sexta-feira, 22 de abril de 2016

Opinião do dia – Roberto Freire

Os mais de 70% de deputados que votaram pelo impeachment na Câmara e os muitos milhões de brasileiros que tomaram as ruas em todo o país já deram o seu recado: é preciso encerrar o governo que aí está, autor de uma série de crimes de responsabilidade, e escrever um novo capítulo de nossa história. Em nome da esperança, do destino das novas gerações, da democracia e da Constituição, chegou a hora de o Brasil se livrar daqueles que se locupletaram do Estado e o tomaram de assalto em prol de um mero projeto de poder. Precisamos virar essa página e não devemos ter medo do futuro, que pede passagem.

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Roberto Freire é deputado federal por São Paulo e presidente nacional do PPS. ‘O futuro pede passagem’. Diário do Poder, 21/4/2016

Discurso de golpe prejudica imagem do País, diz Temer

Para Temer, chamar impeachment de golpe prejudica o Brasil

• Vice-presidente disse estar pronto para assumir o governo caso o impeachment vença também no Senado

- O Estado de S. Paulo

O presidente em exercício do Brasil, Michel Temer (PMDB-SP), criticou a caracterização do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff como um golpe. À agência de notícias Dow Jones, ele declarou que está pronto para assumir o governo caso o impeachment vença também no Senado. O peemedebista afirmou também que tem "na cabeça" nomes para seu eventual gabinete.

Temer, que assumiu como presidente em exercício durante a viagem de Dilma a Nova York, nesta quinta-feira, 21, afirmou que os procedimentos do impeachment estão em linha com a Constituição do Brasil e que falar sobre golpe de Estado prejudica a imagem do País no exterior.

"Vou retornar ao meu posto assim que ela voltar", disse durante a entrevista. O retorno de Dilma está previsto para domingo, 24. "Cada passo do impeachment está de acordo com a Constituição", acrescentou. "Como isso poderia ser chamado de golpe?"

A agência destaca que as falas de Temer vêm em um momento histórico de "profunda crise", com recessão econômica e tensão política. Um porta-voz do Planalto disse que o governo não iria comentar as declarações de Temer.

'Apoio do PSDB está definido', afirma Jucá

'Apoio parlamentar do PSDB a Temer está definido', diz Jucá

• Para presidente do PMDB, Temer começará governo com base de 367 deputados federais

Pedro Venceslau - O Estado de S. Paulo

FOZ DO IGUAÇU - O senador Romero Jucá (RR), presidente nacional do PMDB, minimizou nessa quinta-feira, em um evento com empresários em Foz do Iguaçu organizado pelo empresário tucano João Doria, a resistência do PSDB em integrar o ministério de um eventual governo Michel Temer. "O fundamental é ter o PSDB na base parlamentar, e isso está definido".

A avaliação dele é que, se a presidente Dilma Rousseff for afastada do cargo, o próximo governo contará com uma base parlamentar de 367 deputados federais. Ou seja: o mesmo número de deputados que apoiaram o impedimento na Câmara.

Maior partido de oposição, o PSDB tende a manter distância institucional da gestão Temer. Por isso o dirigente do PMDB faz as contas contando com o apoio em peso dos tucanos nas votações mais importantes. "A base começa a se desenhar com 367, que é mais que os 302 necessários para aprovar uma PEC (Proposta de Emenda Constitucional)", diz Jucá.

O senador também falou sobre a ação do PSDB que tramita no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e pede a cassação da chapa Dilma-Temer. "Se houver a cassação de Dilma, haverá perda de objeto da ação cirminosa que a questão do PT. O vice presidente não pode ser penalizado por causa disso".

O dirigente peemedebista fez críticas ao PT. "O PT tem que sair do poder e se reciclar para depois se credenciar e disputar novamente". O aguardado discurso de Dilma Rousseff na ONU também foi tema da conversa dele com os jornalistas em Foz do Iguaçu.

"O apoio que o governo tem em nível internacional é a Venezuela com o Maduro, a Bolívia com o Evo, o Equador com o Rafael Correa e na Argentina a ex-presidente Cristina Kirchner. Espero que Dilma no avião possa rever essa posição. Seria muito triste esse vexame externo".

O Fórum Empresarial, que é realizado há 16 anos em Comandatuba, dessa vez foi em Foz do Iguaçu e reuniu apenas políticos de oposição. Estão presentes os governadores tucanos Beto Richa (PR) e Pedro Taques (MT), os senadores José Agripino (RN), presidente do DEM, Antonio Anastasia (PSDB-MG), e os principais líderes oposicionistas na Câmara.

Durante o evento, Taques e Richa deram declarações contrárias a participação do PSDB em um eventual ministério de Temer.

Temer reage a Dilma e nega acusações de golpe

• Antes de assumir a Presidência, vice critica declarações do governo

Poucas horas antes de assumir interinamente a Presidência, o vice Michel Temer lançou mão de ofensiva internacional para se contrapor ao discurso da presidente Dilma Rousseff, que vem associando o processo de impeachment a um golpe. Em entrevista ao “The Wall Street Journal”, Temer disse que a associação é ruim para o Brasil. Dilma chegou ontem a Nova York, onde deverá repetir o discurso.

Vice contra-ataca

• Temer tenta neutralizar acusações de Dilma a golpe; manifestantes protestam contra ele em SP

Lauro Neto - O Globo

-SÃO PAULO- Em uma entrevista de 24 minutos concedida na manhã de ontem ao jornal “The Wall Street Journal”, o vice-presidente Michel Temer criticou a associação do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff a um golpe de Estado e demonstrou incômodo com a acusação de ser traidor. A entrevista a veículos estrangeiros é parte da estratégia de comunicação para uma contraofensiva ao discurso de golpe adotado pela presidente e pelo PT. Aliados do peemedebista têm demonstrado grande preocupação com a fala de Dilma na ONU, marcada para hoje, e com a possibilidade de que ela faça circular entre chefes de Estado a ideia de que é vítima de um processo forjado de impedimento. Há evidências de que, principalmente no exterior, essa versão tem ganhado adesões. Temer assumiu ontem interinamente a Presidência pela primeira vez desde que foi aprovado, na Câmara, o prosseguimento do processo de impeachment de Dilma.

— Ela diz que sou o chefe do golpe, o que obviamente é uma perturbação para mim e para a Vice-Presidência da República — disse Temer ao “Wall Street Journal”, completando: — Cada passo do processo de impeachment está de acordo com a Constituição. Como isso pode ser um golpe?

Além de criticar o tratamento que os petistas têm dado ao processo de impeachment, o vice disse ao jornal que estará pronto para assumir o governo caso o afastamento de Dilma seja aprovado e que, “quando for a hora, terá nomes na cabeça para compor um Ministério”. Ele confirmou que tem conversado com possíveis nomes aos cargos para compor um governo de coalizão, mas que isso não significa qualquer disposição de atropelar o rito processual do impeachment.

— Eu vou retornar ao meu posto (de vice-presidente) assim que ela voltar — ressaltou Temer.

Na manhã de ontem, cerca de cem manifestantes do Levante Popular da Juventude, que não é ligado ao PT, fizeram um protesto em frente à casa de Temer em São Paulo. No ato, conhecido como escracho e normalmente feito contra torturadores de regimes militares na América Latina, os militantes de esquerda bradaram que o vice é golpista e pintaram com tinta branca a frase “QG do golpe” no chão da rua. A manifestação de 30 minutos fez com que Temer cancelasse os planos de passar o feriado e o fim de semana na capital paulista com a mulher, Marcela, e o filho Michelzinho, e seguisse para Brasília. No Palácio Jaburu, continuará as articulações políticas e comandará o país até o retorno de Dilma.

Por orientação de sua segurança e alegando temer incomodar os vizinhos do bairro nobre Alto de Pinheiros (Zona Oeste de São Paulo) com a movimentação de manifestantes em frente à sua casa, Temer embarcou para Brasília por volta das 16h de ontem. Durante o protesto, além de pintar o chão, os manifestantes estenderam uma faixa com a inscrição “Temer Golpista”, distribuíram cópias de notas de US$ 100 com o rosto do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e espalharam no chão réplicas da capa da Constituição. Foram colados ainda cartazes nas lixeiras com a foto do vice e a frase “Temer Golpista”. Mais de dez seguranças acompanharam a manifestação, que transcorreu sem incidentes.

Medo de criar imagem de traidor
Para fortalecer o discurso externo, peemedebistas recrutaram a ajuda do ex-ministro da Comunicação de Dilma Thomas Traumann, que tem bom trânsito com a imprensa internacional. Internamente, correligionários procuram minimizar o impacto desse tipo de protesto. O presidente da Fundação Ulysses Guimarães, Moreira Franco, que esteve na casa de Temer na manhã de ontem, negou que a ida do presidente interino para Brasília tenha sido motivada pelo protesto.

— (A viagem de Temer para Brasília) Não atrapalha a articulação política. Pelo contrário, facilita — disse rapidamente na saída da casa de Temer, minimizando os efeitos da mudança de planos. A presença do vice em São Paulo era considerada estratégica para a composição da equipe econômica e a definição das políticas que devem ser adotadas. Essa é a prioridade dos aliados, já que contam com relativa folga de votos para o pleito no Senado que definirá o afastamento da presidente.

O vice foi poupado de ver a pichação “QG do Golpe” em frente à sua casa. Antes que partisse para o aeroporto, a empresa de limpeza Inova apagou a inscrição feita na rua com um jato d’água lançado de caminhão-pipa. A empresa presta serviços à prefeitura de São Paulo, que nega ter dado a ordem para a remoção da tinta. De acordo com a gestão municipal, a própria Polícia Militar, que reforçou a segurança da área, acionou a empresa. A velocidade da limpeza causou estranheza em moradores da região.

— Nunca vi lavarem essa rua com tanta rapidez. E olha que estamos em plena crise hídrica — afirmou a aposentada Urania Kipriadis.

No início da noite de ontem, uma nova mobilização contra o impeachment e que acusava Temer de golpista tomou corpo no vão livre do Masp, na Avenida Paulista. Mas, a essa altura, Temer já estava no Palácio do Jaburu, isolado do burburinho das ruas. (Colaborou Mariana Sanches)

Dilma chega a Nova York para reafirmar discurso de golpe

• Presidente aproveita evento climático para denunciar risco à democracia

Henrique Gomes Batista*, Catarina Alencastro e Eliane Oliveira - O Globo

-NOVA YORK E BRASÍLIA- A presidente Dilma Rousseff desembarcou na noite de ontem em Nova York, onde deverá apresentar a sua defesa contra o processo de impeachment. No discurso de cinco minutos, durante a assinatura do acordo climático na sede da Organização das Nações Unidas (ONU), a previsão é que Dilma fará uma breve citação à situação política do país. Na entrevista que dará a seis veículos de imprensa internacional, a presidente deve explorar com mais detalhes o discurso de que foi vítima de um golpe. Dilma terá ainda conversas paralelas com outros líderes mundiais, como os presidentes Barack Obama (EUA) e François Hollande (França).

Cerca de 50 brasileiros aguardavam a chegada da presidente em frente à residência oficial do embaixador Antonio Patriota em Nova York. O grupo se manifestou a favor de Dilma com palavras de ordem contra o impeachment, cartazes, tambores e flores.

— A gente pensou nessa história depois que a presidente Dilma recebeu flores no Palácio do Planalto de um grupo de mulheres. Foi um gesto muito bonito — afirmou Flavia Fontes, brasileira radicada em Nova York.

De acordo com os manifestantes, o movimento foi organizado pelas redes sociais.
— Não ficamos temerosos de encontrar protestos a favor do impeachment. Os golpistas preferem se manifestar na Times Square, lugar turístico — disse a gaúcha Patricia Matzbacher, que mora nos EUA há dez anos.

O discurso de Dilma deverá focar no papel decisivo que o Brasil teve para que a 21ª Cúpula das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP 21) chegasse ao acordo mais importante sobre redução de gases de efeito estufa desde o Protocolo de Kyoto, assinado em 1997. Auxiliares da presidente a aconselharam a tratar do impeachment durante a entrevista coletiva, para evitar desconforto entre os líderes mundiais reunidos para tratar de um tema ambiental.

Em algum momento, Dilma apresentará os argumentos de que as pedaladas fiscais foram feitas por outros presidentes antes dela e não deveriam configurar crime de responsabilidade. Dirá também que os decretos orçamentários não serviram para beneficiá-la pessoalmente, que mais uma vez é vítima de uma injustiça e que o impeachment é um golpe na democracia.

A decisão de participar do evento da ONU, tomada pouco mais de 24h antes de embarcar, levou em conta a agenda positiva que o acordo climático representa para Dilma e a chance de ela demarcar sua versão na esfera internacional. O Planalto vem monitorando a cobertura da imprensa estrangeira sobre a crise brasileira e avalia que os veículos de fora têm dado mais espaço para os argumentos de defesa da presidente. Em seu editorial, esta semana, o New York Times afirma que o problema contra Dilma não são as manobras fiscais, feitas por outros governantes brasileiros, mas sim a culpa que ela está levando pela crise econômica, que se soma às investigações que envolvem boa parte da classe política. Segundo o jornal americano, o impeachment é na verdade um referendo sobre a gestão do PT. Para um negociador climático do Brasil, é vantajoso para Dilma se apresentar num momento crítico como este:

— Dilma está vindo aqui porque esta é a grande contribuição da gestão dela para o mundo.

Rubens Barbosa, embaixador aposentado e presidente do Instituto de Relações Internacionais e de Comércio Exterior, acredita que, se Dilma falar sobre impeachment e golpe, será algo gravíssimo.

— Seria algo lamentável, prejudicaria a imagem do Brasil — disse Barbosa.
Já o professor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília, Thiago Galvão, acha que dificilmente Dilma falará diretamente sobre o tema.

— Se a presidente da República trouxer à tona a questão, será em conversas paralelas com autoridades americanas e de outros países.

As propostas dos negociadores brasileiros na COP 21, em dezembro passado, foram decisivas no acordo fechado por 195 países em Paris, no qual o mundo concordou em caminhar para uma economia de baixo carbono.

— Dilma não poderia ficar fora dessa foto. O Brasil foi muito importante para termos o acordo de Paris — disse ao GLOBO a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, que está nos EUA com Dilma. (*Correspondente)

Temer lança ofensiva fora do país contra tese de golpe

Contraofensiva de Temer tenta desmontar no exterior tese de golpe

Graciliano Rocha – Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - No dia em que Dilma Rousseff viajou para os EUAcom a intenção de denunciar o que chama de golpe de Estado representado pelo processo de impeachment, o vice-presidente Michel Temer lançou uma contraofensiva na imprensa internacional para rebater a tese de que o possível afastamento da presidente represente ruptura da ordem institucional do país.

Temer concedeu entrevistas separadamente ao "The New York Times" e a duas das principais publicações especializadas em finanças do mundo –o nova-iorquino "The Wall Street Journal" e o londrino "Financial Times"– para rejeitar a pecha de golpista que Dilma tem lhe atribuído. O peemedebista também diz que revelará os integrantes de seu ministério quando o momento chegar.

Foram as manifestações públicas mais aprofundadas do peemedebista desde que 367 dos 513 deputados da Câmara aprovaram a continuidade do processo de impeachment, no domingo (17).

"Se cada etapa do impeachment está de acordo com a Constituição, como pode ser golpe?", disse Temer ao "The Wall Street Journal".

"Estou muito preocupado com a intenção da presidente de dizer que o Brasil é uma República de menor importância onde há golpes", afirmou ao "The New York Times".

Se o Senado der continuidade ao processo iniciado pela Câmara, Dilma será afastada por até 180 dias, sendo substituída por Temer. Em caso de condenação, o peemedebista fica no cargo até a posse do sucessor escolhido pelas urnas em 2018.

Dilma pretende dizer nos EUA que as chamadas pedaladas fiscais não constituem motivo suficiente para seu afastamento e que ela não é alvo de acusações de corrupção, diferentemente de grande parte dos congressistas que votaram para destituí-la.

Ao internacionalizar o discurso de que o impeachment solapa a democracia brasileira, Dilma busca minar a legitimidade de Temer aos olhos da comunidade internacional.

Falando na condição de presidente interino devido à viagem de Dilma ao exterior, Temer disse que deixará o cargo com a volta da titular, no sábado (23), o que prova do funcionamento regular das instituições no país.

O peemedebista expressou descontentamento com as recentes acusações de que esteja conspirando para destituir a presidente e, assim, tomar o lugar dela. "O fato de ela estar dizendo que eu sou um golpista é obviamente perturbador para mim e para a Vice-presidência", disse.

Ele criticou a companheira de chapa com quem foi eleito em 2010 e reeleito em 2014. Segundo ele, Dilma deveria cuidar da sua defesa no Senado, etapa seguinte do processo de impeachment, ao invés de criar problemas para o Brasil fazendo "falsas declarações" no exterior.

"O que ela deveria fazer, na minha opinião, é defender-se no Senado, com argumentos sólidos e então o Senado não vai julgá-la nem afastá-la", disse ao "Financial Times".

Também ao diário britânico, Temer relatou que Dilma perdeu, simultaneamente, base de sustentação no Congresso e apoio da população.

Segundo pesquisa Datafolha do início de abril, o governo Dilma é avaliado como ruim ou péssimo por 63%.

"Quando ela me acusa de ser um conspirador ou um golpista, eu me pergunto se eu realmente teria a capacidade de influenciar 367 deputados e 70% da população brasileira. Trata-se de algo sem o menor fundamento", afirmou Temer.

O vice também reclamou de ter sido isolado pelo Planalto. "Eu passei quatro anos em absoluto ostracismo", disse.

Novo governo
Temer também se disse preparado para montar um novo governo no caso de o Senado aprovar a continuidade do processo de impeachment, mas evitou mencionar nomes.

"Quando o tempo chegar, eu terei o governo na minha cabeça e só então vou anunciar os nomes", disse.

Na mesma pesquisa Datafolha, realizada em 7 e 8 de abril, a taxa dos que defendiam também o impeachment de Michel Temer era muito semelhante à dos que queriam ver Dilma longe do Palácio do Planalto: 58% a 61%.

Em diferentes simulações da disputa presidencial de 2018, o atual vice-presidente alcança entre 1% e 2% das intenções de voto.

Propostas dificultam adesão do PSDB

• Tucanos discutem obrigar filiados a se licenciar do partido e não concorrer em 2018 caso queiram integrar eventual governo de Temer

Pedro Venceslau, Alberto Bombig - O Estado de S. Paulo

FOZ DO IGUAÇU - Peça importante no processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff, o PSDB permanece distante de se acertar com o vice Michel Temer (PMDB) sobre uma participação no eventual governo dele, a poucos dias da votação decisiva no Senado.

Caso o partido não aceite integrar o novo governo, umas das propostas em discussão pretende obrigar filiados que queiram ocupar cargos oferecidos por Temer a se licenciar da legenda e sob o compromisso de não concorrer à Presidência em 2018.

Se a ideia vingar, será uma barreira para que tucanos com pretensões eleitorais aceitem compor um governo Temer, caso ele assuma. O PSDB marcou para 3 de maio a reunião da Executiva que definirá se o partido ocupará cargos em eventual governo.

A tendência no colegiado é contra a adesão. Secretário-geral do partido, o deputado Silvio Torres (SP) vai defender a licença de quem aceitar cargos se a adesão institucional for recusada. “O PSDB tem compromisso e dever moral de tirar o Brasil da crise, mas tem um caminho próprio, que é o projeto apresentado ao País nas eleições de 2014, quando o senador Aécio Neves foi derrotado”, diz.

Para Torres, quem desobedecer ao que for decidido pela Executiva terá também de se comprometer a não ser candidato em 2018. Na terça-feira o partido reunirá a bancada na Câmara para debater o tema. Depois consultará senadores e governadores.

O senador José Serra, tucano com boa interlocução com Temer, é apontado por aliados do vice como o mais cotado para assumir um ministério importante – na área econômica, infraestrutura ou Saúde. A posição de Serra é de que o PSDB tem um compromisso com o Brasil. “Michel Temer assumindo, eu diria que deveria se batalhar para se formar um governo de união e reconstrução nacional, com todas as forças interessadas na recuperação do País”, disse Serra ao Estado em março. Para ele, o PSDB deveria participar do novo governo “sem abdicar de propostas e convicções”. Serra descarta adesão pessoal motivada por pretensões eleitorais.

Se a adesão institucional for vetada e a proposta de Torres aprovada, a participação de Serra, considerada importante para o sucesso de eventual novo governo, se tornaria mais difícil. É mais um problema para Temer, que nesta semana ouviu um não do economista Armínio Fraga, seu plano A para a Fazenda.

Grupos do governador Geraldo Alckmin e de Aécio rejeitam a ideia de ocupar espaços na máquina pública. Dirigentes lembram que a ação em curso no Tribunal Superior Eleitoral pedindo a cassação da chapa Dilma-Temer seria um constrangimento para um eventual ministro do PSDB, autor da ação.

Além de Alckmin, outros dois governadores tucanos se manifestaram contrários à adesão do PSDB à gestão Temer. “Sou contra ter cargo no governo. O apoio programático não precisa disso”, disse Pedro Taques, de Mato Grosso. Para Beto Richa, do Paraná, não há “necessidade” de a legenda ocupar ministérios. Taques e Richa participam, em Foz do Iguaçu, do Fórum Empresarial, evento organizado pelo empresário João Doria.

Causou desconforto entre os tucanos paulistas o convite de Temer ao secretário de Segurança Pública, Alexandre de Moraes (PSDB), para integrar o novo Ministério. Temer não consultou Alckmin nem a direção nacional antes da sondagem.

Pauta. Apesar da resistência, o PSDB não se colocará na oposição e promete apoiar eventuais reformas de Temer. Aécio se reuniu em São Paulo com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e apresentou a ele uma lista de demandas que deve ser levada ao vice. O documento defende a simplificação do sistema tributário, compromisso com programas sociais, reforma política e blindagem da Operação Lava Jato.

Em reunião, PSDB deve decidir ficar de fora de eventual governo Temer

Paulo Gama, Thais Arbex – Folha de S. Paulo

FOZ DO IGUAÇU, SÃO PAULO - Em reunião de sua Executiva Nacional no dia 3 de maio, o PSDB deve fechar questão sobre não participar do provável governo Michel Temer (PMDB).

Parte dos tucanos vinha defendendo nos bastidores que o partido apoiasse Temer no Congresso, mas não aderisse ao governo. Deputados do PSDB ouvidos pela Folha defendem que, dessa forma, o partido não corre o risco de "entrar em uma embarcação que pode naufragar", o que colocaria em fisco o projeto tucano para o país.

Há hoje no PSDB três nomes dispostos a concorrer à Presidência em 2018: o presidente nacional, senador Aécio Neves (MG), o governador Geraldo Alckmin (SP) e o também senador José Serra, este último cotado para integrar o governo Temer.

Na noite desta quinta-feira (21) governadores tucanos engrossaram publicamente discurso que vinha sendo repetido nos bastidores, defendendo que o PSDB não tenha cargos no provável governo Michel Temer.

Pedro Taques (MT) e Beto Richa (PR) que participam do Fórum Empresarial, promovido pelo Lide em Foz do Iguaçu, afirmaram que começa a se firmar um consenso entre tucanos nesse sentido.

"Sou contra ter cargos. Acho que podemos apoiá-lo no Congresso Nacional em cima de propostas. Lutamos pelo impeachment, não podemos deixá-lo só", disse Taques.

"Não há necessidade de ocupar cargos", afirmou Beto Richa.

Nesta semana, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, seguiu na mesma linha, ao afirmar que "não vê razão" o PSDB ter cargos no governo peemedebista.

A Executiva, no entanto, não impedirá que integrantes do PSDB assumam espaço na Esplanada de Temer na cota pessoal do peemedebista.

"Nada impede que alguém participe mas como cota pessoal", afirmou Pedro Taques. "O Serra, por exemplo, pode assumir como cota de competência", disse o governador sobre o senador José Serra (SP), cotado para ser ministro de Temer.

Na reunião da Executiva Nacional, será apresentada à instância máxima do partido uma carta elaborada pela bancada tucana no Senado para ser levada a Michel Temer. Ela reúne um conjunto de "princípios e medidas" que o partido considera essencial para dar apoio no Congresso a um possível governo do peemedebista.

Os tucanos reuniram onze pontos para, segundo diz o texto, a "formação de um entendimento partidário que promova a conciliação nacional e a construção de um ambiente político-institucional que permita ao país superar este grave momento de sua história".

Temer diz que Dilma prejudica o Brasil


Por Andrea Jubé e Camilla Veras Mota – Valor Econômico

BRASÍLIA e SÃO PAULO - A tensão entre a presidente Dilma Rousseff e o vice Michel Temer (PMDB) aumentou ontem e deu à disputa um caráter de crise institucional. Com a intenção de neutralizar a estratégia de Dilma de propagar no exterior a ideia de que seu impeachment é um golpe de Estado, Temer deu ontem entrevistas a jornais estrangeiros para rebater a tese e disse que Dilma prejudica o país ao falar que seu afastamento é uma ruptura da ordem democrática. No cargo de presidente interino, o pemedebista afirmou que está pronto para assumir o comando do país e disse que já está preparando seu ministério.

"Ela diz que sou o chefe do golpe, o que obviamente é perturbador para mim e para a vice-presidência da República", disse Temer ao jornal "The Wall Street Journal". "Se cada etapa do impeachment está de acordo com a Constituição, como pode ser golpe?", declarou o pemedebista.

"Não há golpe de forma alguma acontecendo no Brasil", afirmou Temer ao Financial Times.

As entrevistas para rebater a pecha de golpista, concedidas de forma separada aos jornais "The Wall Street Journal" e "Financial Times", foram divulgadas ontem, na véspera do discurso que Dilma deve fazer hoje na Assembleia-Geral das Nações Unidas, em Nova York, para denunciar o golpe no país. Temer assumiu ontem a presidência interinamente e ficará no cargo até sábado, quando Dilma deve retornará dos Estados Unidos.

Ao "Financial Times", o vice-presidente afirmou que "vários ministros do Supremo Tribunal Federal" disseram que o possível impeachment da presidente da República "não representaria um golpe". "Este é um processo constitucional", disse. Nas entrevistas divulgadas ontem, o pemedebista afirmou que "vai retornar a seu posto" assim que Dilma retornar o país, na tentativa de mostrar que não dará um golpe.

Temer afirmou que está conversando com potenciais ministros e que espera construir um governo de coalizão para o país durante o julgamento de Dilma no Senado. "Quando chegar a hora, vou ter um ministério formado na minha cabeça e só então vou revelar nomes", afirmou ao "The Wall Street Journal".

Ao "Financial Times", disse que a presidente perdeu, simultaneamente, base de sustentação no Congresso e apoio da população. "Quando ela me acusa de ser um conspirador ou um conspirador ou um golpista, me pergunto se realmente teria a capacidade de influenciar 367 deputados e 70% da população. Trata-se de algo sem o menor fundamento".

Temer desembarcou ontem em Brasília, acatando a recomendação de sua segurança pessoal e os conselhos de auxiliares de que deveria assumir a Presidência interina na capital federal, para confrontar da sede do Executivo o discurso de Dilma. O pemedebista não vai despachar do gabinete de Dilma no terceiro andar do Planalto. Segundo auxiliares, vai manter o estilo discreto e, como das ocasiões anteriores, permanecerá na Vice-Presidência, onde receberá aliados.

Para os próximos dias são aguardadas duas importantes reuniões, com o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), que comanda o processo de impeachment, e com o economista Henrique Meirelles, executivo da holding J&F e ex-presidente do Banco Central, cotado para o Ministério da Fazenda. Com Meirelles o encontro pode ocorrer amanhã.

Para um eventual governo Temer, são nomes confirmados, embora os cargos ainda não estejam definidos: o ex-ministro da Aviação Civil Eliseu Padilha, cotado para a Casa Civil, o ex-ministro Moreira Franco, o presidente em exercício do PMDB, senador Romero Jucá (RR), e o ex-ministro Geddel Vieira Lima. O senador José Serra (SP) é cotado, mas o PSDB resiste. O PP terá dois ministérios, e o PSB pelo menos um.

Depois da votação do impeachment na Câmara, o pemedebista passou a semana em São Paulo, onde se reuniu com aliados para discutir a formação do novo governo. Ontem, reuniu-se com o ex-ministro Moreira Franco, um de seus principais aliados.

A segurança de Temer recomendou que o pemedebista trocasse São Paulo por Brasília depois que cerca de 80 jovens protestaram ontem m frente à casa dele, em São Paulo. Integrantes do "Levante Popular da Juventude" escreveram no asfalto diante da casa do pemedebista "QG do golpe", rasgaram cópias da Constituição Federal e gritaram palavras de ordem. Mais de 20 seguranças foram acionados e a casa foi cercada por barreiras de proteção de metal.

Se o Senado acolher o processo de impeachment, Dilma será afastada por até 180 dias, e será substituída por Temer. Se a presidente for condenada, o peemedebista ficará no cargo até a sucessão de 2018. (Colaborou Gustavo Brigatto, de São Paulo. Com agências noticiosas)

Petista custará em obter apoio dos EUA

Por Juliano Basile e Daniela Chiaretti – Valor Econômico

NOVA YORK e SÃO PAULO - A viagem da presidente Dilma Rousseff a Nova York para participar hoje da Assembleia da Organização das Nações Unidas (ONU) e denunciar o processo de impeachment que está sofrendo no Congresso deverá ter pouco impacto sobre os países membros e não deverá alterar a posição do governo dos Estados Unidos sobre o assunto.

A expectativa é a de que o Departamento de Estado americano permaneça distante das disputas políticas internas do Brasil e de que não adote posicionamentos contrários nem favoráveis ao impeachment. Essa posição foi adotada na segunda-feira, quando o porta-voz do Departamento de Estado, John Kirby, disse que o Brasil vive "um momento político desafiador", mas possui instituições "suficientemente maduras para endereçar os desafios do país".

A ONU também se manifestou de forma diplomática e apartidária sobre o impeachment através do secretário-geral, Ban Ki-moon, que pediu uma "solução harmoniosa" aos líderes brasileiros, se disse preocupado com a instabilidade política no país e pediu que o Judiciário fosse respeitado. "Acho que poucos países vão fugir muito desse roteiro", avaliou o professor da American University e pesquisador do Conselho de Relações Internacionais (CFR na sigla em inglês), Matthew Taylor.

O professor acredita que o governo americano vai evitar qualquer interferência sobre a situação política brasileira e o impeachment. "O governo dos Estados Unidos não deve se intrometer, já que sabe que qualquer sinal de favoritismo poderá acarretar impacto de longo prazo nas relações bilaterais", disse. "O governo americano demorou para apreender, mas ao longo das últimas duas décadas, a política externa americana tem procurado não dar a impressão de excessiva intervenção na autonomia dos sistemas políticos latino-americanos, especialmente nos países de grande porte", continuou o professor. Ele se declarou cético quanto ao impacto da viagem. "Se, de um lado, a imagem da presidente como líder global discursando em Nova York pode ajudá-la a mudar o foco das atenções dentro do Brasil, do outro lado, acho que um discurso qualificando o impeachment como golpe em nada ajudará a presidente no plano internacional e pode até repercutir mal na imprensa brasileira", justificou Taylor.

Após a Assembleia da ONU, a presidente deverá fazer uma ofensiva junto à imprensa americana, concedendo entrevistas para contestar o que qualifica como um "golpe". De maneira geral, os jornais dos Estados Unidos estão adotando uma postura crítica ao fato de o processo de impeachment ter sido conduzido pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que é réu no Supremo Tribunal Federal (STF) onde responde a duras acusações de envolvimento em episódios de corrupção na Petrobras e de outros parlamentares suspeitos terem votado contra Dilma. Por outro lado, a imprensa americana também publicou declarações de ministros do STF de que o processo de impeachment segue ditames da Constituição e ressaltou o fato de a Corte ter indicado um rito que está sendo seguido pelo Congresso.

O vice-presidente Michel Temer também iniciou uma ofensiva a jornais estrangeiros e concedeu entrevista ao "The Wall Street Journal" para dizer que "cada passo do impeachment está de acordo com a Constituição".

Dilma fará um discurso na Assembleia da ONU sobre mudanças climáticas em sessão que será iniciada às 9h30, horário de Brasília. Depois, participará da assinatura do acordo do clima, que foi acertado em Paris, em dezembro, e terá um almoço com chefes de Estado.

O acordo poderá ter a maior adesão de um tratado internacional na história das Nações Unidas. A ONU espera representantes de mais de 160 países e mais de 60 chefes de Estado e de governo na Assembleia.

O evento deverá marcar a última viagem internacional de Dilma como presidente, caso o impeachment seja confirmado pelo Senado. Dias antes da votação do processo na Câmara, a expectativa era a de que o Brasil seria representando pela ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, e que Dilma não iria a Nova York por causa da crise política em Brasília.

O acordo, que pretende colocar as economias mundiais na trilha do baixo carbono, só entra em vigor quando se tornar lei em 55 países que signifiquem 55% das emissões mundiais de gases-estufa. No caso brasileiro, tem que passar pelo Congresso.

Se por um lado o governo brasileiro se empenhou em atuar diplomaticamente para que o texto pudesse ser fechado em Paris, o acordo pode não se tornar prioritário na agenda do Legislativo, onde tem ocorrido duros embates em pautas ambientais. O Protocolo de Nagoya, criado em conferência internacional em 2010, no Japão, e que versa sobre o acesso a recursos genéticos e repartição de benefícios da biodiversidade, ainda não foi ratificado pelo Brasil por oposição da bancada ruralista.

FH: PSDB precisa repudiar Bolsonaro

• Para ex-presidente, é ‘inaceitável’ que ainda haja quem defenda tortura

Stella Borges - O Globo

-SÃO PAULO- O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso disse que o PSDB, partido do qual é presidente de honra, precisa repudiar afirmações como as do deputado federal Jair Bolsonaro (PSC-RJ). Durante a votação do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff na Câmara, no último domingo, Bolsonaro homenageou o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, ex-chefe do DOI-Codi, órgão de repressão da ditadura militar, e primeiro militar a ser reconhecido como torturador pela Justiça.

“O PSDB precisa repudiar com clareza essas afirmações, que representam uma ofensa aos cidadãos do país e, muito especialmente, aos que sofreram torturas”, disse o ex-presidente em nota publicada ontem, em uma rede social.

Processo “mais conveniente”
Fernando Henrique afirmou que espera que a votação do processo de impeachment no Senado se processe “de forma mais conveniente, sem declarações estapafúrdicas como algumas que testemunhamos na Câmara dos Deputados”. FH disse que especialmente a declaração do deputado Bolsonaro lhe desagradou.

“É inaceitável que tantos anos após a Constituição de 1988 ainda haja alguém com a ousadia de defender a tortura e, pior, elogiar conhecido torturador”, completou o ex-presidente.

Leia a íntegra da nota do expresidente:
“O processo do impeachment começa agora a tramitar no Senado. Esperamos que os trâmites legais sejam todos cumpridos, sem delongas. E quando chegar o momento da decisão dos senadores, que a votação se processe de forma conveniente, sem declarações estapafúrdicas como algumas que testemunhamos na Câmara dos Deputados. Especialmente uma me desagradou, aquela proferida pelo deputado Bolsonaro. É inaceitável que tantos anos após a Constituição de 1988 ainda haja alguém com a ousadia de defender a tortura e, pior, elogiar conhecido torturador. O PSDB precisa repudiar com clareza essas afirmações, que representam uma ofensa aos cidadãos do país e, muito especialmente, aos que sofreram torturas”.

PGR analisa denúncias
Depois de receber mais de 17 mil pedidos de providências contra Bolsonaro, o procurador-geral da República, Rodrigo Janto, analisa se abre uma investigação ou se faz uma denúncia contra o deputado do PSC.

Legendas como PSOL e PV já se manifestaram contra Bolsonaro, assim como o Instituto Vladimir Herzog, que pediu aos deputados federais que expulsem o colega da Câmara.

Ao 'NYT', Temer afirma que ficou no 'ostracismo absoluto' por quatro anos

Ao 'NYT', Temer diz que falou com Dilma pela última vez no fim de janeiro

• Jornal americano questionou o vice sobre as menções a ele em delações premiadas, como do senador Delcídio Amaral (ex-PT); Temer afirmou que conexões com executivos envolvidos na Petrobrás se deveram às responsabilidades burocráticas como presidente do PMDB

- O Estado de S. Paulo

SÃO PAULO - No mesmo dia em que Dilma Rousseff deve denunciar o "golpe" em curso no Brasil às Nações Unidas, em Nova York, o presidente em exercício Michel Temer voltou a negar ilegalidades no processo de impeachment da petista e afirmou que esteve em "ostracismo absoluto" nos últimos quatro anos. Depois de falar ao Wall Street Journal e ao Financial Times, ele concedeu uma entrevista ao The New York Times.

Segundo Temer, Dilma e ele nunca foram amigos, mal se cumprimentando com cerimônia, e a última vez que se falaram foi no final de janeiro. "Nós não somos amigos porque ela não se considerava minha amiga", afirmou na entrevista.

Temer voltou a defender a legalidade do impeachment da presidente. "Estou muito preocupado com a intenção da presidente de dizer que o Brasil é alguma republiqueta onde golpes acontecem", afirmou, em referência ao discurso do governo e do PT de que o processo de afastamento de Dilma - que após aprovação da Câmara tramita agora no Senado - é uma "fraude política".

O vice também voltou a dizer que não pretende interferir nas investigações de corrupção e defendeu seus aliados das suspeitas de irregularidades. Temer disse que não pediria a Eduardo Cunha (PMDB-RJ) para renunciar à presidência da Câmara. "Esse é um assunto para o Supremo Tribunal Federal decidir", afirmou.

O jornal americano questionou o vice sobre as menções a ele em delações premiadas, como do senador Delcídio Amaral (ex-PT). Temer se disse inocente e afirmou que suas conexões com executivos envolvidos no esquema de corrupção na Petrobrás se deveram às suas responsabilidades burocráticas como presidente do PMDB.

O jornal destaca que Temer assumiria o maior país da América Latina enfrentando uma crise econômica, uma epidemia de zika, um furioso clima político e uma Olimpíada - tudo ao mesmo tempo. Apesar disso, o peemedebista diz que mantém esperança de promover uma espécie de catarse, reunindo um "governo de unidade nacional". Citando Juscelino Kubitschek, Theodore e Franklin Roosevelt, Temer disse que quer criar um "governo de otimismo". "É preciso fazer nascer de novo a esperança", afirmou.

A publicação ressalta ainda que Temer, segundo pesquisas, teria 2% das intenções de voto se houvesse uma eleição hoje e esteve tão raras vezes no foco nacional que muitos brasileiros o conheciam por sua mulher, Marcela. Mais de 30 anos mais nova, ela chamou a atenção na posse de Dilma e tem uma tatuagem com o nome do vice na nuca, lembra o jornal.

O vigia do PMDB

Por Maria Cristina Fernandes – Valor Econômico

"À Mesa com o Valor", Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE) diz a Maria Cristina Fernandes que, depois de votar sim pelo impeachment de Dilma, o próximo alvo é Eduardo Cunha. O deputado também defende que um eventual governo Temer deva buscar diálogo até com o PT.

Cunha tem de ser o próximo, diz Jarbas Vasconcelos

BRASÍLIA - "Voto sim, senhor presidente, mas quero dizer do meu desconforto de ter uma pessoa como Vossa Excelência presidindo esta Casa. O processo de impeachment fica profundamente maculado com sua presença." A sorte da presidente Dilma Rousseff já estava selada quando o deputado Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE) proferiu o 348º voto, um dos últimos da sessão iniciada 63 horas antes pelo deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ).

A sobriedade contrastava com a algazarra provocada, minutos antes, pela definição do placar. O papel picado era o mesmo que, nos dias que antecederam o impeachment, encerrava as reuniões da oposição de monitoramento de votos, mas os empurrões e cotoveladas que se seguiram foram inéditos em sua vida parlamentar. Encerrada a sessão já depois da meia-noite, a maioria dos deputados rumou para as festas de comemoração e Jarbas foi para casa dormir. Às 9h do dia seguinte, uma segunda-feira, chegou a uma Câmara deserta, com os elevadores funcionais ainda desligados, para ler a crônica do confete.

Na véspera do impeachment, durante um café da manhã em seu apartamento na Asa Sul, ele avisara do cravo e da ferradura: "Sou daqueles que acredita que na vida é preciso ter prioridades. A nossa agora é o impeachment. Mas a prioridade é Dilma agora e ele [Cunha] amanhã ".

Alessandra Cordeiro, a cozinheira pernambucana herdada do ex-ministro do Tribunal de Contas da União José Jorge serve tapioca com manteiga e coco, milho cozido, ovos mexidos, presunto, queijo prato e iogurte com gelatina. O deputado dá início aos trabalhos pelas frutas e pelo apartamento funcional que ocupa em prédio reservado ao Senado, Casa que lhe deu assento por oito anos até dezembro de 2014.

Depois de indicar o vice na chapa que sucederia Eduardo Campos no governo de Pernambuco, pensou em se aposentar, mas teve medo de endoidar. A reeleição não dava, então resolveu tentar a Câmara. De volta a Brasília, ligou para o presidente do Senado, Renan Calheiros, o correligionário de quem já havia pedido a renúncia em 2007 durante outra temporada de escândalos.

"Você vê alguma extravagância em eu ficar morando onde estou? Lá tem três ministros do STJ e dois do TCU." Renan foi afável. Disse que ele poderia ficar no apartamento, mas não havia como formalizar a permanência. Jarbas recuou. Não abriria o flanco. "Tenho uma tese de que em política tudo aquilo que você tem que explicar é complicado."

Nesse momento, a bola rolou para seus pés. O senador Romário Faria (PSB-RJ) havia reformado às suas expensas o apartamento funcional da Câmara que ocupou em seu mandato anterior como deputado e queria ficar por lá. Jarbas sugeriu uma permuta e Renan editou um ato formalizando-a.

Aos 73 anos, no exercício do seu quinto mandato parlamentar (três de deputado federal, um de senador e o primeiro, de deputado estadual), intercalados entre os quatro no Executivo (dois de prefeito do Recife e dois de governador de Pernambuco), Jarbas é o aliado que o vice-presidente gostaria de ver sentado na cadeira de Cunha.

Cinco dias antes do impeachment, Michel Temer pediu que Jarbas reunisse, em seu apartamento, um grupo de parlamentares cuja lista ficaria a cargo do anfitrião. Alessandra preparou o cardápio: filé mignon ao molho madeira, frango recheado e um galo do alto, peixe de águas profundas.

Do Recife vieram o bolo de rolo e a goiabada e da turma de Jarbas chegaram os deputados Heráclito Fortes (PSB-PI), Benito Gama (PTB-BA), Darcísio Perondi (PMDB-RS), Rubens Bueno (PPS-PR), Mendonça Filho (DEM-PE) e os pemedebistas Osmar Terra (RS), Carlos Marun (MS), Baleia Rossi (SP) e Lelo Coimbra (ES). "Na condição de presidente do PMDB", esclarece, veio o senador Romero Jucá, o conterrâneo do partido que fez carreira em Roraima, mas nunca tocou por sua partitura. Cada um falou um pouco. "Ainda não tínhamos atingido o quórum do impeachment, mas todos concordamos que havia uma longa e penosa travessia pela frente e, para dar uma resposta ao Brasil, o porvir não poderia ser do PMDB. Tinha que ampliar." Temer saiu de lá à meia-noite. "Não houve nem de longe essa coisa de participação em governo. Era uma discussão sobre o país."

• Sou daqueles que acredita que na vida é preciso ter prioridades. A nossa agora é o impeachment, mas a de amanhã tem que ser o Cunha

Na liturgia de Brasília, o jantar foi um signo de prestígio. O desejo de Temer cumpriria o vaticínio de Ulysses Guimarães, que considerava Jarbas, presidente do partido durante sua campanha presidencial de 1989 e único pemedebista com quem rivalizava na sisudez, seu sucessor na política.

Tratava-o como filho. Em 1990, ao ser derrotado na primeira vez em que disputou o governo do Estado, Jarbas recebeu um telefonema do velho pemedebista, preocupado com seu estado de ânimo. "Não sou viúva de eleição, dr. Ulysses", disse-lhe. O amigo não acreditou. Dali a alguns dias, baixou com a mulher, Mora, no Recife. Chegaram com uma caixa de papelão toda furada. Dentro estava Vick, filhote de fox terrier. O pemedebista nunca fora muito chegado a cachorro, mas era muito festejado pelo fox terrier do casal Guimarães, que julgou o filhote um presente de consolação ao amigo derrotado nas urnas.

O deputado encara o mamão e o melão antes de relatar as premissas de sua campanha anti-Cunha. Há dois meses as expôs, pela primeira vez, na presença do senador Aécio Neves (PSDB-MG), ao pelotão pluripartidário da frente pró-impeachment na casa do deputado Heráclito Fortes (PSB-PI). "Meu nome tem sido colocado para presidir a Câmara. Então quero colocar para vocês o seguinte: não sou candidato. Isso me dá liberdade para dizer que esse camarada é uma excrecência. É uma desmoralização que presida o processo de impeachment."

É possível que os presentes tenham acreditado mas, nas alas que desembarcaram nas últimas semanas do Planalto e querem fazer uma clonagem de Cunha para sua sucessão, o bombardeio sobre o deputado já começou. Do senador Ciro Nogueira (PI), presidente do PP, partido recordista em réus da Lava-Jato, vem a provocação: "Se for candidato, não terá mais que 30 votos".

Jarbas era favorável a que se reabrisse a peça acusatória para incluir a denúncia da OAB que abrigava a delação do senador Delcídio do Amaral contra a presidente da República e daria mais robustez ao crime de responsabilidade. Credita a pressa a Cunha. "Quando o PT diz que ele agiu por vingança, não está inventando. É uma inteligência voltada para o malfeito. A única regra que ele quebra é que todo amoral é simpático. Ele é um gelo. Não tem amigos, tem seguidores. Não sabe o que é o alvorecer, o pôr de sol, o sentimento de família."

Jarbas filia Ulysses e Egídio Ferreira Lima, ex-deputado federal pelo PMDB de Pernambuco, na escola da política que não se precipita nem cria inimigos. A ojeriza a Eduardo Cunha, acredita, não o deixará de segunda época. Assume ter errado em dar seu voto para elegê-lo presidente da Câmara: "Eu o tinha por lobista e regimentalista. Votei nele para evitar PT. Não dava para deixar que Dilma se reelegesse e ainda tivesse a Câmara na mão. Mas estava desinformado sobre ele e sou responsável por isso".

Agora pretende agregar a sua campanha contra o presidente da Câmara aqueles que temem ver o eventual governo Temer vítima das mesmas chantagens que açodaram a gestão Dilma Rousseff. Como parece provável que o Senado confirme o placar da Câmara, as manobras que o presidente da Casa já começou a fazer em torno da pauta fiscal, impactarão diretamente o sucessor de Dilma.

Naquela manhã, Brasília havia amanhecido sob o bombardeio de informações de que os governistas haviam virado o jogo, colocando 20 votos à frente da oposição. O vice-presidente, que havia viajado na véspera para São Paulo, decidira retornar a Brasília para a contraofensiva. Jarbas não parecia se abalar com as notícias.

Era seu primeiro impeachment. No de Fernando Collor, estava no Recife, sem mandato, para disputar a prefeitura. Neste, acompanhara as reuniões do comitê do impeachment e ficou seguro de que não deixariam escapar a votação. "É amadorismo ficar inquieto." Nas reuniões, os nomes eram esquadrinhados um a um. Para cada parlamentar indeciso havia um outro, da oposição, para monitorar, com lances dignos de espionagem: "Esse aí não está seguro, não. Vi um vice-líder do governo saindo do seu apartamento ontem. Volta o nome dele para a coluna do meio e vamos atrás", diziam os mais aguerridos.

Jarbas mais participou como observador e consultor da turma que ainda o olha com a reverência de quem tem de idade o que o deputado tem de vida pública (46 anos). Quando voltou para a Câmara, no início do ano passado, os colegas ora o chamavam de governador, ora de senador, diziam que o pai - ou o avô - tinha sido seu colega na Casa e mencionavam de cor entrevistas da década passada em que já desancava lideranças de seu partido como o ex-presidente José Sarney.

Afastado da cúpula do PMDB há mais de dez anos, Jarbas tem divergências ainda mais antigas. Egresso da esquerda do partido, foi um dos primeiros a visitar o então líder sindical Luiz Inácio Lula da Silva, preso no início da abertura. Um dos "autênticos" do PMDB, foi contra a maioria ao recusar voto em Tancredo Neves no Colégio Eleitoral em 1985. E foi um dos primeiros do PMDB a subir no palanque de Lula no segundo turno de 1989. O ex-presidente ainda tentou, sem sucesso, fazer de Jarbas um interlocutor no PMDB, mas a ideia não prosperou: "O PT foi eleito há 14 em cima de duas pernas que empolgaram o país, a ética e a mudança. Hoje não é mais capaz de fazer uma coisa nem outra".

Sua origem à esquerda justifica o desconforto com a pauta que Eduardo Cunha, apresentou à Câmara nesta legislatura. Discorda do açodamento com o qual a terceirização foi aprovada ("saiu pior do que entrou na Casa") e ficou inconformado com a tramitação dada à redução da maioridade. "Os dois lados tinham pontos robustos e fomos obrigados a votar numa madrugada com o argumento de que 80% da população era favorável. O mesmo percentual deve querer o fechamento do Congresso. E é por isso que vamos fechá-lo?"

• Um governo do PMDB seria um desastre. É um erro do PSDB querer apoiar pela metade, sem participar. Michel deve buscar até o PT

O terceiro desserviço que diz ter sido prestado ao país pela Câmara dos Deputados foi a reforma política. Votou pelo fim do financiamento de campanha, mas sabe que ainda não se descobriu um jeito de fazer política sem dinheiro. E chama de arremedo qualquer reforma política que não imponha cláusula de barreira ou acabe com coligações proporcionais. Estava na Alemanha na década de 1980 quando os Verdes, finalmente, chegaram ao Parlamento depois de sucessivas eleições em que se aproximavam, mas não alcançavam os 5% de representação. "Hoje é um dos bons partidos de lá, se consolidou porque conquistou." Não acredita que Temer, um dos maiores defensores do "distritão" leve à frente a ideia de implantá-lo depois da derrota já sofrida pelo projeto na Câmara.

O afogadilho dessas votações tirou dos deputados as noites de terça e quarta. Jarbas, que sempre gostou de oferecer jantares aos colegas e de frequentar aqueles para os quais é convidado, passou a bater ponto na Câmara até a madrugada. "Somos operários, mas no sentido de aperfeiçoar o processo legislativo. Inicia a sessão mais cedo e termina até as 20h. Política não se faz apenas na ordem do dia, mas também na livre troca de ideias fora do Parlamento."

É dessa política que pretende se ocupar agora para ampliar a aliança em torno de um eventual governo Michel Temer. Não tem boas recordações de seus dias no Executivo, quando todo mundo soprava no seu ouvido o que tinha que ser feito. Por isso prefere bradar aos quatro ventos: "Um governo do PMDB é um desastre". A busca de composição deve incluir até mesmo o PT. Sabe que o partido do governo, se derrotado, vai resistir a aproximações, mas vê as pontes como inadiáveis para conter a radicalização política em que o país se meteu neste impeachment com ameaça de movimentos sociais de não dar sossego ao vice. "É uma coisa delicada essa. O grande nome do Michel para essa intermediação é o Paulinho [da Força]. Não quero atacar ninguém, mas não é ideal. Não faltam pontes, faltam nomes mesmo."

Se o PT não tem razão alguma para participar de um eventual governo Temer, o PSDB deveria ter todas. É o que tem dito a seus amigos tucanos. Acha um erro o partido optar por apoio sem participação sob o risco de comprometer o projeto que se iniciou com o impeachment.

Concorda que as divisões do PSDB derivam, em grande parte, de suas disputas internas e assume com todas as letras seu lado na briga alheia: "Serra é o quadro político mais qualificado do país e é com os melhores que o Temer tem que governar". Diz que Temer não terá como escolher ministro da Fazenda sem pactuar com o PSDB. E que o partido erra em querer aderir pela metade - vota, mas não participa.

Jarbas já parara de comer há muito tempo. O insumo ali era a política. E o sentido que lhe quer dar é de urgência: para não se inviabilizar, o governo que vier a assumir tem que tomar as medidas impopulares e cortar na carne logo de cara.

E a Lava-Jato, é parte dessa desestabilização? "É uma das coisas mais exitosas que aconteceram no país nos últimos anos. O que eu concordo é que ela tenha tempo para terminar como o juiz Sérgio Moro já sinalizou. Que se façam outras, mas esta não pode ficar aberta por tempo indeterminado."

Para que não pairem suspeitas de que Michel Temer esteja sendo pressionado a colocar panos quentes sobre a operação, Jarbas defende que o PMDB venha a público defender o apoio à Lava-Jato. "Não se pode dizer que a operação atrapalhou o país. Da mesma maneira que a força-tarefa, em Curitiba, foi pra cima das empreiteiras, o Ministério Público e o Supremo têm que ir em cima da classe política. Há um descompasso."

Para cima de quem? O primeiro da lista, claro, é Eduardo Cunha. Ciente do acordo para livrar o presidente da Câmara no Conselho de Ética, defende pressão redobrada sobre o Supremo por seu afastamento. Acha que o ex-ministro Nelson Jobim, pela amizade mantida com o vice-presidente, pode ajudar, ainda que não vire ministro da Justiça. "É uma área difícil. Mesmo que não seja uma pessoa afeita à área jurídica, tem que ser desenvolta. Capaz de sentar com um ministro para conversar. Não se pode errar aí."

Já se aproximam de duas horas que o café da manhã começou. Sua coleção de arte popular, que estava no cardápio, ainda permanecia intocada e, pela premência, dos fatos, assim permaneceria. A joia de sua coleção de 1.118 peças são as de mestre Vitalino, ceramista de Caruaru, considerada por especialistas como a maior do artista em mãos privadas. Jarbas lhes desconhece o valor. "Me falam que uma ou outra peça foi vendida em leilão por R$ 5 ou R$ 6 mil, mas este não é um assunto que me interesse. Não vendo minha coleção de jeito nenhum." À sua declaração de bens, na Justiça Eleitoral, indicou um valor total de R$ 288 mil. Ainda amadurece a sugestão do amigo jurista Joaquim Falcão de fazer uma fundação para abrigar a coleção. Por enquanto, a maior parte está abrigada nos dois apartamentos do Recife que foram conjugados para recebê-las. Ficam, naquelas que são conhecidas como as "torres gêmeas", espigões de 42 andares que, há três anos, modificaram a paisagem do Cais de Santa Rita, no bairro de São José, um dos primeiros núcleos urbanos do país que guarda nichos do traçado holandês do século XVII.

Divorciado, depois de dois casamentos, Jarbas tem quatro filhos e cinco netos. O caçula dos filhos, que leva seu nome, disputou, aos 23 anos, uma vaga na Câmara de Vereadores, nas últimas eleições, sem sucesso. Hoje trabalha numa secretaria municipal no Recife. Numa quadra em que tantos penhoraram o futuro do Brasil na conta da gratidão para com os filhos, mulheres, pais, avós e todos os santos, Jarbas é econômico em falar do filho. Prefere que ele termine o curso de administração de empresas e siga carreira na iniciativa privada.

Ao fim dos três anos, sete meses e um Eduardo Cunha que lhe restam, planeja se aposentar da vida pública. Se não mudar de ideia antes, pretende se afastar da política como ela é para cuidar de seus bonequinhos de barro. Terá 77 anos.

'Governo Temer é alternativa razoável'

Por Malu Delgado - Valor Econômico

O ponto-chave para o êxito de um eventual governo Michel Temer, na opinião do sociólogo Brasílio Sallum Júnior, professor titular da USP, é a montagem do ministério e a pactuação política para aprovação imediata de alguma reforma estruturante, como a fixação da idade mínima para aposentadoria.

Observador atento do impeachment de Fernando Collor, em 1992, o professor considera a saída de Dilma Rousseff traumática, mas não enxerga alternativa. O profissionalismo político de Temer, sustenta, abre caminhos diante do flagrante amadorismo de Dilma nesse quesito. A proximidade das eleições municipais, a fragmentação partidária num sistema político-eleitoral deteriorado e a proximidade com o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, reflete o sociólogo, são problemas cruciais que Temer terá de enfrentar.

• Valor: Há ambiente propício à instalação de um governo de Michel Temer?

Brasílio Sallum Júnior: Menos difícil do que barrar o processo do impeachment no Senado será governar com esse nível de descrédito e falta de apoio. Uma presidente que tem 137 votos de apoio na Câmara é muito difícil. Você não tem condições de sustentar um governo dessa maneira. É uma deficiência de sustentação no interior da classe política muito grave. A previsão de que a presidente tem poucas chances de fato faz sentido, embora no Senado ela tenha mais apoio. Os políticos profissionais sempre encontram meios de resolver a crise. O impeachment é um deles. O vice é um político profissional e isso ajuda bastante, porque uma das deficiências da atual presidente é o amadorismo político.

• Valor: O que o senhor entende por profissionalismo político?

Sallum Júnior: A capacidade de interpretar a situação política do jogo no qual ele está inserido, a relação de forças entre os vários partidos, de grupos de pressão, correntes de opinião que atuam no meio político. Temer está há decênios na política. Isso não é um sinônimo de fazer um bom governo, mas é um requisito mínimo para manejar a situação.

• Valor: O senhor sustenta então que na atual condição política e econômica do país um eventual governo Temer seria saída mais razoável?

Sallum Júnior: Pode ser, se ele conseguir montar um bom governo. A gente não tem alternativa. A alternativa de reconstruir um governo Dilma está quase fora de questão. Hoje o governo Temer é uma alternativa razoável. Não sei se será bem-sucedido, mas é uma possibilidade. Espero que seja, para o bem de todos nós. A forma pela qual a presidente e o PT decidiram se defender do processo é extraordinariamente restritiva, e não há nenhum sinal de reflexão crítica. Como é que você vai repactuar se acusa os outros de uma das piores coisas que se pode fazer numa democracia, que é chamar o outro de golpista?

• Valor: O vice pode ter alguma implicação na Operação Lava-Jato e outro problema é a credibilidade que teria diante dessa imagem de "traidor", construída pelo PT. Isso o afetaria?

Sallum Júnior: A presidente fez um discurso contra ele, e ela ainda tem visibilidade, mas não acredito que isso vá se manter muito. Qualquer vice se prepara para a Presidência. Ele deve ter lutado pela Presidência agora no final, porque eles romperam. Se o governo dele for empossado e tiver alguma expectativa de que funcione, tenho a impressão de que, embora a Lava-Jato continue com delações premiadas e possa eventualmente aparecer alguma coisa, ao menos no TSE isso [processo de cassação da chapa Dilma-Temer] teria o ritmo reduzido. Isso caso ele consiga montar uma equipe que traga alguma expectativa positiva. Ele vai ter que mostrar ações que estejam mais ou menos sintonizadas com o que o mercado e os agentes econômicos estão esperando. Isso é mais difícil, porque estamos diante de uma eleição municipal.

• Valor: Se assumir, o senhor acha que Temer conseguirá, por exemplo, discutir uma reforma tributária e previdenciária em 2016?

Sallum Júnior: Certas reformas são icônicas e permitem que haja reversão de expectativas, podem acelerar o processo de recuperação econômica. A Previdenciária é complicada. Às vezes é uma coisa que não afeta ninguém imediatamente, mas que tem grande impacto simbólico, tipo idade mínima para aposentadoria. Temer precisa se afirmar como governante. Ele não pode fazer um tipo de administração em que apenas mantém a máquina, senão ele não se mantém, e é bom lembrar que o processo está correndo no Senado. Ele precisa dizer a que veio.

• Valor: Outro aspecto complexo seria essa aliança entre Temer e o presidente da Câmara, Eduardo Cunha.

Sallum Júnior: Aliança é um termo forte, mas de fato é um problema. No fundo, a credibilidade do governo dele fica conectada com alguém que é uma espécie de ícone da corrupção. Cunha é presidente da Câmara, e Temer vai precisar do presidente da Câmara. Não sei como o problema será resolvido. Mas é uma fragilidade de um eventual governo Temer.

• Valor: Há uma conversa nos bastidores de que o Cunha seria preservado da cassação no governo Temer.

Sallum Júnior: Não acredito que funcione dessa maneira. Acho que ninguém faria isso. Duvido que ele [Temer] tenha feito. É suicídio. Cunha pode ser retirado do posto, trocando isso por algum tipo de ação dentro do Conselho de Ética, ou o próprio STF pode enfrentar esse problema. De certa maneira, essa será uma acusação que o atual governo vai jogar o tempo inteiro contra Temer. Tem uma base de verdade. É diferente da acusação de traidor, que é juízo moral, não tem como provar. Mas, no caso do Eduardo Cunha, tem.

• Valor: E a pecha de traiçoeiro e golpista? Não o afetaria?

Sallum Júnior: Acho que não. A presidente teve muita responsabilidade pelo que aconteceu. Ocorreu um conjunto de processos que fez com que o vice-presidente se afastasse. Ele é vice-presidente, precisa se preparar para a Presidência. Claro que ele fez mais do que isso, ele lutou pela Presidência no final. É provável que ele tenha de assegurar que não vai ser candidato em 2018. Uma questão-chave que deveríamos enfrentar é reformar o sistema político-eleitoral, que produziu essa deterioração. São quase 30 partidos na Câmara. Vamos ter que mexer nisso para não chegarmos novamente a uma situação traumática de tirar um presidente no meio de um mandato. Uma coalizão não deveria ser apenas uma junção de partidos em que cada um faz o que quer. Tem que ter diretriz. Uma das questões que o próximo governo vai enfrentar é isso: o Temer vai ter que dar graças a Deus se houver figuras com disposição de ir para os ministérios, porque a desagregação dos partidos é uma coisa inacreditável. É um samba do crioulo louco, é inacreditável.

• Valor: O que o senhor acha que podemos esperar dos movimentos sociais e do comportamento do PT em um governo Temer?

Sallum Júnior: O impeachment tratou basicamente - embora o discurso e a retórica sejam o do golpe à democracia - da gestão econômica. A administração do Estado e sua relação com a economia é o que está em jogo. Qual é a acusação que pesa contra a presidente, não em termos de corrupção: ela ser promotora de um ativismo estatal, o Estado ser usado de modo arbitrário sem levar em conta a lógica do mercado. Esse pensamento, hoje, é hegemônico. Acho que vamos ter no próximo governo uma inflexão na área de concessões. Isso é uma das chamadas bondades que o governo Temer pode fazer. A tendência é ter uma política econômica mais para o mercado do que a da presidente Dilma. Não teremos, certamente, um governo neoliberal. Não acredito que se chegue ao limite do que está lá na proposta do PMDB, a Ponte para o Futuro. Aquilo seria um programa liberal demais para as possibilidades do sistema político. E mesmo para o empresariado, que está muito acostumado às benesses estatais. Não tenho dúvida de que as centrais sindicais vão se opor, mas não sei se terão tanta força. Não acho que haverá obstáculos suficientes para o exercício do poder e do governo. Estamos numa situação em que a dificuldade básica dos assalariados é o desemprego. O ativismo sindical pode se manifestar, mas não acredito que carregue muita gente atrás.

O futuro pede passagem - Roberto Freire

- Diário do Poder

O primeiro passo para o impeachment de Dilma Rousseff foi dado pela Câmara dos Deputados, em votação histórica, com a aprovação por mais de dois terços de seus representantes da abertura do processo de impedimento da presidente da República. Cumprindo sua prerrogativa constitucional e em consonância com o desejo amplamente majoritário da sociedade, a Casa iniciou o caminho que pode levar ao fim do desgoverno lulopetista, de forma legítima e democrática, pelo bem do Brasil e em respeito absoluto ao que determina a nossa Constituição.

A partir de agora, caberá ao Senado Federal a apreciação da admissibilidade do processo e a votação final que, caso alcance os dois terços de parlamentares necessários ao impeachment, afastará Dilma de forma definitiva do Palácio do Planalto. A população tem de se manter mobilizada, seja nas ruas ou nas redes sociais, e continuar acompanhando atentamente o trâmite do processo junto aos senadores. O Congresso Nacional deve ter o compromisso de não fazer nenhum jogo protelatório, como insinuam alguns parlamentares governistas, sob pena de prolongar a crise que aflige os brasileiros e gerar um ambiente de indefinição política e insegurança institucional que fragilizaria ainda mais o país.

As forças políticas que votaram pelo impeachment de Dilma na Câmara e o farão no Senado têm a responsabilidade política e até a obrigação moral de dar sustentação ao governo de transição que emergirá, como é natural e próprio do regime democrático. Não podemos repetir o equívoco histórico do PT, que participou ativamente do impedimento de Fernando Collor em 1992, mas se recusou a integrar a coalizão comandada por Itamar Franco.

A nova gestão terá um caráter inequivocamente reformista e, diante do desmantelo econômico que os governos de Lula e Dilma legaram ao país pela incompetência e irresponsabilidade dos últimos 13 anos, o novo presidente necessitará de um apoio expressivo do Parlamento para levar adiante as reformas de que o Brasil precisa neste momento tão delicado.

Ao contrário das mentiras que já começam a ser propagadas pelo PT, não há qualquer intenção de cortar os programas sociais ou mexer naquilo que estiver funcionando. O próprio vice-presidente Michel Temer reiterou que as alterações mais profundas e necessárias se darão especificamente nas áreas que têm sérios problemas e precisam avançar, sobretudo no campo econômico, duramente afetado por uma das maiores recessões de nossa história republicana, com desemprego recorde e inflação em alta. É fundamental agir rápido e com eficiência para dar esperança às famílias brasileiras, tão vilipendias pelo descalabro promovido pelo lulopetismo.

O governo Itamar, ao qual servi honrosamente como líder na Câmara, é a prova cabal de que, ao contrário do que se viu no período em que o PT conduziu o país, é possível formar maiorias no Parlamento e angariar apoios a partir de um programa e de propostas, e não das tenebrosas transações que desaguaram no mensalão e no petrolão – os dois maiores escândalos de corrupção da história do Brasil, que têm o carimbo do PT e as digitais de Lula e Dilma. O governo de transição que se avizinha será de coalizão, como deve ser em uma democracia em que se respeitem as instituições republicanas, e não de cooptação.

Os mais de 70% de deputados que votaram pelo impeachment na Câmara e os muitos milhões de brasileiros que tomaram as ruas em todo o país já deram o seu recado: é preciso encerrar o governo que aí está, autor de uma série de crimes de responsabilidade, e escrever um novo capítulo de nossa história. Em nome da esperança, do destino das novas gerações, da democracia e da Constituição, chegou a hora de o Brasil se livrar daqueles que se locupletaram do Estado e o tomaram de assalto em prol de um mero projeto de poder. Precisamos virar essa página e não devemos ter medo do futuro, que pede passagem.

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Roberto Freire é deputado federal por São Paulo e presidente nacional do PPS

Estamos falando da mesma coisa? - Fernando Gabeira*

- O Estado de S. Paulo

Acordei na segunda-feira com um travo na garganta. A Câmara dos Deputados votou o impeachment. Era o desejo da maioria. Mas a maneira como o fez, com aquela sequência de votos dedicados à família, a filhos, netos e papagaio, com Bolsonaro saudando um torturador... fui dormir como se estivéssemos entrando na idade das trevas.

Entretanto, quando me lembro das grandes demonstrações, sobretudo nas áreas metropolitanas do Brasil, constato que os deputados inventaram um enredo próprio para o impeachment. Não há sintonia com a realidade das ruas. Isso é demonstrado pela própria reação nas redes sociais.

O Brasil parece ter descoberto um Congresso que só conhecia fragmentariamente. Isso dói, mas em médio e longo prazos será bom.

Na segunda passada, na minha intervenção radiofônica, previ essa cantilena. Foi assim no impeachment de Collor. De lá para cá, o Congresso, relativamente, decaiu em oratória e cresceu em efeitos especiais. Houve até uma bomba de papel picado no plenário.

Durante anos as coisas se degradaram por escândalos no aumentativo: mensalão, petrolão. No impeachment, os 511 deputados passaram por um raio X do cérebro, diante de cerca de 100 milhões de expectadores.

Visto de fora, abstraindo a causa das ruas, foi um espetáculo grotesco.
Isso implica consequências. Agora todos têm ideia ampla da Câmara real. Durante os debates, viram vários dedos apontados para Eduardo Cunha. Numa escala de golpista, corrupto e gângster. E Cunha ouviu tudo, gélido, apenas esfregando as mãos.

Tem de ser o próximo a cair. Sua queda une os dois lados do impeachment, sem muros. Nem que se tenha de pedir socorro ao Supremo, tentar comunicar aos ministros a sensação de urgência da queda de Cunha.

O descompasso entre a sociedade, que pede uma elevação no nível político, e a Câmara pode levar a um novo comportamento eleitoral.

O impeachment é uma tentativa de iniciar o longo caminho para tirar o Brasil da crise. Algumas pessoas choraram pelo resultado, outras, como eu, choraram apenas pelo texto.

Compartilho parcialmente a sua dor. Mas os generais da esquerda as levaram para uma batalha com a derrota anunciada. Mascararam de perseguição política um processo policial fundamentado, com provas robustas e até gente do PT na cadeia.

Ao classificarem como golpe o impeachment, tentaram articular o discurso salvador que pudesse dar-lhes algum abrigo dos ventos frios que sopram de Curitiba.
Sobraram motivos para ressaca do day after. O essencial, se tomarmos a crise como referência, é que o processo siga seu curso da forma que prevê o rito, que é razoavelmente rápida.

Muito brevemente o centro do processo será Michel Temer. As coisas que vazam de seu refúgio não são animadoras. Por exemplo, consultar um ex-ministro da Comunicação de Dilma que propunha uma articulação do governo com a guerrilha na internet. O próprio ex-ministro deveria ser mais leal a Dilma.

Aliás, o rosário de traições na Câmara foi deprimente. Um deputado do Ceará disse: desculpe, presidente, mas voto pelo impeachment. É um espetáculo da natureza humana que me fez lembrar as traições a Fernando Collor. Gente que jantou com ele na noite anterior ao impeachment.

Costumo deixar essas considerações gerais para domingo. O foco é o processo de impeachment como esperança de dar um passo para enfrentar a crise. Deixo apenas esta lembrança para exame posterior: com 90 deputados investigados, a Casa Legislativa que existe legalmente cassou Dilma. Mas agora que todos os conhecem, não seria o momento de questionar o foro privilegiado?

Ao longo de 16 anos de Congresso, sempre defendi privilégio para o direito de voz e voto, como na Inglaterra. Fora daí, Justiça comum.

É um fragmento de uma reforma política que pode vir de baixo, como a Lei da Ficha Limpa. E a mensagem é clara nestes tempos de Lava Jato: a lei vale para todos.
Se os processos de impeachment, no Brasil, acontecem de 20 em 20 anos, creio que este foi o último a que assisti. Privilégios da idade.

É preciso pensar agora na transição. A de Itamar era mais leve. Ele não tinha partido forte, não era candidato. Temer tem uma energia pesada em torno dele. A começar por Cunha.

Em tese, precisa tocar o barco e contribuir para que alguns corpos caiam no mar. Se não contribuir, vão cair de qualquer maneira, só que de forma mais embaraçosa. O que está em jogo é o destino de muita gente, um projeto para sair da crise.

Já que decidiu ficar calado por um tempo, Temer deveria pensar. O cavalo que chega encilhado à sua frente é um cavalo bravio. Para montá-lo é preciso coragem.

A vitória do impeachment na Câmara dos Deputados foi resultado do movimento de milhões de pessoas indignadas com a corrupção, castigadas pela crise econômica.

Se considerar apenas o resultado da Câmara, não tocará nos dois temas ao mesmo tempo. Mas se considerar o esforço social que levou a esse resultado, não pode ignorar o problema da corrupção, como se ela estivesse indo embora com os derrotados de agora.

Com mais faro para o desastre, o PMDB pode organizar melhor que o PT a sua retirada. Compreender, por exemplo, que não está chegando ao poder, mas se preparando para sair dele com estragos menores nos seus cascos bombardeados pelos canhões da Lava Jato.

É uma transição na tempestade até 2018. Nenhuma força política sabe se chegará lá ou como chegará. Diante da vigilância social, o jogo ficou mais complicado.
Mas esse é o nível do nosso universo político. Do salão verde para o azul, espera-se uma ligeira melhora no Senado. Ainda assim, é longo e espinhoso o caminho de uma renovação política no Brasil.

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*Fernando Gabeira é jornalista