Detenção
de Daniel Silveira por ataques ao SFT foi medida extrema e necessária — mas a
batalha contra esse movimento antidemocrático será longa
Por Marcela Mattos, Gabriel
Mascarenhas, Thiago Bronzatto, Juliana
Castro / Revista Veja
Com
1,90 metro de músculos e um arsenal de palavrões de fazer inveja a
frequentadores de arquibancadas, o deputado federal Daniel Silveira se sente
mais à vontade em meio a gritos e intimidações, armas das quais ele lança mão
frequentemente, do que com a troca de ideias. No fim de 2019, por exemplo, ao
ser questionado sobre o ato em que rasgou a placa que levava o nome da
ex-vereadora Marielle Franco, ele jogou o telefone celular de um jornalista no
chão e esbravejou: “Te bati, vai lá no STF e me processa, otário”, antes de
voltar ao plenário da Câmara e regozijar-se da agressão em conversa com policiais
legislativos. Em 19 de abril de 2020, Silveira era um dos mais inflamados na
plateia do evento em que Jair Bolsonaro celebrou o Dia do Exército participando
de uma manifestação a favor da intervenção militar. Ao término do encontro, o
deputado postou um vídeo nas redes sociais: “Vocês não fazem ideia do poder que
o povo tem. Se o povo sair às ruas de fato, e resolver cercar o STF, resolver
cercar o Parlamento… invadir mesmo, tô falando pra invadir, não tô falando pra
botar faixinha não. Tô falando pra cercar, invadir mesmo. Tô falando pra cercar
lá e retirar na base da porrada”.
Irresponsável,
truculento e perigoso, o parlamentar tem um histórico problemático desde os
tempos em que era policial militar no Rio de Janeiro, quando acumulou
investigações internas por uma série de transgressões, que incluíam faltas, mau
comportamento e gravação de vídeos ofensivos, inclusive enquanto estava em
patrulha. Acumulou mais de sessenta sanções disciplinares e oitenta dias de
prisão. Não foi expulso da corporação em 2018 porque empilhou licenças-médicas
em série por mais de noventa dias até se eleger deputado e sair da corporação.
Foi com esse nível de competência e agressividade que o ex-PM e ex-cobrador de
ônibus construiu sua curta carreira política (no primeiro pleito que disputou,
chegou ao Congresso pelo PSL do Rio em 2018), angariando votos da direita
radical no vácuo da vitoriosa onda eleitoral bolsonarista. Mas, felizmente, os
tempos de glória desse tipo de comportamento bárbaro estão com os dias contados.
Tanto no exterior quanto no Brasil há sinais claros de que esse extremismo,
baseado na pregação da violência e contra a democracia, está começando a perder
força (no voto e na reação das instituições). A união nacional que
permitiu a vitória de Joe Biden e a imediata reação contra a recente invasão do
Capitólio mostram que o fenômeno passou a ser combatido com firmeza nos Estados
Unidos. Por aqui, a prisão do deputado na semana passada — uma medida extrema,
mas necessária — foi um importante sinal de que tais comportamentos não serão
mais tolerados.
Estava
na hora. Inebriados pelo resultado das eleições e, de certa forma, sentindo-se
empoderados por sinais de simpatia do presidente Jair Bolsonaro e de seus
familiares, figuras como Silveira vêm fazendo do seu mandato parlamentar um
palanque permanente de difusão de inverdades e ataques ao Congresso e,
principalmente, ao Supremo Tribunal Federal. Com tal postura de ódio e
intolerância, eles conquistam seguidores nas redes e acabam provocando ainda
mais confusão num cenário político que já enfrenta inúmeros desafios. Para
eles, tal jogo tem sido positivo (eles ganham holofotes e arregimentam fãs).
Para o país, é uma desgraça que atrasa o entendimento político na direção que
deve — a aprovação de reformas — e ainda corre o risco de terminar em tragédia.
Até recentemente, Daniel Silveira nunca havia sido incomodado por suas atitudes
e provocações. O jogo começou a mudar, quando ele entrou na mira do STF por
meio dos inquéritos que apuram responsabilidades sobre atos antidemocráticos
e fake news. Na
terça 16, veio o desfecho inevitável.