção tributária que lhes permite ganhar dinheiro de legiões de confiantes fiéis sem ter de pagar impostos. Inúmeras mulheres confiam em companheiros que passam a agressores quando elas decidem romper. E em espertalhões confiados que prometem juventude eterna e cirurgias plásticas mirabolantes. 

E há casos como Roger Abdelmassih, que traiu a confiança das clientes e foi condenado a 181 anos por estupros em série. Sem falar nas estarrecedoras revelações sobre o criminoso abuso de confiança por parte do médium João de Deus. Com direito a confiantes reações de quem quis culpar as vítimas. Centenas delas. Durante décadas. E o rebanho, ó, confiando...

Recentemente Verissimo escreveu sobre negadores da realidade e citou que a Paraíba, com o lema NEGO, é o único estado cuja bandeira tem algo escrito. Confiou demais na memória. Desconfio que se enganou. A bandeira do Espírito Santo, ainda que desafie a ministra Damaris, vestindo azul e rosa ao mesmo tempo, traz o dístico “Trabalha e confia.” Depende de em quem se confia enquanto se trabalha. Certas confianças podem ser arriscadas. De minha parte, desconfio de plebiscitos para decidir questões complexas. Vide Brexit ou posse de armas.

Fernando Pessoa alerta: “Ó sol que dás confiança só a quem já confia!” Mais vale desconfiar e abrir o olho.

Cacá Diegues: A cota das minorias

- O Globo

O cinema é a única cultura nacional que compete com o produto estrangeiro em pé de igualdade

O que está hoje em perigo em todo o mundo é o humanismo que iluminou o pensamento ocidental durante os últimos séculos. A ideia de que o ser humano é o centro do universo que interessa, o alvo de tudo que deve ser desenvolvido, protegido e preservado, começa a não encaixar mais em novas culturas políticas espalhadas por aí. Inclusive no Ocidente que o inventou desde a Antiguidade grega, e que depois o manteve subterrâneo até o Renascimento.

O apogeu histórico do humanismo se dá com o iluminismo, a ideia de que a razão pode tudo resolver. Foi graças a essa concepção do conhecimento como instrumento de nossa compreensão e atuação no mundo que construímos a civilização em que vivemos.

A partir do século XV, com a invenção da imprensa, uma nova tecnologia, parte da Europa se alfabetizou, e os monges copistas deixaram de ser os detentores únicos dos segredos do conhecimento. Grandes pensadores alteraram os padrões sociais e fizeram as culturas valorizarem o homem comum. Como a desgraça nunca desapareceu completamente do mundo real do presente, o ser humano teve que contar com o futuro para iluminar seu rumo. Os grandes humanismos, religiosos ou ateus, tiveram que inventar o paraíso celeste e a Parusia, a sociedade sem classes e a harmonia absoluta com a natureza, essas coisas que dão sentido à vida depois que ela acaba.

O humanismo inventou a democracia moderna. Os gregos já a haviam praticado, mas dela só se beneficiava a elite cidadã. O povo e os escravos não tinham direito a ela. Agora, no nascimento da democracia moderna, todos têm teoricamente direito a ela, aperfeiçoada de acordo com as tradições de cada lugar. Embora a democracia acabe sempre por servir às maiorias, nela o minoritário pode sempre sobreviver. John Stuart Mill, um inglês precursor de ideias que floresceram no século XIX, dizia que a democracia era a “tirania da maioria”.

Nessa segunda década do século XXI, outra nova tecnologia inventada pelo homem desbanca a imprensa e o audiovisual, as formas ilustres de conhecimento até seu surgimento. Com ela, os poderosos não precisam mais ser maioria para exercer sua tirania. Através dela, eles podem saber onde está cada um de nós, pensando o quê, e nos manipular na direção que julgarem mais conveniente. Se os cérebros de Adolf Hitler ou Joseph Stalin tivessem conhecido a ciência digital e a internet, o mundo hoje seria bastante diferente. Diferente para muito pior.

Leandro Colon: Aceno de Renan é sinal de perigo

- Folha de S. Paulo

Elogio de senador a Flávio Bolsonaro é mensagem de proteção a um governo enfraquecido

O presidente Jair Bolsonaro desembarca em terras suíças nesta segunda-feira (21) para o Fórum Econômico Mundial, em Davos, deixando por aqui uma crise com potencial para causar sérios danos em um governo que ainda engatinha.

Uma consequência do caso Queiroz é a dificuldade que Bolsonaro terá para faturar politicamente as eleições às presidências da Câmara e do Senado, no dia 1º de fevereiro.

Salvo imprevistos, tudo caminha, respectivamente, para as vitórias de Rodrigo Maia (DEM-RJ) e Renan Calheiros (MDB-AL) em cada Casa.

O PSL de Bolsonaro abraçou a candidatura de Maia ao perceber que, mesmo com a maior bancada eleita, não teria condições de levar adiante um candidato competitivo.

O provável sucesso de Maia não será uma vitória de Bolsonaro. O atual presidente da Câmara não é um candidato do governo. Pode até, por circunstâncias da eleição na Câmara, ter se aproximado do Planalto, mas deve manter a relação política ambígua adotada no período de Temer.

O maior perigo para Bolsonaro está no Senado. Na última sexta-feira (18), em entrevista à Folha, Renan Calheiros fez um aceno ao defender o senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), filho do presidente.

“Temos com relação a ele (Flávio) as melhores expectativas, de que é um moço que quer trabalhar, que quer fazer um bom mandato, que tem posições e defende-as”, disse.

Ricardo Noblat: Conta outra, Flávio!

- Blog do Noblat | Veja

Os rolos do senador

E o título de “Corretor do Ano” vai para… Flávio Bolsonaro, deputado estadual até outubro do ano passado quando se elegeu senador pelo Rio de Janeiro no rastro da eleição do seu pai para presidente da República.

Nas entrevistas à TV Record e à Rede TV, ontem à noite, ele contou que o título de R$ 1 milhão que pagou à Caixa em 2017 se refere à compra de um imóvel na planta da construtora PDG no valor total de R$ 1.700 mil.

O imóvel então passou a ser financiado pelo banco, do qual ele se tornou credor. Mas como a entrega do imóvel atrasou, ele o vendeu pouco tempo depois pelo valor de R$ 2,4 milhões.

Quer dizer: no período de um ano se tanto, com o mercado imobiliário em baixa por conta da crise econômica que ainda se arrasta, Flávio lucrou no negócio cerca de 40%. É de deixar os demais corretores de queixo caído.

Quanto aos 48 depósitos de R$ 2 mil feitos em espécie em sua conta entre junho e julho de 2017 em um caixa eletrônico da Assembleia Legislativa do Rio, Flávio explicou que se tratava de dinheiro dele mesmo.

Justificou que além de político ele é também empresário, e pelo visto muito bem-sucedido. Assim como Fabrício Queiroz, seu ex-assessor, comprava e vendia carros usados, Flávio comprava, vendia e trocava imóveis.

Segundo a Folha de S. Paulo, Flavio comprou entre 2014 e 2017 pelo menos dois apartamentos em bairros nobres do Rio, ao custo informado de R$ 4,2 milhões. O período coincide com depósitos suspeitos em sua conta.

Em parte das transações, registra o jornal, o valor declarado pelos compradores e vendedores é menor do que aquele usado pela prefeitura para cobrança de impostos.

Renan mata no peito

É dando que se recebe

O senador Renan Calheiros (PMDB-AL) está pronto para matar no peito qualquer pedido de CPI para investigar os negócios de Flavio Bolsonaro e de Fabricio Queiroz que venha a ser apresentado pelos partidos de oposição.

Naturalmente, desde que o governo não crie problemas para que ele se eleja presidente do Senado pela quinta vez (ou será a sexta?).

A disposição de Renan já chegou aos ouvidos do presidente Jair Bolsonaro, e muito o agradou.

Vinicius Mota: Presente do capeta

- Folha de S. Paulo

Custa crer que os britânicos tenham se metido em tamanha enrascada conscientemente

Nunca foi fácil ser o demônio —embora a coisa talvez venha ficando ainda mais dificultosa com a proliferação contemporânea de especialistas em expulsá-lo do corpo.

Veja a dedicação de Mefistófeles no cultivo da alma danada de Fausto. Por décadas atendeu a todos os caprichos do homem com a paciente expectativa de obter seu justo prêmio após a morte do doutor. Tomou um drible celestial na hora agá, uma quebra de contrato de dar pena.

Mas o capeta é o capeta não porque seja ruim ou porque seja velho. Ele é como o coiote do papa-léguas: jamais desiste. Em junho de 2016, meteu os britânicos numa arapuca da qual não conseguem escapar.

Foi o diabo. Apenas ele seria capaz de um ardil tão... diabólico.

O embuste veio embalado em papel nobre, a vontade popular. Perguntou-se à população se queria o Reino Unido fora da União Europeia, e uma pequena maioria disse sim.

Coube ao Parlamento, cuja maioria se opunha ao desembarque, desembrulhar o pacote-surpresa. Caiu o premiê que, decerto sob influência satânica, tinha parido o referendo. Assumiu a ex-ministra do Interior.

Um ano depois tentou-se, com uma eleição geral, sintonizar a vontade de cidadãos e representantes.

Cida Damasco: Depois de Davos, a realidade

- O Estado de S. Paulo

Começa o jogo na economia, mas caso Queiroz pode criar obstáculos no Congresso

O presidente Jair Bolsonaro e o ministro Paulo Guedes desembarcam em Davos nesta semana em busca do aval da elite financeira internacional, reunida no Fórum Econômico Mundial. Ele repete o roteiro dos seus antecessores Lula, Dilma Rousseff e Michel Temer, que também participaram do encontro com o objetivo central de desfazer o clima de desconfiança criado com a chegada deles ao Planalto – ainda que por motivos diferentes.

Lula e Dilma tentavam provar que um governo de esquerda não faria loucuras na economia e conseguiria conciliar responsabilidade com prioridades sociais. Temer procurava se livrar do rótulo de golpista colado em sua imagem pelos militantes anti-impeachment. No caso de Bolsonaro e sua tropa, todo empenho será dirigido a convencer os investidores de que o presidente converteu-se de fato ao ideário liberal de Guedes e vai segui-lo à risca para corrigir os graves desajustes da economia brasileira.

Seu discurso como representante da América Latina vai repisar temas caros aos liberais, como reformas e abertura comercial, além do combate à corrupção – justamente num momento em que o clima de descontentamento global dá voz a teses nacionalistas e populistas, impondo mudanças às entidades internacionais para manter as bases da globalização, como relata o repórter Jamil Chade.

Bolsonaro aproveitará o evento para dar seu recado não só para o público externo, como também para o interno, que já demonstra uma certa inquietação, especialmente em relação à Previdência. A proposta para a reforma, discutida nos últimos dias em Brasília, deve estar no centro das conversas em Davos e aportará no Congresso no começo de fevereiro, depois da posse dos novos parlamentares e da definição dos comandos das duas casas.

Bruno Carazza*: Davos: Passagem de Ida e Volta

-Valor Econômico

O Brasil despencou no ranking do Fórum Econômico Mundial

Ao longo desta semana, as atenções estarão voltadas para a visita de Jair Bolsonaro a Davos, no encontro anual do Fórum Econômico Mundial. Será o batismo internacional do novo presidente brasileiro, diante de uma plateia de chefes de Estado e representantes de mais de 100 países, além de CEOs das mil maiores companhias globais.

O Brasil é uma das maiores economias do mundo e tem um papel de relevo na geopolítica latino-americana, além de protagonismo no G-20 e entre os BRICS. Durante a campanha, contudo, Bolsonaro embarcou na onda populista, conservadora e nacionalista que varre a Europa e os EUA. Será, portanto, interessante observar como Bolsonaro traduzirá esse discurso para a elite econômica mundial, reunida num encontro que tem, como um de seus princípios, "aprimorar o diálogo entre governos, empresas e sociedade civil em prol do crescimento global inclusivo e sustentável". Aliás, o tema deste ano é "Globalização 4.0 - Adaptando a Arquitetura Global na Era da 4ª Revolução Industrial".

Por mais paradoxal que seja, no entanto, o maior desafio da ida de Bolsonaro a Davos será convencer o mundo sobre o que ele fará na sua volta ao Brasil. Afinal, segundo a métrica do próprio Fórum Econômico Mundial, a situação brasileira se deteriora rapidamente frente a seus parceiros e concorrentes internacionais.

De acordo com o Índice Global de Competitividade, indicador construído pelo instituto que organiza o encontro de Davos com base em estatísticas oficiais e em entrevistas com os mais poderosos CEOs do mundo, o Brasil despencou da 48ª posição em 2013 - seu melhor desempenho - para o 80º lugar em 2018 (ver gráfico). Em apenas cinco anos, fomos ultrapassados por 32 países, incluindo, sem demérito, o Tajiquistão e a Albânia.

Luiz Carlos Mendonça de Barros*: Primeiros movimentos do governo

- Valor Econômico

Redução do banco público trará uma concentração ainda maior do oligopólio formado por Bradesco, Itaú e Santander

Na última coluna do ano passado procurei mostrar ao leitor do Valor minhas razões para ser otimista com a economia brasileira em 2019. A posição favorável do ciclo econômico de curto prazo, com um elevado hiato na economia - principalmente no setor industrial e no mercado de trabalho - inflação estruturalmente baixa e conta corrente externa extremamente favorável suportam esta minha posição.

Outra questão levantada por mim foi a qualidade e homogeneidade da equipe econômica do presidente Bolsonaro, comandada por um ministro de muito boa formação técnica e grande experiência na economia brasileira das últimas décadas. Substituem eles um outro grupo de profissionais que mostrou ao longo dos últimos anos um entendimento superficial, errado e perigoso sobre o funcionamento de uma economia de mercado como a nossa. A posição do governo do PT de não reconhecer a importância de reformas estruturais - e mesmo de negar sua necessidade - jogou a sociedade brasileira em uma crise fiscal de grande proporção e que, se não revertida rapidamente, nos arrastará a uma crise institucional gravíssima.

O governo Bolsonaro assume o comando da nação com um forte compromisso com as reformas estruturais, principalmente no campo fiscal, que precisam ser aprovadas com rapidez no Congresso. Na maior parte delas o governo já tem à sua disposição várias alternativas técnicas, desenvolvidas por especialistas e pesquisadores ao longo dos últimos anos. Precisa agora de uma avaliação política eficiente para definir seu desenho final em função do apoio possível no Congresso.

Outro compromisso importante assumido pela equipe econômica do presidente Bolsonaro foi a busca de uma abrangente e radical reforma do chamado Ambiente de Negócios. Neste universo de leis e regulamentações estão estabelecidas as características principais de nossa economia de mercado, ou seja, a essência da natureza do capitalismo brasileiro. O governo Bolsonaro tem uma posição crítica muito radical sobre o nosso ambiente de negócios e propõem realizar uma verdadeira revolução depois de "um longo período de social democracia econômica" em nossa sociedade. Esta busca por um capitalismo mais eficiente me parece ser uma meta muito ambiciosa e de grandes dificuldades de ser atingida ao longo de seu mandato.

A mais importante delas deriva do fato de que o ambiente de negócios de hoje é o resultado de 30 anos de uma experiência democrática com forte participação da sociedade. O desenho final que temos hoje foi fruto da interação entre problemas criados por uma Constituição utópica e a realidade social e política que sempre acaba se impondo em uma democracia. Não creio que na avaliação crítica deste período, feita pela nova equipe econômica, estes fenômenos tenham sido devidamente considerados. Por isto, as dificuldades para se chegar ao modelo ideal, que certamente está na cabeça da equipe econômica, serão muito maiores do que os previstos.

Angela Bittencourt: Reformar a Previdência é conquistar confiança

- Valor Econômico

"Reforma levará à consolidação fiscal e expansão", diz Velho

O presidente Jair Bolsonaro chegou ao Palácio do Planalto com a missão de promover equilíbrio fiscal e crescimento. Porém, neste momento não há assunto mais popular, entre aficionados por política e economia, do que a reforma da Previdência. E, nada mais justo, quando as perspectivas de crescimento sustentado tropeçam em gastos do governo com aposentados e pensionistas. Previdência também estará no foco da elite financista reunida no Fórum Econômico Mundial, em Davos, Suíça, que, nesta terça, acompanhará o primeiro discurso do presidente do Brasil e do seu ministro da Economia, Paulo Guedes, à comunidade internacional.

Poderá ofuscar a estreia do novo governo a tensão que paira no entorno do senador Flávio Bolsonaro, filho do presidente. Na sexta, o Jornal Nacional, da TV Globo, revelou que o Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) cita, em relatório, que em um mês, Flávio teria recebido quase 50 depósitos em dinheiro, em sua conta. Na quinta, o filho do presidente catalisou todas as atenções ao pedir à Suprema Corte a suspensão temporária de investigação sobre Fabrício Queiroz, seu ex-assessor, investigado por movimentações bancárias suspeitas.

Em entrevista à coluna, o economista João Luiz Mascolo, professor dos cursos de graduação e pós-graduação em Economia do Insper e sócio da SM Managed Futures afirma que a reforma da Previdência é um fim em si mesma, mas vai além dos velhinhos. "Do ponto de vista macroeconômico, essa reforma é um meio. O papel da Previdência nas contas públicas é fundamental. Se a expansão dessa despesa, a maior de todas, não for contida, em algum momento não muito distante o investidor terá a percepção de que haverá um calote na dívida pública ou uma espiral inflacionária", afirma

Em 3 anos, Flávio Bolsonaro comprou R$ 4,2 mil em imóveis

Filho de Bolsonaro comprou R$ 4,2 mi em imóveis em 3 anos

Período das aquisições coincide com o da movimentação atípica identificada pelo Coaf

Ranier Bragon , Camila Mattoso , Italo Nogueira e Ana Luiza Albuquerque | Folha de S. Paulo

BRASÍLIA E RIO DE JANEIRO - Documentos obtidos em cartórios mostram que o então deputado estadual e hoje senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) registrou de 2014 a 2017 a aquisição de dois apartamentos em bairros nobres do Rio de Janeiro, ao custo informado de R$ 4,2 milhões.

Em parte das transações, o valor declarado pelos compradores e vendedores é menor do que aquele usado pela prefeitura para cobrança de impostos.

O período da aquisição dos imóveis pelo filho de Jair Bolsonaro é o mesmo em que o Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) teria detectado movimentação de R$ 7 milhões nas contas de Fabrício Queiroz, ex-assessor de Flávio, segundo reportagem do jornal O Globo publicada neste domingo (20).

O ex-motorista é investigado sob suspeita de ser o pivô de um esquema ilegal de arrecadação de parte dos salários de servidores do gabinete, prática conhecida como rachadinha.

Flávio começou na vida pública em 2002, tendo como único bem na época um Gol 1.0, segundo sua declaração de bens.

Em outro relatório, divulgado pelo Jornal Nacional, da TV Globo, sobre movimentações atípicas na conta do filho do presidente, o Coaf identificou um pagamento de R$ 1.016.839 de um título bancário da Caixa —o órgão não teria conseguido identificar a data exata e o beneficiário.

De acordo com os documentos obtidos em cartórios, Flávio registrou em junho de 2017 a quitação de uma dívida com a Caixa no valor aproximado de R$ 1 milhão para aquisição de um dos apartamentos que comprou, no bairro das Laranjeiras. Segundo dados de uma das escrituras, o débito foi pago em 29 de junho daquele ano.

Segundo informações cartoriais, Flávio comprou o imóvel na planta, por valor declarado de R$ 1,753 milhão.

Ele se desfez do bem em 2017, quando fez uma permuta, recebendo em troca uma sala comercial na Barra da Tijuca e um apartamento em na Urca, além de R$ 600 mil em dinheiro —sendo R$ 50 mil em cheque e R$ 550 mil sem descrição da forma de pagamento— para completar o negócio. Na escritura, o imóvel dado por ele tinha passado a valer R$ 2,4 milhões.

O novo bem, na Urca, teve valor registrado de R$ 1,5 milhão --vendido depois, em maio de 2018.

Em entrevista na noite de domingo ao programa Domingo Espetacular, da TV Record, Flávio afirmou que o pagamento do título bancário se refere à negociação imobiliária. Ele levou papéis, mas não quis mostrá-los, afirmando que a imprensa não é o foro adequado para esse tipo de esclarecimento.

Revelações do caso Queiroz elevam tensão no Planalto

Auxiliares temem que não seja possível isolar o presidente das suspeitas sobre Flávio Bolsonaro, que diz que dinheiro era de negociação de imóvel

As revelações da coluna de Lauro Jardim e da TV Globo de que o Coaf registra movimentação financeira suspeita nas contas do senador eleito Flávio Bolsonaro (PSLRJ) e de seu ex-assessor na Alerj Fabrício Queiroz elevaram a tensão no Palácio do Planalto. Auxiliares passaram a temer que não seja possível isolar o presidente das denúncias envolvendo seu filho mais velho. Em entrevista à TV Record ontem, Flávio alegou que os R$ 96 mil depositados em espécie em sua conta em 2017 eram parte do pagamento da venda de um apartamento. E disse que o título da Caixa no valor de R$ 1 milhão era referente à quitação da compra do mesmo imóvel. “Não tem sacanagem comigo”, afirmou. Ele se queixou de suposta quebra de sigilo bancário, mas o entendimento do STF é que o Coaf pode passar informações para o Ministério Público sem ordem judicial.

Agravamento do caso Queiroz preocupa Planalto

Jussara Soares, Vinícius Sassine e Daniel Gullino | O Globo

BRASÍLIA – A informação de que Fabrício Queiroz, ex-assessor do deputado estadual e senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), movimentou R$ 7 milhões entre 2014 e 2017, revelada neste domingo pelo colunista Lauro Jardim, ampliou o temor, no Palácio do Planalto, de que o governo não consiga se blindar da repercussão negativa do caso. Auxiliares do presidente Jair Bolsonaro afirmaram ontem que foram pegos de surpresa e dizem que a extensão do problema ainda é desconhecida.

Oficialmente, todo o primeiro escalão mantém o discurso de que se trata de uma questão particular de Flávio. Entretanto, reservadamente, admitem que o caso abala os primeiros dias de governo. O presidente fazes ta semana sua primeira viagem internacional para participar do Fórum Econômico Mundial de Davos, na Suíça, onde pretende fazer um discurso para se firmar como líder da América Latina. O receio, contudo, é que essa pauta fique em segundo plano diante das novas revelações envolvendo o ex-asses sordes eu filho. Diante da crise, não há previsão que Bolsonaro conceda entrevista coletiva durante a viagem. O presidente optou pela leitura de um comunicado à imprensa.

A movimentação financeira nas contas de Queiroz consta dos arquivos do Conselho de Controle de Atividades Financeiras(Coaf ). Ele trabalhou no gabinete de Flávio na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) até 15 de outubro de 2018. Em dezembro passado, foi revelado que, entre janeiro de 2016 e janeiro de 2017, ele movimentou R$ 1,2 milhão. O Coaf registrou que, nos dois anos anteriores, passaram por sua conta R$ 5,8 milhões, totalizando R$ 7 milhões em três anos. Até hoje Queiroz não apresentou explicação ao Ministério Público.

Entre os incomodados com o agravamento da crise está o núcleo militar mais próximo do presidente. A expectativa durante o dia de ontem era por uma explicação convincente por parte de Flávio.

Volta do Congresso avaliará a estratégia do presidente: Editorial |Valor Econômico

Há muito tempo um governo não é montado sem que os cargos públicos, do alto escalão, sejam objeto de loteamento entre os partidos políticos que dão sustentação ao presidente da República eleito. O presidente Jair Bolsonaro decidiu seguir este caminho e preencheu o seu ministério sem indicações partidárias, dando inteira liberdade para que os titulares das pastas escolhessem os seus assessores. É provável que a maioria da população brasileira nunca tenha visto isso acontecer.

A negociação de cargos com os partidos da chamada base governista sempre foi apresentada como indispensável para garantir a governabilidade, principalmente em um regime presidencialista de coalisão, marcado por uma fragmentação partidária crescente. As diretorias das grandes estatais e dos bancos públicos eram disputadas pelos políticos de forma aguerrida, como se tudo isso fosse muito natural.

O máximo que o presidente conseguia, às vezes por exigência de seus ministros da Fazenda, era não permitir indicações políticas para as presidências das instituições financeiras federais, com o objetivo de preservar a execução da própria política econômica.

Soube-se recentemente, graças à Operação Lava-Jato, que a disputa de diretorias de estatais e de cargos importantes na administração pública estava relacionada com a perspectiva de arrecadar dinheiro, não apenas para o financiamento ilegal de partidos, mas também para o enriquecimento ilícito de agentes políticos. Bolsonaro se propôs a mudar isso.

O preço da confissão: Editorial | Folha de S. Paulo

Governo propõe modelo americano de acordos penais, mas iniciativa é temerária

Anunciado pelo novo governo como uma de suas prioridades neste ano, um pacote de medidas para aumentar o poder de fogo das autoridades no combate ao crime deverá ser submetido em breve à apreciação do Congresso Nacional.

O ministro da Justiça, Sergio Moro, indicou que a iniciativa incluirá propostas para agravar penas, acelerar o andamento de processos e endurecer o tratamento dispensado a organizações criminosas.

Entre as sugestões está a adoção de um novo tipo de acordo para resolver casos criminais, inspirado nos Estados Unidos. Conhecido como “plea bargain”, esse mecanismo permite oferecer penas reduzidas a réus que assumirem a culpa e desistirem de se defender.

Estima-se que, nos EUA, 9 de cada 10 casos sejam encerrados com negociações desse gênero. No modelo americano, é possível obter benefícios mesmo sem confissão, simplesmente renunciando ao direito de contestar as acusações.

Para Moro e os defensores da ideia, esses acordos ajudariam a descongestionar o sistema judicial, oferecendo solução rápida para delitos comuns e liberando promotores e juízes para que se dediquem a casos mais complexos.

Réus confessos, por sua vez, teriam a vantagem de reduzir penas e evitar custos e outros constrangimentos suportados por todos que enfrentam longos julgamentos.

É fundamental controlar fundos de pensão estatais: Editorial | O Globo

Há chance de tornar mais rígidas as regras do setor. E de enquadrar fundações estaduais e municipais

Michel Temer deixou ao sucessor Jair Bolsonaro uma base normativa razoável para ajuste dos fundos de pensão patrocinados por companhias públicas. É necessário, agora, aperfeiçoar as regras no circuito das empresas federais e criar a oportunidade de enquadrar aqueles vinculados aos estados e municípios.

O país já desperdiçou tempo e dinheiro demais na tentativa de garantir o equilíbrio na administração desses fundos. A sociedade acaba pagando duas vezes, porque as patrocinadoras são públicas. E paga-se sempre pelos mesmos erros, em benefício de uma associação de interesses de grupos políticos, burocráticos e empresariais beneficiários.

Não raro, o condimento é a corrupção. Exemplar é o caso da Sete Brasil, empresa criada nos governos Lula e Dilma para coordenar um programa megalomaníaco, sem paralelo no planeta, de construção de 40 sondas para campos de petróleo no pré-sal, financiado, em parte, por fundos de pensão de empresas estatais.

O PT, como já confessou à Justiça Antonio Palocci, ex-ministro de Lula e Dilma, viu no pré-sal “a real possibilidade de eleger seu programa quatro ou cinco vezes”. Criou-se então a Sete Brasil, um projeto que abrigava “todo ilícito possível”, segundo ele, com o dinheiro dos fundos previdenciários.

Quando se dissolveu o governo Dilma Rousseff, em 2016, apurou-se nas fundações federais de previdência um desajuste superior a meia centena de bilhões de reais, uma parcela decorrente do fiasco do projeto das sondas.

O primeiro da fila: Editorial | O Estado de S. Paulo

O pedido de socorro financeiro feito pelo governo do Estado de Goiás para colocar em dia os salários dos funcionários e enfrentar o rombo de R$ 6 bilhões previsto para este ano é apenas o primeiro que o governo do presidente Jair Bolsonaro terá de examinar com alguma urgência. Seis outros governos estaduais sem condições de honrar seus compromissos já decretaram estado de calamidade financeira.

Caso cumpra as exigências para a adesão ao programa federal de ajuda aos Estados, o governo goiano conseguirá um alívio financeiro imediato, mas terá de se comprometer a adotar medidas rigorosas para ajustar suas contas. Ao governo federal ficarão ônus, como o adiamento da entrada de recursos referentes ao pagamento da dívida com a União, que agravarão uma crise fiscal cujo enfrentamento exige decisões urgentes, como a apresentação de seus projetos de reformas estruturais, a começar pela da Previdência.

Mas as dificuldades do governo federal continuarão a aumentar, pois outros governos estaduais em dificuldades financeiras já pediram ou acabarão pedindo o socorro da União, que se transformou numa espécie de recurso de última instância para os Estados quebrados.

O governo de Goiás, no início da gestão anterior, encerrada em 31 de dezembro, conseguiu ajustar suas finanças por meio de um severo programa de controle e restrição de despesas. Mas, como demonstra o pedido de socorro feito pela gestão que assumiu no dia 1.º de janeiro, o ajuste feito no início foi destruído no fim do governo anterior, decerto por motivos eleiçoeiros. “Sem a ajuda federal, a dor é muito maior”, disse ao Estado a atual secretária da Fazenda de Goiás, Cristiane Alkmin.

Ivanir dos Santos*: O Leviatã contemporâneo

- O Dia

“ ...precisamos promover a tolerância cotidianamente e não apenas no doa 21 de janeiro.”

A intolerância religiosa não é um fenômeno social e religioso que acontece exclusivamente no Brasil. Um breve panorama histórico sobre a História Mundial nos permite enxergar que a intolerância ainda é um dos maiores desafios para a construção da coexistência pacífica em várias partes do mundo.

Se fossemos fazer a alusão da intolerância a uma representação, talvez a melhor seria a do imenso e destruidor monstro marinho Leviatã, com os seu imensos tentáculos.

Leviatã é descrito em várias mitologias como o monstro destruidor, que ataca ferozmente suas vítimas com os seus imensos oito tentáculos. Na contemporaneidade, o nosso Leviatã, forjado durante séculos e séculos, se chama intolerância e, diferente das mitologias, cada tentáculo tem um nome.

Vejamos quais são: racismo, misoginia, homofobia, transfobia, xenofobia, machismo, desigualdade desrespeito. Juntos, esses tentáculos permeiam nossas relações sociais, políticas e religiosas deixando seus rastros de destruições por onde quer que passem.

E de dentro do nosso Leviatã contemporâneo, entre as intolerâncias, salta a intolerância religiosa, que vem ceifando vidas, deixando vítimas e provocando danos patrimoniais e religiosos.

Marisa Monte: Dança da Solidão

Ferreira Gullar: Não há vagas

O preço do feijão
não cabe no poema. O preço
do arroz
não cabe no poema.
Não cabem no poema o gás
a luz o telefone
a sonegação
do leite
da carne
do açúcar
do pão
O funcionário público
não cabe no poema
com seu salário de fome
sua vida fechada
em arquivos.
Como não cabe no poema
o operário
que esmerila seu dia de aço
e carvão
nas oficinas escuras
– porque o poema, senhores,
está fechado:
“não há vagas”
Só cabe no poema
o homem sem estômago
a mulher de nuvens
a fruta sem preço
O poema, senhores,
não fede
nem cheira.