O Globo
Em que medida o passeio no bosque que foi a
votação da recondução de Augusto Aras à Procuradoria Geral da República, nesta
terça-feira, melhora o ambiente do Senado para Jair Bolsonaro?
Aras foi bem-sucedido ao conseguir descolar
sua sabatina e votação em plenário do processo idêntico para a indicação de
André Mendonça ao Supremo Tribunal Federal. Costurou isso laboriosamente,
alertando senadores e integrantes do governo para a possibilidade de que, caso
a recondução tardasse, poderia haver vacância da Procuradoria-Geral da
República, com a ocupação de sua cadeira por alguém que poderia mudar os rumos
da gestão atual.
E é essa nova cara do Ministério Público
Federal que explica a extrema facilidade que Aras encontrou, simbolizada à
perfeição pelo ridículo comitê de boas vindas armado pelo presidente da
Comissão de Constituição e Justiça, Davi Alcolumbre, com senadores de todos os
partidos para, vejam só! - recepcionar o
sabatinado e conduzi-lo à comissão. Como esperar alguma dificuldade a partir de
tão ridículo salamaleque?
Aras conseguiu o milagre de obter um apoio
suprapartidário no momento mais radicalizado da polarização política do Brasil.
O segredo do sucesso é justamente a desarticulação que promoveu, ao longo de
dois anos, do aparato de investigação do MPF e de fiscalização da atividade dos
políticos.
Sob o discurso conveniente de que combateu
a “criminalização da política” promovida pelos antecessores, Aras falou o que
os senadores do PT a Bolsonaro queriam ouvir. Uma coisa é combater excessos,
que houve de fato, nos períodos anteriores, sobretudo sob o instável Rodrigo
Janot.
Outra é mudar a própria natureza do que a
Constituição preceitua no artigo 127 como atribuições do Ministério Público,
entre as quais se destaca, como síntese, a de defesa do estado democrático de
direito.
No momento em que essa democracia é mais vilipendiada, Aras se omite, e os senadores assentem com essa omissão ao reconduzi-lo sem sequer admoestá-lo.