terça-feira, 22 de março de 2016

Opinião do dia – Luiz Sérgio Henriques

De modo polêmico, e considerando o quadro de devastação institucional que ora nos aflige, é possível argumentar que a “função Berlusconi” entre nós tenha antecedido a operação judiciária e se corporificado no partido “hegemônico” da esquerda e, em especial, em seu líder indiscutível. O modo de existência e comportamento do lulopetismo esteve sempre como que inscrito no código genético: autoproclamado portador das exigências substantivas da democracia, suposto realizador, nos anos áureos entre 2003 e 2010, de uma verdadeira revolução social, a que o credenciava até a natureza operária, d’origine controllata, do dirigente máximo, por que estimularia o respeito – teórico e prático – às formas da democracia? Não seria tal respeito expressão de classe oposta ao interesse real dos trabalhadores, menos fixados em firulas jurídicas do que em ingressar no mundo do consumo (privado), a despeito de elites irracionalmente avessas à expansão do próprio capitalismo?”

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Luiz Sérgio Henriques é tradutor e ensaísta, é um dos organizadores das ‘Obras’ de Gramsci no Brasil, ‘Berlusconi e Lula’, O Estado de S. Paulo, 20/03/2016

Governo já vê risco de derrota no impeachment

• Planalto teme estar no limite dos 172 votos para tentar barrar processo

Dilma e aliados contabilizam perda de apoio enquanto situação se agrava e ação contra a presidente avança na Câmara, que ontem realizou sessão usada para contar prazo para a defesa

Com a deterioração de sua base política, o governo refez as contas e estima que está hoje no limite dos 172 votos necessários para barrar o impeachment da presidente Dilma no plenário da Câmara. Há 15 dias, antes da divulgação da delação premiada do senador Delcídio Amaral, o Planalto contava ter de 240 a 250 votos. Para tentar reverter o quadro, Dilma pretende montar força- tarefa coordenada pelo ex- presidente Lula, liberado ou não para tomar posse como ministro.

Base se deteriora

• Governo avalia que perdeu folga e que hoje está no limite para barrar processo na Câmara

Catarina Alencastro, Cristiane Jungblut, Simone Iglesias, Leticia Fernandes Eduardo Barretto - O Globo

- BRASÍLIA- O governo está preocupado com a deterioração da situação nos últimos 15 dias e avalia que está no limite para conseguir impedir o impeachment da presidente Dilma Rousseff. Na reunião comandada por Dilma com dez ministros e quatro líderes aliados no Congresso foi feita uma avaliação de que o governo perdeu a margem de votos que tinha antes do acirramento da crise política, a partir da divulgação da delação do ex- líder do governo Delcídio Amaral, e hoje teria pouco mais do que os 172 votos para conter o processo no plenário da Câmara.

Um participante da reunião contou que até o fim da semana retrasada, a conta era que o governo tinha entre 240 e 250 votos. Já na comissão especial do impeachment, o governo contabiliza apenas metade dos votos, algo entre 32 e 33 dos 65, além de dois indecisos na base aliada.

O líder do governo no Senado, Humberto Costa (PT-PE), admitiu que o governo tem pequena margem de vantagem e que a tarefa agora será ampliá-la. Para isso, Dilma quer montar uma força-tarefa. O ex-presidente Lula, ainda que não consiga assumir a Casa Civil, tem papel- chave para arregimentar parlamentares na guerra contra o impeachment. Os outros soldados são Jaques Wagner (chefe de gabinete de Dilma), Ricardo Berzoini ( ministro da Secretaria de Governo), líderes aliados e ministros do PMDB, que foram chamados a ajudar. A própria Dilma conversará com os integrantes da comissão. A presidente pretende se reunir com integrantes do PMDB e em seguida com os do PSD, partido do presidente da comissão, Rogério Rosso (DF).

— Pelo primeiro placar, temos uma pequena vantagem, mas nada que não possa ser ampliado durante o processo de discussão. Vamos trabalhar junto a cada deputado — disse Costa.

Na reunião, também foi dado um informe sobre as atuações jurídicas para garantir a posse do ex-presidente Lula como ministro. Ele continua tentando um encontro com o vice- presidente Mibém Temer, presidente do PMDB. O partido, o maior da base aliada, marcou para dia 29 uma definição sobre sua permanência no governo. Embora aliados de Dilma ainda nutram a expectativa de que o PMDB permaneça no governo, expoentes do partido garantem que o desembarque daqui a uma semana será “quase unânime”.

— Não haverá duas chapas, será chapa única. Mais de 90% do PMDB são a favor do rompimento — disse um cacique peemedebista anti- Dilma.

Situação é tida como delicada
Depois do relato que recebeu, Dilma buscou saber ontem à tarde como está o placar junto às bancadas aliadas. A presidente chamou ao seu gabinete os ministros André Figueiredo (Comunicações), do PDT; Antônio Carlos Rodrigues ( Transportes), do PR; e Eduardo Braga ( Minas e Energia), do PMDB. Nestas conversas, segundo relato de participantes ao GLOBO, Dilma disse saber que sua situação é “delicada” e “difícil”, mas que lutará até o fim e que não renunciará em hipótese alguma.

— A presidente quer ter clareza absoluta sobre os votos que tem na Câmara. Está serena, mas consciente de que a situação não é fácil. Ela pediu apoio e que a gente converse com todos os deputados — relatou um dos participantes dessas reuniões.

Pelo PR, a presidente foi informada de que enfrenta uma dificuldade significativa. Dos quatro parlamentares na comissão do impeachment, Rodrigues disse não ser possível garantir hoje, com 100% de certeza, nenhum voto a seu favor. Em plenário, dos 40 deputados, 20 são a favor do impeachment. Entre os peemedebistas, o cenário também é de divisão. Os ministros do PMDB decidirão na próxima terça-feira, após reunião do Diretório Nacional, que rumo tomarão.

De André Figueiredo, Dilma ouviu que os dois pedetistas na comissão do impeachment votarão contra o afastamento, e a bancada de 19 deputados está fechada com ela. Em uma operação casada para tentar sobreviver na aguda crise política, Dilma recebe hoje no Planalto um grupo de juristas que condenam as últimas ações do juiz da 13 ª Vara Federal, Sérgio Moro.

A primeira reunião após a eleição da mesa da comissão do impeachment começou conturbada ontem. Convocada para que o presidente, Rogério Rosso (PSD-DF), e o relator do processo, Jovair Arantes ( PTB- GO), anunciassem o cronograma dos trabalhos, a reunião logo recebeu 17 pedidos de questão de ordem, a maioria de parlamentares do PT e partidos da base aliada, mas tamchel do PSOL. O questionamento é sobre a inclusão da denúncia da delação premiada do senador Delcídio Amaral. Argumentam que a petição original e a denúncia acatada em plenário pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB- RJ), dizem respeito apenas ao suposto crime de responsabilidade em razão das chamadas pedaladas fiscais, e que seria desvio de finalidade anexar outros elementos, o que também prejudicaria o direito de defesa da presidente.

PT cogita recurso ao STF
Sílvio Costa (PTdoB-PE) disse que o aditamento foi feito por “má vontade” de Cunha:

— Um médico, quando vai fazer uma cirurgia de coração, ele sabe que o diagnóstico é para cirurgia de coração. Qual foi, presidente, o motivo do pedido de impeachment? Pedalada fiscal e ponto. Aí o presidente Cunha, por má vontade, vem agora fazer um aditamento? Me parece que Vossa Excelência não é um empregado de Eduardo Cunha, tem o dever regimental de decidir.

Chico Alencar (PSOL- RJ) também criticou a possibilidade de se anexar a delação ao processo:

— Começaríamos muito mal se essa decisão do presidente Eduardo Cunha tiver amparo. Isso só pode ser um novo pedido de impeachment. Pedalada fiscal não tem nada a ver com a delação do Delcídio. Pão é pão, queijo é queijo.

Vice- presidente da comissão, Carlos Sampaio ( PSDB- SP) argumentou que as novas informações não alteram o andamento do processo, já que elas não poderão, segundo ele, ser usadas como elemento de decisão.

Após a reunião da comissão, Wadih Damous ( PT- RJ) disse que o PT vai recorrer ao Supremo Tribunal Federal caso o aditamento da delação de Delcídio não seja anulado por Rogério Rosso.

À noite, a oposição decidiu retirar o aditamento. A tendência é que um novo pedido seja apresentado incluindo as acusações de Delcídio.

Após grampo, ninguém telefona para Lula

• Depois de divulgação de conversas gravadas, petista teve de viajar a Brasília para tratar pessoalmente de articulação contra impeachment de Dilma

Catarina Alencastro, Cristiane Jungblut e Eduardo Barretto - O Globo

BRASÍLIA - Diante da impossibilidade de comandar a articulação política longe de Brasília, como foi aconselhado por amigos, o ex-presidente Lula resolveu ir para a capital federal ontem. Aliados comentam que, se não fosse, ele não conseguiria levar a cabo a missão de arrebanhar votos contra o impeachment, o que envolve longas conversas. O motivo é pitoresco: depois da divulgação de ligações telefônicas de Lula, ninguém mais se dispõe a falar com ele pelo telefone.

Apesar dos apelos para que ficasse longe do Planalto para evitar interpretações de que estaria desafiando decisão de Gilmar Mendes, do Supremo, que suspendeu sua nomeação na Casa Civil, Lula foi convencido a ir a Brasília. A tendência é que despache do hotel onde está hospedado e mantenha reuniões no Alvorada, residência oficial da Presidência, como ocorreu ontem à noite, e na residência de políticos. Ontem, ele chegou no fim do dia e foi direto para o hotel onde costuma se hospedar na capital, a poucos metros do Alvorada, onde jantou com Dilma à noite.

Interlocutores do petista contam que ele deve ficar a semana toda em Brasília, quando manterá reuniões políticas. Enquanto isso, aguarda o desenrolar de seu destino político, no Supremo Tribunal Federal (STF). A vinda dele foi cercada de mistério. Ao chegar ao hotel, o carro que o levava deixou outro carro passar na frente, dificultando o registro de imagens. Ele ficou cerca de uma hora no local, esperando o chamado da presidente para o Alvorada. Ao partir para o encontro de Dilma, o ex-presidente procurou se ocultar dentro do carro, colocando a mão sobre o rosto.

O líder do PT no Senado, Paulo Rocha (PA), foi um dos que disseram a Lula que ele precisava comandar pessoalmente as negociações para conter o processo de impeachment na Câmara. O líder do governo no Senado, Humberto Costa ( PT- PE), também defendeu a ida de Lula a Brasília, para conversar diretamente com os integrantes da comissão do impeachment. Nos bastidores, petistas brincavam que “falar com Lula por telefone não dá mais”.

Na Casa Civil, os trabalhos foram tocados pela secretária- executiva, Eva Maria Chiavon, que atendia como ministra da Casa Civil substituta. Diante da vacância do chefe da pasta, o advogado- geral da União, José Eduardo Cardozo, passou boa parte da tarde em reuniões no 4 º andar do Planalto, onde Lula ficará caso assuma definitivamente o cargo. Cardozo se reuniu com o subchefe de Assuntos Jurídicos, Rodrigo Messias, escalado por Dilma para levar a Lula o polêmico termo de posse para que ele assinasse antes de embarcar para São Paulo, na última quinta-feira.

PPS reafirma o caminho da democracia e reitera o seu total apoio ao juiz Sergio Moro e à Operação Lava Jato

O presidente nacional do PPS, deputado federal Roberto Freire (SP), afirmou na abertura da Conferência Nacional sobre as Cidades, aonde o tema da Governança Democrática foi predominante, que o momento político brasileiro é importante e que a agitação que toma conta do país é favorável ao impeachment de Dilma Rousseff. Ele criticou a estratégia do PT de buscar convencer a população de que o processo de cassação seria uma tentativa de golpe.

Freire afirmou ainda que a ação exige coragem de todos os brasileiros, citou a decisão da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) favorável ao impeachment da presidente e ressaltou que o seu afastamento é o único caminho para tirar o país da mais grave crise política, econômica e ética da história republicana.

Ele destacou que é necessário atacar a tentativa do PT e do governo federal de desmoralizar a justiça, em especial o juiz Sérgio Moro, que junto com as ações da Política Federal e do Ministério Público merece todo o respaldo da sociedade.

Ao finalizar o discurso de abertura, Freire propôs que a Conferência debatesse as decisões e os encaminhamentos tendo em vista o atual momento do país, afirmando que o caminho que o PPS quer seguir é o da defesa da democracia e o do fortalecimento das cidades. Ao final do evento, realizado nos dias 19 e 20 de março em Vitória, no Espírito Santo, foi aprovado um documento político neste sentido.

Fachin nega habeas corpus a favor de Lula; Rosa Weber decidirá outro

• Advogado- geral da União entra com outras ações em defesa do ex- presidente

Após o ministro do STF Edson Fachin se dizer impedido, Rosa Weber, citada por Lula em grampo, relatará pedido do ex-presidente.

Carolina Brígido - O Globo

- BRASÍLIA- O ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal ( STF), negou ontem um dos habeas corpus que pedem para derrubar a decisão do ministro Gilmar Mendes, que suspendeu a posse do ex- presidente Lula para a Casa Civil e enviou as investigações contra Lula para o juiz Sérgio Moro. De acordo com Fachin, a regra do STF não permite que um ministro derrube a decisão de outro por meio de habeas corpus. A ação tinha sido apresentada pelo advogado Samuel da Silva, que não representa Lula. Silva queria ainda que fosse expedido alvará de soltura em favor do petista, caso ele fosse preso.

Fachin também se declarou suspeito para julgar outro habeas corpus, esse de autoria de advogados de Lula. O ministro citou trecho do Código de Processo Civil segundo o qual o juiz é suspeito para julgar se for “amigo íntimo ou inimigo de qualquer das partes ou de seus advogados”. E disse ter relação com “um dos ilustres patronos subscritores da medida”, sem citar nomes.

Por sorteio, a relatoria coube à ministra Rosa Weber, citada por Lula num dos grampos divulgados semana passada. Ao ministro Jaques Wagner, Lula diz: “Eu queria que você visse agora, falar com ela (Dilma) já que ela está aí, falar com ela o negócio da Rosa Weber. Está na mão dela para decidir. Se homem não tem saco, quem sabe uma mulher corajosa possa fazer o que os homens não fizeram”. Lula se referia à ação pedindo suspensão da investigação da Lava- Jato contra ele. No início do mês, Rosa negou a liminar.

“Risco à soberania nacional”
Ontem à noite, o advogado- geral da União ( AGU), José Eduardo Cardozo, entrou com duas novas ações no STF em defesa de Lula. Em um mandado de segurança, ele também pede para anular a decisão de Gilmar Mendes. Para Cardozo, Gilmar deve ser declarado suspeito para ser relator do caso, pois teria se declarado publicamente contrário à posse de Lula antes mesmo de ela ocorrer. E porque a advogada do PPS, que assina o pedido julgado por Gilmar, é professora do Instituto de Direito Público (IDP), do qual o ministro é sócio. Luiz Fux julgará esse pedido.

Em outra ação, a AGU pede ao STF para que seja anulada a decisão do juiz Sérgio Moro de divulgar os áudios de conversas de Lula com várias pessoas, inclusive Dilma Rousseff. Segundo Cardozo, Moro pôs em risco a soberania nacional ao divulgar diálogos que não teriam relação direta com a investigação: “Tomar a decisão de divulgar o conteúdo de conversas envolvendo a presidenta da República coloca em risco a soberania nacional, em ofensa ao Estado democrático republicano. A interceptação é medida extrema que ofende direitos e garantias constitucionais, como a privacidade”.

Para a AGU, ao encontrar pessoas com foro especial nos áudios, Moro deveria ter encaminhado o material para o STF. Caberá ao ministro Teori Zavascki julgar esse pedido.

A decisão definitiva sobre a validade da nomeação de Lula para a Casa Civil deve ficar para abril. Durante essa semana, o STF está em recesso — portanto, não haverá sessões plenárias. Além disso, Gilmar Mendes viaja para o exterior e só volta no dia 2. O ministro precisará ser ouvido antes de qualquer decisão dos demais ministros em ações que o consideram suspeito.

Hoje, são 21 ações no Supremo tratando do destino de Lula. Em uma delas, Teori poderá decidir se o foro para investigar Lula é o STF ou a primeira instância. Essa é a maior preocupação da defesa do ex-presidente. O pedido da defesa de Lula não questiona a suspensão da posse na Casa Civil. Os advogados querem que o STF impeça Moro de investigar Lula e de divulgar novas gravações.

Gilmar suspendeu a validade da posse de Lula com o argumento de que Dilma só o nomeou para garantir o foro privilegiado e assim tirar as investigações das mãos de Moro. Ocupando o cargo de ministro, Lula só poderia ser investigado pelo STF. No pedido de habeas corpus, a defesa de Lula afirma que o ministro extrapolou, pois decidiu também transferir as investigações para Moro.

Para Cardozo, a decisão é “flagrantemente ilegal” e está gerando “dano irreparável à União e à República Federativa do Brasil”. Segundo o advogadogeral, a nomeação de ministro de Estado é atribuição exclusiva do presidente. E a falta de um ministro em cargo estratégico estaria impedindo Dilma de “exercer, com o auxílio dos ministros de Estado, a direção superior da administração federal”.

Para alegar a suspeição, Cardozo citou que, no último dia 16, no plenário do STF, Gilmar teria antecipado seu juízo de valor sobre a escolha de Lula ao cargo: “Estamos diante de um dos quadros mais caricatos que a nacionalidade já tenha enfrentado. Como o último lance, busca-se o ex-presidente em sua casa em São Bernardo do Campo. É quase com uma acusação que essa casa será complacente com os contrafeitos”, declarou Gilmar na ocasião.

PSDB e PMDB costuram governo de transição

• Tucanos apoiariam Temer, que não tentaria reeleição

Maria Lima, Cristiane Jungblut - O Globo

- BRASÍLIA- Um pré-acordo sobre a participação do PSDB num governo de transição, se aprovado o impeachment da presidente Dilma Rousseff, começou a ser costurado nos bastidores por integrantes das cúpulas peemedebista e tucana. Segundo senadores dos dois partidos, o presidente do PSDB, Aécio Neves ( MG), foi ontem a São Paulo para se encontrar com o vice- presidente Michel Temer. Seria a primeira conversa dos dois desde o agravamento da crise política.

Senadores tucanos e peemedebistas trabalham no acordo, que incluiria o presidente do Senado, Renan Calheiros (AL). Por essas tratativas, o PSDB participaria de um governo Temer; em contrapartida, o PMDB apoiaria o fim da reeleição, deixando o caminho livre para o PSDB em 2018.

— Conversamos na semana passada, e o Aécio ficou de conversar hoje ( ontem) com Michel. Eles querem um acordo com o PMDB. Apoiam o Michel, participam do seu governo, se tiver o impeachment, com uma condição: ele extinguir a reeleição. Assim, Michel não pode concorrer à reeleição, e 2018 fica com eles — disse um senador peemedebista que conversou com os tucanos semana passada.

Temer, porém, não quer se expor neste momento. Ontem, divulgou nota oficial para reafirmar que “não tem porta-voz, não discute cenários políticos para futuro governo e não delegou a ninguém anúncio de decisões sobre sua vida pública”.

Em entrevista ao jornal “O Estado de S. Paulo”, o senador José Serra ( PSDB- SP) disse que Temer deve assumir compromissos com a oposição, se a presidente Dilma for afastada do cargo. Em resposta ao tucano, Temer disse que, quando tiver que anunciar algum posicionamento, “ele mesmo o fará, sem intermediários”.

Apesar da cautela do vice, nem tucanos nem peemedebistas querem esperar o dia 29 ( data da convenção do PMDB em que deverá ser selado o rompimento do partido com o governo), ou a aprovação do impeachment para começar a estruturar um governo de união nacional e de transição.

— Não dá para esperar. Dilma vai cair logo, e é preciso saber o que colocar no lugar — explicou um senador tucano.

Segundo um senador tucano, Aécio mudou de ideia em relação ao impeachment diante do agravamento da crise.

— Aécio era contra o impeachment, mas agora está se rendendo a esse fato irremediável.

Temer evita reaproximação tentada por Dilma e Lula

• Vice só deverá encontrá- los após partido decidir se fica no governo

Maria Lima e Cristiane Jungblut – O Globo

- BRASÍLIA- Se o ex-presidente Lula e a presidente Dilma Rouseff pretendem se reaproximar do vice- presidente Michel Temer, para barrar a aprovação do impeachment, vão procurá-lo em vão. A ordem na cúpula do PMDB é que Temer continue “em lugar incerto e não sabido” e só volte a conversar com Lula e Dilma após o dia 29, quando o PMDB oficializará o rompimento com o governo, arrastando outras siglas da base.

— A chance de haver essa reaproximação com Dilma e Lula é zero. Temer está em lugar incerto e não sabido, quem o procura não está achando. E vai continuar assim até o dia 29 — diz uma fonte do PMDB.

Embora senadores da oposição estejam conversando com os senadores Romero Jucá ( PMDB-RR), Eunício Oliveira (PMDB- CE) e o presidente do Senado, Renan Calheiros ( PMDB- AL), para articular o impeachment, Temer não quer se envolver com o Planalto e o processo no Congresso.

Na cúpula do partido houve irritação com entrevista do senador José Serra ( PSDB- SP) ao “Estado de S. Paulo”, publicada ontem, na qual o tucano diz que o vice deve assumir compromissos com a oposição, se Dilma for afastada do cargo. Para Serra, Temer deve se comprometer a não disputar a reeleição, nem interferir nas eleições municipais deste ano.

— Os senadores estão conversando entre eles, mas Temer tem que ser preservar como um todo. Até para não dar abertura para manifestações como a de Serra. O que aconteceu foi bem chato, não foi bom para ninguém, e ele arrumou confusão até dentro do PSDB — reagiu um peemedebista.

Posição conjunta de ministros
Na tentativa de evitar uma divisão, os ministros do PMDB decidiram aguardar a definição do partido sobre a permanência no governo, dia 29, para tomar uma posição conjunta sobre a entrega de seus cargos. Um consenso não será fácil. A ministra da Agricultura, Kátia Abreu, que não foi ao encontro, ontem disse no Twitter que continuará defendendo Dilma.

“Continuarei escrevendo que acredito na honestidade da presidente Dilma. Até que me provem o contrário. Pedalada não é argumento”, escreveu Kátia em sua conta no Twitter.

Além de Kátia, Eduardo Braga (Minas e Energia) e Henrique Eduardo Alves ( Turismo) resistiram à ideia de sair do governo. O PMDB tem ainda mais quatro ministros: Marcelo Castro (Saúde), Celso Pansera (Ciência e Tecnologia), Helder Barbalho (Portos), e Mauro Lopes (Aviação Civil).

Apoio de José Serra a eventual governo de Temer divide tucanos

• Oposicionistas avaliam que senador se firmou como ‘ponta de lança’ da negociação; deputados veem ‘precipitação

Pedro Venceslau - O Estado de S. Paulo

A entrevista do senador José Serra (PSDB-SP) ao Estado publicada nesta segunda-feira, 21, na qual ele afirmou que o PSDB será chamado e terá “obrigação” de participar de um eventual governo Michel Temer (PMDB), causou reações imediatas entre as alas tucanas e dentro dos demais partidos de oposição.

Em caráter reservado, lideranças do PSDB próximas ao tucano avaliam que Serra despontou como “ponta de lança” da legenda na construção de um eventual governo de coalizão a ser liderado pelo atual vice-presidente peemedebista.

Deputados e integrantes da cúpula do partido, no entanto, reclamam que ele foi “precipitado” e não consultou nenhuma instância partidária antes de se pronunciar publicamente.

Os tucanos convergem na avaliação que as declarações ocorrem em um momento de fragilidade da liderança do senador Aécio Neves (PSDB-MG), que está acuado pelas citação de seu nome na delação premiada do senador Delcídio Amaral (sem partido-MS).

Líderes de outros partidos compartilham de análise semelhante. “O Serra é uma figura respeitada e tem uma boa relação com o PMDB do Senado, coisa que o Aécio não tem”, diz o deputado Paulinho da Força (SP), presidente do Solidariedade e líder da Força Sindical. Segundo ele, o senador paulista se colocou como o “principal articulador” da oposição a um eventual governo do PMDB, e isso causou “ciumeira” no PSDB.

“O PSDB tem que ser o protagonista de um eventual governo Temer. O Serra tem uma grande capacidade de articulação, mas as conversas não são apenas com ele”, afirma o deputado Roberto Freire (SP), presidente do PPS.

Protagonismo. A entrevista de Serra foi alvo de críticas da bancada do PSDB na Câmara. Parlamentares reclamam que o senador paulista antes resistia ao impeachment e agora tenta assumir o protagonismo do processo no lugar dos deputados. Serra, no entanto, vem defendendo, inclusive em artigos, o afastamento da presidente.

Outra reclamação da bancada foi que o partido ainda não discutiu internamente a participação em um eventual governo Temer e não há consenso interno na sigla sobre esse tema. “A opinião do Serra é sempre muito respeitada, mas o PSDB não tem ainda esse nível de expectativa sobre a participação no governo”, afirma o deputado federal Silvio Torres (SP), secretário-geral do PSDB.

A ponderação é a mesma feita por aliados diretos do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, que pleiteia a vaga de candidato à Presidência em 2018.

Nota. O vice-presidente Michel Temer afirmounesta segunda, por meio de nota, que não discute cenários políticos para uma eventual saída da presidente Dilma Rousseff, que é alvo de processo de impeachment na Câmara dos Deputados.

“Michel Temer não tem porta-voz, não discute cenários políticos para futuro governo e não delegou a ninguém anúncio de decisões sobre sua vida pública.

Quando tiver que anunciar algum posicionamento, ele mesmo o fará, sem intermediários”, diz a nota, enviada pela assessoria do vice-presidente.

O texto assinado pela assessoria de Temer não cita em nenhum momento o nome do senador José Serra. Ambos, mantém uma boa relação de amizade. Na entrevista ao Estado, o tucano aconselhou Temer a descartar a reeleição e disse não acreditar que o afastamento da presidente se dará pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) por uma questão de tempo. “A crise se aprofunda exponencialmente a cada semana, a cada dia. O Michel Temer assumindo, eu diria que deveria se batalhar para se formar um governo de união.” / Colaborou Carla Araújo

Ex-presidente atua como articulador sem cargo oficial

• Sem a garantia de que vai conseguir assumir a chefia da Casa Civil, Lula age como ministro da pasta e tenta segurar o PMDB no governo

Vera Rosa e Tânia Monteiro - O Estado de S. Paulo

/ BRASÍLIA - Mesmo sem saber se conseguirá virar ministro da Casa Civil, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva já atua nos bastidores como articulador político do governo. A prioridade de Lula é segurar o PMDB na equipe, mas há também uma estratégia para impedir a debandada de partidos menores, pois o Palácio do Planalto foi informado de que existem aliados dispostos a trair a presidente Dilma Rousseff na Comissão Especial do impeachment, instalada na Câmara.

Em jantar realizado nesta segunda, no Palácio da Alvorada, Dilma e Lula conversaram sobre o PMDB e acertaram uma ofensiva para convencer os parlamentares indecisos, uma vez que, pela contabilidade oficial, o governo tem hoje 33 dos 65 votos da comissão, um placar muito apertado. Distribuição de cargos de segundo e terceiro escalões, além de emendas parlamentares, está no cardápio das alternativas para enfrentar a crise.

Lula também vai se encontrar hoje com o vice-presidente Michel Temer, que comanda o PMDB. O ex-presidente acha que Dilma errou ao deixar Temer isolado e tenta uma aproximação para que ele ganhe protagonismo no governo, mas boa parte do PMDB define a iniciativa como “tardia”.

No quarto andar do Planalto, o gabinete da Casa Civil – até a semana passada ocupado por Jaques Wagner – foi todo esvaziado ontem para receber Lula, embora ninguém saiba se ele efetivamente ocupará a pasta.

Tribunal. Alvo da Operação Lava Jato, o ex-presidente teve sua nomeação suspensa na sexta-feira pelo ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal. O governo recorreu da decisão, mas o desfecho da batalha jurídica é imprevisível. Até a noite de ontem, Lula não havia desistido de assumir a Casa Civil, embora dissesse que não precisava do cargo para ajudar a presidente.

Com Wagner já transferido para a chefia de gabinete de Dilma, no terceiro andar, o comando da Casa Civil está com a secretária executiva Eva Chiavon.

Sob intensa pressão política, Dilma repete para interlocutores que não renunciará sob nenhuma hipótese. Na guerra contra o impeachment, o governo decidiu partir para o “tudo ou nada” e o clima no Planalto é o de lutar “até o último minuto”.

Antecipada para o próximo dia 29, a reunião do Diretório Nacional do PMDB é considerada decisiva para o futuro do governo. É por isso que Lula, mesmo combalido, corre contra o tempo para impedir a saída do principal aliado, que hoje comanda sete ministérios. O diagnóstico do Planalto é que, se o PMDB cumprir a promessa de divórcio, a derrocada do governo será iminente.

O PRB já deixou a aliança e o PSB, antes independente, passou para a oposição. Agora, setores do PSD, partido que dirige o Ministério das Cidades, e do PP, hoje no controle de Integração Nacional, pressionam as cúpulas das legendas pelo rompimento com o governo.

“Você acha que o Lula tem condições de construir algum pacto de governabilidade depois daquelas gravações da Polícia Federal que vieram a público?”, perguntou um dirigente do PMDB próximo de Temer. “Ele não tem como ajudar a Dilma nem oferecendo cargos nem emendas. Nós não queremos isso.”

Estratégia. Sob a orientação de Lula, a presidente vai se reunir com todas as bancadas na Câmara e também conversará com deputados e senadores da oposição. Recentemente, Dilma procurou o ex-senador José Sarney (PMDB-AP), acompanhada do ministro da Secretaria de Governo, Ricardo Berzoini. Ela pediu a Sarney que a ajudasse a retomar a relação com o PMDB.

Além de tentar barrar o impeachment, o “Plano Lula”, como foi batizado no Planalto, também tem um protocolo econômico. A dirigentes do PT o ex-presidente disse que, para salvar o mandato de Dilma, será preciso afrouxar o ajuste fiscal e “pôr dinheiro na mão do pobre”.

Impasse jurídico se arrasta e PT volta a se preocupar com prisão de Lula

• Ministro Edson Fachin desiste de relatar no Supremo habeas corpus do ex-presidente, que agora será analisado por Rosa Weber, citada em grampo; partido avalia que juiz Sérgio Moro pode aceitar pedido para prender petista antes de ele assumir Casa Civil

Beatriz Bulla e Ricardo Galhardo - O Estado de S. Paulo

O impasse jurídico sobre a posse do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na chefia da Casa Civil, que se arrasta desde a semana passada no Supremo Tribunal Federal, não tem previsão para terminar e, por isso, o PT voltou a se preocupar com a possibilidade de o juiz Sérgio Moro decretar a prisão do líder petista, investigado pela Operação Lava Jato e denunciado pelo Ministério Público de São Paulo.

A ministra Rosa Weber é a nova relatora no STF do habeas corpus impetrado pela defesa do ex-presidente Lula que questiona decisão do ministro Gilmar Mendes da sexta-feira passada, que suspendeu a posse do petista na chefia da Casa Civil. Rosa é uma das citadas nas conversas telefônicas do ex-presidente interceptadas pelos investigadores da Lava Jato.

O relator original, ministro Edson Fachin, se declarou ontem suspeito de julgar o caso e reencaminhou o habeas corpus à presidência do STF. Por sorteio, Rosa foi definida a nova relatora do caso. Na ação ao Supremo, os advogados de Lula pedem para suspender o trecho da decisão de Gilmar Mendes que determinou a remessa da investigação sobre o ex-presidente de volta a Moro, responsável pela Lava Jato na Justiça Federal em Curitiba, Paraná.

Fachin se declarou suspeito, pois é padrinho da filha de um dos advogados que assinam o habeas corpus em favor de Lula. A suspeição é prevista em lei e deve ser declarada quando há motivos de foro íntimo ou proximidade com as partes da causa que gerem algum tipo de obstáculo para que o ministro analise o caso de forma imparcial.

Por causa disso, líderes petistas de dentro e de fora do governo Dilma voltaram a se preocupar com a possibilidade de Moro decretar a prisão do ex-presidente nesta semana. A situação de Lula no Supremo faz os petistas avaliarem que será pouco provável a possibilidade de assumir oficialmente o ministério antes da debandada do PMDB do governo, que deve ocorrer na próxima terça.

Ontem, Moro decidiu manter a remessa ao STF dos autos da quebra de sigilo telefônico do ex-presidente, em que foi monitorada conversa dele com a presidente Dilma Rousseff, no dia 4 de março – quando foi deflagrada a 24.ª fase batizada de Operação Aletheia. No mesmo despacho, o magistrado suspendeu o envio dos inquéritos que apuram suposta ocultação patrimonial e supostos crimes envolvendo a família de Lula.

Na prática, o juiz manteve controle de casos “como os inquéritos instaurados para apurar suposta ocultação de patrimônio e supostos crimes relacionados ao esquema criminoso da Petrobrás”. Entre eles estão as investigações de compra e reforma do Sítio Santa Bárbara, em Atibaia (SP), que está registrado em nome de terceiros, mas que seria de Lula, do tríplex no Guarujá e das palestras e doações feitas pela LILS Palestra e Eventos e para o Instituto Lula. “Não há, em princípio, notícia do envolvimento de autoridades com foro privilegiado nos supostos crimes que constituem objeto daqueles procedimentos.”

No STF, a mudança do caso para as mãos da ministra Rosa Weber é vista nos bastidores como prejudicial a Lula. Rosa já teve Moro como assessor criminal no julgamento do mensalão e o STF tem entendimento recente de que não cabe habeas corpus para derrubar decisão monocrática tomada por ministro da Corte. A jurisprudência deve ser usada pela ministra para rejeitar o pedido de Lula.

Áudio. Nas conversas obtidas por meio de grampo, Lula sugere ao então ministro da Casa Civil, Jaques Wagner, que converse com Dilma sobre o “negócio da Rosa Weber”. A ministra foi relatora do pedido da defesa de Lula para retirar das mãos do juiz Moro investigação sobre o ex-presidente que corria na Justiça Federal em Curitiba.

Em um dos diálogos, Lula diz: “Ô, Wagner, eu queria que você viesse agora, falar com ela, já que ela está aí, falar o negócio da Rosa Weber. Está na mão dela para decidir. Se homem não tem saco, quem sabe uma mulher corajosa possa...”.

Na semana passada, o advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo, procurou os ministros – entre eles Rosa Weber – para dar explicações sobre os áudios. Ao deixar o encontro, a ministra não falou com a imprensa. O gabinete de Rosa Weber não emitiu qualquer manifestação sobre os áudios.

A Corte já tem 21 ações que discutem a possibilidade de o petista assumir um ministério no governo Dilma Rousseff. Na noite de sexta-feira, o ministro Gilmar Mendes suspendeu a posse de Lula. Ontem, a Advocacia-Geral da União protocolou duas ações no Supremo alegando a suspeição de Gilmar para discutir o caso e questionando a divulgação do áudio em que Lula conversa com Dilma.

Proibição. Lula não pode despachar no Planalto até que outro ministro da Corte derrube a decisão ou até que o plenário do STF decida de forma definitiva a questão. Não é comum que um ministro derrube a decisão do colega no tribunal.

Com feriado de Páscoa prolongado, não há sessão de julgamentos nesta semana.

Tampouco não há previsão, até agora, para que o caso seja julgado dia 30, data da próxima sessão plenária. Isso porque os ministros que receberam ações sobre o tema não liberaram nada para inclusão na pauta. Além disso, Gilmar Mendes está em viagem internacional até o próximo dia 2 de abril. Dessa maneira, a nomeação de Lula pode permanecer em suspenso por mais duas semanas pelo menos.

Ministro do STF nega pedido para anular decisão de Gilmar Mendes sobre Lula

• Luiz Fux decidiu extinguir o processo sem sequer analisar o mérito do pedido feito pela Advocacia-Geral da União, porque, segundo ele, a ação ia contra a jurisprudência criada pela Corte

Beatriz Bulla e Isadora Peron - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal, negou nesta terça-feira, 22, o pedido do governo para anular a decisão do ministro Gilmar Mendes, que suspendeu a posse do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na Casa Civil.

Fux decidiu extinguir o processo sem sequer analisar o mérito do pedido feito pela Advocacia-Geral da União, porque, segundo ele, a ação ia contra a jurisprudência criada pela Corte. “O Supremo Tribunal Federal, de há muito, assentou ser inadmissível a impetração de mandado de segurança contra atos decisórios de índole jurisdicional, sejam eles proferidos por seus Ministros, monocraticamente, ou por seus órgãos colegiados”, anotou o ministro.

O mandado de segurança foi protocolado nesta segunda-feira pela AGU diante da perspectiva de que o recurso sobre a decisão de Gilmar Mendes e as ações sobre o caso que estão com o ministro Teori Zavascki só irão ser julgados pelo plenário a partir da próxima semana, por conta do feriado prolongado da Páscoa no Judiciário.

Na peça, a AGU alegava que que a decisão de Gilmar Mendes de anular a nomeação de Lula para a Casa Civil foi “absolutamente peculiar, ilegal e de caráter satisfativo”.

O órgão afirmava que o ministro deveria ter se declarado impedido de julgar a situação de Lula porque já havia se manifestado sobre o caso publicamente e porque tem ligação com a advogada Marilda de Paula Silveira, que assinou o mandado de segurança apresentado pelo PPS. O pedido do partido, juntamente com uma ação do PSDB, culminou na liminar de Mendes que suspendeu a posse de Lula na última sexta-feira.

A AGU também argumentava que era prerrogativa da presidente escolher os seus ministros e que Lula poderia assumir o cargo porque está sendo apenas investigado e ainda não foi condenado. “Notadamente, em período de notória crise política e turbulência institucional, não se pode manietar a presidenta da República no seu típico espaço de discricionariedade na direção política”, diz na peça.

Em sua decisão, tomada de maneira monocrática, Gilmar Mendes afirmou que Lula havia aceitado assumir a Casa Civil para ganhar foro privilegiado e não ser mais julgado pelo juiz Sérgio Moro, responsável pelos processos da Operação Lava Jato na primeira instância.

‘PMDB e PT são irmãos siameses na crise’, diz Marina

Entrevista. Marina Silva, ex-ministra do Meio Ambiente

  • Marina afirma que partido do vice-presidente indicou diretores para a Petrobrás e que Lula ainda não deu explicações convincentes

Gabriela Caesar e Iuri Pitta – O Estado de S. Paulo

“O PMDB, durante 12 anos, como irmão siamês do PT, indicou diretores para a Petrobrás e tomou decisões políticas que nos levaram à crise. O Brasil está vivendo um momento de emergência econômica. Não podemos, em hipótese alguma, permitir que haja emergência institucional”

Marina Silva, candidata derrotada à Presidência em 2014 e atual líder da Rede, afirmou nesta segunda-feira, 21, ao Estado que um eventual governo Michel Temer não teria legitimidade, pois seria “irmão siamês” da gestão Dilma Rousseff. Por esse motivo, Temer não contaria com a adesão da Rede Solidariedade.

Candidata duas vezes derrotada à Presidência (2010 e 2014), Marina lidera as pesquisas de intenção de voto, mas evita colocar-se como o nome capaz de conduzir o País num eventual momento “pós-PT”. Ela diz preferir esperar uma definição sobre o mandato de Dilma.

A criadora da Rede refuta o argumento de que o impeachment seria um golpe, como afirma a presidente, mas insiste em dizer que o mais legítimo seria a cassação da chapa eleitoral de Dilma, da eleição de 2014, pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

“Os seis ministros do TSE devolveriam para os 200 milhões de brasileiros a possibilidade de reparar o erro a que foram induzidos a cometer”, afirma ela, sem, no entanto, confirmar se seria candidata novamente à Presidência.

Para ela, setores interessados no impeachment gostariam de travar as investigações da Lava Jato. Apesar dos elogios à operação, Marina evita dizer se apoia decisões do juiz Sérgio Moro relacionadas ao ex-presidente Lula, assim como a condenar o petista “antes do julgamento”.

ESTADO - Para a sra., qual seria a solução mais viável para solucionar a crise política no País?

O que alcança a legalidade e a finalidade de resolver a crise seria o processo de cassação no TSE. Isso se devidamente comprovado que o dinheiro da Lava Jato foi utilizado na eleição da chapa do PT e do PMDB. Os seis ministros do TSE devolveriam aos 200 milhões de brasileiros a possibilidade de reparar o erro a que foram induzidos a cometer.

ESTADO - Qual é o posicionamento da sra. quanto ao impeachment, defendido pelo ex-presidente FHC?

O impeachment cumpre uma formalidade e até dá uma resposta política imediata, mas não cumpre com a finalidade de resolver a crise e de passar o Brasil a limpo. Ao final dele, a metade que patrocinou a crise estará lá, que é o PMDB. O PMDB, durante 12 anos, como irmão siamês do PT, indicou diretores para a Petrobrás e tomou decisões políticas que nos levaram à crise. O Brasil está vivendo um momento de emergência econômica, política e social. Não podemos, em hipótese alguma, permitir que haja emergência institucional. Se estamos dizendo que queremos passar o Brasil a limpo, que o Brasil se recupere com base na legalidade e na credibilidade, então não há como isentar uma parte que ajudou a patrocinar tudo que está aí.

ESTADO - Caso o TSE casse a chapa Dilma e Temer, a sra. seria candidata à Presidência?

Acho precipitado você se colocar na fila de eleição antes de devolver a quem pode votar o direito de votar.

ESTADO - Seria melhor se Cunha deixasse a presidência da Câmara antes do impeachment?

É um processo que está em tramitação, que tem de ter o sentido de urgência e a celeridade de que o Conselho de Ética precisa para atuar no caso do presidente Cunha. Ele já deveria ter sido afastado se não fossem as manobras protelatórias que vêm sendo feitas.

ESTADO - Por que a sra. decidiu não ir às manifestações?

Eu não participei exatamente para não ter a ilusão de que as pessoas estão indo para a rua porque eu estava ajudando. As pessoas estão se mobilizando porque querem dizer que o que está aí não as representa. As pessoas estão corretas. Se as lideranças e os partidos políticos deixaram tudo isso acontecer, as pessoas estão corretas em não querer que tirem casquinha do protesto.

ESTADO - Na pesquisa do Datafolha, a sra. foi a mais bem colocada.

Não é momento de ficar pensando em pesquisa. O mais importante não é quem esta à frente ou quem está atrás. É quem está apenas com 16% (de pessoas que consideram que o governo Michel Temer seria ‘bom’ ou ‘ótimo’) querendo ser o polo que vai resolver o problema da nação. Isso (impeachment) pode ser feito em 30 dias e não resolver. Neste momento, é importante que a gente esteja focado no que é efetivo; em resolver a crise, e não em instrumentalizar a crise.

ESTADO - A sra. acredita que essa aproximação de PSDB e PMDB esconda, por trás, medo de a sra. sair vitoriosa em nova eleição?

Há setores que estão querendo estabilizar a crise política nos dois polos, tendo um cruzamento em que são convergentes. Dentro do governo, há muitos que estão querendo atrair de novo o PMDB. Dentro do PSDB, outros querendo se unir ao PMDB. Há um ponto convergente nos dois campos que se cruzam. Eles se cruzam e se encontram com a mesma proporção e a mesma intensidade, que é o arrefecimento das investigações. Isso é preocupante.

ESTADO - A sra. concorda com as recentes ações do juiz Sérgio Moro, como a condução coercitiva de Lula e as gravações telefônicas do ex-presidente?

A Justiça tem seus mecanismos próprios de controle. A Lava Jato tem dado grande contribuição.

ESTADO - A sra. aprova a divulgação de intercepções telefônicas da presidente Dilma com Lula?

A Lava Jato não grampeou a presidente. O ex-presidente Lula estava sendo investigado, havia autorização da Justiça para fazê-lo. E a conversa foi apanhada de forma fortuita.

ESTADO - Qual é a opinião da sra. quanto à nomeação de Lula?

Logo que foi feita a nomeação eu entendia como uma espécie de paliativo para a crise, criando ali, num regime presidencialista, a figura do primeiro-ministro. Isso não está previsto na nossa Constituição. Depois de tudo que aconteceu com essa nomeação, passei a ver como um combustível de aprofundamento da crise. É preciso fazer adequadamente a leitura das ruas, que tinham acabado de se manifestar, dizendo que não estão satisfeitas com o que está aí.

ESTADO - A Lava Jato tem potencial de enterrar carreiras?

Se as pessoas são culpadas, se as pessoas cometeram erros e isso fica comprovado, quem enterrou a carreira foi ela. O problema é que nesses anos todos a política foi tomada como sinônimo de ascensão econômica e de ascensão social. Quando isso ocorre, é preciso que um movimento dê um basta nisso, trazendo a Justiça para restabelecer os parâmetros legais, que é o interesse público. O que aconteceu na Itália, em que a Operação Mãos Limpas foi sendo minada, desmoralizada para não cumprir com suas funcionalidades, não pode acontecer no Brasil.

ESTADO - A sra. está satisfeita com as respostas de Lula às investigações do sítio de Atibaia e do tríplex do Guarujá?

Lula ainda está dando explicações, ainda está sendo julgado. As explicações ainda estão no processo. Obviamente até agora não são satisfatórias todas as respostas que vêm sendo dadas. Não só a esse caso, mas a todos os demais.

ESTADO - Num possível governo, a sra. tem medo de ter pouco apoio no Congresso?

Por incrível que pareça, tudo que foi projetado em mim (na campanha de 2014, quando ela foi acusada de não ter capacidade de aglutinar apoios) agora acontece sobre quem projetou. Para ver como a derrota ou a vitória se assemelham na história. Se não tivermos uma atualização da política, quem quer que seja terá dificuldade de governar. Tanto é que aqueles que ganharam com um condomínio de partidos não estão conseguindo governar.

Temer deve se reunir com Lula para informar a saída do PMDB do governo

Mônica Bergamo – Folha de S. Paulo

Michel Temer deve se encontrar com Lula em breve. O vice-presidente dirá que o PMDB desembarcará de vez do governo da presidente Dilma Rousseff.

Vale a pena tentar
Antes de aceitar ser ministro da Casa Civil, Lula titubeou justamente depois de receber informações de que o PMDB não seguiria com o governo. Foi convencido de que valeria a pena ao menos tentar convencer alguns líderes do contrário.

Data marcada
Informados da intenção de Temer, integrantes do PT defendiam que Lula nem sequer marcasse o encontro.

Data marcada 2
O PMDB deve oficializar a saída do governo na convenção marcada para o dia 29. Até lá, Temer tentará costurar para que o rompimento seja unânime ou ao menos amplamente majoritário.

Eu, hein!
E o "governo Temer", que só existirá em caso de impeachment de Dilma, já passa por sua primeira "crise". O vice ficou inconformado com declarações do senador José Serra (PSDB-SP), em que o tucano dava "conselhos" a Temer sobre como o eventual futuro governo deveria se organizar.

O dono da voz
Num diálogo ríspido, Temer disse a Serra que ninguém fala por ele –o que voltou a repetir em nota oficial lançada nesta segunda (21). Um aliado de Temer no PMDB diz que o tucano "avançou demais, como se o Temer estivesse conspirando e ele [Serra] fosse o braço da conspiração".

Vassoura
O vice ficou contrariado também com o fato de Serra dizer que ele não deveria promover uma caça às bruxas caso assuma a Presidência. "Ele vai falar isso logo do Temer, a pessoa mais apaziguadora do mundo?", diz o mesmo aliado.

Poeira
A referência de Serra a um suposto "Plano de Reconstrução Nacional", que, segundo o aliado de Temer, não existe, também irritou o vice. Segundo o interlocutor dele, o plano do vice para o país é o do PMDB, elaborado e divulgado pelo partido há alguns meses.

Dilma já prepara ação no STF contra impeachment

• Para governo, processo que tramita na Câmara não possui ‘base legal’

Valdo Cruz, Gustavo Uribe e Mariana Haubert – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Com o aumento do risco de sofrer uma derrota na Câmara dos Deputados, a presidente Dilma Rousseff orientou sua equipe jurídica a preparar um recurso ao STF (Supremo Tribunal Federal) caso seja aprovado um pedido de impeachment contra seu mandato.

A estratégia foi elaborada no fim de semana em reunião da petista com ministros e assessores e tem como objetivo judicializar o processo de afastamento diante da conclusão do Planalto de que ele "não tem base legal" e é "insustentável juridicamente".

A ideia é que, inicialmente, deputados petistas ingressem com medidas judiciais na Suprema Corte durante a tramitação do processo na comissão especial do impeachment, que foi instalada na semana passada. Caso Dilma sofra uma derrota no plenário da Câmara, o governo daria início à estratégia de "judicializar" o impeachment.

Cabe à Câmara decidir se abre ou não o processo, com o voto de pelo menos 342 dos 512 deputados federais (o presidente da Câmara não vota).

Em paralelo às ações na Justiça, a presidente orientou o núcleo político a reforçar movimento para impedir que a votação dos deputados seja ratificada pelo Senado e, assim, ela seja afastada temporariamente por até 180 dias.

Em iniciativa capitaneada pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, escalado para atuar informalmente como ministro da Casa Civil, o governo aumentará a ofensiva sobre o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e sobre a base governista, sobretudo a bancada do PMDB.

A avaliação é que, diante da perspectiva de derrota na Câmara, é necessário estruturar uma espécie de "front" de resistência para barrar o impeachment logo de cara e impeça que o Senado ceda ao longo da tramitação às pressões de manifestações de rua pela saída da petista.

Para reforçar a estratégia de judicialização, a presidente fará encontro público nesta terça (22) com juristas e advogados para defender a "legalidade democrática" e criticar o processo de impeachment.

Pressão
O governo também estuda questionar judicialmente caso a comissão especial do impeachment anexe ao pedido de afastamento a delação premiada do senador Delcídio do Amaral (ex-PT-MS).

Em notificação a Dilma, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), incluiu solicitação feita pelos autores do pedido para que sejam incluídasacusações feitas pelo senador. Para o Planalto, a decisão é "totalmente ilegal" e "não para em pé".

Segundo um assessor presidencial, se a delação premiada pode ser usada como argumento para o impeachment, será necessário também abrir pedido de cassação contra outros políticos citados por ele, como o senador Aécio Neves (PSDB-MG).

Na delação premiada, Delcídio disse que Lula mandou comprar o silêncio de testemunhas de casos de corrupção na Petrobras e que Dilma usou sua influência para evitar a punição de empreiteiros envolvidos no escândalo.

O senador acrescentou ainda que Aécio recebeu propina de Furnas, empresa de economia mista subsidiária da Eletrobras. Os três negam as acusações.

A preocupação da presidente com a aprovação do impeachment aumentou nesta segunda-feira (21) após reunião de coordenação política. No encontro, ministros de partidos da base aliada, como PR e PMDB, relataram sofrer pressões de deputados e senadores para que deixem a Esplanada dos Ministérios.

Numa tentativa de evitar uma debandada, sugeriram à petista que apresente medidas econômicas e políticas que demonstrem que o governo não acabou.

A presidente fez um apelo para que os ministros das cotas partidárias atuem de maneira mais incisiva nas bancadas federais para evitar a abertura do processo.

Com crise de Dilma, vice monta time de conselheiros econômicos

Daniela Lima, Mariana Carneiro – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA, SÃO PAULO - O time de conselheiros que vem auxiliando o vice-presidente Michel Temer a elaborar seu programa econômico, caso venha a assumir o comando do país, reúne nomes que colaboraram tanto com o PSDB como com o PT, mas hoje são críticos à gestão Dilma Rousseff.

O grupo de economistas reúne nomes como o ex-ministro da Fazenda Delfim Netto, o ex-secretário de Política Econômica no primeiro mandato de Lula Marcos Lisboa e o ex-ministro da Previdência de Fernando Henrique Cardoso Roberto Brant.

O primeiro documento elaborado com a participação dos três foi "A Ponte para o Futuro", o chamado "Plano Temer". O documento traz uma série decríticas à política econômica de Dilma Rousseff e sugere a adoção de medidas drásticas para limitar o aumento dos gastos públicos.

Muitas das propostas, porém, são consideradas impopulares, como a que prevê desvincular os benefícios da Previdência dos reajustes concedidos ao salário mínimo. Aliados do vice dizem, contudo, que são medidas imprescindíveis para a retomada da economia.

Coordenador da equipe que formulou a "Ponte para o Futuro", o ex-ministro Moreira Franco costuma dizer que seus idealizadores beberam nas fontes que "deram certo": o Plano Real, de FHC, e a "Carta ao Povo Brasileiro", de Lula.

Citado como um dos principais conselheiros do vice, Delfim Netto auxiliou os governos de Lula e Dilma, mas passou a fazer críticas à economia da presidente quando vieram à tona as chamadas pedaladas fiscais.

Ele e Temer são amigos e almoçam semanalmente em São Paulo, para discutir o cenário econômico.

Ex-secretário de política econômica de Antonio Palocci, Marcos Lisboa também é próximo de líderes do PSDB –em 2014, ajudou a formular o programa econômico da campanha de Aécio Neves.

Ele afirma que "conversa e dá sugestões a todos os partidos" e nega rumores de que ocuparia um ministério em um eventual governo Temer.

"Não o conheci e nunca o encontrei", disse Lisboa sobre o vice. "Faço colaborações em textos e leio os que me enviam.
"
O mineiro Roberto Brant é apontado como o autor da redação final da "Ponte para o Futuro". O documento também contou com a colaboração de políticos, inclusive nomes de fora do PMDB.

O senador José Serra (PSDB-SP) recebeu com antecedência um rascunho do documento e contribuiu com propostas, como a que sugere mais transparência à administração da taxa de câmbio pelo Banco Central.

Publicamente, ele não assume a colaboração.

Hoje próximo de Temer e do PMDB, Serra é visto, mesmo entre tucanos, como um possível ministeriável de uma Presidência do vice.

Ainda entre os colaboradores políticos está o senador Romero Jucá (PMDB-RR). Ele é um dos principais interlocutores de seu partido com o mercado financeiro e defendeu internamente a divulgação do "Plano Temer", quando muitos diziam que o documento era impopular.

Armínio Fraga, ex-presidente do Banco Central de FHC, também foi abordado por pessoas próximas ao vice. Ele foi reticente ao contato, mas leu o Plano Temer e o elogiou publicamente. À Folha, ele negou reunir-se com representantes do PMDB.

O vice trabalha agora no que vem sendo chamado de "Plano Temer 2", focado na área social.

Peemedebistas dizem que este documento contará com uma colaboração do economista Ricardo Paes de Barros –ele nega a participação.

Paes de Barros atuou na formulação de políticas sociais nos governos Fernando Henrique Cardoso e Lula, incluindo o Bolsa Família.

"Lula é combustível da crise", diz Marina

• "O caminho que assegura a vontade das ruas de passar o Brasil a limpo é o de novas eleições"

• "Temo que [com o impeachment] se crie uma aura de que as coisas foram resolvidas"

Por Daniela Chiaretti e Cristiane Agostine – Valor Econômico

SÃO PAULO - Líder nas pesquisas de intenção de voto para a sucessão presidencial, a ex-senadora Marina Silva (Rede) afirma que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva tornou-se o "combustível da crise", ao ser nomeado para o comando da Casa Civil. Ex-ministra do governo Lula, Marina diz que o ex-presidente se tornará uma espécie de "primeiro ministro", ao retornar ao Planalto e analisa que isso não deve atenuar os problemas enfrentados pela presidente Dilma Rousseff.
Em entrevista ao Valor PRO, serviço de informação em tempo real do Valor, a ex-senadora diz que o impeachment de Dilma é "uma realidade que está posta", mas apresenta ressalvas e diz preferir novas eleições. Para Marina, o risco de o vice-presidente da República, Michel Temer (PMDB), assumir a Presidência, em parceria com o PSDB, é o de arrefecer as investigações sobre os esquemas de corrupção do governo. "Temo que [com o impeachment] se crie uma aura de que as coisas foram resolvidas", diz. Ela acredita que há mais evidências do uso do dinheiro da corrupção para a chapa Dilma-Temer e defende o caminho da apuração pelo Tribunal Superior Eleitoral.

Marina desconversa sobre a pesquisa Datafolha divulgada no domingo, na qual aparece em primeiro lugar das intenções de voto, entre 21% e 24%. No entanto, afirma que, no caso de ser eleita, não tentará um novo mandato, mesmo se ficar apenas dois anos.

A ex-senadora critica a atitude da presidente Dilma na eleição de 2014 por ter dito que Marina, se eleita, não teria condições de governabilidade, seria deposta e o desemprego aumentaria, assim como os juros e a inflação. Para a ex-petista, a população foi induzida ao erro na campanha presidencial passada ao votar em uma "fraude eleitoral". Marina sinaliza que não apoiaria mais o presidente nacional do PSDB, Aécio Neves (MG), e diz que a aliança no segundo turno em 2014 foi "circunstancial". O tucano é investigado na Lava-Jato e foi acusado pelo senador Delcídio do Amaral (MS). "Política não é repetição", diz. A seguir, os principais pontos da entrevista:

Valor: A senhora apoia o impeachment da presidente Dilma?

Marina Silva: O impeachment é uma realidade que está posta e cada vez mais, ainda que o processo que está em tramitação tenha excluído todos os aspectos ligados à corrupção por parte do presidente [da Câmara, Eduardo] Cunha, que é implicado nas denúncias da Lava-Jato. Cunha acolheu apenas as pedaladas. O impeachment não é só um processo jurídico, mas também político e cada vez mais há indícios de que houve uso de dinheiro da corrupção para a eleição da chapa Dilma-Temer. Em uma democracia, em situação difícil como essa, tem a renúncia, o impeachment ou a cassação da chapa.

Valor: Como avalia as opções?

Marina: A renúncia tem a legalidade mas, no meu entendimento, não tem a razoabilidade, porque parece que a presidente não está sendo minimamente razoável com a gravidade da crise. É uma decisão de foro íntimo. O impeachment não é golpe, está na Constituição. Ele se fortaleceu e está fortalecido, mas cumpre com a formalidade, não com a finalidade. Porque no final da linha você vai ficar com a outra metade da origem dos problemas que hoje afetam o país.

Valor: Quais problemas?

Marina: Com as crises econômica, política e da corrupção. A partilha das diretorias [da Petrobras] não eram feitas pelo PT e PMDB? As denúncias não são de que havia uma coordenação entre os dois partidos em relação aos recursos que foram desviados? Há um ponto comum entre aqueles que querem estabilizar a crise pelo lado do PT, puxando de volta o PMDB, e o lado que quer estabilizar a crise pelo PSDB, puxando para si o PMDB, em que eles se cruzam e convergem na mesma proporção, que é arrefecer as investigações. Os governos do PT e do PSDB, durante esses 12 anos, foram ombro a ombro como irmãos siameses, responsáveis por tudo o que está aparecendo na Lava-Jato e pela crise. Quanto mais se evidenciam os indícios do uso do dinheiro da corrupção para a chapa Dilma-Temer, mais se torna um imperativo ético a saída via TSE. O TSE é o caminho de uma possibilidade de repactuar os rumos da nação, de devolver aos 200 milhões de brasileiros a possibilidade de corrigir o erro a que foi induzido a cometer, se ficar provado o uso do recurso público.

Valor: A senhor considera que foi um erro o voto em Dilma?

Marina: Se comprovado que o dinheiro da Lava-Jato foi usado para as eleições, a população terá oportunidade de corrigir o erro a que foi induzida, que é o de votar em uma fraude eleitoral.

Valor: Hoje existem mais razões para o impeachment?

Marina: O agravamento da crise, as revelações que o tempo todo vêm sendo feitas pelas investigações, deram muita força para o impeachment. A Lava-Jato está fazendo o julgamento jurídico e criminal dos que foram implicados comprovadamente. Mas uma nova eleição possibilitará que a sociedade faça o julgamento político das suas lideranças políticas. A sociedade está dizendo que o que está ai não a representa. Neste momento corre-se o risco de haver uma grande convergência. O senador José Serra diz que haverá um grande pacto e não haverá caça às bruxas. Temo que o ponto onde o polo governista e a oposição se encontrem seja exatamente no cruzamento do arrefecimento da Lava-Jato. E é isso que a sociedade não quer.

Valor: A senhora diz temer um arrefecimento das investigações...

Marina: Que se crie a aura de que as coisas já foram resolvidas.

Valor: A bancada da Rede está dividida em relação ao impeachment no Congresso. Qual será a orientação do partido?

Marina: Desde o início, quando Cunha acolheu as denúncias de impeachment, rejeitando as denúncias da Lava-Jato e aceitando apenas as pedaladas, decidimos que iríamos formar a nossa posição, de que não fazíamos parte dos que eram a priori contra ou a favor. A minha posição tem sido de dizer que não se deve a priori culpar nem inocentar ninguém. Minha preocupação maior não é em ter algo para fazer em 30 dias, mas como vamos resolver. A pesquisa Datafolha mostra que só 16% da população acredita que Temer poderá fazer um bom governo. O país já está dividido, completamente cindido. Imagina no dia seguinte do impeachment, o PT na oposição, uma nova conformação, as pessoas se colocando para fazer o grande apelo da união nacional. Mas em torno do quê? Qual foi o compromisso assumido até agora em relação a manter o trabalho da Lava-Jato? Qual foi o compromisso assumido em relação ao ajuste Brasil, que não é só o fiscal? Isso é o compromisso que deve ser assumido primeiro pela sociedade. As questões mais importantes poderão dar um fôlego para a transição, com uma agenda de vários segmentos da sociedade e todos os partidos se comprometendo com essa agenda. Quem ganhar terá que estar comprometido com essa agenda e quem perder terá que ajudar essa agenda. Isso seria pegar de fato esses dois anos para fazer a transição com o respaldo da população. Não adianta você trocar seis por meia dúzia, o PT e o PMDB produziram essa crise.

Valor: Como é que a senhora vê as manifestações de rua?

Marina: As ruas estão tendo uma sabedoria muito grande. Não estão se deixando instrumentalizar pelos partidos ou pelas lideranças políticas. Estão indo às ruas para dar termo de referência. Queremos apoiar a Lava-Jato, um governo que não tenha corrupção, em que as instituições funcionem, que cuide da saúde, educação, que recupere a economia. É isso que a população está dizendo. E tem que ter muito cuidado porque nem os que vão de verde e amarelo são a materialização da Justiça e nem os que estão indo de vermelho são a materialização da democracia.

Valor: Com qual cenário trabalha para este ano? É viável o julgamento do TSE?

Marina: Com o cenário que de fato a gente tenha uma saída que seja à altura da crise e não um paliativo. Ou ganhar fôlego de dois ou três meses e voltar tudo para uma situação de mais crise. O TSE tem o seu rito, mas também tem o seu sentido de urgência. Estamos em um momento em que é preciso sair da escalada do acirramento e ter um pouco mais de humildade.

Valor: A senhora lidera na pesquisa Datafolha, mas suas intenções de voto não aumentaram apesar da queda das dos tucanos e de Lula. Como interpreta esse sinal?

Marina: Eu não me preocupo com pesquisa, não acho que é isso. O que nos levou a essa situação que estamos vivendo é que as pessoas só ficam pensando na eleição pela eleição. A sociedade está nos dizendo algo, que o que está aí não a representa e ela quer usar sua possibilidade de escolha para pactuar uma nova representação. Não é de pessoas. É de ideias, de projetos.

Valor: A senhora vê excessos na Lava-jato?

Marina: A própria Justiça tem seus mecanismos de controle. Existe o Conselho Nacional de Justiça, do mesmo jeito que o Executivo e o Legislativo têm os seus. Estes mecanismos estão aí para que se assegure o princípio de que ninguém está acima da lei, de que nenhuma lei está acima da Constituição. O trabalho que está sendo feito pelo Ministério Público, Polícia Federal e pelo juiz Sergio Moro, desmontando este esquema de corrupção, merece o respeito e o apoio da sociedade. E quanto mais estiver em conformidade com o princípio de que ninguém está acima da lei, e que não tem nenhuma lei acima da Constituição, melhor será o resultado positivo para passarmos o Brasil a limpo.

Valor: A senhora vê algum tipo de abuso do juiz Sergio Moro na prisão coercitiva do ex-presidente Lula ou na interceptação telefônica?

Marina: Foram mais de 100 conduções coercitivas, mas essa, como é de um ex-presidente, criou toda uma polêmica. O que defendo é que não se pode desqualificar as denúncias e as investigações que estão sendo feitas a priori e nem se pode condenar ninguém a priori. Devemos ter como mapa deste caminho única e exclusivamente, a Constituição. Sem querer desqualificar as investigações, dizendo que tudo é perseguição política e nem achar que é porque está sendo investigado já é condenado. É por isso que acho que o processo no TSE nos dá a possibilidade de fazer um julgamento que não é apenas político.

Valor: Agora, este caminho tem um tempo para ser concluído e chamar novas eleições.

Marina: Sim, mas estamos em uma emergência e a Justiça também tem que ter este sentido de urgência. Tem um processo tramitando no TSE. Neste momento, imagino que todos os poderes da República e todas as instituições da República estão operando para tentar uma saída para a crise.

Valor: Como vê o ex-presidente Lula como ministro de Dilma?

Marina: Por tudo o que suscitou, por todos os poderes com que foi investido, inclusive os R$ 40 bilhões do PAC (Programa de Aceleração ao Crescimento) que estavam no Ministério do Planejamento, voltando à Casa Civil para ficar sob sua coordenação, não será apenas um ministro, mas uma espécie de primeiro-ministro. Estamos em um sistema presidencialista, e na prática, foi instituído uma espécie de sistema parlamentarista com a figura do primeiro-ministro. Um parlamentarismo sem o Parlamento. No começo eu achava que era um paliativo, mas com tudo o que aconteceu, virou um combustível para a crise.

Valor: A senhora acha que foi um erro ele assumir o Ministério?

Marina: Acho que foi uma leitura na contramão do que foram as manifestações que mobilizaram seis milhões de pessoas. De que a saída não seria mais governo, mais Lula, mais PT. É legítimo, por parte do governo buscar as saídas, mas sequer conseguiu ser um paliativo, pelo menos até agora.

Valor: Como vê a posição do senador Aécio Neves (PSDB-MG)? No segundo turno, a senhora o apoiou. Agora, o nome dele está na delação do senador Delcídio do Amaral.

Marina: As investigações têm que continuar, são elas que irão revelar quem é culpado e quem é inocente. E isso é muito importante, inclusive para quem hoje está sendo citado, seja Aécio, seja Lula, seja quem for.

Valor: A senhora apoiaria Aécio Neves novamente?

Marina: Eu o apoiei diante de uma circunstância, em que vocês viram uma eleição em que a violência da mentira política foi usada na última potência, que se eu ganhasse sofreria impeachment porque não teria apoio no Congresso, que a inflação e os juros voltariam a crescer e as pessoas perderiam o seu emprego. Tudo o que está acontecendo hoje foi projetado em mim. E naquelas circunstâncias, entendendo que era muito importante uma alternância do poder, e depois de o senador Aécio assumir o compromisso de que teria apoio para a reforma agrária, para as políticas sociais, para a questão indígena, de que manteria as conquistas sociais já alcançadas, eu manifestei o meu apoio pessoal a ele. Eu só posso dar meu voto se houver compromisso com um agenda, que foi o que eu fiz também em 2010, oferecendo tanto à Dilma quanto ao Serra. Mas agora temos outras circunstâncias completamente diferentes. A política não é repetição, a política é um momento vivo que tem que ser lido adequadamente, de acordo com a realidade como ela está acontecendo. E naquele momento, do meu ponto de vista, uma alternância de poder teria feito muito bem ao nosso país. Não foi a decisão soberana da sociedade brasileira, que eu respeito e que agora, novamente, em consonância com este respeito, eu reitero. O melhor caminho não é o do Colégio Eleitoral com o impeachment, é o das diretas, com o TSE.

Valor: A senhora sempre teve uma boa relação com o ex-presidente Fernando Henrique. Pretende se aproximar desta ala do PSDB?

Marina: Porque as pessoas acham que ter relação de respeito é sempre com alguma finalidade de aderir ou ser aderida? Eu advogo desde 2010 que é preciso um novo realinhamento político, uma cultura que conquistas não devem ser partidarizadas ou fulanizadas, mas institucionalizadas. Isso nos levou ao retrocesso em que estamos hoje. Hoje estamos perdendo o Plano Real e a inclusão social. E estamos tensionando a nossa jovem democracia

Valor: Teme confrontos piores?

Marina: Torço, espero e trabalho para que não. As manifestações pacíficas do dia 13 e dia 18 de março, são uma comprovação de que as pessoas querem busca de solução, mas não tem nada a ver com violência. Já estamos em crise econômica, em crise política, em crise social com milhões de pessoas desempregadas, tudo o que não precisamos é de uma crise institucional. Já que é com base no funcionamento das instituições o acolhimento do legítimo direito de participar dos rumos do país. E isso ela consegue na hora em que vai para uma eleição. Se tiver comprovação de que o dinheiro da corrupção foi usado na chapa Dilma-Temer, impõe-se como um imperativo ético a necessidade de uma reeleição. Aí sim pode haver uma repactuação, uma transição nesses dois anos. Neste momento, não se pode aprofundar o fosso entre a sociedade e as lideranças políticas. É uma questão de apresentar proposta, apresentar projeto.

Valor: Teria dinheiro para fazer estas eleições?

Marina: Uma eleição não deve se submeter a se tem ou não dinheiro, mas se tem ou não propostas. Se tem eleitor, sociedade, projeto. Acho que há uma possibilidade, já existe uma estrutura articulada para as eleições municipais. É possível fazer uma eleição para essa transição. Mas, mais importante que uma eleição, é um movimento que crie uma agenda comum, trazida por empresários, trabalhadores, cidadãos, intelectuais, para que, se tiver uma nova eleição, todos os partidos se comprometam com ela. Vamos assumir um compromisso, todos, com um Brasil sustentável do ponto de vista social, econômico, ambiental e ético. Em 2018, aí a sociedade decide quem vai dar continuidade. Na democracia é assim. Se existe um projeto de país que é tão maravilhoso, mas se só funciona comigo, alguma coisa está errada.

Valor: A senhora já disse que não apoiaria a reeleição. Isso se mantém em um governo curto, de dois anos? E no caso de o governo cair, como entende esse futuro próximo governo negociado pelo PSDB e PMDB?

Marina: O pior dos caminhos é a gente ficar na fila, de ser escolhido com base em intenção de voto, antes de devolver para as pessoas a possibilidade de votar. Este é o momento de devolver aos brasileiros a possibilidade de repactuar as coisas. Eu estava defendendo o processo pelo TSE antes de qualquer coisa, porque acho que este é o melhor caminho para o Brasil. E obviamente, a minha posição de não reeleição é mantida em qualquer circunstância. Isso é um princípio.

Valor: A senhora fala pela via do TSE, se se comprovar uso ilegal de dinheiro na campanha Dilma-Temer, haveria uma nova eleição. Mas a sua campanha também é investigada por suposto caixa 2 na compra do avião de Eduardo Campos. Isso não contamina sua candidatura?

Marina: Não estou discutindo a minha candidatura e como qualquer outra pessoa, não estou acima da lei. A campanha do Eduardo Campos era a campanha dele, com a prestação de contas dele, como está no TSE. A minha campanha foi outra, depois que Eduardo Campos morreu. E não tem dinheiro de caixa 2. Mas se alguém quiser investigar, eu não estou acima da lei.